Os especialistas querem e o Governo admite um confinamento
geral como o que foi decretado em 18 de março de 2020 para vigorar a partir do
dia 19 e que se prolongou até 2 de maio.
Não só tal confinamento é pedido pelos
especialistas como estranham que se espere pela reunião do próximo dia 12,
visto que os númenos de infetados de covid-19, internados, sujeitos a cuidados
intensivos e mortos estão em crescendo, mercê do deslaçamento de cuidados por
ocasião do Natal e do Ano Novo e do frio com que este inverno nos mimoseia.
O Chefe de Estado, ouvido o Governo e obtida autorização
do Parlamento, pelo Decreto do
Presidente da República n.º 6-A/2021, de 6 de janeiro, renovou “a declaração do
estado de emergência, com fundamento na verificação de uma situação de
calamidade pública”, com “a duração de 8 dias, iniciando-se às 00h00 do dia 8 de janeiro de 2021 e
cessando às 23h59 do dia 15 de janeiro de 2021, sem prejuízo de eventuais
renovações, nos termos da lei”.
E o Conselho de Ministros aprovou, a 7 de janeiro, o decreto que regulamenta a prorrogação do estado de
emergência decretado pelo Presidente da República, em todo o território
continental, para entre as 00h00 do dia 8 de janeiro de 2021 e as 23h59 do dia
15 de janeiro.
Trata-se do
Decreto n.º 2-A/2021, de 7 de janeiro, semelhante aos congéneres anteriores (aliás, procede à 2.ª alteração ao Decreto n.º 11/2020,
de 6 de dezembro, alterado pelo Decreto n.º 11-A/2020, de 21 de
dezembro), o qual, “tendo por base a
reavaliação da situação epidemiológica no país, atualizou a lista dos
concelhos de risco e procedeu ao agravamento das medidas para o fim de semana
de 9 e 10 de janeiro” e
decidiu estender aos concelhos em risco
elevado a proibição de circulação na via pública a partir das 13h00 no predito fim
de semana, bem como aplicar a todo o território nacional continental a
proibição de circulação entre concelhos entre as 23h00 do dia 8 de janeiro e as
05h00 do dia 11 de janeiro de 2021, salvo por motivos de saúde, de urgência
imperiosa ou outros especificamente previstos.
Também a 7
de janeiro, o Conselho de Ministros aprovou o decreto-lei que prorroga o apoio
extraordinário à retoma progressiva de atividade em empresas em situação de
crise empresarial, já que, face à evolução da pandemia, o Governo assumiu a
necessidade de atualizar para 2021 o quadro de apoios extraordinários à
economia, ao emprego e às famílias. Logo, em conformidade com essa assunção:
estabelece que “todos os trabalhadores que estejam abrangidos pelo lay-off
simplificado, lay-off do Código do Trabalho (motivado pela pandemia da doença
Covid-19 e que se inicie após 1 de janeiro de 2021) e apoio extraordinário à retoma progressiva de
atividade passem a auferir 100% da sua retribuição normal ilíquida até 3 vezes a Retribuição Mínima Mensal Garantida (RMMG), não havendo lugar a esforço adicional dos empregadores”; cria “o apoio
simplificado para microempresas em situação de crise empresarial, tendo em
vista a manutenção de postos de trabalho”; prorroga “o apoio extraordinário à
retoma progressiva de atividade em empresas em situação de crise empresarial
até 30 de junho de 2021”; estende “ao elenco dos beneficiários do apoio à
retoma os membros de órgãos estatutários que exerçam funções de gerência”; e
mantém “a dispensa parcial de contribuições para a segurança social, a cargo da
entidade empregadora, para as micro, pequenas e médias empresas”.
Foi, ainda,
no âmbito da pandemia, aprovado o decreto-lei que prolonga até ao final do ano
de 2021 a vigência das regras de atribuição de financiamento e compensações aos
operadores de transportes essenciais, no âmbito da pandemia Covid-19.
Além disso,
o Primeiro-Ministro, numa altura em que se aguarda para perceber o impacto real
do Natal e do Ano Novo na evolução da pandemia, admitiu o regresso a normas
semelhantes às que estiveram em vigor desde os idos de março, com exceção do encerramento
das escolas. Disse-o após a reunião do Conselho de Ministros do predito dia 7. Isto
significa que poderemos voltar a confinamento mais geral, com o encerramento de
restaurantes e do comércio de bens não essenciais. Ora, se o número de casos
continuar elevado, depois de ter sido superior aos dez mil no dia 6, António
Costa assumiu:
“O cenário que podemos ter como provável é
voltarmos a ter um conjunto de medidas tipo o que tínhamos em março, mas com a ressalva de todos os especialistas nos indicarem que não se
justifica afetar o normal funcionamento das escolas”.
