A situação de pandemia fez aumentar, quase
generalizar, as situações de teletrabalho, ou seja, o trabalho a partir de
casa, sem a deslocação à empresa ou serviço – estilo que estava circunscrito a
um número relativamente diminuto de pessoas por motivos de facilitação, mas sem
a dispensa da ida ao escritório ou empresa e que permitia a solução rápida de negócios
e decisões.
Faço um
parêntesis para especificar que o novo coronavírus que está em causa é o SARS-CoV-2 (síndrome respiratória aguda grave – coronavírus 2), que foi
detetado na China, no final de 2019, e que significa “síndrome respiratória
aguda grave – coronavírus 2”. E a Covid-19 (das
palavras “Corona”, “Vírus” e “Doença”
com indicação do ano em que surgiu) é a doença provocada pela infeção por este coronavírus. Os coronavírus
são um grupo de vírus que podem causar infeções nas pessoas. Normalmente estas
infeções estão associadas ao sistema respiratório, podendo ser parecidas com
uma gripe comum ou evoluir para uma doença mais grave, como pneumonia.
Ora, o pânico que o SARS-CoV-2
criou um pouco por toda a parte fez com que as pessoas tivessem de vir para
casa para evitar contágio e tratar dos filhos pelo facto de as instituições que
os recebem terem encerrado. Porém, teletrabalhar em tempos de pandemia faz
que muitas pessoas trabalhem mais
horas por dia que o normal. Ao fim de mais de um mês em casa, muitas
pessoas estão sobrecarregadas, stressadas e ansiosas para voltar ao local de
trabalho.
Segundo
o “Jornal de Negócios”, que cita
um artigo da “Bloomberg”, são vários
os exemplos de excesso de trabalho ou trabalho fora de horas, em tempos de Covid-19. Escreve o
periódico:
“Um executivo do JPMorgan Chase recebe mensagens à noite e nos fins de semana sem um pedido
de desculpas dos colegas, incluindo uma notavelmente exigente no domingo de
Páscoa. Um web designer cujo quarto serve de escritório tem de acionar um
alarme para se lembrar de almoçar durante a horário de trabalho sem parar. Na
Intel, uma vice-presidente com quatro filhos fica ligada 13 horas por dia enquanto tenta conciliar a
tarefa de cuidar das crianças e do trabalho.”.
Este
“cenário” e outros como este permitem concluir que, neste período, o
teletrabalho já dura há mais de um mês e que estão a ser quebradas as fronteiras entre o trabalho e a
vida pessoal.
Nos EUA, as pessoas que trabalham em casa
estão ligadas 3 horas a mais por dia que antes do confinamento, segundo
dados da NordVPN, que permitem
rastrear quando os utilizadores se conectam e desconectam. Entre todos os
países que a NordVPN analisa, os
trabalhadores dos EUA eram os que se ligavam por mais tempo. Em França, Espanha e Reino Unido, o horário de trabalho
aumentou duas horas. Outro
exemplo de excesso de trabalho vem de Toronto (Canadá): Huda Idrees, diretora-presidente da Dot Health, uma
startup de tecnologia, confirma que os seus 15 funcionários estão a trabalhar,
em média, 12 horas por dia, acima das 9 horas pré-pandemia, pois, como ninguém
sai há noite, estão no computador sem tempo de deslocação.
Em Portugal,
além do que ocorre noutros países, acrescem situações como estas. Há pais que
estão em casa em teletrabalho com filhos que têm aulas pelos meios digitais, ministradas
pelos respetivos professores, e aulas difundidas pela RTP Memória, com
intervenção dos professores dos alunos antes e depois para preparação, apoio e
dissipação de dúvidas. Muitas vezes há mais pessoas em casa a precisar de
computador ou tablet que máquinas e
os pais a dividirem-se pelo apoio vigilante aos filhos, pelo trabalho profissional
e pelas lides de casa. E há muitos professores que ministram, pelos meios
digitais e outros meios de comunicação à distância, aulas síncronas e assíncronas,
respondem a questões do alunos e dos encarregados de educação, apoiam os alunos
em torno das aulas ministradas pela TV, fazem reuniões por videoconferência,
vão dar aulas presenciais e farão serviço de exames nacionais e exames de
equivalência à frequência. Tanto uma como outra situação são esgotantes. E acresce
referir que muitos desses professores também são pais ou mães.
***
Por norma,
as casas de habitação são de exíguas dimensões e há dificuldades em manter
todos no domicílio e em teletrabalho e “telescola”. Mas, como teletrabalho, quarentena, confinamento e
isolamento são palavras que passaram a fazer parte do dicionário na
sequência da pandemia, a Deco
(Associação
Portuguesa para a Defesa do Consumidor) forneceu ao
“idealista/news” dicas, que aqui se sintetizam,
para instalar um escritório em
casa, de forma a manter o profissionalismo.
