quarta-feira, 12 de junho de 2019

Uma mulher à frente do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais


É Isabel Figueiredo, que tem como primeira prioridade “conhecer a realidade”, como revelou ao portal da Santa Sé, e para quem “é uma lição diária ouvir e ver o Papa Francisco”.
Em entrevista ao VATICAN NEWS, a diretora do SNCS (Secretariado Nacional das Comunicações Sociais), órgão da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, da CEP (Conferência Episcopal Portuguesa) sublinhou ter acolhido “com um sentimento de gratidão” a sua nomeação para diretora do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais. Foi uma escolha dos bispos portugueses na assembleia plenária da CEP que terminou no passado dia 2 de maio, que nomearam, pela primeira vez, para estas funções uma mulher – escolha que recaiu na responsável pelos conteúdos religiosos das rádios do Grupo Renascença Multimédia onde trabalha desde 1990 e adjunta do presidente do Conselho de Gerência.
A novel diretora do SNCS, que mantém as demais funções e sucede no cargo Dom Américo Aguiar, Bispo Auxiliar de Lisboa, refere que um dos primeiros e-mails que recebeu depois de sair a nomeação recomendava que não se esquecesse das “periferias”, pelo que um dos seus primeiros trabalhos foi “visitar os secretariados diocesanos” para “os conhecer localmente”. E, reafirmando, neste contexto, o apelo de Francisco para a importância da linguagem e da comunicação digital onde a Igreja deve estar presente, deixa um alerta: “Não podemos perder nunca de vista o que é fundamental”, ou seja, a “comunhão local”.
Ao portal da Santa Sé, a também colaboradora regular da revista Mensageiro do Coração de Jesus e autora de várias obras (nomeadamente: “Vale a Pena Pensar nisto”, “Via Sacra com Maria”, “Advento para Crentes e Não Crentes” e “Linhas Tecidas com Tempo) realça ainda a importância dos pontificados de São João Paulo II, Bento XVI e Francisco para a valorização dos ‘media’ da Igreja. 
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Entretanto, a 24 de maio, Isabel Figueiredo deu uma entrevista à Renascença e à Ecclesia em que assegurou ter acabado “o tempo em que o trabalho de comunicação era feito em projetos isolados” e sublinhou a necessidade de prestar atenção ao público para quem se produzem os conteúdos. Dela se respigam alguns dados, em virtude da sua pertinência.         
A entrevista foi a propósito da sessão agendada para o dia 30 de maio, em Lisboa, em que foi apresentado o Dia Mundial das Comunicações Sociais que a Igreja Católica celebrou a 2 de junho, e em que foi entregue o prémio de jornalismo ‘Dom Manuel Falcão’.
E a questão de chofre incidiu sobre o facto de ser uma leiga e mulher a dirigir aquele organismo e sobre que mais-valia o caso traz à causa, replicando que não vê as coisas por esse prisma, pois, embora seja diferente o contributo de cada pessoa, não se pode pensar que os contributos de outros traga menos-valias. Por isso, é melhor esperar pelo que “o trabalho mostra”.
Quanto a expectativas para o desempenho do cargo, uma vez que se sente “orgulhosa, grata, tranquila”, entende que “as expectativas decorrem desta forma de estar”. E explica:
As expectativas que tenho são que possamos continuar o trabalho – por isso dizia que me sentia orgulhosa, porque vinha atrás de pessoas cujo trabalho e qualidade são reconhecidos por todos; quando digo que estou grata à Igreja, digo também que espero continuar a merecer essa mesma gratidão, fazer algo de diferente que mereça a confiança que é depositada; a tranquilidade, outra expressão que eu utilizei, também é engraçado misturá-la com isso – já tive oportunidade de dizer que tenho dias mais tranquilos e outros menos, à medida que o tempo passa. (…) Há alguns acontecimentos que já sabemos que aí vêm, que são claramente importantes. Vamos ver o que vai trazer.”.
No atinente a prioridades definidas ou a definir, atém-se à lição do pároco velhinho da paróquia onde cresceu, que ensinava ao grupo de jovens que, ao chegar-se a um novo cargo, “ durante um período de tempo não se deve fazer absolutamente nenhuma mudança, deve ficar-se quieto e observar, só depois é que se fazem as mudanças”. Assim, a sua postura atual “é observar o que se passa” para, depois, “conseguir trabalhar”.
