O Primeiro-Ministro, apesar de ter anunciado, a 18 de
janeiro, o aperto de restrições no âmbito do confinamento, disse que as escolas
vão manter-se abertas em ensino presencial, lembrando que “as ondas de
crescimento de pandemia” ocorreram em tempos de pausa letiva.
No dia 14, o Governo avançou com novas medidas de
confinamento, em que a regra era “ficar em casa”, mas manteve as escolas
abertas em todos os níveis de ensino, desde a educação pré-escolar até ao ensino
secundário. Entretanto, o agravamento diário de novos casos de infeção e a
situação no SNS (Serviço Nacional de Saúde) levou
vários especialistas e sindicatos de professores a pedir o encerramento das
escolas e a retoma do ensino à distância.
Efetivamente, o
SIPE (Sindicato
Independente dos Professores e Educadores), por exemplo, discorda da decisão de não fechar as escolas e
receia que “os sacrifícios económicos, psicológicos e sociais” a que os portugueses
estão sujeitos neste período, “de nada sirvam e não surtam qualquer efeito
devido a esta opção do executivo”. Entende que as medidas anunciadas
configuram “um confinamento parcial”, uma vez que “dois milhões de crianças e
jovens continuam a circular livremente, com tudo o que isso implica”. Defende,
pois, a necessidade de medidas de proteção de professores e alunos, nomeadamente
a prioridade na vacinação dos docentes e a atribuição dum subsídio de risco, bem
como o prolongamento do período de 30 dias de faltas justificadas, “atribuído
mediante apresentação de declaração médica aos docentes que pertençam a grupos
de risco para a covid-19”. E exige melhores condições de segurança, com
reorganização de espaços e disponibilização de equipamento para proteção de
alunos e professores em todos os estabelecimentos de ensino, nomeadamente
máscaras descartáveis, acrílicos de proteção e dispensadores de álcool gel.
Também
o diretor de serviço de medicina intensiva do Hospital de São João, no Porto,
defendeu o encerramento das escolas, medida que vai “contra” a sua “convicção
natural”, mas que considerou “essencial” num momento “horribilis” do SNS.
Contudo, questionado, no dia 18, hoje sobre a
possibilidade de encerrar as escolas, o chefe do Governo voltou a defender o
ensino presencial como opção de fundo correta, considerando que “não se
justifica, do ponto de vista sanitário, o custo social de impor por um segundo
ano letivo as limitações ao ensino presencial”. Lembrou o “custo das
desigualdades de aprendizagem” que o ensino à distância trouxe para os alunos,
em especial para os mais carenciados, sustentando que é “um custo irreversível
para a vida”. Além disso, sublinhou que “as ondas de crescimento de pandemia
não ocorreram em tempo de períodos letivos”, mas “em tempos de pausa letiva”.
António Costa disse ser “provável que, sobretudo os
alunos mais crescidos, os jovens, conviveram mais [nas férias] do que o fazem quando têm de partilhar o tempo livre
com a escola e o período de estudo”. E, acrescentando que, em caso de surto em
ambiente escolar, tanto os estabelecimentos de ensino como as autoridades de
saúde podem tomar medidas para tentar conter a situação, lembrou:
“Desde sempre que as escolas têm tido
autonomia e as autoridades de saúde têm tido o dever de condicionar o
funcionamento das escolas em função da circunstância sanitária no concelho ou
na escola”.
Nestes termos, cerca de dois milhões de crianças e
jovens continuam a ir diariamente para as escolas, tendo em conta os inscritos
em estabelecimentos de educação e ensino desde a educação pré-escolar até ao
ensino superior. Aos alunos juntam-se milhares de educadores, professores e
restantes funcionários escolares que se mantêm a trabalhar nas escolas. Porém,
as estruturas sindicais exigem, para escolas
abertas, medidas adequadas, nomeadamente acesso prioritário dos professores à vacinação, testes gratuitos e
sistemáticos à comunidade escolar, subsídio de risco para docentes, menos
alunos nas turmas.
