terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Escolas mantêm-se abertas, até que a evolução pandémica urja doutra feita

 

O Primeiro-Ministro, apesar de ter anunciado, a 18 de janeiro, o aperto de restrições no âmbito do confinamento, disse que as escolas vão manter-se abertas em ensino presencial, lembrando que “as ondas de crescimento de pandemia” ocorreram em tempos de pausa letiva.

No dia 14, o Governo avançou com novas medidas de confinamento, em que a regra era “ficar em casa”, mas manteve as escolas abertas em todos os níveis de ensino, desde a educação pré-escolar até ao ensino secundário. Entretanto, o agravamento diário de novos casos de infeção e a situação no SNS (Serviço Nacional de Saúde) levou vários especialistas e sindicatos de professores a pedir o encerramento das escolas e a retoma do ensino à distância.

Efetivamente, o SIPE (Sindicato Independente dos Professores e Educadores), por exemplo, discorda da decisão de não fechar as escolas e receia que “os sacrifícios económicos, psicológicos e sociais” a que os portugueses estão sujeitos neste período, “de nada sirvam e não surtam qualquer efeito devido a esta opção do executivo”. Entende que as medidas anunciadas configuram “um confinamento parcial”, uma vez que “dois milhões de crianças e jovens continuam a circular livremente, com tudo o que isso implica”. Defende, pois, a necessidade de medidas de proteção de professores e alunos, nomeadamente a prioridade na vacinação dos docentes e a atribuição dum subsídio de risco, bem como o prolongamento do período de 30 dias de faltas justificadas, “atribuído mediante apresentação de declaração médica aos docentes que pertençam a grupos de risco para a covid-19”. E exige melhores condições de segurança, com reorganização de espaços e disponibilização de equipamento para proteção de alunos e professores em todos os estabelecimentos de ensino, nomeadamente máscaras descartáveis, acrílicos de proteção e dispensadores de álcool gel.
Também o diretor de serviço de medicina intensiva do Hospital de São João, no Porto, defendeu o encerramento das escolas, medida que vai “contra” a sua “convicção natural”, mas que considerou “essencial” num momento “horribilis” do SNS.

Contudo, questionado, no dia 18, hoje sobre a possibilidade de encerrar as escolas, o chefe do Governo voltou a defender o ensino presencial como opção de fundo correta, considerando que “não se justifica, do ponto de vista sanitário, o custo social de impor por um segundo ano letivo as limitações ao ensino presencial”. Lembrou o “custo das desigualdades de aprendizagem” que o ensino à distância trouxe para os alunos, em especial para os mais carenciados, sustentando que é “um custo irreversível para a vida”. Além disso, sublinhou que “as ondas de crescimento de pandemia não ocorreram em tempo de períodos letivos”, mas “em tempos de pausa letiva”.

António Costa disse ser “provável que, sobretudo os alunos mais crescidos, os jovens, conviveram mais [nas férias] do que o fazem quando têm de partilhar o tempo livre com a escola e o período de estudo”. E, acrescentando que, em caso de surto em ambiente escolar, tanto os estabelecimentos de ensino como as autoridades de saúde podem tomar medidas para tentar conter a situação, lembrou:

Desde sempre que as escolas têm tido autonomia e as autoridades de saúde têm tido o dever de condicionar o funcionamento das escolas em função da circunstância sanitária no concelho ou na escola”.

Nestes termos, cerca de dois milhões de crianças e jovens continuam a ir diariamente para as escolas, tendo em conta os inscritos em estabelecimentos de educação e ensino desde a educação pré-escolar até ao ensino superior. Aos alunos juntam-se milhares de educadores, professores e restantes funcionários escolares que se mantêm a trabalhar nas escolas. Porém, as estruturas sindicais exigem, para escolas abertas, medidas adequadas, nomeadamente acesso prioritário dos professores à vacinação, testes gratuitos e sistemáticos à comunidade escolar, subsídio de risco para docentes, menos alunos nas turmas.

A FNE (Federação Nacional da Educação) refere que manter a atividade letiva presencial exige medidas adequadas que assegurem a proteção e a saúde da comunidade escolar. Para tanto, pede a realização sistemática de testes para acompanhar e detetar situações de infeção que se registem nas escolas, e diz que a comunidade escolar deve estar no topo das prioridades na vacinação, por ser “indispensável que todos os alunos tenham docentes para todas as atividades curriculares” e que as escolas estejam dotadas dos trabalhadores não docentes (técnicos especializados, assistentes técnicos e assistentes operacionais) que forem indispensáveis para que todos os serviços das escolas estejam a funcionar”. Para a FNE, o ensino presencial é preferível, mas a decisão das condições de funcionamento das escolas neste contexto deve assentar nos pareceres dos especialistas e da comunidade científica. E, havendo divergências sobre qual a melhor decisão, a FNE vinca a insuficiência de meios tecnológicos para o ensino à distância ou um modelo híbrido, apontando:

O Governo não assegurou o compromisso de que, no início deste ano letivo, todos os alunos e professores estivessem dotados de equipamentos e meios para que essas modalidades pudessem ser asseguradas. Mas também temos consciência de que, mesmo que esses meios existissem, eles são sempre de efeito inferior ao da atividade letiva presencial, que é mais rica e mais eficaz.”.

