Recentemente, o CaixaBank catalão, que detém 44,1% do
capital do BPI, lançou uma OPA (oferta pública de aquisição) sobre o banco, ou
seja quer deter a o controlo da instituição.
Aquele grupo já comprou cinco
bancos desde 2010 – Caixa Girona, Bankpyme, Banca Cívica, Banco de Valência e
Barclays em Espanha. O jornal espanhol El País refere que o BPI perdera 161
milhões de euros em 2014 e vale 1520 milhões em Bolsa.
Mas, para que a OPA fosse viável,
era necessário que a Santoro (o
segundo maior acionista),
que detém 18,6% do capital do mesmo BPI, concordasse com a desblindagem dos
estatutos, pois, de momento, nenhum acionista, qualquer que seja o volume da
sua participação, dispõe de mais de 20% dos votos para uma tomada de decisão
negocial.
Pronunciando-se sobre a OPA,
Isabel dos Santos (filha do Presidente da República Popular
de Angola), que
detém o controlo da Santoro e o da Sonangol (acionista
maioritário do BCP),
encontra um negócio alternativo, que julga mais vantajoso para Portugal (?!).
Sendo
assim, Isabel dos Santos, não pensa abrir mão do BPI para o ceder aos
espanhóis. Pretende, antes, fundir o Banco Português de Investimento (BPI),
liderado por Fernando Ulrich, com o Banco Comercial Português (BCP), o maior
banco privado português, liderado por Nuno Amado, para vir a criar o maior
banco português – com posições em Angola, Moçambique e Polónia e uma estrutura
de geração de valor para os acionistas – superando o banco do Estado, a Caixa
Geral de Depósitos (CGD).
Não é a primeira vez que a fusão entre BPI e BCP surge como cenário. A
primeira foi em 2006, quando o BCP lançou uma OPA sobre o Banco Português de
Investimento. Nove anos depois está sobre a mesa uma nova proposta para fundir
as duas instituições. A rejeição da possibilidade de apoio aos espanhóis do
Caixabank na OPA lançada sobre o BPI coloca o grupo catalão num impasse,
podendo precipitar a queda da operação. Por seu turno, os espanhóis já tinham
feito saber que só apoiariam o BPI na aquisição do Novo Banco se a sua OPA
tivesse sucesso. Também o sério candidato à compra do Novo Banco pode perder as
esperanças em relação a esta aquisição enquanto se mantiver o atual estado de
coisas.
Fonte oficial da empresária angolana garante estar, com esta proposta, a “devolver
o sentimento da ambição ao sistema financeiro português”, no pressuposto de que
propor uma fusão “potencia muito mais valor para as instituições em causa e
para a economia portuguesa”. Afinal, os zeladores do nosso bem-estar coletivo
não são apenas os chineses – é bom que Portas e Costa o aprendam e façam um
discurso de elogio aos angolanos, dizendo que o país está bastante diferente de
2011! A seguir, virão altas figuras do PSD a declarar apoio improvável a Portas
e a Costa.
Isabel dos Santos é ainda mais explícita ao argumentar que, enquanto a
OPA anunciada pelo grupo catalão “pressupõe uma integração ibérica, legítima à
luz dos interesses de quem a faz, mas afastada dos interesses do sistema
financeiro português, a nossa proposta de fusão projeta um movimento de
consolidação em Portugal”. É óbvio que estas são tiradas de inegável pendor
político, para fazer valer, à vista de todos, as convenientes tomadas de
posição financeiras e alcançar objetivos económicos privados.
***
Isabel dos Santos escreveu, no
passado dia 2 de março, uma carta ao BCP e ao BPI, tendo-a também enviado ao
presidente do Caixabank. O BPI divulgou-a no dia seguinte por imposição da
Comissão do Mercado dos Valores Mobiliários (CMVM). Nela se refere que a
Santoro manteve nos últimos dias contactos “ainda preliminares” com vários
acionistas do BCP, e com a gestão de Nuno Amado, concluindo pela existência de
abertura para iniciar o processo de negociação com vista à fusão. Na sequência
da divulgação da missiva, a Comissão Executiva do BCP veio manifestar
disponibilidade, se houver “interesse” do BPI, “para analisar a referida
operação”. E refere que falou só depois de ter recebido luz verde dos seus
principais acionistas, sendo o mais relevante a petrolífera angolana Sonangol,
que detém cerca de 20% do capital do BCP, fundado por Jardim Gonçalves.
