terça-feira, 26 de novembro de 2019

As águas correm turvas lá pelas bandas do Livre


O partido não teve dificuldades na instalação no hemiciclo de São Bento, a não ser no atinente à distribuição dos deputados pelas filas e bancadas, feita pela Conferência de Líderes, sem que os partidos que não formam grupo parlamentar tivessem sido ouvidos, circunstância em que estão em pé de igualdade com a Iniciativa Liberal e o Chega, tal como na conhecida tentativa de silenciamento nos debates parlamentares quinzenais com o Primeiro-Ministro e na decisão de lhes conceder o uso da palavra, em regime transitório, até à aprovação das alterações ao Regimento da Assembleia da República.  
Nos últimos dias, o Livre esteve nas pantalhas da comunicação social porque a sua deputada, ao arrepio da orientação da direção do partido, absteve-se na votação num voto contra as agressões israelitas na Faixa de Gaza. Disse ter votado contra si própria e alega falta de comunicação entre a direção do partido e o seu gabinete no Parlamento.
Porém, a direção do Livre assegurou que não foi pedido pelo gabinete de Joacine Katar Moreira qualquer apoio específico no voto sobre a Palestina. Em declarações à Lusa, Pedro Nunes Rodrigues, membro do Grupo de Contacto do Livre, reagiu ao comunicado da deputada única do Livre, Joacine Katar Moreira, que garantiu que a abstenção no voto sobre a Palestina não se deveu a “um descaso desta grave situação”, mas “à dificuldade de comunicação” com a direção, mostrando-se surpreendida com a posição do partido, que, antes de lhe renovar a confiança política, a criticou fortemente. Disse o dirigente partidário, contrapondo:
A dificuldade de comunicação passa também por ela, para o gabinete dela, uma vez que nunca se dirigiu aos restantes membros da direção a pedir uma ajuda naquele voto específico. Foi-nos enviado o guião de votações, como nos é enviado todas as semanas, mas na semana passada nós também não nos pronunciámos sobre todas as votações e, no entanto, não houve nenhuma situação destas de haver uma falha de comunicação.”.
Joacine chegou a dizer que foi eleita sozinha e que a direção do Livre nunca a apoiou. Quem acredita nisso? E hoje, dia 26, acusou o partido de lançar um “autêntico golpe” contra ela. O mal-estar é crescente e o Conselho de Jurisdição promete decidir “rapidamente” a polémica.
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Hoje, dia 26, Joacine está na berra por causa do projeto de lei do partido sobre a nacionalidade, que não deu entrada na Assembleia da República dentro do prazo estabelecido pelo Regimento para ser discutido com os demais projetos partidários no próximo dia 11 de dezembro. A deputada eleita pelo Livre ainda tentou entregar na mesa da Assembleia da República, fora do prazo, o projeto do partido sobre a Lei da Nacionalidade, mas não houve consenso dos grupos parlamentares para o permitir.
A alteração desta lei era uma das prioridades do Livre, mas o partido falhou o prazo para entrar na discussão que ficou agendada, em Conferência de Líderes, para dia 11 de dezembro. Depois de ter sido noticiada a falha, Joacine Katar Moreira requereu à mesa da Assembleia da República  (que organiza a agenda dos trabalhos parlamentares) que o seu projeto sobre a matéria pudesse ser entregue para que fosse debatido juntamente com os que já foram entregues pelo BE, PCP e PAN. CDS e BE não se opuseram, mas os outros partidos não concordaram.
A decisão de aceitar esta entrada tardia de um projeto teria de ser tomada por consenso dos grupos parlamentares, o que não aconteceu. Apesar de terem sido feitos os contactos, não houve assentimento por parte de todos os outros partidos.
O PCP, por exemplo, entende que “as regras são para cumprir”. Na mesma linha, posiciona-se o PS para quem esta é “uma não questão”.  O partido aduz que “existem regras bem estabelecidas para agendamentos e que devem [ser] e são respeitadas por todos”. Mais diz que “nada impede o Livre de apresentar a iniciativa quando quiser ao longo desta ou de outra sessão legislativa”.