A FNE (Federação
Nacional da Educação)
refere que manter a atividade letiva presencial exige medidas adequadas que
assegurem a proteção e a saúde da comunidade escolar. Para tanto, pede a
realização sistemática de testes para acompanhar e detetar situações de infeção
que se registem nas escolas, e diz que a comunidade escolar deve estar no topo das
prioridades na vacinação, por ser “indispensável que todos os alunos tenham
docentes para todas as atividades curriculares” e que as escolas estejam
dotadas dos trabalhadores não docentes (técnicos especializados, assistentes técnicos e assistentes
operacionais) que forem
indispensáveis para que todos os serviços das escolas estejam a funcionar”. Para
a FNE, o ensino presencial é preferível, mas a decisão das condições de
funcionamento das escolas neste contexto deve assentar nos pareceres dos
especialistas e da comunidade científica. E, havendo divergências sobre qual a
melhor decisão, a FNE vinca a insuficiência de meios tecnológicos para o ensino
à distância ou um modelo híbrido, apontando:
“O Governo não assegurou o compromisso de
que, no início deste ano letivo, todos os alunos e professores estivessem
dotados de equipamentos e meios para que essas modalidades pudessem ser
asseguradas. Mas também temos consciência de que, mesmo que esses meios
existissem, eles são sempre de efeito inferior ao da atividade letiva
presencial, que é mais rica e mais eficaz.”.
Em suma, A FNE pede medidas que garantam o acompanhamento da
situação epidemiológica em contexto escolar e a promoção da saúde e segurança
de toda a comunidade educativa. Por isso, insiste na redução do número de
alunos por turma, no distanciamento físico e no adequado enquadramento dos
docentes que pertençam a grupos de risco.
Por seu turno, o SIPE, que não
concorda com a decisão de manter as escolas abertas, como se disse, pede medidas
extraordinárias para proteção dos professores e alunos no confinamento. E, como
a FNE, quer o acesso prioritário dos professores à vacinação e a realização de
testes rápidos nas escolas, acessíveis a pessoal docente e não docente, bem
como aos alunos, medida que “deveria ter entrado em vigor no início do ano
letivo”, como comenta em comunicado.
Insiste na atribuição dum subsídio de risco aos professores,
correspondente ao serviço prestado durante este período de confinamento, no
prolongamento do período de 30 dias de faltas justificadas, atribuído, mediante
apresentação de declaração médica, aos docentes que integrem grupos de risco, e
na reclamação de melhores condições de segurança com reorganização de espaços e
disponibilização de equipamento para proteção de alunos e professores em todos
os estabelecimentos de educação e ensino. A este respeito, realça na sua comunicação:
“O SIPE considera que as medidas anunciadas
configuram um confinamento parcial, uma vez que dois milhões de crianças e
jovens continuam a circular livremente com tudo o que isso implica. Não
concordamos com a decisão de não fechar as escolas e receamos que os
sacrifícios económicos, psicológicos e sociais a que os portugueses estarão
sujeitos durante este período, de nada sirvam e não surtam qualquer efeito
devido a esta opção.”.
Também a FENPROF (Federação Nacional dos Professores) considera indispensável a realização
de testes gratuitos à comunidade escolar e pede “significativa melhoria” das
condições de segurança sanitária e consequente reforço de recursos humanos. Defendendo
que a classe docente deve, de imediato, integrar a segunda fase de vacinação e
que devem ser mobilizados os recursos necessários para reduzir o número de
alunos nas salas, entende que devem ser “alteradas as condições de proteção aos
docentes de grupos de risco, garantindo a sua proteção efetiva, como o
pagamento do salário ou permitindo que desenvolvam atividade em regime de teletrabalho”.
