quinta-feira, 21 de julho de 2016

A invenção do futebol

Embora não haja certeza absoluta sobre os primórdios do futebol, os historiadores descobriram vestígios dos jogos de bola em várias culturas antigas. Estes ainda não eram o “futebol”, pois não havia regras como hoje, porém, demonstram o interesse do homem por este tipo de desporto desde a Antiguidade. O futebol tornou-se tão popular graças ao seu modo simples de jogar que basta uma bola, equipas de jogadores e traves, para que, em qualquer espaço, crianças e adultos se possam divertir com o futebol. Na rua, na escola, no clube, no campinho do bairro ou mesmo no quintal da casa, desde cedo jovens de vários cantos do mundo começam a praticar o futebol.
Não foram os ingleses quem inventou o futebol. O que eles fizeram, quando criaram a primeira associação de clubes no século XIX, foi a organização sistemática e a invenção de regras aceites comummente para um desporto praticado desde a Antiguidade em variantes diversas. Na China e no Japão, por exemplo, jogava-se algo parecido havia mais de 3 mil anos, muito antes de os ingleses reivindicarem a sua invenção. Os gregos antigos também batiam uma bolinha com os pés, assim como os romanos da época do Império.
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O mais remoto ancestral do futebol moderno no Oriente talvez seja o tsu chu (à letra, pontapear a bola), jogado na China pelo menos desde o século III a.C. Começou por ser um exercício que integrava o treinamento militar, mas tornou-se tão popular que até a realeza o apreciava. Alguns registos históricos referem que, na dinastia Han, o imperador Wudi (156 a.C. – 87 a.C.) ordenou a mudança de todos os melhores jogadores para a capital do Império – para que ele pudesse assistir a jogos de alto nível.
Cerca de 500 ou 600 depois, em território japonês, surgiria a prática desportiva bastante semilar do futebol atual. Era o kemari, jogo disputado num campo redondo. Há indícios de que, em algum momento da história antiga, um grupo de jogadores desse desporto fora à China para um desafio contra praticantes de tsu chu. De certo modo, esse poderá ser considerado o primeiro jogo internacional de sempre. Fica, pois, assegurado que o futebol é um fenómeno de audiência desde os seus primórdios.
No Ocidente, a forma mais primitiva de futebol conhecida é o episkyros (sobre as mãos) ou epikoinos (comum), praticado na Grécia a partir de 800 a.C., que não ficou tão popular como a maioria das modalidades “olímpicas” da época, como o lançamento de disco ou a corrida, mas tinha os seus admiradores. Alguns séculos mais tarde, em 146 a.C., os romanos invadiram a Grécia, aprenderam o jogo, fizeram algumas adaptações e criaram o harpastum (bola de jogar). Neste desporto, tal como no episkyros, podiam usar-se as mãos além dos pés – o que o aproxima bastante do râguebi atual. Todavia, foi provavelmente pelos pés de soldados do Império Romano, que o futebol (“pediludium”, jogo com os pés) chegou à Inglaterra, nos primeiros anos da era cristã. Porém, certos historiadores do desporto, sobretudo britânicos, sustentam a tese de que a bola rolava nos gramados da Ilha antes de chegarem os conquistadores romanos.
Não obstante, há quem sustente, anteriormente ao tsu chu, o aparecimento do marngrook (jogo de bola) entre os povos aborígenes da Austrália Ocidental. Os jogadores tinham de evita que a bola tocasse no solo.
Veja-se um pouco mais detalhadamente como era cada uma das modalidades referidas, embora com as vicissitudes e alterações surgidas ao longo do tempo.
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O TSU CHU surge na China antiga seguramente no século III a. C., embora haja registos do século V a. C. Os militares praticavam-no como jogo que era, na verdade, um treino militar. Após as guerras, formavam-se equipas para chutar a cabeça dos soldados inimigos. Com o tempo, as cabeças inimigas foram substituídas por bolas de couro revestidas de cabelo. Eram duas equipas com 8 jogadores cada uma, e o objetivo era passar a bola de pé em pé sem a deixar cair no chão, levando-a para entre duas estacas fincadas no campo e ligadas por um fio de cera.
Mais tarde, a bola, passou a ser feita de couro e preenchida com pelos de animais (ou penas) e tinha de ser chutada num golo (baliza) – um buraco feito num pano ano de seda pendurado entre duas estacas de bambu separadas por 30 ou 40 centímetros e com até 9 metros de altura. Nesse jogo, não era permitido usar as mãos. Numa das suas modalidades, o atacante tinha literalmente de lutar com a defesa adversária para chegar lá. O jogo teve o seu auge durante a dinastia Song (anos 60-1279) e ficou no esquecimento durante o período Ming (1368-1644).
O KEMARI foi criado no Japão Antigo, a partir do tsu chu, como um desporto muito parecido com o futebol atual. Praticado por integrantes da corte do imperador japonês, começou por desenvolver-se num campo redondo (o “kikutsubbo”) de 200 metros quadrados, aproximadamente, passando depois a disputar-se num quadrado com árvores nos cantos. A bola era feita de fibras de bambu e entre as regras, o contacto físico era proibido entre os 16 jogadores (8 para cada equipa). Era o sistema do jogo de dar toques. Tinham os jogadores de manter a bola no ar o máximo de tempo possível fazendo-a ressaltar nas árvores. Um árbitro atribuía pontos extra para toques particularmente elaborados. Não havia gol. Historiadores do futebol encontraram relatos que confirmam a ocorrência de jogos entre equipas chinesas e japonesas na antiguidade.
