É Isabel
Figueiredo, que
tem como primeira prioridade “conhecer a realidade”, como revelou ao portal
da Santa Sé, e para quem “é uma lição diária ouvir e ver o Papa Francisco”.
Em entrevista
ao VATICAN NEWS, a diretora do SNCS (Secretariado
Nacional das Comunicações Sociais), órgão da
Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, da CEP (Conferência
Episcopal Portuguesa) sublinhou
ter acolhido “com um sentimento de gratidão” a sua nomeação para diretora do Secretariado
Nacional das Comunicações Sociais. Foi uma escolha dos bispos portugueses na
assembleia plenária da CEP que terminou no passado dia 2 de maio, que nomearam,
pela primeira vez, para estas funções uma mulher – escolha que recaiu na responsável
pelos conteúdos religiosos das rádios do Grupo
Renascença Multimédia onde trabalha desde 1990 e adjunta do presidente do
Conselho de Gerência.
A novel
diretora do SNCS, que mantém as demais funções e sucede no cargo Dom Américo
Aguiar, Bispo Auxiliar de Lisboa, refere que um dos primeiros e-mails que recebeu depois de sair a
nomeação recomendava que não se esquecesse das “periferias”, pelo que um dos seus
primeiros trabalhos foi “visitar os secretariados diocesanos” para “os conhecer
localmente”. E, reafirmando, neste contexto, o apelo de Francisco para a
importância da linguagem e da comunicação digital onde a Igreja deve estar
presente, deixa um alerta: “Não podemos
perder nunca de vista o que é fundamental”, ou seja, a “comunhão local”.
Ao portal da
Santa Sé, a também colaboradora regular da revista Mensageiro do Coração de Jesus e autora de várias obras (nomeadamente:
“Vale a Pena Pensar nisto”, “Via Sacra com Maria”, “Advento para Crentes e Não Crentes” e “Linhas Tecidas com Tempo”) realça ainda a importância dos pontificados de São
João Paulo II, Bento XVI e Francisco para a valorização dos ‘media’ da Igreja.
***
Entretanto, a 24 de maio, Isabel Figueiredo deu uma entrevista à
Renascença e à Ecclesia em que
assegurou ter acabado “o tempo em que o trabalho de comunicação era feito em
projetos isolados” e sublinhou a necessidade de prestar atenção ao
público para quem se produzem os conteúdos. Dela se respigam alguns dados, em
virtude da sua pertinência.
A entrevista foi a propósito da
sessão agendada para o dia 30 de maio, em Lisboa, em que foi apresentado o Dia Mundial das Comunicações Sociais que
a Igreja Católica celebrou a 2 de junho, e em que foi entregue o prémio de
jornalismo ‘Dom Manuel Falcão’.
E a questão de
chofre incidiu sobre o facto de ser uma leiga e mulher a dirigir aquele
organismo e sobre que mais-valia o caso traz à causa, replicando que não vê as
coisas por esse prisma, pois, embora seja diferente o contributo de cada
pessoa, não se pode pensar que os contributos de outros traga menos-valias. Por
isso, é melhor esperar pelo que “o trabalho
mostra”.
Quanto a
expectativas para o desempenho do cargo, uma vez que se sente “orgulhosa, grata, tranquila”, entende que “as
expectativas decorrem desta forma de estar”. E explica:
“As
expectativas que tenho são que possamos continuar o trabalho – por isso dizia
que me sentia orgulhosa, porque vinha atrás de pessoas cujo trabalho e
qualidade são reconhecidos por todos; quando digo que estou grata à Igreja,
digo também que espero continuar a merecer essa mesma gratidão, fazer algo de
diferente que mereça a confiança que é depositada; a tranquilidade, outra
expressão que eu utilizei, também é engraçado misturá-la com isso – já tive
oportunidade de dizer que tenho dias mais tranquilos e outros menos, à medida
que o tempo passa. (…) Há alguns acontecimentos que já sabemos que aí vêm, que
são claramente importantes. Vamos ver o que vai trazer.”.
No atinente a
prioridades definidas ou a definir, atém-se à lição do pároco velhinho da
paróquia onde cresceu, que ensinava ao grupo de jovens que, ao chegar-se a um
novo cargo, “ durante um
período de tempo não se deve fazer absolutamente nenhuma mudança, deve ficar-se
quieto e observar, só depois é que se fazem as mudanças”. Assim, a sua postura
atual “é observar o que se passa” para, depois, “conseguir trabalhar”.