O PSD não chegou a ter de se pronunciar porque, diz um deputado do partido, a Secretária da Mesa, Maria da Luz Rosinha, foi quem consultou este grupo parlamentar e disse que o PCP “mandava aplicar as regras”. A partir daí,  “não havia mais consenso, questão arrumada”.
Todavia, os sociais-democratas estranham o procedimento da deputada Joacine Katar Moreira, chegando mesmo a considerá-lo “insólito”, pois, como refere o PSD, “quando se pretendem ganhar consensos, deve ser o próprio deputado ou o grupo parlamentar a atuar”. E, aqui, estranhamente “a deputada meteu intermediários a tratar” do seu assunto.
O CDS e o BE foram os dois partidos que não levantaram objeções à pretensão da deputada do Livre. Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do BE, anunciou-o mesmo através do Twitter:
O Livre pediu hoje para agendar uma iniciativa legislativa no debate marcado pelo Bloco de Esquerda sobre a Lei da Nacionalidade. Apesar de a iniciativa do Livre ainda não ter dado entrada nos serviços da Parlamento, o Bloco de Esquerda mostrou abertura para esse agendamento.”.
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Até 22 de novembro teriam de entrar projetos de lei dos partidos para a discussão da lei que é uma das prioridades do Livre. Por se tratar duma prioridade do partido, ninguém estava à espera deste falhanço e que o Livre não contasse com a frieza das regras que determinam os procedimentos. Tanto assim é que, no dia 23, a deputada única do partido dizia estar “para breve” a apresentação do projeto de lei. E fonte parlamentar garantia à agência Lusa que o projeto iria dar entrada na Assembleia da República esta terça-feira, embora já depois do prazo para entrar na discussão que ficou agendada, em Conferência de Líderes, para dia 11 de dezembro, como avançavam o Público e o Diário de Notícias.
A discussão ficou agendada depois do Bloco de Esquerda ter entregado o projeto do partido logo no primeiro dia de trabalhos desta legislatura, a 25 de outubro. A conferência de líderes do dia 19, que fixou os agendamentos do Parlamento até início de fevereiro, decidiu que o projeto do BE seria discutido dia 11 de dezembro, sendo possível arrastar outros projetos de lei dos partidos que se quisessem somar à discussão, sob a condição de serem entregues até dia 22 de novembro. PAN e PCP entregaram os respetivos projetos no último dia do prazo, contribuindo assim para que a 11 de dezembro sejam discutidos os projetos do BE, PAN e PCP.
O Livre, que fez da lei da nacionalidade uma das bandeiras do partido durante a campanha eleitoral e que a colocava como uma das prioridades já para este primeiro ano de legislatura, poderá tentar o agendamento da discussão da sua proposta para outra data ou ainda usar da prerrogativa de fazer o agendamento potestativo do projeto de lei do partido.
Rafael Esteves Martins, assessor de Joacine informou que a deputada estaria “ocupada a trabalhar e, portanto, indisponível para responder” às questões que lhe queriam colocar.
O Livre não pode agora desculpar-se com a gaguez da deputada (que diz não ser descartável), nem com a hipótese de o assessor se ter enredado na saia plissada (O assessor, que deveria ser discreto na sus condição de assessor fez aquela fita toda aquando da posse! Para quê?). E, sabendo que não conta com o beneplácito dos grandes (os pequenos devem ser respeitados, mas não se podem sobrepor aos outros), deve cumprir as regras estabelecidas. É certo que os outros partidos poderiam condescender, mas ninguém os obriga à complacência. Em caso de situações conflituais, mandam o bom senso e a prudência cumprir regras e prazos e não levantar ondas quando não se tem razão.
2019.11.26 – Louro de Carvalho    

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