Passando a aspetos substanciais da entrevista, pronunciou-se sobre a missão do SNCS de animar o setor na linha do Vaticano II equilibrando a prestação do dado religioso por meios próprios, a ajuda a que outros também o prestem e a abertura dos canais de comunicação da Igreja a temas mais abrangentes. E, em relação a esta matéria, vincou o “caminho feito pela Igreja Católica nos últimos anos”, sublinhou o facto de o Papa Francisco vir falando “quase todas as semanas para a Comunicação Social, de uma maneira ou de outra”, pensando que ele está a fazer o “trabalho de alargar horizontes”. Entende que temos de alargar cada vez mais os horizontes, mas num caminho “que tem de ser feito sem que pareça ser uma novidade, porque não é”. E ilustrou o seu pensamento com a diferença de atuação da Renascença e da Ecclesia em termos de trabalho de comunicação entre o que se faz hoje e o que se fazia dantes – um caminho que se percorre na dialética da continuidade e da inovação. Entretanto, identificou as redes sociais como “o desafio mais evidente”.
Questionada sobre como conseguirá essa relação com todos os meios de Comunicação Social equilibrando a tensão entre ter meios próprios e ajudar outros meios a comunicar o religioso, afirmou que essa questão “assenta num princípio que todos partilhamos, embora nem sempre o verbalizemos”, ou seja, em termos de comunicação de Igreja “temos de avançar sempre num caminho de comunhão”, pois “o tempo em que cada um fazia o seu trabalhinho de comunicação”, segundo a entrevistada, “pertence ao passado”. E, concedendo, adianta:
Foi rico, teve o seu caminho, fizeram-se as suas coisas, mas olhando para o presente e para o futuro, será sempre uma tentativa de alargarmos o trabalho e todos podermos estar uns com os outros. Julgo que conhecer os secretariados diocesanos, procurar fazer um trabalho a nível nacional, é precisamente com esse enfoque, é isso que a Igreja espera.”.
Estabelecendo que o agora dito “é uma prioridade”, passou à preocupação com a chamada comunicação institucional da Igreja Católica e aos alegados “problemas na forma como as dioceses reagem a determinadas notícias, como usam as redes sociais, como partilham informação nos seus sites, [sendo que] algumas nem sequer têm site…”. Disse que esta preocupação “decorre do momento que nós estamos a viver, que tem isto de bom e tem o lado menos bom”. E apontou:
O facto de, hoje em dia, termos praticamente uma comunicação instantânea – o efeito de um post no Facebook é replicado em muito pouco tempo, o efeito de uma notícia ou determinada abertura, sem se ler a notícia toda, ganha uma velocidade que escapa a toda a gente”.
Sabe que “é um problema de comunicação institucional”, que “a Igreja tem sempre de pensar o que é comunicar para dentro e o que é comunicar para fora, estar com outros órgãos de comunicação social”, não se podendo dizer que “está tudo feito nos dois campos”, mas “tem de se avançar”. Porém, afasta a preocupação com problemazinhos, porque “a vida se encarrega de nos mostrar que aquilo que hoje parece uma coisa, amanhã será outra”, devendo nós ter “a real consciência da dimensão das coisas, ir tateando e melhorando”.
No respeitante à formação e gestão mais profissional dos meios que a Igreja tem ao seu dispor, confessou sentimentos mistos: sabe que “já há profissionais a trabalhar em muitos” [meios de comunicação da Igreja], não tendo a situação atual “nada a ver com o que se vivia há 10 anos”; que “há trabalho profissional feito em muitos lados”, de modo que “não podemos dizer que estamos a trabalhar com amadores, em termos institucionais”; mas tem de se prestar grande “atenção a quem consome tudo aquilo que se faz”, pois, não se faz comunicação “só para comunicadores”, mas “para toda a gente”; e “é aí que as redes sociais dão uma dimensão enorme a tudo isto [de] que estamos a falar”. Isto, “para o bem e para o mal”. E vincou:
Portanto, quando se diz que a comunicação é feita para uma multidão de gente – que não fazemos a mais pequena ideia de como é que lê, quando é que vai ler, quando é que vai ver, como é que vai ouvir, se vai ouvir do princípio até ao fim – isto é que obriga os profissionais (…) a estarem permanentemente atentos a isto”.