Por seu turno, o Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital admitiu,
em declarações aos jornalistas, no final da reunião de Concertação Social deste
dia 8 de janeiro, a possibilidade de encerramento da restauração e comércio não alimentar, no âmbito do novo confinamento
geral do país em resposta ao agravamento da pandemia. Não obstante, como
aconteceu na primavera, os estabelecimentos poderão funcionar em regime de take
away e de entregas ao domicílio. E adiantou que o Governo se
inclina para manter as aulas em regime presencial,
considerando o “impacto social e económico” dum novo encerramento das escolas.
A reunião com peritos e especialistas, no Infarmed, a 12 de janeiro, servirá
de base para a decisão do Governo de regressar, ou não, às medidas de março.
No quadro da declaração do primeiro estado de emergência no país, que
trouxe o confinamento do país, impôs-se o dever geral de
recolhimento domiciliário, sendo que as medidas aplicadas a todo o território, ao
contrário de agora, que são aplicadas consoante os níveis de incidência.
As regras eram basicamente as seguintes:
- Confinamento obrigatório para os doentes de covid-19 e
infetados, bem como para os cidadãos a
quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde determinou a
vigilância ativa;
- Dever especial de proteção para os maiores de 70 anos, os imunodeprimidos e
os portadores de doença crónica que, segundo as orientações da autoridade de
saúde, deviam ser considerados de risco e que só podiam circular com base numa
lista mais limitada de razões;
- Dever geral de recolhimento domiciliário, só se podendo circular para algum destes fins: aquisição
de bens e serviços; atividades profissionais ou equiparadas; procura de
trabalho ou resposta a oferta de trabalho; saúde, designadamente para obtenção
de cuidados de saúde e transporte de pessoas a quem deviam ser administrados
tais cuidados ou dádiva de sangue; acolhimento de emergência de vítimas de
violência doméstica ou tráfico de seres humanos, bem como de crianças e jovens
em risco, por aplicação de medida decretada por autoridade judicial ou Comissão
de Proteção de Crianças e Jovens, em casa de acolhimento residencial ou
familiar; assistência de pessoas vulneráveis, pessoas com deficiência, filhos,
progenitores, idosos ou dependentes; acompanhamento de menores: fruição, de
curta duração, de momentos ao ar livre; frequência dos estabelecimentos escolares,
ao abrigo do n.º 1 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (acolhimento dos filhos ou outros dependentes a cargo dos
profissionais de saúde, das forças e serviços de segurança e de socorro, das
forças armadas, dos trabalhadores dos serviços públicos essenciais, de gestão e
manutenção de infraestruturas essenciais, bem como outros serviços essenciais); atividade física de curta duração, sendo proibido o
exercício de atividade física coletiva; participação em ações de voluntariado
social; outras razões familiares imperativas, como o cumprimento de partilha de
responsabilidades parentais, como determinado por acordo entre os titulares das
mesmas ou pelo tribunal competente; visitas, quando autorizadas, ou entrega de
bens essenciais a pessoas incapacitadas ou privadas de liberdade de circulação;
participação em atos processuais junto das entidades judiciárias; ida a estação
e posto de correio, agência bancária e agência de corretores de seguros ou
seguradoras; passeio, de curta duração, dos animais de companhia e alimentação
de animais; deslocações de médicos-veterinários, de detentores de animais para
assistência médico-veterinária, de cuidadores de colónias reconhecidas pelos
municípios, de voluntários de associações zoófilas com animais a cargo que
necessitem de se deslocar aos abrigos de animais e de equipas de resgate de
animais; deslocação de pessoas portadoras de livre-trânsito, emitido nos termos
legais, no exercício das respetivas funções ou por causa delas; deslocação de
pessoal das missões diplomáticas, consulares e das organizações internacionais
localizadas em Portugal, desde que relacionadas com o desempenho de funções
oficiais; satisfação do exercício da liberdade de imprensa; retorno ao
domicílio pessoal; e outras atividades de natureza análoga ou por outros
motivos de força maior ou necessidade impreterível, devidamente justificados;
- Possibilidade de veículos particulares circularem na
via pública para
realizar as atividades já mencionadas ou para reabastecimento em postos de
combustível;
- Teletrabalho obrigatório, independentemente do vínculo laboral, sempre que as
funções em causa o permitissem;
- Encerramento dos estabelecimentos de atividades recreativas, de lazer e
diversão, como discotecas, de atividades culturais e artísticas, como cinemas,
teatros e salas de concertos, de atividades desportivas, salvo as destinadas à
atividade dos atletas de alto rendimento, espaços de jogos e apostas, termas e
SPA;
- Manutenção da atividade dos restaurantes, se os seus
titulares assim o decidirem, para efeitos exclusivos de confeção destinada a
consumo fora do estabelecimento ou entrega no domicílio,
diretamente ou através de intermediário;
- Suspensão das atividades de comércio a retalho, com
exceção das que disponibilizassem bens de primeira necessidade ou outros bens considerados essenciais na
presente conjuntura, ficando também de fora os estabelecimentos de comércio por
grosso e os estabelecimentos que pretendessem manter a respetiva atividade
exclusivamente para entrega ao domicílio ou disponibilização dos bens à porta
do estabelecimento ou ao postigo, estando neste caso interdito o acesso ao
interior do estabelecimento pelo público;
- Encerramento das lojas de cidadão (mantendo-se
o atendimento presencial mediante marcação);
- Proibição da realização de celebrações de cariz
religioso e de outros eventos de culto
que implicassem uma aglomeração de pessoas;
- Encerramento de parques de lazer, recintos de jogos e outros espaços
públicos;
- Proibição de ajuntamentos de pessoas em lugares públicos e proibição de consumo
de bebidas alcoólicas na rua;
- Possibilidade de realização de feiras e mercados de levante a critério da
respetiva autarquia;
- Condicionamento da realização de funerais à adoção
de medidas organizacionais a determinar
pela autarquia local que exercesse os poderes de gestão do respetivo cemitério,
incluindo a limitação do número de participantes; e
- Não invocação do encerramento de instalações e estabelecimentos como fundamento de resolução, denúncia ou outra forma de extinção
de contratos de arrendamento não habitacional ou de outras formas
contratuais de exploração de imóveis, nem como fundamento de obrigação de
desocupação de imóveis em que os mesmos se encontrassem instalados.
