João Melchior Bosco nasceu em 16
de agosto de 1815, em Becchi, perto de Castelnuovo, na diocese de Turim, e
faleceu em 31 de janeiro de 1888, na cidade de Turim. Nascido
do segundo casamento de Francesco Bosco com Margherita Occhiena, tinha uma família ainda composta pelo irmão
do primeiro casamento do pai, António, e do seu irmão germano mais velho, José.
Sofreu muitas privações nos primeiros anos. Órfão de pai, quando
tinha apenas dois anos de idade, teve uma infância marcada pela pobreza da
família, num contexto da difícil situação económica porque passava o norte da
Itália. Fez a primeira comunhão em 1826 e, em
1828, começou a estudar, passando aos dezasseis anos a frequentar a escola de
Castelnuovo D'Asti. Em 30 de outubro de 1835, quando completou vinte anos,
ingressou no Seminário de Chieri, vindo a ser ordenado sacerdote em 5 de junho de 1841, pelo
bispo Luigi Fransoni, após
o que se transferiu para Turim.
Foi em Turim que sentiu que Deus o chamava a consagrar
a sua vida aos jovens pobres e abandonados, a quem devia ajudar a tornarem-se
cidadãos honestos e bons cristãos, por meio da promoção humana e da educação da
fé. A revolução industrial na Itália levou para as grandes
cidades um grande contingente de jovens sem família. Desde 1809, em Milão, a
igreja católica mantinha um tipo de obra assistencial para jovens denominada oratório, que se ocupava do seu lazer, educação e
catequese.
O primeiro oratório de Turim foi fundado em 1841, pelo padre
Giovanni Cochi. Influenciado por
essa iniciativa, Bosco funda, em 8 de dezembro de 1841, um oratório em Turim,
quando atende e ensina o jovem Bartolomeo Garelli na sacristia da Igreja de São
Francisco de Assis. A 8 de dezembro de 1844, o oratório passa a denominar-se Oratório
de São Francisco de Sales, constituindo
o embrião da primeira casa Salesiana, e a 12 de abril de 1846 passou a ter sua
sede definitiva numa propriedade de Francisco Pinardi, no bairro turinense de
Valdocco. Tratava-se de jovens que,
arrancados da zona rural pelas dificuldades aí existentes, buscavam trabalho na
cidade grande.
A missão de Dom Bosco em favor da juventude pobre, para
ser duradoura, precisava de pessoas decididas a trabalhar com ele e exigia instituições
que garantissem a continuidade do empreendimento. Sob a ação do Espírito Santo –
que lhe deu especial sensibilidade para captar, mediante várias experiências, o
abandono e os perigos em que se achavam os jovens de seu tempo – o grande
apóstolo compreendeu logo que essa pesada tarefa só poderia apoiar-se em homens
que se consagrassem inteiramente à obra. E o mesmo Espírito fez desabrochar no
coração dos primeiros discípulos o chamamento à consagração total na vida
religiosa.
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Politicamente,
o cenário do Piemonte e de toda a Itália era de caráter revolucionário, com
inúmeros conflitos entre um Estado em formação e a Igreja Católica, durante
todo o período do Risorgimento. Os biógrafos
de Dom Bosco anotam a sua grande amizade com políticos como Camilo de Cavour e
Humberto Ratazzi, e outras pessoas influentes como a Marquesa Barolo, bem como
a amizade direta com os papas Pio IX e Leão XIII. Localmente, o arcebispo de
Turim que ordenou o padre João Bosco, esteve no exílio e preso, tendo recusado
os últimos sacramentos ao ministro Santa Rosa, pelo que foi repreendido pelo
Rei Vítor Emanuel. O seu sucessor, Dom Lorenzo Gastaldi, teve uma longa disputa
com João Bosco, que resultou num processo canónico. A paz entre ambos só se fez
por decisão de Leão XIII. As relações com políticos italianos e com papas, de
forma muito direta, teriam dado a João Bosco uma posição política que parecia,
sobretudo ao bispo Gastaldi, ameaçar a ordem hierárquica eclesiástica.