Relativamente ao enquadramento empresarial dos Meios de Comunicação Social da Igreja, lembrou que já várias pessoas alertaram para a questão, inclusivamente Dom Américo Aguiar (anterior diretor do Secretariado das Comunicações Sociais), pois “estamos a viver um tempo especial e difícil (…) em termos de empresas de Comunicação”. E explicou recorrendo a uma das últimas palavras do Papa ao agradecer “o trabalho dos jornalistas e da Comunicação Social”, afirmando a importância da Comunicação Social numa sociedade livre, pois “nós precisamos de gente, de profissionais de Comunicação Social que saibam pôr o dedo nas feridas da sociedade atual”, inclusive nas feridas eclesiais, “porque sem esse trabalho nós não conseguimos, a sociedade não é verdadeiramente livre, nem é uma sociedade de comunhão a que todos aspiramos, e todos temos essa inquietação interior da comunhão”. E Francisco acrescentava:
Isto é tudo verdade, mas nós ao mesmo tempo precisamos de gente que seja completamente humilde no seu trabalho, e gente que seja completamente dedicada à verdade”.
Por isso, Isabel Figueiredo vê a dificuldade do que se passa em termos empresariais, mas sustenta a necessidade de toda a sociedade ter consciência de que precisa da Comunicação Social, avançando que a presença da Igreja nos media faz cada vez mais sentido. E alerta:
Não é um assunto que pense que se pode tornar menor, ou ao qual se pode dizer: vamos-lhe dar menos meios, vamos-lhe dar menos importância, porque há imensas notícias horríveis que correm, há imensas mentiras, há imensa coisa mal feita”.
Questionada sobre a presença da Igreja num espaço inter-religioso no âmbito do serviço público de rádio e televisão e sobre o contributo que nele vê para a informação na sociedade portuguesa sobre a dimensão religiosa e para a convivência e diálogo inter-religioso que marcam a nossa sociedade, respondeu com o orgulho que tem no trabalho da Ecclesia. E contou:
Ainda hoje me falavam de que no Brasil consultavam a Ecclesia diariamente, tinham o ecrã aberto e tinham a Ecclesia e o Vaticano, as notícias do Vaticano. E eu achei muito simpático, e claro que não tinham necessidade de dizer, portanto, se o disseram é porque é a pura das verdades.”.
Depois,  disse que um programa eclesial no serviço público de rádio e televisão acaba por ser mais abrangente e inter-religioso, com uma mais-valia nessa marca. E explanou:
A experiência da Ecclesia é a prova evidente disto. Sim, nós temos de caminhar para isso, caminhamos exatamente para isso. E eu acho que Portugal, aí também, dá muitas cartas, porque a nossa capacidade de estarmos ao lado das outras confissões religiosas e de fazermos um caminho é algo que tem muitos anos. Eu volto atrás, à história da minha pequena paróquia, onde eu cresci como adolescente, e há muitos, muitos anos já havia uma Missa que era celebrada em inglês e já tínhamos momentos de oração feita com outras comunidades religiosas.”.
Relativamente aos problemas dos media que preocupam as empresas, nomeadamente as ‘fake news’ e a tendência para o jornalismo-espetáculo ou o jornalismo de chicote, se isso se reflete no SNCS e como este organismo pode refletir e contribuir para enfrentar estas dificuldades, começou por defender o jornalismo da Rádio Renascença como “sinónimo de jornalismo de qualidade e de seriedade”, como atestam os muitos prémios recebidos pela estação. Quanto às ‘fake news’, disse que “vão continuar sempre”, pois “sempre existiram”, embora atualmente tenham um “impacto completamente fora do habitual porque elas se espalham com uma velocidade enorme e são incontroláveis”. E, em relação ao facto de o Papa as ter denunciado na sua mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais deste ano, comentou:
O Papa também dizia uma coisa muito interessante, dizia que nesta questão das ‘fake news’ e da comunicação de hoje em dia, já não é possível pôr a errata, que se punha antigamente nos livros: quando havia uma coisa que estava errada, punha-se uma errata e resolvia-se o problema. E hoje em dia já não é possível pôr erratas, portanto, as ‘fake news’ têm este problema muito real.”.
