O prémio Nobel da Economia em 2001, Joseph
Stiglitz, defendeu no dia 27 de março, em Macau, uma reestruturação ‘profunda’
da dívida soberana de Portugal, ao mesmo tempo que teceu duras críticas às
políticas de austeridade impostas pelas ‘troikas’ aos países com programa de
ajustamento na Europa. Entretanto, por cá, o caseiro fenómeno dos 74 subscritores
do manifesto pela reestruturação/renegociação é considerado como quase crime de
lesa-pátria ou, no mínimo, os autores formais daquele documento político são apodados
de irresponsáveis pela situação a que o país chegou, por via de erros de
antanho, e agora mal arrependidos dos erros de governação, mas reconvertidos a
uma postura demagógica e fautora da imagem do incumprimento no exterior.
Porém, o insigne orador no Fórum e Exposição
Internacional de Cooperação Ambiental de Macau (MIECF), que arrancou na
quinta-feira e se prolonga até sábado, declarou aos jornalistas: “É preciso
fazer uma reestruturação e, quando a fizerem, devem fazer uma reestruturação
profunda. Se não for suficiente, vão voltar a ter problemas daqui a três anos,
tal como a Grécia teve” – são palavras de Joseph Stiglitz que podem ser lidas
no Jornal de Notícias, de 27 de março.
Apontando o caso da Grécia, assegurou que a sua
dívida precisava mesmo de uma reestruturação, argumentando que “não havia outra
saída”. No entanto, apontou o dedo ao erro cometido: “Não a fizeram, de uma forma
tão profunda como deveriam ter feito. E, por isso, tiveram uma segunda
reestruturação e estão a discutir agora uma terceira e hoje o Produto Interno
Bruto da Grécia é cerca de 25% inferior ao que era antes da crise”. Mas os
portugueses sempre ouviram o pregão governamental de que “nós não somos a Grécia”,
esquecendo-nos de que a todo o momento o podemos vir a ser, se é que já não o
somos.
Embora, ao ser questionado se assinaria o
documento dos 74 magníficos a apelar à reestruturação da dívida pública portuguesa
(que já recebeu o apoio de vários economistas de renome internacional), tenha
respondido não o conhecer, não deixou de assinalar a analogia entre os países e
as empresas. “Os países tal como as empresas – afirma – quando ficam sobre-endividados,
precisam de um 'recomeço' e isso significa reestruturar”.
Nestes termos, evocou o exemplo da Argentina,
de cuja dívida apoiou a reestruturação, lembrando que este país se encontrava
na mesma situação que Portugal tem hoje e que mereceu uma reestruturação “profunda”.
Ora, se se faz uma reestruturação superficial, pouco tempo depois tem de se proceder
a outra. Nada que em Portugal se não tenha afirmado por quem vem avisando os
governantes.
Continuando a glosar o caso do aludido país sul-americano,
sublinhou que “a Argentina teve uma reestruturação muito profunda e o resultado
que obteve – durante o período desde 2003 até à crise financeira global [em
2008] – foi um crescimento de 8%, o mais rápido crescimento em qualquer país do
mundo, à exceção da China”.
Criticando a falsa ingenuidade dos governantes
europeus de países em ajustamento, entende que há algum crescimento que é tão
diminuto e tão lento que se pode tornar ilusório. “Quando falo com pessoas de
governos de países como Espanha ou Portugal – comenta Stiglitz – eles dizem: ‘As
coisas estão a melhorar. A crise acabou’. E, em certo sentido [estão]: Eles
estavam a cair de um precipício e deixaram de cair e começaram a crescer”.
Contudo, como sustentou o Nobel da Economia, com
quem alinha António Costa (a ajuizar pelas suas declarações recorrentes do
programa “Quadratura do Círculo” na SIC Notícias), “o crescimento é tão lento
que, a este ritmo, nunca mais vão voltar à normalidade. Mas, mesmo se
começassem a crescer rapidamente ia demorar anos e anos”. Nada que o Presidente
da República não tenha prevenido, como escreveu no prefácio ao último livro dos
seus roteiros presidenciais, apesar de muitas vezes se ter apresentado como o
ministro da informação do XIX governo constitucional.
Mas atente-se nas palavras referido eminente
economista: “Penso que as políticas que têm sido impostas pela ‘troika’ são
contrárias às políticas sustentáveis. São políticas que farão com que o
crescimento seja mais difícil no futuro”.
E a Europa, nas suas palavras não sai bem na
fotografia: “O preço que estes países estão a pagar, particularmente os jovens,
é enorme” – afirmou o economista laureado pelo Nobel, que, na intervenção que
proferiu na abertura do MIECF, já tinha estabelecido um paralelismo entre a
atual crise na Europa e a Grande Depressão.
Que mais necessidade tem o Governo de
testemunhos para arrepiar caminho e passar a defender os interesses de Portugal
na linha da razoabilidade negocial, à luz dos ditames do são realismo e do
mutualismo?
Porém, parece que os políticos portugueses parecem
inscrever-se no quadro de honra dos políticos mundiais, que, mesmo quando ela
está bem à vista, “nada aprendem com a História e cometem, por isso, os mesmos
erros dos seus antecessores” (Bill Fawcett, in Os 100 Grandes Erros da História. 3.ª ed. 2013: Clube do Autor). Ou,
como afirma George Santanaya (apud Fawcett, op cit): “os que não conseguem
aprender com a História estão condenados a repeti-la”.
Estaremos a militar a sério sob a égide de uma
ingovernabilidade hereditária? Ou estaremos a ser presa de governantes que,
herdeiros de uma atávica paroquialidade provinciana, mais não sabem do que governar
em regime de navegação à vista, não se coibindo de “por dá cá aquela palha” se
atirarem aos cofres pessoais e familiares daqueles que, segundo o preceito
bíblico, comem o pão com o suor do seu rosto (cf Gn 3,19)?
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