+++
Para a modernização e eficácia do ensino presencial,
foram dotadas as escolas de novos meios tecnológicos – há
efetivamente mais computadores nas escolas –, mas apenas 7% dos alunos usam as
novas tecnologias em atividades relacionadas com o estudo. Por isso, há que reforçar
as competências digitais, em todos os ciclos de educação e ensino.
Na verdade, os recursos que as escolas e os professores podem
utilizar constituem preciosas ferramentas para motivar, facilitar e enriquecer
a aprendizagem de crianças e jovens, em todos os níveis de educação e ensino. E
o relatório “Estado da Educação 2019”,
do CNE (Conselho Nacional
de Educação), dedica um
capítulo a alguns desses meios ao dispor das escolas, já que os instrumentos
digitais ganham importância cada vez maior a cada dia que passa.
Ora, apesar do aumento do número de computadores nas escolas
do Continente (mais 5 134,
de 2018 para 2019) a
percentagem de equipamentos com mais de três anos é muito significativa, de
83,7%. Em 2019, já 92,5% dos computadores das escolas tinham ligação à internet
e o número médio de alunos por cada computador era de 5 no ensino público e de
4,3 no privado.
Um inquérito da UE, relativo a 2017-2018, concluiu que as nossas
escolas estavam mais equipadas e conectadas digitalmente, em todos os níveis e
ciclos de ensino, do que a média dos países membros, com particular destaque
para o ensino básico. Porém, um estudo realizado em 2018 indica que apenas 7%
dos alunos utilizavam as novas tecnologias para atividades escolares, abaixo
dos 11% da média internacional. E o predito relatório do CNE deixa ler:
“A presença das tecnologias digitais em todos
os domínios da sociedade, já classificada como a quarta revolução industrial, é
uma realidade à qual a escola não pode escapar. Por um lado, pela influência
que estas tecnologias têm no modo de ensinar e de aprender e, por outro, porque
é suposto a escola preparar os jovens para a vida no mundo digital e para a
inserção no mercado de trabalho, de modo a evitar a exclusão social dos que não
detêm competências neste domínio.”.
No final de 2020, o Ministro da Educação anunciou a aquisição
de mais 260 mil computadores para as escolas, depois da distribuição de 100 mil
equipamentos durante o 1.º período, no âmbito do programa Escola Digital. E, no
início de 2021, Brandão Rodrigues garantiu que, nas próximas semanas, será
feito um reforço da internet em várias escolas do país.
E a FNE, que acompanha o processo, avisa o Governo de que é
necessário contratar, pelo menos, um técnico informático para cada agrupamento de
forma a garantir a manutenção e funcionamento dos computadores, pois, como
refere João Dias da Silva, “não teremos uma escola digital se lá só colocarmos
computadores” e “não há escola digital com recurso a habilidosos”, tendo,
antes, de “ser técnicos que saibam do que se trata e que garantam
sistematicamente a manutenção e funcionamento dos equipamentos”.
Nos primeiros dias de 2021, a Comissão Europeia anunciou o
projeto “Assistência para o
Desenvolvimento Escolar” que pretende promover a inovação digital em
“escolas pequenas ou rurais” de seis estados-membros, lista que Portugal
integra. Até fevereiro de 2023, os parceiros investigarão e avaliarão, em
conjunto, teorias e práticas de assistência e construirão e animarão
comunidades com base em quatro escolas digitalmente avançadas, em cada país,
que orientarão quatro escolas em desenvolvimento.
Segundo o CNE, Portugal vem registando progressos na dimensão
do capital humano, mercê de maior percentagem de licenciados em TIC e melhoria
no nível básico de competências digitais. Contudo, se comparado com os padrões
europeus, continua a ter de melhorar o seu desempenho, sobretudo em matéria de
utilização de serviços de internet. Cerca de metade da população (48%) não possui competências digitais básicas, passando,
assim, uma das estratégias por estimular e reforçar os domínios da literacia e
competências digitais em todos os ciclos de ensino e de aprendizagem ao longo
da vida. E, como Portugal não se encontra no grupo da metade dos sistemas
educativos europeus que tem políticas que promovem a existência de um coordenador
digital nas escolas, o CNE observa:
“Os diretores das escolas e os coordenadores
digitais podem ter uma ação relevante na mudança ao nível das infraestruturas
digitais e do seu uso para o ensino e aprendizagem. Daí a importância de
promover a formação dos primeiros e de providenciar a nomeação dos segundos.”.