Passando a aspetos substanciais da
entrevista, pronunciou-se sobre a missão do SNCS de animar o setor na linha do
Vaticano II equilibrando a prestação do dado religioso por meios próprios, a
ajuda a que outros também o prestem e a abertura dos canais de comunicação da
Igreja a temas mais abrangentes. E, em relação a esta matéria, vincou o “caminho
feito pela Igreja Católica nos últimos anos”, sublinhou o facto de o Papa
Francisco vir falando “quase todas as semanas para a Comunicação Social, de uma
maneira ou de outra”, pensando que ele está a fazer o “trabalho de alargar
horizontes”. Entende que temos de alargar cada vez mais os horizontes, mas num
caminho “que tem de ser feito sem que pareça ser uma novidade, porque não é”. E
ilustrou o seu pensamento com a diferença de atuação da Renascença e da Ecclesia em
termos de trabalho de comunicação entre o que se faz hoje e o que se fazia
dantes – um caminho que se percorre na dialética da continuidade e da inovação.
Entretanto, identificou as redes sociais como “o desafio mais evidente”.
Questionada
sobre como conseguirá essa relação com todos os meios de Comunicação Social
equilibrando a tensão entre ter meios próprios e ajudar outros meios a
comunicar o religioso, afirmou que essa
questão “assenta num princípio que todos partilhamos, embora nem sempre o
verbalizemos”, ou seja, em termos de comunicação de Igreja “temos de avançar
sempre num caminho de comunhão”, pois “o tempo em que cada um fazia o seu
trabalhinho de comunicação”, segundo a entrevistada, “pertence ao passado”. E,
concedendo, adianta:
“Foi rico, teve
o seu caminho, fizeram-se as suas coisas, mas olhando para o presente e para o
futuro, será sempre uma tentativa de alargarmos o trabalho e todos podermos
estar uns com os outros. Julgo que conhecer os secretariados diocesanos,
procurar fazer um trabalho a nível nacional, é precisamente com esse enfoque, é
isso que a Igreja espera.”.
Estabelecendo que
o agora dito “é uma
prioridade”, passou à preocupação com a chamada
comunicação institucional da Igreja Católica e aos alegados “problemas
na forma como as dioceses reagem a determinadas notícias, como usam as redes
sociais, como partilham informação nos seus sites,
[sendo que] algumas nem sequer têm site…”. Disse que esta preocupação
“decorre do momento que nós estamos a viver, que tem isto de bom e tem o lado
menos bom”. E apontou:
“O facto de,
hoje em dia, termos praticamente uma comunicação instantânea – o efeito de um post no Facebook é replicado em muito pouco tempo, o efeito de uma notícia
ou determinada abertura, sem se ler a notícia toda, ganha uma velocidade que
escapa a toda a gente”.
Sabe que “é um problema de
comunicação institucional”, que “a Igreja tem sempre de pensar o que é
comunicar para dentro e o que é comunicar para fora, estar com outros órgãos de
comunicação social”, não se podendo dizer que “está tudo feito nos dois campos”,
mas “tem de se avançar”. Porém, afasta a preocupação com problemazinhos, porque
“a vida se encarrega de nos mostrar que aquilo que hoje parece uma coisa,
amanhã será outra”, devendo nós ter “a real consciência da dimensão das coisas,
ir tateando e melhorando”.
No respeitante à
formação e gestão mais profissional dos meios que a Igreja tem ao seu dispor, confessou
sentimentos mistos: sabe que “já há
profissionais a trabalhar em muitos” [meios de comunicação da Igreja], não tendo a situação atual “nada a ver com o que se
vivia há 10 anos”; que “há trabalho profissional feito em muitos lados”, de modo
que “não podemos dizer que estamos a trabalhar com amadores, em termos
institucionais”; mas tem de se prestar grande “atenção a quem consome tudo
aquilo que se faz”, pois, não se faz comunicação “só para comunicadores”, mas “para
toda a gente”; e “é aí que as redes sociais dão uma dimensão enorme a tudo isto
[de] que estamos a falar”. Isto, “para o bem e para o mal”.
E vincou:
“Portanto,
quando se diz que a comunicação é feita para uma multidão de gente – que não
fazemos a mais pequena ideia de como é que lê, quando é que vai ler, quando é
que vai ver, como é que vai ouvir, se vai ouvir do princípio até ao fim – isto
é que obriga os profissionais (…) a estarem permanentemente atentos a isto”.