Em relação à predita sessão, aberta a todas as pessoas, no dia 30 de maio, pelas 17 horas, no auditório da Rádio Renascença, frisou o facto de o primeiro convite ser para os secretariados diocesanos de comunicação e o facto de se pôr a mensagem do Papa “a ser debatida por diversos olhares” e exemplificou: o olhar do diretor da Faculdade de Ciências Humanas (UCP), Nelson Ribeiro, antigo diretor da Renascença, e que ensina comunicação; o de uma antiga aluna da UCP, que neste momento trabalha numa televisão, essencialmente na questão das redes; e o de Nello Scavo, jornalista que tem escrito alguns livros, um dos quais sobre o Papa que se tornou mais conhecido, e agora este, que lançou em Portugal exatamente sobre as ‘fake news’ acerca do Papa, comentando também a mensagem papal. Depois, referiu que o tema da sessão ‘Esta é a rede que queremos’ inspirado nessa mensagem onde diz:
Nós queremos uma rede, mas não queremos a rede como dela se fala habitualmente, queremos uma rede que caminhe para a comunhão das pessoas, que cruze as pessoas de outra maneira”.
E explicou:
A imagem da rede é muito poderosa, porque a rede traz tudo com ela, o que entra dentro da rede, o que sai fora da rede, o que cai da rede, a rede cheia, a rede vazia, a rede que se lança, a rede que se recolhe. Portanto, esta é uma rede que toca claramente o coração das pessoas e eu acho que é por aí que nós podemos pegar na mensagem do Papa, olhar para ela de outra maneira e ir à procura do que é que ela tem a dizer a cada um dos profissionais de comunicação social.”.
Sobre o título da mensagem papal Das ‘Community’ às comunidades’, frisou que é “um desafio muito oportuno” e que o Papa dá exemplos concretos, enaltecendo o mérito da família que utiliza a rede para comunicar entre si, mas ao fim do dia se senta à volta da mesa e fala olhos nos olhos, e o da paróquia que usa a rede para comunicar o que faz e anunciar iniciativas, mas depois as pessoas, ao domingo estão na Missa todas juntas e fazem comunhão. Mas, se não é assim, segundo o Pontífice, “há aqui um sinal vermelho que tem de se abrir” e “as pessoas têm de pensar”. Obviamente, para Isabel Figueiredo, esta “é uma questão pertinente”.
E a nova diretora do SNCS acha que as redes sociais são muito relevantes antes e depois das JMJ (Jornadas Mundiais da Juventude) e um desafio a encarar e a aproveitar para a que se vai realizar em Portugal. Só esteve nas primeiras JMJ de Roma, mas afiança:
Nem nós, nem as pessoas que já estiveram em Jornadas Mundiais têm a consciência do que é o desafio de receber uma Jornada Mundial da Juventude, e de comunicar uma JMJ. Portanto, acho que é um enorme desafio, sendo que tenho sempre presente, a tocar cá na minha campainha que – e foi dito pelo senhor Cardeal-Patriarca – a JMJ é dos jovens, feita pelos jovens e para os jovens. E, portanto, nós temos de olhar, até para a comunicação, temos de olhar assim. Temos de saber o que é que eles querem ouvir, o que é que eles precisam de dizer, como é que eles entendem as coisas.”.
Por fim, fez referência ao prémio de jornalismo ‘Dom Manuel Falcão’. Concorreram os órgãos de comunicação social e o júri escolheu, na dúzia de trabalhos entrados, o trabalho que tem o título ‘É como se a Mãe descesse à terra’ – muito bom do ângulo da imagem (joga muito bem com a imagem, a fotografia, o texto e a música) – que nos situa “no universo da religiosidade popular” e com “a questão mariana”. É a grande reportagem da TVI, de Catarina Canelas, em cuja equipa trabalham João Franco, Tiago Donato, Rodrigo Cortegiano e João Pedro Ferreira. Também o prémio foi atribuído ao Diário do Minho em forma honorífica pelo seu centenário.
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Em suma, uma entrevista a reler por quem se preocupe com a Igreja e com a Comunicação.
2019.06.12 – Louro de Carvalho

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