quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Histórico restabelecimento de relações diplomáticas e comerciais (?)

Vinte e cinco anos depois da queda do muro de Berlim, cai o “segundo muro”, o que opunha diplomática e comercialmente a relação Cuba/Estados Unidos. Interpretando a vontade maioritária das populações americana, cubana e hispano-americana, o Presidente Barack Obama bradou que “todos somos americanos”, à semelhança de Helmut Khol, que, em coerência com o seu labor pelo fortalecimento do projeto de união europeia, apostou na realidade de que só havia uma Alemanha.
Também agora o presidente norte-americano, mesmo com a ira do Congresso, decidiu fazer o que pode: promover a libertação mútua de presos cubanos nos EUA e de presos norte-americanos em Cuba e levar a cabo a nomeação recíproca de embaixadores. A seguir, a decisão política do Congresso há de viabilizar as relações comerciais, pondo-se fim ao embargo diplomático e económico vigente desde 1961 (mais de meio século). O próprio presidente cubano Raul Castro elogiou a simpatia da iniciativa do presidente Obama e não se esqueceu de salientar a vontade do povo cubano.
Em 1989, a opinião pública mundial e, em especial, a opinião pública europeia ficaram moduladas pelos reflexos das lutas do sindicato polaco “Solidariedade”, pelas intuições reformistas de Gorbatchev consignadas tanto no campo político, representadas pelo projeto Glasnost, como no campo económico, através da Perestroica, e pela força anímica do Papa João Paulo II – o que levou ao desabar do império soviético e ao fim guerra fria, embora com os riscos hoje por demais conhecidos e sentidos. Agora, o descalabro mundial do sistema financeiro, de efeitos ainda não previsíveis de todo, o pulular dos conflitos regionais e o amadurecimento de algumas democracias latino-americanas lançaram o ceticismo, para não dizer o descrédito, sobre o capitalismo internacional (gerador do fosso cada vez maior entre os poucos muitíssimo ricos e os muitíssimos muitíssimo pobres, com uma classe média, de permeio, em crise sistémica e pandémica) e sobre o capitalismo de Estado (inoperante ou assimilável economicamente ao capitalismo liberalista. Veja-se o caso da China com a compra da EDP). Ademais, trata-se do fortalecimento do continente americano e da unidade atlântica.
Depois das contundentes críticas de Bento XVI à economia de mercado absoluta e ao presidencialismo político-económico de alguns países, como o caso de Angola, surge a figura simpática e contundente do Papa argentino. E, sim, depois dum considerável tempo em que representantes das duas partes entabularam negociações e até se encontraram no Vaticano, surgiu a decisão histórica tomada pelos governos dos Estados Unidos da América e de Cuba de estabelecerem relações diplomáticas, com o escopo de britar, em prol dos cidadãos dos dois países, as dificuldades que marcaram esta sua história mais que semissecular.
A própria Santa Sé declarou a verdade da sua intervenção diplomática, através dos seus especialistas na matéria, nas negociações entre os dois países com vista ao encontro de “soluções aceitáveis para ambas as partes”.
Assim, um comunicado da Secretaria de Estado do Vaticano informou que o Papa Francisco, nesta quarta-feira, dia 17, “saúda vivamente” e “expressa os seus parabéns” pela “histórica decisão” dos dois países de restabelecerem relações diplomáticas “pelo interesse dos respetivos cidadãos”, superando as “dificuldades que marcaram a sua história recente”. O mesmo documento revela que o Pontífice escrevera a Raul de Castro e a Barack Obama, “convidando-os a resolver questões humanitárias de interesse comum, como a situação de alguns detidos, para dar início a uma nova fase das relações entre as partes”. Foi também verdade que a Santa Sé acolheu, em outubro próximo passado, no Vaticano, delegações dos dois países, disponibilizando os seus bons ofícios para facilitar e agilizar “o diálogo construtivo sobre temas delicados”. Trata-se de um encontro de que resultaram “soluções satisfatórias para ambas as partes”.
A Santa Sé revela garante que se mantém no propósito de “continuar a apoiar as iniciativas” que os Estados Unidos da América e Cuba levem a cabo para promover e assegurar “as suas relações bilaterais e favorecer o bem-estar dos respetivos cidadãos”.
O Presidente cubano, do seu lado do seu lado, que falou aos meios de comunicação ao mesmo tempo que o Presidente dos EUA discursava na Casa Branca, afirmou, na sua intervenção, ter falado com Barack Obama por telefone na terça-feira, dia 16. Raul Castro teceu, pois, rasgados encómios ao papel do Papa Francisco e do Vaticano, que acolheram o encontro conclusivo de 18 meses de conversações desenvolvidas e mantidas em absoluto segredo.
Não há dúvida de que, segundo a Casa Branca, a permuta, ou melhor o regresso de prisioneiros à sua nação, marcou uma “mudança histórica” nas relações diplomáticas e económicas entre as duas nações, que passa ainda, para já, pela minoração das sanções económicas impostas unilateralmente pelos Estados Unidos da América – o dito embargo. 