Apesar dos seus objetivos e do
eventual mérito maior que o da OPA, a fusão também é passível de objeções, por
não salvaguardar” a independência da gestão, que fica “integrada numa estrutura
internacional”, ao passo que o atual modelo acionista do BPI tem o “mérito” de
ser “diferenciado”, “alinhado e coeso” e permitir manter “a independência da
gestão a longo prazo”. Por outro lado, a fusão implicará o encerramento de
agências e o despedimento de trabalhadores – o que parece ser de somenos, já
que o desígnio empresarial se concretiza mesmo à custa das expectativas das pessoas
e famílias e com o emagrecimento dos serviços. É o capital, a reestruturação,
os jogos de poder!
BCP
e BPI são dois bancos que têm a principal força da sua atividade no território
português, mas o estrangeiro tem sido também uma aposta de ambos. O primeiro
gere uma importante operação na Polónia, enquanto o segundo tem em Angola a sua
mais importante presença em termos externos.
Enquanto,
no ano passado, o BPI regressou a um cenário de prejuízos (161
milhões de euros, essencialmente devidos a custos e perdas não recorrentes), o BCP melhorou de forma
significativa o seu resultado negativo, para 218 milhões de euros (740
em 2013).
Os
dois bancos reúnem, em conjunto, um volume de depósitos de cerca de 78 mil
milhões de euros, contra os 71 mil milhões que a CGD contabiliza. Do lado do
crédito concedido, o novo banco, resultante da fusão do BCP e BPI, teria cerca
de 75 mil milhões de euros, face aos 67 mil milhões emprestados pelo banco do
Estado.
Hoje,
4 de março, o conselho de administração do BPI, presidido pelo fundador Artur
Santos Silva, debateu a OPA do CaixaBank. São os dois principais acionistas do
BPI (CaixaBank e Santoro) a baterem-se pelo capital. A administração, que está
dividida sobre a fusão, adiou para amanhã a decisão final. Mas, pelo menos,
parece unânime na contestação do preço pelo qual os espanhóis se propõem
comprar o BPI. Os 1,239 euros oferecidos por ação (a
média dos últimos seis meses)
representam o valor mínimo obrigatório no contexto de uma operação de mercado.
***
Voltando à carta de Isabel dos
Santos, vejam-se os objetivos que ela define para a fusão dos dois bancos e
para a potencial candidatura à compra do Novo Banco (o
bom), resultante da
divisão do Banco Espírito Santo (Novo Banco e BES):
- Criar o maior banco privado
português com sede em Portugal e posições de referência em Angola, Moçambique e
Polónia;
- Conseguir ter gestão
profissional, portuguesa e independente dos acionistas;
- Obter um núcleo acionista
forte, coeso e diversificado; e
- Reforçar a capacidade de
intervenção no suporte às relações empresariais e negócios das empresas
portuguesas.
***
Acredita-se que a participação da
empresária angolana no BPI não terá sido “apenas financeira” e que a sua
posição no setor financeiro português é “estratégica”. Porém, não é crível que
Isabel sobreponha os interesses de Portugal aos de Angola e sobretudo aos seus.
De resto, o dilema permanece: um
grupo económico e financeiro de reduzida dimensão não tem pernas para andar; e
um grupo muito grande, por mais estratégico, político ou filantrópico que se
autodenomine, busca em primeiro lugar os interesses imediatos dos gestores de
topo e, a prazo, os dos acionistas.
Dá jeito agora a um capital sem
rosto e sem nacionalidade acoitar-se em Portugal, país da permissividade e onde
a justiça é lenta, ineficaz e desigual – o país das pontes para toda a parte,
ainda com remorso da colonização!
Patriotismo, ética e democracia
económica têm sido vertentes que mais se têm visto na política e no desenho
financeiro, não é? Veja-se como eles ficaram anediados! Onde param os homens e
mulheres que serviram Portugal governando? Que é dos swaps, PPP, reformas
chorudas, estágios políticos em grandes empresas? Que é feito das filantropias
económicas do BCP, BPP, BPN, também da nossa CGD e sobretudo agora do BES/GES?
O jogo na banca e da banca é mais
vergonhoso que o do Terreiro do Paço e ainda mais explorador, não?
Como não sou Presidente da
República, não sugiro o sobressalto democrático de 12 de março, mas proponho a
todos e cada um a pertinente tomada de consciência crítica que traga reais
consequências.
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