Em suma, A FNE pede medidas que garantam o acompanhamento da situação epidemiológica em contexto escolar e a promoção da saúde e segurança de toda a comunidade educativa. Por isso, insiste na redução do número de alunos por turma, no distanciamento físico e no adequado enquadramento dos docentes que pertençam a grupos de risco.

Por seu turno, o SIPE, que não concorda com a decisão de manter as escolas abertas, como se disse, pede medidas extraordinárias para proteção dos professores e alunos no confinamento. E, como a FNE, quer o acesso prioritário dos professores à vacinação e a realização de testes rápidos nas escolas, acessíveis a pessoal docente e não docente, bem como aos alunos, medida que “deveria ter entrado em vigor no início do ano letivo”, como comenta em comunicado.

Insiste na atribuição dum subsídio de risco aos professores, correspondente ao serviço prestado durante este período de confinamento, no prolongamento do período de 30 dias de faltas justificadas, atribuído, mediante apresentação de declaração médica, aos docentes que integrem grupos de risco, e na reclamação de melhores condições de segurança com reorganização de espaços e disponibilização de equipamento para proteção de alunos e professores em todos os estabelecimentos de educação e ensino. A este respeito, realça na sua comunicação:

O SIPE considera que as medidas anunciadas configuram um confinamento parcial, uma vez que dois milhões de crianças e jovens continuam a circular livremente com tudo o que isso implica. Não concordamos com a decisão de não fechar as escolas e receamos que os sacrifícios económicos, psicológicos e sociais a que os portugueses estarão sujeitos durante este período, de nada sirvam e não surtam qualquer efeito devido a esta opção.”.

Também a FENPROF (Federação Nacional dos Professores) considera indispensável a realização de testes gratuitos à comunidade escolar e pede “significativa melhoria” das condições de segurança sanitária e consequente reforço de recursos humanos. Defendendo que a classe docente deve, de imediato, integrar a segunda fase de vacinação e que devem ser mobilizados os recursos necessários para reduzir o número de alunos nas salas, entende que devem ser “alteradas as condições de proteção aos docentes de grupos de risco, garantindo a sua proteção efetiva, como o pagamento do salário ou permitindo que desenvolvam atividade em regime de teletrabalho”.

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Para a modernização e eficácia do ensino presencial, foram dotadas as escolas de novos meios tecnológicos – há efetivamente mais computadores nas escolas –, mas apenas 7% dos alunos usam as novas tecnologias em atividades relacionadas com o estudo. Por isso, há que reforçar as competências digitais, em todos os ciclos de educação e ensino.

Na verdade, os recursos que as escolas e os professores podem utilizar constituem preciosas ferramentas para motivar, facilitar e enriquecer a aprendizagem de crianças e jovens, em todos os níveis de educação e ensino. E o relatório “Estado da Educação 2019”, do CNE (Conselho Nacional de Educação), dedica um capítulo a alguns desses meios ao dispor das escolas, já que os instrumentos digitais ganham importância cada vez maior a cada dia que passa.

Ora, apesar do aumento do número de computadores nas escolas do Continente (mais 5 134, de 2018 para 2019) a percentagem de equipamentos com mais de três anos é muito significativa, de 83,7%. Em 2019, já 92,5% dos computadores das escolas tinham ligação à internet e o número médio de alunos por cada computador era de 5 no ensino público e de 4,3 no privado.

Um inquérito da UE, relativo a 2017-2018, concluiu que as nossas escolas estavam mais equipadas e conectadas digitalmente, em todos os níveis e ciclos de ensino, do que a média dos países membros, com particular destaque para o ensino básico. Porém, um estudo realizado em 2018 indica que apenas 7% dos alunos utilizavam as novas tecnologias para atividades escolares, abaixo dos 11% da média internacional. E o predito relatório do CNE deixa ler:

A presença das tecnologias digitais em todos os domínios da sociedade, já classificada como a quarta revolução industrial, é uma realidade à qual a escola não pode escapar. Por um lado, pela influência que estas tecnologias têm no modo de ensinar e de aprender e, por outro, porque é suposto a escola preparar os jovens para a vida no mundo digital e para a inserção no mercado de trabalho, de modo a evitar a exclusão social dos que não detêm competências neste domínio.”.

No final de 2020, o Ministro da Educação anunciou a aquisição de mais 260 mil computadores para as escolas, depois da distribuição de 100 mil equipamentos durante o 1.º período, no âmbito do programa Escola Digital. E, no início de 2021, Brandão Rodrigues garantiu que, nas próximas semanas, será feito um reforço da internet em várias escolas do país.