Relativamente ao
enquadramento empresarial dos Meios de Comunicação Social da Igreja, lembrou
que já várias pessoas alertaram para a
questão, inclusivamente Dom Américo Aguiar (anterior diretor do Secretariado das
Comunicações Sociais), pois “estamos
a viver um tempo especial e difícil (…) em termos de empresas de Comunicação”. E
explicou recorrendo a uma das últimas palavras do Papa ao agradecer “o trabalho
dos jornalistas e da Comunicação Social”, afirmando a importância da
Comunicação Social numa sociedade livre, pois “nós precisamos de gente, de profissionais de Comunicação Social que
saibam pôr o dedo nas feridas da sociedade atual”, inclusive nas feridas
eclesiais, “porque sem esse trabalho nós
não conseguimos, a sociedade não é verdadeiramente livre, nem é uma sociedade
de comunhão a que todos aspiramos, e todos temos essa inquietação interior da
comunhão”. E Francisco acrescentava:
“Isto é tudo
verdade, mas nós ao mesmo tempo precisamos de gente que seja completamente
humilde no seu trabalho, e gente que seja completamente dedicada à verdade”.
Por isso, Isabel Figueiredo vê a
dificuldade do que se passa em termos empresariais, mas sustenta a necessidade
de toda a sociedade ter consciência de que precisa da Comunicação Social,
avançando que a presença da Igreja nos media faz cada vez mais sentido. E
alerta:
“Não é um
assunto que pense que se pode tornar menor, ou ao qual se pode dizer: vamos-lhe
dar menos meios, vamos-lhe dar menos importância, porque há imensas notícias
horríveis que correm, há imensas mentiras, há imensa coisa mal feita”.
Questionada
sobre a presença da Igreja num espaço inter-religioso no âmbito do serviço
público de rádio e televisão e sobre o contributo que nele vê para a informação
na sociedade portuguesa sobre a dimensão religiosa e para a convivência e
diálogo inter-religioso que marcam a nossa sociedade, respondeu com o orgulho que tem no trabalho da Ecclesia. E contou:
“Ainda hoje me
falavam de que no Brasil consultavam a Ecclesia
diariamente, tinham o ecrã aberto e tinham a Ecclesia e o Vaticano, as notícias do Vaticano. E eu achei muito
simpático, e claro que não tinham necessidade de dizer, portanto, se o disseram
é porque é a pura das verdades.”.
Depois, disse que um programa eclesial no
serviço público de rádio e televisão acaba por ser mais abrangente e
inter-religioso, com uma mais-valia nessa marca. E explanou:
“A experiência
da Ecclesia é a prova evidente disto.
Sim, nós temos de caminhar para isso, caminhamos exatamente para isso. E eu
acho que Portugal, aí também, dá muitas cartas, porque a nossa capacidade de
estarmos ao lado das outras confissões religiosas e de fazermos um caminho é
algo que tem muitos anos. Eu volto atrás, à história da minha pequena paróquia,
onde eu cresci como adolescente, e há muitos, muitos anos já havia uma Missa
que era celebrada em inglês e já tínhamos momentos de oração feita com outras
comunidades religiosas.”.
Relativamente
aos problemas dos media que preocupam
as empresas, nomeadamente as ‘fake news’ e a tendência para o jornalismo-espetáculo
ou o jornalismo de chicote, se isso se reflete no SNCS e como este organismo pode
refletir e contribuir para enfrentar estas dificuldades, começou por defender o
jornalismo da Rádio Renascença como “sinónimo de jornalismo de qualidade e de
seriedade”, como atestam os muitos prémios recebidos pela estação. Quanto às
‘fake news’, disse que “vão continuar sempre”, pois “sempre existiram”, embora
atualmente tenham um “impacto completamente fora do habitual porque elas se
espalham com uma velocidade enorme e são incontroláveis”. E, em relação ao
facto de o Papa as ter denunciado na sua mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais deste ano, comentou:
“O Papa
também dizia uma coisa muito interessante, dizia que nesta questão das ‘fake
news’ e da comunicação de hoje em dia, já não é possível pôr a errata, que se
punha antigamente nos livros: quando havia uma coisa que estava errada,
punha-se uma errata e resolvia-se o problema. E hoje em dia já não é possível
pôr erratas, portanto, as ‘fake news’ têm este problema muito real.”.