***
O confinamento de março/abril só se justificou: pelo desconhecimento das caraterísticas
do SARS-CoV-2, designadamente periculosidade, capacidade de mutação e formas de
contágio; pela ausência ou insuficiência de instrumentos de proteção individual;
impreparação das instalações das entidades prestadoras de cuidados de saúde –
públicas ou privadas – em termos de equipamentos, apetrechos e técnicas de
isolamento para cuidar com eficácia dos doentes de covid-19 e impedir que outros
doentes fossem contaminados. Enfim, foram a insuficiência científica e a
incapacidade do sistema de saúde e subsistemas que levaram ao confinamento.
Por seu turno, os cidadãos movidos pelo medo e/ou pelo sentido de
obediência às leis e impelidos pelo imperativo do dever para si para os outros,
em geral, cumpriram estoicamente.
Porém, houve excessos e medidas erradamente indiscriminatórias, como; quase
clandestinidade dos funerais, com o afastamento dos familiares (sem possibilidade
de luto conveniente) e quase “mumização”
dos defuntos; proibição absoluta de atos de culto; acumulação de agregados familiares
em habitações exíguas; severidade para com alguns infratores idosos, que não
foram presentes a julgamento; cancelamento da efetiva prestação de cuidados de saúde
primários e da atenção a outras doenças também graves; não distribuição atempada
de equipamentos de proteção individual; não atenção aos lares de idosos…
Agora, a necessidade de confinamento é injustificável, a não ser pelo facto
de o SNS (Serviço Nacional
de Saúde) estar incapacitado de dar resposta e
o plano de vacinação ser de si moroso.
Porém, as autoridades, que diligenciaram, em tempo, alojamento, tendas,
hospitais de campanha e concitaram o apoio de autarquias, Igrejas e associações,
desmantelaram tudo. O Estado, por falta de vontade política, não reforçou o SNS
nem requisitou suficientemente os serviços do setor privado e do social,
preferindo o regime de contrato, moroso de si.
Hoje não se justifica o encerramento de clínicas médicas privadas, clínicas
dentárias, hospitais, postos de colheita de análises, serviços privados de TAC,
imagiologia, radiologia, cardiologia e congéneres e mesmo barbearias, polidesportivos,
cabeleireiros, ginásios e restaurantes. Com efeito, tais instalações estão suficientemente
preparadas para servir sem perigo de contágio, a menos que as autoridades de saúde
não tenham instado e acautelado as regras sanitárias.
E o confinamento hoje não será eficaz. Recorde-se que março e abril eram
meses primaveris, ao passo que agora estamos no pico do inverno, já complicado
por si. A obrigação de permanecer em casa, para muitos, implica sobrelotação
potenciando o contágio e leva a maior consumo de água e calor, o que não
sucederá a contento pelo excessivo custo de água, gás e eletricidade. Na maior
parte dos casos, estar em casa potencia a falta de exercício, a obesidade e a
depressão, malefícios herdados do confinamento de março/abril e mais suscetíveis
de alojar o vírus. Por sua vez, o teletrabalho a partir de casa com crianças (que não vão
à escola se ela tiver surtos) torna-se
fatigante, excessivo em conteúdos, sem horário e supervigiado; e, mesmo em
regime solitário, muitas vezes torna-se insuficiente para responder às
necessidades profissionais.
Em suma, o confinamento urge porque a primavera, o verão e o outono, em vez
de levarem o Estado a prover a preparação das estruturas para o inverno,
desmantelou o que havia e cingiu-se à contabilidade dos casos e à repetição da
dose da calamidade com ou sem emergência.
2021.01.08 –
Louro de Carvalho
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