E a FNE, que acompanha o processo, avisa o Governo de que é necessário contratar, pelo menos, um técnico informático para cada agrupamento de forma a garantir a manutenção e funcionamento dos computadores, pois, como refere João Dias da Silva, “não teremos uma escola digital se lá só colocarmos computadores” e “não há escola digital com recurso a habilidosos”, tendo, antes, de “ser técnicos que saibam do que se trata e que garantam sistematicamente a manutenção e funcionamento dos equipamentos”.

Nos primeiros dias de 2021, a Comissão Europeia anunciou o projeto “Assistência para o Desenvolvimento Escolar” que pretende promover a inovação digital em “escolas pequenas ou rurais” de seis estados-membros, lista que Portugal integra. Até fevereiro de 2023, os parceiros investigarão e avaliarão, em conjunto, teorias e práticas de assistência e construirão e animarão comunidades com base em quatro escolas digitalmente avançadas, em cada país, que orientarão quatro escolas em desenvolvimento.

Segundo o CNE, Portugal vem registando progressos na dimensão do capital humano, mercê de maior percentagem de licenciados em TIC e melhoria no nível básico de competências digitais. Contudo, se comparado com os padrões europeus, continua a ter de melhorar o seu desempenho, sobretudo em matéria de utilização de serviços de internet. Cerca de metade da população (48%) não possui competências digitais básicas, passando, assim, uma das estratégias por estimular e reforçar os domínios da literacia e competências digitais em todos os ciclos de ensino e de aprendizagem ao longo da vida. E, como Portugal não se encontra no grupo da metade dos sistemas educativos europeus que tem políticas que promovem a existência de um coordenador digital nas escolas, o CNE observa:

Os diretores das escolas e os coordenadores digitais podem ter uma ação relevante na mudança ao nível das infraestruturas digitais e do seu uso para o ensino e aprendizagem. Daí a importância de promover a formação dos primeiros e de providenciar a nomeação dos segundos.”.

Os dispositivos móveis têm sido integrados nos sistemas formais de ensino. Esta utilização coloca desafios, como um eventual fosso entre alunos com aparelhos mais e menos avançados, mas tem consequências. Dos 7% dos alunos utilizam as tecnologias para atividades escolares no espaço da escola, a maior parte (73%) utiliza-as para fazer pesquisas na internet, pelo menos uma vez por semana. E o CNE considera:

Se considerarmos que a literacia em computadores e informação se refere à capacidade de um indivíduo utilizar computadores para investigar, criar e comunicar, podemos admitir que, nas escolas portuguesas, o uso das TIC com a finalidade de criar e comunicar é pouco frequente, o que poderá dever-se à falta de recursos tecnológicos ou à incapacidade de os usar como recursos para a aprendizagem”.

A DGEC (Direção-Geral para a Educação e a Cultura), da Comissão Europeia, ao avaliar os efeitos da tecnologia digital na empatia e capacidade de atenção das crianças, anotou que a tecnologia pode afetar a capacidade de atenção e potenciar a hiperatividade, faz diminuir a empatia das crianças se usada de forma antissocial, se o tempo passado frente ao ecrã reduz as interações face a face, se o conteúdo é violento ou existe o perigo de cyberbullying. Porém, potenciará o aumento da empatia se for criado ambiente de aprendizagem interativo, fautor da colaboração e do diálogo entre as crianças e jovens, e houver educação para os media e para o pensamento crítico. O desafio está, pois, em tirar proveito do uso das tecnologias, acautelando eventuais efeitos nefastos, como a cyberdependência, o cyberbullying e a invasão da vida privada.

Além dos dispositivos eletrónicos, há outros recursos nas escolas. As bibliotecas escolares (BE) são um exemplo. E a sua rede (RBE) registou mais 26 novos espaços, atingindo os 2500 em 2019, a maior parte em estabelecimentos públicos. As bibliotecas são adaptadas às exigências tecnológicas com diversos equipamentos eletrónicos e, em 2019, todas registaram crescimento quantitativo nessa área. Também o Plano Nacional de Leitura (PNL), lançado em 2006, é boa ferramenta de aprendizagem. Nas ações desenvolvidas, em 2019, destaca-se o concurso nacional de leitura (CNL) com 2 mil escolas envolvidas e mil obras lidas e a atualização do catálogo de livros recomendados. E o Plano Nacional do Cinema (PNC) é outro recurso importante que, em 2018/2019, atingiu duas centenas de escolas, envolvendo mais de 870 professores, cerca de 60 mil alunos, e mais de 60 salas de cineclubes, auditórios, cineteatros, para visualização de filmes.

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Apesar de as escolas se manterem abertas para já, há a iminência do seu encerramento (pendente de avaliação: Costa admite, Marcelo pensa) e a realidade de sucessivas quarentenas. Por isso, há que, em vista da maior eficácia do ensino presencial e acautelamento do regime híbrido, aumentar as condições de segurança, mobilizar e otimizar todos os recursos disponíveis (humanos, materiais e tecnológicos), prover as escolas do que ainda lhes falta e favorecer a cultura do antídoto ao medo, bem como à temeridade. São o futuro das novas gerações e a tranquilidade dos mais velhos que estão em causa.

2021.01.19 – Louro de Carvalho

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