segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Plano Estratégico para as Migrações (2015-2020)

Entra hoje, dia 26 de janeiro, em discussão pública, por dez dias úteis, o Plano Estratégico para as Migrações (2015-2020), abreviadamente denominado PEM, que tem uma vertente de incentivo e apoio ao empreendedorismo, capaz de atrair quem emigrou. Por outro lado, faz a gestão da atribuição / distribuição de verbas comunitárias que financiam medidas para emigrantes, imigrantes e “novos portugueses”.
O PEM consta de anexo a um projeto de resolução do Conselho de Ministros, cujo conteúdo vem articulado com outros programas de inclusão, como o Programa Escolhas, já em desenvolvimento e, depois de entrar em vigor, será sustentado pelo “financiamento comunitário 2014-2020, sem onerar de forma acrescida o orçamento nacional”.
O documento em discussão pública estará disponível no portal na Internet do governo.
Partindo da evolução do fluxo migratório português – forte surto emigratório nas décadas de 60 e de 70, do século passado, numerosa entrada de imigrantes na década de noventa do mesmo século, naturalização de muitos descendentes de imigrantes no início do século XXI e abandono do país por muitos nos últimos quatro anos, sob a troika – o Governo entendeu lançar um programa abrangente e polifacetado.
Andreia Sanches, em peça jornalística específica no Público de hoje, salienta que deverão ser aprovadas, até ao final deste ano, as regras e os procedimentos de atribuição de “vistos-talento”, para estudantes, investigadores, artistas e outros migrantes talentosos que efetivamente possam ser especialmente úteis ao país. Afirma, ainda, que esta é uma das 102 medidas do PEM, já antes avançada pelo Governo, vindo agora a estabelecer-se um prazo para a sua concretização.
A novidade que o aludido projeto de resolução, que pode ser consultado desde já no portal do governo, é a inclusão de um programa de “Empreendedorismo para Emigrantes”, a lançar também este ano, ou seja, o Governo vai também “apoiar a criação de empresas por nacionais não residentes em território nacional”. Porém, ao contrário do que acontece em relação a outras medidas deste PEM, que vêm devidamente quantificadas e calendarizadas, não se compromete com metas sobre quantas empresas a criar. No entanto explicita:
“Dispondo Portugal de uma vasta e muito qualificada diáspora, hoje enriquecida por novos perfis migratórios de jovens que têm procurado outros destinos, estará aí a primeira fonte de migrantes que nos interessa enquanto nação captar.”

Com este programa, o governo pretende: a atração de cidadãos portugueses muito qualificados; “a promoção de políticas de apoio à reintegração de emigrantes economicamente vulneráveis, não residentes em território nacional há mais de um ano” (um dos compromissos não quantificado é “apoiar despesas de deslocação e estabelecimento em território nacional”); e a “capacitação dos imigrantes empreendedores”, com programas de incentivo à criação do próprio emprego.
O PEM (2015-2020)” – note-se que a nota de “estratégico” é fundamental – é concebido e preparado num país “em défice demográfico” e a enfrentar “uma emergência social, económica e política nacional”.  Por isso, o Governo, tendo em conta que também outros países tradicionalmente sujeitos a significativos fluxos de imigração e de emigração têm procurado gradualmente articular e integrar as políticas migratórias, quer as relativas às entradas, quer as relativas às saídas, internalizando uma visão integrada do fenómeno imigratório e emigratório, quis – quiçá demasiado tarde – agir de forma similar, tomando em consideração a especificidade da nossa realidade. Assim, reconhecendo que as migrações têm um impacto positivo na sociedade em muitas e diferentes dimensões, Portugal posiciona-se hoje perante cinco desafios particularmente decisivos, que convocam as migrações e a que urge responder:
(i) o combate transversal ao défice demográfico e o equilíbrio do saldo migratório; (ii) a consolidação da integração e capacitação das comunidades imigrantes residentes em Portugal, respeitando e aprofundando a tradição humanista de Portugal; (iii) a inclusão dos novos portugueses, em razão da aquisição de nacionalidade ou da descendência de imigrantes; (iv) a resposta à mobilidade internacional, através da internacionalização da economia portuguesa, na perspetiva da captação de migrantes e da promoção das migrações como o incentivo ao crescimento económico; e (v) o acompanhamento da nova emigração portuguesa, através do reforço dos laços de vínculo e da criação de incentivos para o regresso e reintegração de cidadãos nacionais emigrados.

