sábado, 13 de dezembro de 2014

As novas tecnologias na educação

Já passaram uns dias em que não me refiro à educação, pelo menos de modo explícito. Porém, agora que se avizinha o términus do 1.º período escolar (a 16) e a 1.ª parte da PACC (prova de avaliação de conhecimentos e capacidades) dos docentes (a 19), é tempo de abordar alguns aspetos relacionados com as aprendizagens em ambiente escolar e similares. Por outro lado, tive conhecimento, pelo site da Associação Rumos, do Brasil, a que acedo regularmente, de que, em São Paulo, a UNESCO, a Fundação Santillana e a BBC Brasil promoveram um grande seminário para discussão dum tema recorrente em matéria educativa, “Tecnologias para a transformação da educação: experiências de sucesso e expectativas”.
Também em Portugal, não se conhece projeto educativo, projeto curricular ou qualquer outro documento relevante de escola, do ministério da Educação e Ciência, de academia ou de editora, que não releve, por vezes, de forma acrítica e quase ao nível de endeusamento, o domínio e a utilização das novas TIC (tecnologias de informação e comunicação), a ponto de o professor mais avançado em idade e em tempo de serviço se considerar resignadamente ou o considerarem um autoinfoexcluído.
O documento (de 70 páginas) saído daquele debate, ao mesmo tempo que acentua a importância da tecnologia na vida dos jovens do mundo inteiro, mormente no âmbito do ensino-aprendizagem, alerta para os nefastos efeitos colaterais que será necessário ultrapassar – o que tem suscitado grandes discussões no meio educacional e académico.
A grande questão pragmática gira em torno do modo como transformar os investimentos (muitas vezes altos) em tecnologia em ideias que de facto melhorem o desempenho e aprendizagens dos alunos.
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Embora em tese, as novas TIC constituam uma poderosa mais-valia educativa, todavia, muitos ainda não encontraram correlação direta entre o seu uso e a melhoria dos resultados escolares.
No entanto, há estudiosos que entendem que se a Internet, os tablets, os computadores, os aplicativos e outras plataformas forem usadas para estimular a imaginação e o espírito de pesquisa dos alunos e amparar o trabalho do professor, com objetivos claros e de forma moderada, podem ter impactos positivos não só nas classificações, mas também no desenvolvimento de habilidades e no empenhamento dos estudantes.
Assim, é de exigir que a utilização das tecnologias seja, para garantia de êxito, acompanhada de reformas doutra ordem, como: currículo (escolar), avaliação e desenvolvimento profissional dos docentes – o que em Portugal fica ao critério do pundonor dos educadores e professores.
Com base no debate e na opinião de especialistas, vertidos no referido documento, a BBC Brasil enunciou “dez tendências da tecnologia da educação” ou dez tendências conexas com o uso das novas (tecnologias de informação e comunicação) TIC em contexto de aula e ambientes similares de aula (como ações de formação em empresas) e experiências de uso na prática. Seguimos a síntese elaborada por Paula Adamo Idoeta da BBC Brasil, com os ajustes adequados ao conhecimento da realidade portuguesa. Nestes termos, é necessário e conveniente:
1- Acrescentar valor ao trabalho do professor em vez de o substituir ou mecanizar. É tentador o docente ou quem tem funções similares proceder à construção ou aquisição de materiais didáticos (pequenos textos, esquemas, imagens, powerpoints, CD, Internet) e em sala de aula ou de formação fazer a exibição, precedida de uma nota introdutória e acompanhada de um ou outro considerando. A ação ficará circunscrita a uma aula expositiva com contornos de inovação, mas que fica bem distante de um momento de interatividade. Não se ultrapassa o objetivo da memorização, embora com menos tempo do que se o aluno escutasse a explicação oral, tomasse notas e estudasse pelo manual. O professor como que fica substituído ou mecanizado pelas novas TIC. Tal utilização de meios dificilmente melhora resultados.
Segundo Francesc Pedró, representante da UNESCO para educação, em primeiro lugar, será conveniente levar os professores a que se interroguem sobre o tipo de problemas e dificuldades que enfrentam e pensem como as tecnologias os podem ajudar a ultrapassá-los”. Daí, o professor passa de transmissor de conhecimento a mediador – orientando os alunos com instruções, feedback, contexto, exemplos e questões-chave no quadro de cada projeto e identificando o dispositivo tecnológico mais adequado a cada momento (ainda que tenha eventualmente de ser o papel, o lápis e a borracha – sobretudo quando os outros meios falharem). Não adianta, pois, usar as novas TIC apenas por usar: se não se definirem objetivos claros e não se fizer articulação com o currículo escolar, pouco valor se adiciona às metodologias tradicionais.
