terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Submarinos, caças, patrulhadores oceânicos e outros…

Os submarinos adquiridos pelo nosso país à Alemanha fizeram correr muita tinta, não tanto pelo negócio em si, mas sobretudo por motivos ligados o que foi designado por “contrapartidas”.
As questões ligadas às contrapartidas geraram processos judiciais na Alemanha, de que resultaram condenações, o que em Portugal não acontece, muito embora o nome de alguns atores públicos tenha ficado chamuscado na praça pública, os quais parecem resistir aos sucessivos apelos a que a investigação e a Justiça funcionem adrede. A perceção que o cidadão comum tem dos processos judiciários é que efetivamente nem todos são efetivamente iguais e, segundo diversas vozes, até o complexo dos operadores da Justiça não fica imune ao agendamento político e ao espetáculo.
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Porém, sobre o negócio dos submarinos a massa crítica também beliscou o arco da governança pela superfluidade da aquisição de submarinos por uma de duas razões, consoante o posicionamento face à necessidade e utilidade das forças armadas ou face a redução do país às suas dimensões europeias, quer a nível continental quer a nível insular.
Quanto à necessidade e utilidade das forças armadas, é preciso clarificar que ela decorre da noção de Estado e das exigências que o ser Estado comporta, como se até 1415 o reino de Portugal não houvesse travado batalhas e desenvolvido guerras e algumas bem duras.
Se o Estado se define como comunidade com sólida e coesa organização interna e com uma postura decente perante as comunidades congéneres, se é formado por pessoas em que se distinguem os governados dos governantes e se ocupa um território – é óbvio que tem de cuidar da segurança interna, da ordem pública e da investigação criminal, dando azo a que a justiça possa funcionar. Mas também é natural que o Estado esteja organizado de modo a preservar a imunidade das pessoas e do território contra o eventual agressor externo ou contra as adversidades resultantes de catástrofes naturais ou provocadas (está neste segundo caso a praga incendiária e mo terrorismo) e participar nas ações desenvolvidas pelas organizações internacionais que integre. E, embora a paz deva ser objeto de educação na família, na escola, nas Igrejas, nos grupos, associações, clubes, sociedades e empresas, não deixa de ser pertinente o aforismo romano, si vis pacem para bellum (se queres a paz, prepara a guerra). E a melhor forma de se preparar para a guerra será a organização da defesa e a pugnação pela segurança e pelo desenvolvimento sustentável, integral e harmonioso. Se os homens se devem armar com a cabeça e o coração (como propunha o general Pinto Ferreira, comandante geral da GNR em março de 1975) nem por isso é sensato alinhar por pacifismos utópicos.
É certo que a defesa não se circunscreve à componente militar (têm enorme importância as componentes educativa, industrial, comunicacional, ocupacional, etc.), mas aquela não deixa de ser uma componente fundamental. Pequeno ou grande, o Estado tem de cuidar da sua defesa e da segurança das pessoas e dos bens, a menos que se estribe na sua índole simbólica e de autoridade moral consensualmente reconhecidas (caso da Santa Sé) ou na sua exiguidade voluntariamente assumida e simpaticamente aceite (por exemplo, os principados do Mónaco, de Andorra e de Liechtenstein). Depois, se o Estado tem uma côngrua atividade diplomática, terá eventualmente de saber disponibilizar os seus meios de defesa para a prestação solidária com outros Estados e no cumprimento da política de alianças.
Também é por todos reconhecida a necessidade de colocar as forças armadas, a nível multinacional, a colaborar em ações humanitárias e da promoção e manutenção da paz.
Com o fim da guerra colonial e a descolonização que se lhe seguiu, o povo que apoiou, elogiou as nossas forcas armadas que deram azo à era democrática – talvez pelo excesso de oficiais e sargentos que sobreviveram na instituição militar a seguir ao fim do Império ou pelos excessos revolucionários de alguns – deixou aninhar um certo desdém pelas forças armadas, invocando a sua não necessidade e não utilidade pelo facto de o país ser de diminuta dimensão e por não haver necessidade de aguentar uma forças armadas maximalistas em tempo de paz. E o poder político de um país pequeno preparou a opinião pública para o efeito e, a seu tempo, decretou a extinção do serviço militar obrigatório, ficando a “defesa militar” entregue a voluntários – e mesmo alguns quartéis passaram a ser guardados por seguranças civis. E as forças armadas, que regressaram a quartéis em 1982, acabaram por ser reduzidas à sua expressão mais simples e o desinvestimento nelas tornou-se pouco mais que residual. O próprio político que hoje se intitula constitucionalmente de comandante supremo das forças armadas, quando ocupava o cargo de chefe do governo fez aprovar a chamada lei dos coronéis, que incentivou a passagem à reforma de muitos dos oficiais superiores. Apesar do veto político que o então Presidente Mário Soares lançou sobre ela, a lei foi confirmada no Parlamento e Mário Soares teve de a promulgar. Como alguns se recordam, alguns militares na reforma formam reconvidados a trabalhar nos serviços do Ministério da Defesa Nacional porque os civis lá colocados não davam conta do recado, já que o número dos reformados militares foi maior do que aquele que era expectável.