Os dispositivos móveis têm sido integrados nos sistemas
formais de ensino. Esta utilização coloca desafios, como um eventual fosso
entre alunos com aparelhos mais e menos avançados, mas tem consequências. Dos
7% dos alunos utilizam as tecnologias para atividades escolares no espaço da
escola, a maior parte (73%) utiliza-as para fazer pesquisas na
internet, pelo menos uma vez por semana. E o CNE considera:
“Se considerarmos que a literacia em
computadores e informação se refere à capacidade de um indivíduo utilizar
computadores para investigar, criar e comunicar, podemos admitir que, nas
escolas portuguesas, o uso das TIC com a finalidade de criar e comunicar é
pouco frequente, o que poderá dever-se à falta de recursos tecnológicos ou à
incapacidade de os usar como recursos para a aprendizagem”.
A DGEC (Direção-Geral
para a Educação e a Cultura), da Comissão Europeia, ao avaliar os efeitos da tecnologia digital na
empatia e capacidade de atenção das crianças, anotou que a tecnologia pode
afetar a capacidade de atenção e potenciar a hiperatividade, faz diminuir a
empatia das crianças se usada de forma antissocial, se o tempo passado frente
ao ecrã reduz as interações face a face, se o conteúdo é violento ou existe o
perigo de cyberbullying. Porém, potenciará o aumento da empatia se for criado
ambiente de aprendizagem interativo, fautor da colaboração e do diálogo entre
as crianças e jovens, e houver educação para os media e para o pensamento
crítico. O desafio está, pois, em tirar proveito do uso das tecnologias,
acautelando eventuais efeitos nefastos, como a cyberdependência, o
cyberbullying e a invasão da vida privada.
Além dos dispositivos eletrónicos, há outros recursos nas
escolas. As bibliotecas escolares (BE) são
um exemplo. E a sua rede (RBE)
registou mais 26 novos
espaços, atingindo os 2500 em 2019, a maior parte em estabelecimentos públicos.
As bibliotecas são adaptadas às exigências tecnológicas com diversos
equipamentos eletrónicos e, em 2019, todas registaram crescimento quantitativo
nessa área. Também o Plano Nacional de Leitura (PNL), lançado em 2006, é boa ferramenta de aprendizagem. Nas ações
desenvolvidas, em 2019, destaca-se o concurso nacional de leitura (CNL) com 2 mil escolas envolvidas e mil obras lidas e a
atualização do catálogo de livros recomendados. E o Plano Nacional do Cinema (PNC) é outro recurso importante que, em 2018/2019, atingiu
duas centenas de escolas, envolvendo mais de 870 professores, cerca de 60 mil
alunos, e mais de 60 salas de cineclubes, auditórios, cineteatros, para
visualização de filmes.
***
Apesar de as escolas se manterem abertas para já, há a iminência
do seu encerramento (pendente
de avaliação: Costa admite, Marcelo pensa) e a realidade de sucessivas quarentenas. Por isso, há que,
em vista da maior eficácia do ensino presencial e acautelamento do regime
híbrido, aumentar as condições de segurança, mobilizar e otimizar todos os
recursos disponíveis (humanos,
materiais e tecnológicos),
prover as escolas do que ainda lhes falta e favorecer a cultura do antídoto ao medo,
bem como à temeridade. São o futuro das novas gerações e a tranquilidade dos
mais velhos que estão em causa.
2021.01.19
– Louro de Carvalho
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