Porém, João Bosco, que fora camponês, estudante e aprendiz de vários ofícios, era agora um padre e educador,
pelo que
pensava sobretudo em organizar uma associação religiosa. Só que o contexto
político da unificação da Itália, marcado pela disputa pela separação entre Estado
e Igreja, não estimulava a criação de uma ordem religiosa nos moldes
tradicionais. Por isso, o ministro Umberto Ratazzi sugeriu-lhe a organização de
uma sociedade de cidadãos que se dedicasse às atividades educativas realizadas
pelos oratórios em moldes civis. Bosco propõe, em 1854, a Sociedade de São Francisco de Sales, que seria vista como uma
associação de cidadãos aos olhos do Estado e como uma associação religiosa perante
a Igreja. Após consulta ao Papa Pio IX, Bosco recebeu dos seus companheiros
padres, seminaristas e leigos a adesão à Sociedade de São Francisco de Sales (a congregação salesiana) em 18 de dezembro de 1859 e, em 14 de março de 1862, os
primeiros salesianos (padres e irmãos fraternalmente iguais) fizeram os votos
religiosos de pobreza voluntária, obediência inteira e castidade perpétua. A
partir de 1863, além dos oratórios, os salesianos passam a dedicar-se também
aos colégios e escolas católicas para meninos e jovens. Com a separação entre
Estado e Igreja, passou a haver forte demanda por escolas católicas, fazendo
com que esse tipo de instituições se disseminasse rapidamente. As regras da
Sociedade, chamadas Constituições,
foram aprovadas pela autoridade da Igreja em 1874. À morte do fundador, em 1888, a
Sociedade contava com 768 membros, com 26 casas fundadas nas Américas e 38 na Europa.
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Por volta de 1872, na convicção de que era vontade de
Deus que se ocupasse também das meninas, fundou em Mornese (Itália), com Maria Domingas Mazzarello, o Instituto
das Filhas de Maria Auxiliadora, o das irmãs salesianas.
Dom Bosco tinha ainda a certeza de que o maior número
possível de cristãos devia unir forças para o bem do próximo, sobretudo dos
jovens pobres. Percebeu então que a Congregação Salesiana devia ser como que o
fermento animador de um vasto movimento de fraternidade em que homens e
mulheres participassem da sua missão e espírito, cada um segundo o próprio
estado de vida. Nasceu assim a Associação dos Cooperadores Salesianos,
terceira instituição que se valeria do carisma de Dom Bosco. É um movimento com
25.000 leigos que, com espírito salesiano, se comprometem nas atividades
pastorais das comunidades eclesiais locais.
Por seu turno, as Voluntárias de Dom Bosco são uma
instituição secular, criada em consonância com a constituição Provida Mater Ecclesia, de Pio XII, em 1947.
Compõe-se de mulheres que professam os votos religiosos (pobreza voluntária, obediência inteira e castidade perpétua), mas permanecem com seus familiares ou a sós e, a
par de uma atividade prisional, se entregam às mais diversas atividades
pastorais, conforme as necessidades das igrejas locais.
Mas o mestre da juventude dirigiu também a sua atenção
para os adultos da classe popular, especialmente dos camponeses, nos quais ele
via uma classe altamente desfavorecida, sem meios de se promover humana e
cristãmente. E o seu amor ao próximo estendeu-se aos povos que viviam nas periferias,
em regiões pagãs, aos quais, mais tarde, enviou os salesianos como
missionários. Escreveu
o mestre ainda vários opúsculos de cultura religiosa.