A estratégia do programa pauta-se pelo aprimoramento da absoluta garantia da dignidade da pessoa humana e da promoção da igualdade entre homens e mulheres, em estreita articulação com as políticas públicas de segurança interna e com as políticas para a emigração.
Além da aprovação do PEM, o projeto de Resolução do Conselho de Ministros, contempla, designadamente: a criação da Rede de Pontos Focais de Acompanhamento do PEM, constituída por dois representantes de cada um dos ministérios, um efetivo e um suplente, para o seu acompanhamento e execução; a elaboração de um relatório anual de execução do PEM pelo Alto Comissariado para as Migrações, I.P. (ACM, I.P.) a apresentar ao Conselho para as Migrações; e a determinação de que a assunção de compromissos para a execução das medidas do PEM, incluindo os inerentes à ação das suas estruturas de operacionalização, depende de fundos disponíveis por parte das entidades públicas competentes.
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As 102 medidas inscritas no PEM atingem as várias áreas e com as diversas especificações. De acordo com o exemplo apresentado por Andreia Sanches, no capítulo “Políticas de coordenação dos fluxos migratórios”, diz-se que, até ao final do ano, o país deverá dispor de “um plano de contingência” que permita a disponibilização de meios e a cabal resposta humanitária perante eventuais “afluxos maciços de imigrantes”.
Por outro lado, a coerência do PEM na resposta aos desafios acima enunciados leva a integrar as mencionadas medidas em cinco eixos políticos prioritários:
i) Eixo I – Políticas de integração de imigrantes, cujos objetivos visam a consolidação da atividade de integração, capacitação e combate à discriminação dos imigrantes e grupos étnicos na sociedade portuguesa (combate a todas as formas de racismo e xenofobia), tendo em vista uma melhor mobilização do seu talento e competências, a valorização da diversidade cultural, o reforço da mobilidade social, da descentralização das políticas de integração e uma melhor articulação com a política de emprego e o acesso a uma cidadania comum.
ii) Eixo II – Políticas de promoção da inclusão dos novos portugueses, cujos objetivos perspetivam o reforço de medidas de promoção da integração e inclusão dos novos portugueses (em articulação com o Programa Escolhas, já em desenvolvimento), nomeadamente dos descendentes de imigrantes e de todos aqueles que, entretanto, acederam à nacionalidade portuguesa, através de ações nos domínios da educação, formação profissional, transição para o mercado de trabalho, participação cívica e política, inclusão digital, empreendedorismo e capacitação.
iii) Eixo III – Políticas de coordenação dos fluxos migratórios, cujos objetivos dizem respeito à valorização e promoção internacional de Portugal enquanto destino de migrações, através de ações nacionais e internacionais de identificação, captação e fixação de migrantes, contribuindo para uma gestão mais adequada e inteligente dos fluxos migratórios e para o reforço da atração e circulação de talento e capital humano.
iv) Eixo IV – Políticas de reforço da legalidade migratória e da qualidade dos serviços migratórios, cujos objetivos se prendem com o reforço da capacidade de intervenção transversal na execução da política migratória, através do aprofundamento da rede de parcerias com entidades públicas e privadas, do enquadramento e acompanhamento dos potenciais migrantes, do recurso a ferramentas eletrónicas, da flexibilização dos procedimentos de entrada e da afirmação de uma cultura reforçada de qualidade e de boas práticas na prestação dos serviços migratórios.
v) Eixo V – Políticas de incentivo, acompanhamento e apoio ao regresso dos cidadãos nacionais emigrantes, cujos objetivos visam ações e programas, em coordenação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, que promovam, acompanhem e apoiem o regresso de cidadãos nacionais emigrados ou o reforço dos seus laços de vínculo a Portugal, contribuindo por essa via para a reversão do movimento emigratório de cidadãos portugueses.
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Vai outrossim proceder-se à criação de um “novo portal com potencialidades ao nível da gestão dos serviços migratórios, de forma desmaterializada”, para concretizar o “Simplex Migrante”, bem como ao estabelecimento de uma nova plataforma online, que permita que em qualquer parte do mundo se possa formular um pedido de visto.
Também vem especificamente mencionada no documento a agilização dos procedimentos de inscrição dos estudantes internacionais nos estabelecimentos de ensino superior e dos procedimentos de reagrupamento familiar – sendo, neste último caso, o público-alvo referido o que tem Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI), ou seja, os detentores dos chamados vistos dourados (os ditos vistos Gold), mas também outros, como professores e investigadores estrangeiros.
A estratégia traçada passa ainda por mudar, ainda este ano, o quadro legislativo referente às punições de atos discriminatórios em função da nacionalidade ou origem étnica e, em todo o tempo, intensificar o combate à utilização ilegal de mão-de-obra (nomeadamente o trabalho não declarado) e ao tráfico de seres humanos, bem como promover a melhoria das condições do trabalho. E, no atinente à Educação e Cultura, pretende-se “promover o ensino da língua portuguesa aos migrantes, crianças e adultos”, com o envolvimento das escolas, do Instituto de Emprego, entre outras entidades, e “valorizar talentos desconhecidos, provenientes de bairros desfavorecidos”.
Por fim, no capítulo do “Apoio à transição dos descendentes para o mercado de trabalho” prevê-se a concretização de “medidas de fomento da responsabilidade social das empresas, no sentido de acolher em estágio e/ou emprego jovens descendentes qualificados”. E, para apoiar “a criação de soluções de empreendedorismo económico e social pelos descendentes de imigrantes” haverá um concurso anual de ideias para jovens.
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Oxalá que o PEM passe efetivamente do papel e não sirva de aproveitamentos indevidos!

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