2- Melhorar processos, sem precisar de os mudar radicalmente. As tecnologias não têm de descaraterizar as aulas: devem servir de auxiliares de professores e alunos para trabalho de conteúdos mais abstratos e facilitar as aprendizagens. As novas TIC podem ajudar os alunos na visualização de gráficos matemáticos, experimentações científicas, imagens, esquemas, fórmulas; no tratamento de dados; no cálculo; na digitalização, duplicação e análise de textos e documentos.
A síntese evocada revela que “um estudo com 125 estudantes das 7.ª e 8.ª séries na Colômbia concluiu que recursos tecnológicos nesse tipo de atividade aumentou em 81% a capacidade dos estudantes em interpretar e utilizar gráficos.
3- Os tablets ganham o espaço de laptops e desktops. O tablet tende a ganhar terreno pelo facto de ser portátil e mais barato. O citado documento da Unesco prevê que o tablet individual seja adquirido pelos pais ou emprestado pelos poderes públicos, como uma tendência de médio prazo na educação.
O já citado Pedró, representante da UNESCO, afirma que os desktops e laptops continuarão úteis para trabalhos escritos e para equipar alunos carentes que não tenham acesso à tecnologia do tablet. E, em Portugal, os governos de Sócrates fomentaram a distribuição gratuita dos pequenos computadores “Magalhães” a crianças dos primeiros anos de escolaridade e a aquisição em condições bastante acessíveis de computador portátil e Internet a professores, alunos e formandos. Mas existe a tendência de os governos aproveitarem mais os equipamentos móveis já possuídos pelos próprios estudantes (smartphones e tablets) e focarem os seus investimentos em aplicativos e redes potentes.
4- Pensar na Internet além dos sites de buscas e das redes sociais. Os professores notam que as tarefas tradicionais são muitas vezes resolvidas pelos alunos com buscas pouco criteriosas na Internet e pelo velho “CtrlC+CtrlV” (os comandos de computador de copiar e colar).
O projeto GLOBE (www.globe.gov) conecta mais de 4 mil escolas do mundo com cientistas. Os alunos recolhem dados ambientais das suas regiões e enviam-nos a especialistas, que ajudam na sua análise e sugerem soluções para problemas do meio ambiente local. Plataformas como a Padlet (http://padlet.com/features), usadas por alunos da rede pública brasileira, ajudam estudantes e professores a construir projetos online em conjunto. Os alunos criam os seus próprios websites, que estimulam diversas habilidades e a produção de conteúdos próprios.
Em Portugal, muitas escolas elaboram manuais de orientação de pesquisa em Internet e redes sociais e de elaboração e apresentação de trabalhos académicos. Eu próprio elaborei um.
5- Estabelecer conexões com o mundo real. Se as novas TIC facilitarem a conexão da sala de aula com o mundo exterior, terão um papel crucial no ensino. Vejam-se os exemplos:
Estudantes de anos finais do ensino fundamental, nos EUA, criaram o seu próprio anuário escolar digital e um tour virtual dum museu local, para o mostrar aos estudantes mais novos da mesma escola – o que resultou em maior motivação e compromisso dos alunos com os estudos. 55 alunos equipados com computadores simularam durante as aulas, no Equador, a abertura dum restaurante. Usaram softwares como o Excel para controlar os gastos e plataformas para desenvolver um website do projeto, desenhar panfletos, etc. Numa escola da área rural na Colômbia, os alunos receberam tablets para um projeto de proteção da bacia hídrica local e análise de amostras do solo. Com a ajuda de apps educacionais, agarraram a oportunidade de aprender os elementos da tabela periódica.
Iniciativas destas proporcionam oportunidades para exercitar e aplicar competências, em que os estudantes se motivam e se envolvem muito mais no percurso das aprendizagens.
6- Estimular a criação, cooperação e interação. Os estudantes aprendem mais quando usam as novas TIC para criar novos conteúdos por si mesmos em vez de serem meros recetores.
Neste âmbito há boas práticas de turmas e escolas que criam e debatem conjuntamente bases de dados sobre determinados assuntos em plataformas de construção coletiva como o Knowledge Forum (www.knowledgeforum.org). No Chile, na cidade de Puente Alto, alunos do 4.º ano do ensino fundamental participaram num projeto interdisciplinar de línguas e artes, com o escopo de entender e valorizar os povos nativos. Realizaram pesquisas em grupo, criaram uma história sobre um dos povos, gravaram e editaram o seu próprio vídeo do projeto.
Os resultados indicam que a compreensão de conteúdos é maior em ambientes dinâmicos e interativos do que se fossem usados apenas os livros didáticos e cadernos auxiliares.