Em relação à predita sessão, aberta
a todas as pessoas, no dia 30 de maio, pelas 17 horas, no auditório da Rádio
Renascença, frisou o facto de o primeiro convite ser para os secretariados
diocesanos de comunicação e o facto de se pôr a mensagem do Papa “a ser
debatida por diversos olhares” e exemplificou: o olhar do diretor da Faculdade
de Ciências Humanas (UCP), Nelson
Ribeiro, antigo diretor da Renascença,
e que ensina comunicação; o de uma antiga aluna da UCP, que neste momento
trabalha numa televisão, essencialmente na questão das redes; e o de Nello
Scavo, jornalista que tem escrito alguns livros, um dos quais sobre o Papa que
se tornou mais conhecido, e agora este, que lançou em Portugal exatamente sobre
as ‘fake news’ acerca do Papa, comentando também a mensagem papal. Depois, referiu
que o tema da sessão ‘Esta é a rede que queremos’ inspirado nessa mensagem onde diz:
“Nós queremos
uma rede, mas não queremos a rede como dela se fala habitualmente, queremos uma
rede que caminhe para a comunhão das pessoas, que cruze as pessoas de outra
maneira”.
E explicou:
“A imagem da
rede é muito poderosa, porque a rede traz tudo com ela, o que entra dentro da
rede, o que sai fora da rede, o que cai da rede, a rede cheia, a rede vazia, a
rede que se lança, a rede que se recolhe. Portanto, esta é uma rede que toca
claramente o coração das pessoas e eu acho que é por aí que nós podemos pegar na
mensagem do Papa, olhar para ela de outra maneira e ir à procura do que é que
ela tem a dizer a cada um dos profissionais de comunicação social.”.
Sobre o título da
mensagem papal Das ‘Community’ às
comunidades’, frisou que é “um desafio
muito oportuno” e que o Papa dá exemplos concretos, enaltecendo o mérito da família
que utiliza a rede para comunicar entre si, mas ao fim do dia se senta à volta
da mesa e fala olhos nos olhos, e o da paróquia que usa a rede para comunicar o
que faz e anunciar iniciativas, mas depois as pessoas, ao domingo estão na Missa
todas juntas e fazem comunhão. Mas, se não é assim, segundo o Pontífice, “há
aqui um sinal vermelho que tem de se abrir” e “as pessoas têm de pensar”. Obviamente,
para Isabel Figueiredo, esta “é uma questão pertinente”.
E a nova diretora
do SNCS acha que as redes sociais são muito relevantes antes e depois das JMJ (Jornadas Mundiais da Juventude) e um desafio a encarar e a
aproveitar para a que se vai realizar em Portugal. Só esteve nas primeiras JMJ de Roma, mas afiança:
“Nem nós, nem
as pessoas que já estiveram em Jornadas Mundiais têm a consciência do que é o
desafio de receber uma Jornada Mundial da Juventude, e de comunicar uma JMJ.
Portanto, acho que é um enorme desafio, sendo que tenho sempre presente, a
tocar cá na minha campainha que – e foi dito pelo senhor Cardeal-Patriarca – a
JMJ é dos jovens, feita pelos jovens e para os jovens. E, portanto, nós temos
de olhar, até para a comunicação, temos de olhar assim. Temos de saber o que é
que eles querem ouvir, o que é que eles precisam de dizer, como é que eles
entendem as coisas.”.
Por fim, fez referência ao prémio de
jornalismo ‘Dom Manuel Falcão’. Concorreram
os órgãos de comunicação social e o júri escolheu, na dúzia de trabalhos
entrados, o trabalho que tem o título ‘É
como se a Mãe descesse à terra’ – muito bom do ângulo da imagem (joga muito
bem com a imagem, a fotografia, o texto e a música) – que nos situa “no universo da religiosidade
popular” e com “a questão mariana”. É a grande reportagem da TVI, de Catarina
Canelas, em cuja equipa trabalham João Franco, Tiago Donato, Rodrigo Cortegiano
e João Pedro Ferreira. Também o prémio foi atribuído ao Diário do Minho em forma honorífica pelo seu centenário.
***
Em suma, uma entrevista a reler por
quem se preocupe com a Igreja e com a Comunicação.
2019.06.12 – Louro de Carvalho
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