Segundo declarou em conferência de imprensa o presidente norte-americano, Barack Obama, o Vaticano e o próprio Papa Francisco intervieram diretamente neste processo, solicitando às duas partes que restabelecessem o diálogo e promovessem as mudanças necessárias.
“Sua Santidade, o Papa Francisco, dirigiu-me um apelo pessoal, bem como ao presidente de Cuba, Raul Castro, pedindo-nos que resolvêssemos o caso de Alan [Gross, preso há cinco anos em Cuba] e que tivéssemos em consideração os interesses de Cuba na libertação de três agentes cubanos que estão presos nos Estados Unidos há mais de 15 anos”, revelou Obama.
De acordo com as informações avançadas pela CNN, a libertação de Alan Gross, de 65 anos, por motivos “humanitários” pressupõe também a libertação por parte dos EUA dos três agentes cubanos, Gerardo Hernandez, Luis Medina e Antonio Guerrero. Os outros dois “heróis”, como são conhecidos em Cuba, já foram libertados depois de terem cumprido a sua pena.
Gross foi detido em dezembro de 2009 e condenado a 15 anos de prisão por importar tecnologia proibida para a ilha e tentar estabelecer um serviço de Internet para os judeus cubanos.
Os cinco cubanos foram detidos por espiar os grupos de exilados na Florida, sendo considerados heróis na ilha. Gerardo Hernandez foi condenado ainda por conspiração no abate de dois aviões civis norte-americanos, em 1996, que faziam voos não autorizados no espaço aéreo cubano, tendo morrido quatro cubano-americanos.
Além destas pessoas, Cuba libertou ainda um responsável dos serviços secretos norte-americanos, preso há vários anos.
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Na referida conferência de imprensa, Barack Obama adverte os que se opõem ao fim do embargo a Cuba de que não faz qualquer sentido continuar a fazer a mesma coisa durante cinco décadas esperando resultados diferentes.
O Presidente Obama começou a aludida conferência na Casa Branca anunciando: “Hoje os EUA vão mudar a sua relação com o povo de Cuba”, declarando que se trata da mudança mais significativa nas políticas entre os dois países em mais de 50 anos. Ademais, informou que secretário de Estado John Kerry vai entabular de imediato diálogo com Cuba para restabelecer as relações entre os dois países e que os Estados Unidos vão voltar a ter a embaixada em Havana.
Quanto ao embargo que os EUA mantêm a Cuba desde há 53 nos, Obama não acredita que este, embora “bem intencionado”, tenha cumprido o seu propósito. Porém, o Presidente evidencia a sua perplexidade já que, para levantar o embargo, precisará do apoio do poder legislativo, nomeadamente do Congresso, que neste momento é controlado pelos Republicanos, a força política oposta ao Presidente.
Por outro lado, Barack Obama acredita e espera que uma presença americana mais forte potenciará uma transformação profunda na sociedade cubana, uma vez que, segundo as suas palavras, o país aprendeu, com uma dureza inigualável, que “uma transformação duradoura num país é mais provável se o povo não for sujeito a caos”.
Por isso, além de a conferência de imprensa ter constituído uma boa ocasião para o Presidente agradecer ao Papa Francisco pela sua mediação no processo de libertação de Alan Gross da prisão cubana, ela estriba-se em duas ideias fundamentais ou pressupostos: todos, EUA e Cuba, são americanos; e os EUA podem ajudar cubanos a “entrar no século XXI”.
Assim, em relação ao segundo pressuposto, os Estados Unidos vão trabalhar ainda para aumentar o fluxo de viagens e de imigração entre os dois países, visto que, acentua Barack Obama, “ninguém representa melhor os valores americanos do que os seus cidadãos”, na crença e na esperança de que o intercâmbio cultural possa promover mudanças na sociedade cubana. Por seu turno, as trocas financeiras também vão aumentar, dado que os EUA farão subir o limite de transferências monetárias para Cuba, medida possível a partir da utilização dos fundos respeitantes às transferências com fins de caridade.
Na ótica do Presidente, era a prisão do americano Alan Gross que o impedia de avançar com estas alterações, que vinham sendo planeadas há vários anos. Com a sua libertação, o país pode trabalhar para mudar a natureza da sua relação conturbada com Cuba.
Se bem que os dois países vão discordar frequentemente tanto no atinente à política externa como no atinente à política interna, o presidente dos EUA assume-o, esclarecendo: “Quando discordarmos, expressaremos as nossas diferenças diretamente”. E tem uma forte e firme convicção: “Podemos ajudar o povo cubano a ajudar-se a si próprio à medida que entra no século XXI”.
Já quanto ao primeiro pressuposto, “Todos somos americanos”, Barack Obama, ao agradecer ao Papa, também o inclui, por via da Argentina, naquela asserção. E, mesmo com a perceção assumida de que a mudança será difícil, estabelece o enunciado histórico de que “hoje a América escolhe largar as amarras do passado, pelo povo cubano, pelo povo americano”.
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Oxalá que a irreversibilidade deste gesto histórico logre um lugar ao sol na História para a gesta de Raul, Barack e Francisco.

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