7- Pensar em novas formas de avaliar os alunos

A produção de novos conteúdos, a utilização de novas metodologias, o manuseamento de novos materiais, tudo isto implica nova formulação e avaliação das aprendizagens. Não é consequente estimular os alunos à utilização de novas TIC, com novos conteúdos e desempenhos e continuar com uma avaliação baseada fundamentalmente em provas escritas ou até acrescentar-lhe de modo postiço a avaliação no domínio das novas TIC, mas como que em regime acessório e não em função do real valor acrescentado pelo uso eficiente e eficaz dessas tecnologias.
É, pois, necessário propor tarefas que estimulem a relação com o conteúdo e a reflexão, lançando desafios maiores aos alunos que estão equipados com mais e melhores tecnologias. Não podem as escolas olvidar a sua responsabilidade de desenvolver e avaliar as habilidades digitais dos alunos. Apesar de usarem os seus apetrechos digitais o dia inteiro, os alunos orientam-nos para as tarefas que mais lhes interessam, não necessariamente para o seu desenvolvimento intelectual – o que leva a uma limitação das aprendizagens.
Países como o Chile e Portugal já fazem avaliações do grau de competência digital dos seus estudantes, mas não em total coerência com as possibilidades que ela poderia proporcionar. 
8- Usar jogos que estimulem e facilitem as aprendizagens. Se bem usados, os videojogos podem exigir do aluno análise de situações, concentração e conhecimentos das matérias estudadas, ao mesmo tempo em tornam as aprendizagens mais vivenciais e divertidas. É a relevância do aspeto lúdico da didática
Manoel Dantas, diretor-geral da Clickideia – provedora de conteúdo educacional para escolas públicas e privadas, com sede em Campinas (SP) – afiança a importância dos jogos no diálogo com a realidade e história locais. A empresa desenvolveu, com alunos do Rio Grande do Norte, um jogo interativo que aborda um massacre ocorrido na invasão holandesa no Estado, em 1645. E, no Peru, alguns alunos participaram na construção dum jogo em 3D baseado num episódio da independência (a rebelião de Cusco, de 1814), que foi usado como complemento de aulas e melhorou o rendimento da turma.
Todos reconhecem a relevância, nas aprendizagens, dos filmes, dos livros em Banda desenhada, dos postais, das canções, dos diapositivos, dos powerpoints animados, etc. Porém, importa advertir que a componente lúdica não pode deixar de mobilizar a componente do incómodo e do esforço nas aprendizagens, sem o que estas se tornarão excessivamente reduzidas.
9- A customização e personalização geram vantagens pedagógicas. Algumas plataformas online permitem a personalização dos conteúdos pelas diversas regiões (por exemplo, atividades ligadas à história e ao costume regionais e locais) e até mesmo por cada aluno, de acordo com os seus pontos fortes e fracos. Trata-se dum ensino adaptativo, “que desenha um perfil do aluno e identifica a forma como ele melhor aprende”, refere Dantas, da Clickideia, já citado.
Também o software brasileiro Geekie constitui outra plataforma que usa este método e, ao interagir com o estudante, percebe as suas aptidões e dificuldades e giza-lhe um plano de estudos apropriado.
10- A chave da eficiência e do sucesso é o planeamento. O uso das novas TIC será mais eficaz se for não aleatório, mas planeado, com objetivos claros.
O Banco Interamericano de Desenvolvimento, em estudo de julho passado sobre eficiência da tecnologia na educação, sugere: objetivos de aprendizagem específicos, em áreas básicas, como matemática e idiomas, ou em habilidades, como pensamento crítico e colaboração; coordenação de componentes-chave: infraestrutura tecnológica, conteúdo e recursos humanos; estratégia de avaliação e monitorização de projetos, com cumprimento de etapas e noção do impacto que ele pretende criar; e garantia de que a iniciativa não seja isolada, mas parte dum plano sustentável ao longo do tempo na escola ou na rede de ensino.
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Depois, em educação como na vida quotidiana, importa que as novas TIC não sejam absorventes, despersonalizantes ou ensimesmadoras dos indivíduos, cujos patrões familiares e amigos não permitem horas, dias fins de semana de descanso nem férias tranquilas.

Enfim, pela humanização e rendibilização das novas TIC!

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