Poucas
pessoas contemplaram na decoração da
casa a existência (pelo menos em permanência) dum escritório cómodo e eficiente para cumprir as
atividades profissionais à distância. E, agora, toda a família está confinada na casa aumentando o ruído
ambiente e a disputa pelo monitor mais eficaz, a cadeira mais confortável ou a
mesa com a melhor iluminação.
Embora, não
raro, seja difícil encontrar o local ideal para instalar o computador, há que
descobrir uma área da casa em que a luz entre a partir duma janela, na lateral (da esquerda
para a direita e ao invés para canhotos), evitando a
luz direta intensa e os consequentes reflexos no ecrã.
Como é
complicado trabalhar concentradamente em ambiente ruidoso por toda a família estar
em casa, há que ter em conta a existência
de auscultadores no mercado que reduzem ativamente o ruído, sendo de escolher
os mais eficazes, ainda que mais caros. Tais auscultadores, que têm
grande versatilidade, podem ser usados para ouvir música num momento de lazer
ou enquanto se trabalha, incluem microfone, permitem controlar chamadas e
servem para conversar com os colegas de trabalho, via app de videoconferência. Além
disso, funcionam como sistema de mãos livres para atender telefonemas ou como
controlo do leitor de música do smartphone.
27 a 32
polegadas: não há monitores para computador maiores. Acima destes valores, a
distância de visionamento na mesa de trabalho não é confortável. Portanto, se se
pondera ligar o computador a um televisor, tem de se usar um televisor pequeno,
de 20 a 24 polegadas, não precisando de guardar distância especial para o ecrã,
equiparável ao de monitor normal. Se o televisor tiver 27 polegadas,
medida equivalente a um monitor de computador de grandes dimensões, convirá
prever, pelo menos, uns 50 cm de distância, até porque a resolução destes
televisores nunca é muito elevada. E, sendo as 32 polegadas o limite aconselhado, a distância mínima deve andar
pelos 60 cm. Para ligar o computador portátil ao televisor tem de se usar um
cabo HDMI e, nos televisores menos recentes, pode-se recorrer a um cabo
VGA.
Também é de relevar a necessidade de organizar a
casa agora que
os filhos se juntam aos pais para trabalharem e terem aulas à distância pela
internet e pela nova telescola.
Assim e para
que o teletrabalho não se torne entediante e uma dor de cabeça, ao mesmo
tempo que é preciso acompanhar as crianças e jovens nas tarefas
escolares, é de toda a importância a reorganização do espaço em casa de
acordo com as possibilidades: desde a mesa simples, que se pode abrir na sala
de estar, até aos ambientes mais acolhedores, com mesas de escritório, sem
esquecer as mesas de trabalho para espaços maiores e as casas pequenas (como os
estúdios).
***
É preciso prestar atenção ao facto de serem
proibidas “soluções tecnológicas para controlo à distância do desempenho”. O
alerta é dado pela CNPD (Comissão
Nacional de Proteção de Dados), que tem
sido confrontada com “múltiplas questões” relacionadas com este tema, pelo que
decidiu dar orientações sobre o mesmo, esclarecendo, desde logo, que “soluções tecnológicas para controlo à
distância do desempenho do trabalhador não são admitidas”. Assim, os patrões não podem pedir aos trabalhadores que
tenham a câmara sempre ligada. E, em comunicado recentemente divulgado, avisa:
“São disso exemplo os softwares que, além do rastreamento do tempo de
trabalho e de inatividade, registam as páginas de Internet visitadas, a
localização do terminal em tempo real, as utilizações dos dispositivos
periféricos (ratos e teclados), fazem captura de imagem do ambiente de trabalho,
observam e registam quando se inicia o acesso a uma aplicação, controlam o
documento em que se está a trabalhar e registam o respetivo tempo gasto em cada
tarefa”.
Segundo a
CNPD, “no regime de teletrabalho, o
empregador mantém os poderes de direção e de controlo da execução da prestação
laboral”, mas não há, neste regime, “qualquer
disposição legal que regule o controlo à distância, pelo que a regra geral de proibição de utilização de
meios de vigilância à distância, com a finalidade de controlar o desempenho
profissional do trabalhador, é plenamente aplicável à realidade de
teletrabalho”. Por isso, os empregadores não podem impor a quem está a
trabalhar a partir de casa que mantenha a câmara sempre ligada ou gravar as
conversas – situação que implicaria “uma restrição desnecessária e seguramente
excessiva da vida privada do trabalhador”.