É no século II que o kemari é mais incrementado. O objetivo dos boleiros (de 2 a 12) era manter uma bola no ar o maior tempo possível, usando os pés ou qualquer outra parte do corpo que não fosse as mãos. A pelota era de couro de veado, em geral, preenchida com grãos de cevada.
O EPISKYROS surgiu na Grécia antiga, como se viu, no Século VIII a. C. Neste jogo, praticado sobretudo por militares, podiam usar-se as mãos além dos pés. O campo era retangular, parecido com o do futebol moderno. E o número de jogadores podia ser de 9 ou 12 de cada lado (neste caso, próximo do número no futebol atual). A bola não passava de um saco de couro de cervo com 20 centímetros, cheio de serragem.
Na cidade grega de Esparta, os jogadores, também militares, usavam uma bola feita de bexiga de boi cheia de areia ou terra. Os campos onde se realizavam as partidas espartanas eram bem grandes, pois as equipas eram formadas por quinze jogadores.
Quando os romanos dominaram a Grécia, entraram em contacto com a cultura grega e acabaram por assimilar o Episkyros, porém o jogo, denominado de harpastum, tomou uma feição muito mais violenta.
O HARPASTUM era praticado no Império Romano a partir do século I. Tal como como o chinês tsu chu, era usado como exercício para os soldados. Os jogadores podiam usar as mãos – sinal de que esse jogo é um ancestral tanto do futebol como do râguebi. Disputado num campo retangular, o objetivo era chegar à linha de fundo adversária para marcar um ponto.
O Futebol na Idade Média. Há relatos dum desporto muito parecido com o futebol, embora usasse muito a violência. O Soule ou Harpastum era praticado na Idade Média por militares que se dividiam em duas equipas: atacantes e defensores. Era permitido usar socos, pontapés, rasteiras e outros golpes violentos. Há relatos que mostram a morte de alguns jogadores durante a partida. Cada equipa era formada por 27 jogadores, onde grupos tinham funções diferentes no time: corredores, dianteiros, sacadores e guarda-redes.
Na Itália Medieval apareceu um jogo denominado gioco del cálcio (jogo de coice, pontapé, chuto). Era praticado em praças e os 27 jogadores de cada equipa deveriam levar a bola até aos dois postes que ficavam nos dois cantos extremos da praça. A violência era muito comum, pois os participantes levavam para o campo os seus problemas causados sobretudo por questões sociais típicas da época medieval. O barulho, a desorganização e a violência eram tão grandes que o rei Eduardo II (o jogo era também já praticado na Inglaterra) promulgou, em 1314, uma lei a proibir a prática do jogo (perdurou até 1667), condenando a prisão os praticantes. Porém, o jogo não terminou, pois os nobres criaram uma nova versão com regras que não permitiam a violência. Nesta versão, cerca de 12 juízes deveriam fazer cumprir as regras do jogo. O rei Henrique VIII (1491-1547) largou 4 xelins por umas botas de futebol em couro (hoje +100 libras).
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Pesquisadores concluíram que o gioco de calcio saiu da Itália e chegou em barda à Inglaterra pelo século XVII. Aqui, ganhou regras diferentes e foi organizado e sistematizado. O campo devia medir 120 por 180 metros e nas duas pontas seriam instalados 2 arcos retangulares chamados de gol ou baliza. A bola era de couro e enchida com ar. Com regras claras e objetivas, o futebol começou a ser praticado por estudantes e filhos da nobreza, mas foi-se popularizando. No ano de 1848, numa conferência em Cambridge, estabeleceu-se um único código de regras de futebol, mas foi em 1857 que se criou, como clube amador, o clube mais velho do mundo, o Shefield FC, e foi em 1863 que se criou a Associação de Futebol de Inglaterra, que induziu a profissionalização da modalidade. Em 1871, surgiu a figura do guarda-redes (goleiro), o único que podia colocar as mãos na bola e devia ficar próximo do gol para evitar a entrada da bola. Em 1875, foi estabelecida a regra do tempo de 90 minutos e, em 1891, foi estabelecido o penálti para punir a falta dentro da área. Somente em 1907 foi estabelecida a regra do impedimento.
O profissionalismo no futebol (segundo a noção atual de profissionalismo) foi iniciado apenas em 1885 e, no ano seguinte, foi criada, na Inglaterra, a International Board, cujo objetivo principal era estabelecer e mudar as regras do futebol quando necessário. Em 1897, uma equipa de futebol inglesa, a Corinthians, fez uma excursão fora da Europa, contribuindo para difundir o futebol em diversas partes do mundo. E, em 1888, foi fundada a Football League com o objetivo de organizar torneios e campeonatos internacionais.
No ano de 1904, foi criada a FIFA (Fédération Internationale de Footeball Association) que organiza o futebol em todo mundo. É a FIFA que organiza os grandes campeonatos de seleções (Campeonato do Mundo) de 4 em 4 anos. Em 2014, aconteceu o Campeonato Mundo no Brasil (lá designado como copa do mundo) cujo vencedor foi a Alemanha. E, em 1954, foi criada a UEFA (União das Associações Europeias de Futebol), filiada na FIFA, que representa as federações nacionais da Europa, organiza 9 competições entre nações e 4 entre clubes do continente.  
Enfim, um desporto tão antigo e tão novo!

2016.07.20 – Louro de Carvalho

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