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No atinente à educação, deve referir-se que “a
educação é permanente”. Educa-se ao longo da vida toda e por meio da própria
vida, de tal modo que o movimento dos ex-alunos visa manter os jovens unidos aos
seus educadores pela amizade, como Dom Bosco idealizara. Por outro lado, o
termo “família” é continuamente empregado na tradição salesiana para indicar a
unidade de ideal e os laços de fraternidade que se estabelecem entre os
salesianos, as salesianas, os cooperadores e as voluntárias. Pertencem também à
Família Salesiana, em sentido amplo, os alunos, os ex-alunos, bem como outras
pessoas que, de diversos modos, se interessam pela obra salesiana. O órgão
oficial da Família Salesiana é o Boletim
Salesiano, publicação bimestral, composto e impresso nas Escolas
Profissionais Salesianas (SP).
Dom Bosco deixou como herança aos salesianos o sistema preventivo, um método educativo
que, afastando a repressão pelos castigos corporais, se baseia inteiramente na
razão, na religião e na bondade. É o método do Evangelho vivido na alegria e no
serviço. Os educadores devem estar sempre fraternalmente presentes no meio dos
jovens, em seus grupos e atividades.
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Mas a obra mais caraterística de Dom Bosco é o Oratório Festivo, que funciona onde há
comunidades salesianas. Os oratórios festivos, renovados segundo as exigências
de tempo e de lugar, têm o escopo de entreter adolescentes e jovens
particularmente aos domingos e feriados através do desporto, da música, do teatro,
do cinema, das excursões e de vários outros divertimentos, proporcionando-lhes também
a ocasião de participarem em reuniões catequéticas e celebrações eucarísticas. Propiciam-lhes,
ao mesmo tempo, uma significativa experiência de vida comunitária.
A fim de concretizarem hoje a sua missão, os salesianos
desenvolvem a sua atividade em torno de três eixos fundamentais: a opção pelos
jovens e pelos pobres; a atividade catequética; e a pastoral missionária.
A opção pelos pobres concretiza-se no trabalho
educativo pastoral em benefício dos jovens mais pobres e das classes populares,
sobretudo no ensino profissional. A atividade catequética insere-se em toda a atividade
educativa nas escolas, paróquias, escolas, infantários, estabelecimentos de educação
pré-escolar, oratórios, casas de acolhimento de meninos de rua... Já a pastoral
missionária específica Ad gentes desenvolve-se
nas Missões em vários países da Ásia, África e América.
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Tendo participado no dinamismo do
período do Risorgimento e
entabulado relação com os seus atores principais, Dom Bosco acabou por
participar indiretamente na resolução do último aspeto que aquele movimento
deixou em aberto para o século XX: a
Questão Romana. O momento da beatificação de Dom Bosco, em 1929, coincide
com a Concordata de São João de Latrão, celebrada entre Benito Mussolini e
o Cardeal Pietro Gasparri, com a anuência e aprovação superior do Papa Pio XI.
A coincidência configura em si uma expressão de nacionalismo italiano, com
Mussolini, que estudara um ano no colégio salesiano de Faenza, a elogiar Dom
Bosco, e com Pio XI, a pôr fim ao poder temporal da Igreja, permitindo a unificação
da Itália e o encontro em Mussolini de um “homem da Providência”. Já na
canonização de Dom Bosco, em 1934, o contexto era totalmente outro. Descontente
com os fatídicos rumos totalitários do fascismo e do nazismo, Pio XI escrevia
duas encíclicas, uma em alemão e outra em italiano, condenando ambas as
ideologias.
O uso político da popularidade e
italianidade de Dom Bosco e dos salesianos é recorrente na República Italiana.
Em 2005, o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi, de visita ao
Instituto Salesiano Santo Ambrósio, em Milão, de que fora aluno, recordou que
aprendera com Dom Bosco que “é preciso estar de acordo com todos”.
A memória litúrgica de São João Bosco
passa a 31 de janeiro, com missa e ofício próprios. Foi São João Paulo II que o
aclamou com toda a propriedade “Pai e Mestre da Juventude”.
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