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Ora bem: com a entrada na CEE, ora União Europeia, a fronteira marítima portuguesa representa uma das mais consideráveis fronteiras da União, o que implica um esforço comum de defesa do território europeu, por este lado, para lá da defesa do território nacional. Por outro lado, Portugal integra a NATO, a qual precisa de ter no país dispositivo bastante de defesa e segurança; e faz parte integrante da ONU, pelo que deve encarregar-se das missões que o executivo da organização lhe confiar. Mas Portugal, por motivos históricos e por razões de afeto lusófono, é o país que diz querer ajudar, ao menos em termos de formação, os países de expressão portuguesa em África e na Ásia (Timor-Leste). E ainda, segundo Brandão Ferreira, tenente-coronel piloto-aviador (vd O Diabo de hoje, dia 16), temos o projeto de alargamento da Plataforma Continental Portuguesa, que, “a ser decidido favoravelmente pela ONU, constituiria o ganho geopolítico mais significativo desde 1543, pico da expansão portuguesa com a nossa chegada ao Japão”.
Enquanto o referido militar alerta para o facto de a decisão em favor de Portugal não ser o jogo de favas contadas, pelo que o seu texto constitui uma forte interpelação ao Ministro da Defesa Nacional, o programa “Prós e Contras” da RTP1, de ontem, dava o alargamento da Plataforma Continental Portuguesa como um dado adquirido. Até se considerava a Região Autónoma dos Açores, que de região de fronteira de Portugal e da União Europeia (o cabo da Roca não será mais o ponto mais ocidental da Europa, mas apenas o ponto mais ocidental da Europa Continental, porque a zona mais ocidental da Europa é a ilha mais ocidental do arquipélago dos Açores) passará a ter uma centralidade atlântica, vindo a abandonar a sua tão propalada condição periférica.
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Há uns anos a esta parte, eu pensava que o facto de Portugal ter uma fronteira marítima extensa tornava imperioso cuidar racionalmente da sua defesa e segurança (aliás, distinguir em demasia defesa e segurança não é bom augúrio de cura das pessoas e do território). Se calhar, adquirir submarinos, caça bombardeiros, patrulhadores oceânicos e outros meios de vigilância e defesa das águas territoriais portuguesas e do luso continente será mesmo necessário. E, em vez de se fazer uma oposição à aquisição de meios de defesa e segurança, deveria pensar-se antes na forma de promover, manter e reforçar a suficiência de meios.
Mas eu também pensava – e continuo a pensar – que, provavelmente, dado que Portugal integra a UE e a NATO, assim como lhe são confiadas missões humanitárias e de promoção e manutenção paz, deveríamos motivar os outros países membros das organizações que o país integra a contribuir com os meios adequados para a defesa e segurança do território que a História nos confiou. Se integramos a UE e a NATO, estas deveriam, por sua vez, contribuir para a consecução de meios de defesa e segurança, também daqui deste lado do Atlântico. E o país, em vez de mandar emigrar os portugueses para qualquer lado, deveria promover a ocupação do território terrestre e marítimo por portugueses e por parceiros de outros países que possam cooperar na segurança do Velho Continente do lado ocidental e do Atlântico cujo centro norte parece ser o arquipélago dos Açores em ligação com as Canárias e Cabo Verde. Não se defende o país esvaziando-o de pessoas e outros recursos. Tive o ensejo de bradar publicamente, em 28 de novembro de 1993 em terras do Interior, perante o então Secretário de Estado da Defesa Nacional, que “território que não tenha pessoas nem está defendido nem em segurança”. Mais afirmei que as pessoas para proverem à defesa e segurança do território que ocupam devem ter uma formação sólida; e essa formação começa na escola.
E, se a diplomacia portuguesa conseguir lograr que a vizinha Espanha, parceira histórica de Portugal na partilha do mundo, modere as suas tentações hegemónicas nesta área regional, o homem português terá de assumir o protagonismo que a geografia e a geoestratégia lhe impõem.

E, se o discurso miserabilista der lugar à efetiva concretização do desígnio de universalidade que o português herdou dos seus egrégios avós para poder desempenhar o seu papel construtivo neste erário cosmo-geográfico ao serviço do homem e da paz rumo a um futuro de progresso, paz, coesão e solidariedade?!

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