No entanto, a CNPD considera
legitimo fixar a obrigação de envio de email, SMS ou modo similar que permita,
além do controlo da disponibilidade do trabalhador e dos tempos de trabalho, a
demonstração de que não foram ultrapassados os tempos máximos de trabalho
permitidos por lei. E nada impede que o
empregador faça o controlo da
disponibilidade do trabalhador e do cumprimento dos tempos de trabalho por contacto telefónico ou eletrónico .
***
Por fim, é
de esclarecer que os trabalhadores em regime de teletrabalho mantêm todos os
direitos estipulados no Código do Trabalho, incluindo o direito ao subsídio de refeição.
Com efeito, o art.º 169.º, no âmbito da “igualdade de tratamento de trabalhador em regime
de teletrabalho”,
estabelece:
“1. O trabalhador em regime de
teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores,
nomeadamente no que se refere a formação e promoção ou carreira profissionais,
limites do período normal de trabalho e outras condições de trabalho, segurança
e saúde no trabalho e reparação de danos emergentes de acidente de trabalho ou
doença profissional. 2. No âmbito da
formação profissional, o empregador deve proporcionar ao trabalhador, em caso
de necessidade, formação adequada sobre a utilização de tecnologias de
informação e de comunicação inerentes ao exercício da respectiva atividade. 3. O empregador deve evitar o isolamento
do trabalhador, nomeadamente através de contactos regulares com a empresa e os
demais trabalhadores.”.
Na
administração pública o entendimento já era de que o subsídio de refeição é
pago aos trabalhadores em regime de teletrabalho. E os peritos da ACT (Autoridade
para as Condições de Trabalho) e da DGERT (Direcção-Geral
do Emprego e das Relações de Trabalho) entendem
que as empresas com trabalhadores em regime de teletrabalho por causa das medidas
de contenção do surto do novo corona vírus deverão continuar a pagar
o subsídio de refeição.
A posição
das duas entidades que estão na alçada do Ministério do Trabalho foi confirmada
à UGT (União Geral de Trabalhadores) pelo
gabinete da Ministra Ana Mendes Godinho, como revelou a central sindical num
comunicado enviado às redações no dia 3 de abril. Embora houvesse entendimentos
diferentes, esta posição da ACT constitui um aviso aos empregadores, já que
este é o serviço do Estado a quem incumbe fiscalizar se as relações laborais no
setor privado são cumpridas de acordo com a lei.
Segundo o
gabinete da Ministra do Trabalho, tanto a ACT como a DGERT entendem que “o
trabalho prestado em regime de teletrabalho confere ao trabalhador os mesmos
direitos que este vinha auferindo quando estava a exercer funções presenciais
no posto de trabalho, tendo por fundamento a redação atualmente em vigor do n.º
1 do artigo 169.º do Código do Trabalho”, em que se estabelece que “o trabalhador em regime de teletrabalho tem
os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores, nomeadamente no que se
refere a formação e promoção ou carreira profissionais, limites do período
normal de trabalho e outras condições de trabalho, segurança e saúde no
trabalho e reparação de danos emergentes de acidente de trabalho ou doença
profissional”.
A própria
ACT, num instrumento de perguntas com respostas publicado no seu site, esclarece
que nada muda relativamente ao subsídio de almoço: “Os trabalhadores em regime de teletrabalho mantêm os mesmos direitos e
deveres dos demais trabalhadores”.
Esta
interpretação leva a UGT, sabedora de que há empresas que não estão a pagar o
subsídio aos trabalhadores que agora exercem funções à distância, a exigir que
as empresas apliquem este entendimento “sob pena de incumprimento legal”.
Para a UGT,
quando o teletrabalho se tornou massivo por obrigação legal, passando a ser o
modo de prestação de trabalho sem qualquer decisão do trabalhador, em que o
teletrabalho é determinado por razões de saúde pública que obrigam os
trabalhadores a comportamentos, incluindo alimentares diversos do habitual, e é
realizado na ausência de um qualquer acordo com o empregador que permita
regular aspetos como a compensação das despesas acrescidas suportadas pelo
teletrabalhador (utilização e desgaste de equipamentos – quase sempre
próprios –, aumento de despesas com gás, eletricidade, etc.), é “ainda mais indubitável que o pagamento de
subsídio de refeição deva ser pago integralmente a todos os teletrabalhadores”.
***
Enfim,
questões que a generalização do teletrabalho levanta e que têm de ser
resolvidas pela lei e pelo sentido da equidade, a ninguém sendo permitido o
aproveitamento para abuso ou fuga às responsabilidades laborais e sociais.
2020.05.01 –
Louro de Carvalho
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