quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

No dia de São Dâmaso

Hoje, 11 de dezembro, a Igreja Católica celebra a memória litúrgica de São Dâmaso, Papa.
Dâmaso nasceu pelo ano 305 na Península Hispânica, ao que se sabe provavelmente em território que hoje pertence ao nosso país. Integrou o clero de Roma, e foi eleito Bispo da Igreja de Roma ou Papa, no ano 366, em tempos muito difíceis. Teve de reunir frequentes sínodos contra os cismáticos e hereges e foi um grande promotor do culto dos Mártires, cujos sepulcros adornou com versos seus. Morreu no ano 384.
Quem lhe situa o nascimento em Guimarães é André de Resende, que no seu Breviário de Évora, de 1548, afirma que “... B. Damasus ... patria Vimaranensis ex Bracarensi Provincia”.
A verdade é que Dâmaso aparece ainda criança em Roma, onde o pai era Secretário do diácono São Lourenço, um dos sete diáconos da Igreja de Roma, martirizado durante a perseguição do Imperador Valeriano, que decorreu no ano 258. A sua vida até ser eleito Papa é muito resumida afirmando-se unicamente que era dotado de grande cultura e santidade.
Foi eleito Papa em 1 de Outubro de 366, por larga maioria, mas alguns seguidores do anterior Papa Libério, próximos do arianismo, elegeram o diácono Ursino, criando um Antipapa para tentar depor Dâmaso I. Mas acabou por o bom senso vir ao de cima e o pontificado de Dâmaso sobreviveu com denodo e fulgor.
Este pontífice compôs diversos textos para a liturgia, um tratado e poesia, tendo adquirido um poder eclesiástico e temporal sem precedência, num contexto de oficialidade do cristianismo como religião do Império, por decreto do Imperador Teodósio, de origem hispânica.
São Jerónimo, que foi secretário de Dâmaso, caraterizou-o como um “homem puro”.
São Dâmaso foi sepultado numa igreja na Via Ardeatina, tendo os seus restos sido trasladados posteriormente para a igreja de San Lorenzo in Damaso ou São Lourenço Fora dos Muros, que é uma igreja em Roma, imediatamente no exterior da muralha da cidade. Talvez o facto se deva à sua especial devoção por São Lourenço de quem o pai fora secretário.
A cidade de Guimarães honra o seu nome com uma igreja e uma alameda.
A edificação da igreja principiou na primeira metade do século XVII e terminou apenas no século seguinte. A sua capela-mor possui um notável retábulo em talha dourada, obra do entalhador vimaranense Pedro Coelho e o teto é de caixotões. A nave é igualmente decorada com retábulos em estilo português de finais do século XVII e princípios do século XVIII. A talha combina admiravelmente com os azulejos historiados que decoram os interiores. Executados durante a primeira metade do século XVIII, são atribuídos ao monogramista PMP e contam episódios da vida do Papa S. Dâmaso.
Já a alameda foi requalificada no âmbito da eleição da cidade de Guimarães como capital europeia da cultura 2012. A intervenção foi considerada pela comunidade como uma das requalificações mais bem conseguidas. A nova Alameda de São Dâmaso, também conhecida agora como “bosque urbano”, tornou-se famosa pela sua carismática iluminação noturna incentivando atividades familiares, passeios, espetáculos, entre outros. 
No Vaticano, o Pátio de São Dâmaso está ligado à entrada principal do Vaticano pela segunda escadaria de estado e com os aposentos papais no 3.º andar pela terceira escadaria de estado, a “Scala Nobile”.
É em torno do Pátio de São Dâmaso que fica a porção habitacional do Palácio Apostólico. Guarda Suíça, Gendarmeria, Câmara Pontifícia, Secretariado e outros departamentos de menor importância – residem todos perto uns dos outros. E é neste pátio que prestam juramento os novos elementos da Guarda Suíça.
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Porém, hoje gostaria de fazer menção, não de Papa nem de Bispo, mas do Padre Dâmaso Lambers. Orientou, no mês de setembro de 1979, o retiro do clero da diocese de Lamego, em que participei como ordinando de presbítero. Numa das efemérides de comemoração do Dia de Portugal, mais propriamente em 2009, foi condecorado com o grau de Grande Oficial da Ordem do Mérito.
De origem holandesa, foi ordenado em 1955 e queria ir para as missões, mais propriamente para uma difícil missão nas Ilhas Cook, na Polinésia, numa zona da Nova Zelândia onde a Congregação dos Sagrados Corações está presente. Mas o superior provincial, correspondendo a um pedido do cardeal Cerejeira, designou-o, com seu consentimento, para vir pregar missões populares em Lisboa, aonde chegou em princípios de 1957, permanecendo por três meses em seminário de franciscanos, com quem aprendeu Português, nomeadamente com um seminarista António Montes, hoje bispo emérito de Bragança.
Cedo se apercebeu de que as missões populares habituais não davam resultado, “porque as pessoas andavam todas muito atrás de Nossa Senhora”. Então passou a organizar muitas procissões, mas muito curtas, para depois fazer o respetivo sermão.
Com Monsenhor José de Freitas, pároco de Arroios, um padre dos Açores, assistente da LIC feminina, e o padre António Ribeiro, que veio a ser cardeal patriarca, lançou os cursos de cristandade no patriarcado em 1960, sendo o padre Dâmaso o primeiro diretor nacional deste movimento.
Antes, porém, em 1959, recebeu um convite da Direção-Geral das Prisões para fazer umas conferências na cadeia de Tires, após o que passou a outras cadeias.
Depois de uns anos de relutância da parte de Cerejeira, que alegava que Dâmaso tinha qualidades para outras coisas, embora aceitasse que ele fosse visitador voluntário, por interferência do cónego Manuel Falcão, que foi depois bispo de Beja, o cardeal patriarca lá o nomeou, em 1966, para o Estabelecimento Prisional do Linhó.
Dadas a suas viagens pelo país, como diretor dos cursos de cristandade, passou a conhecer a realidade prisional. O Ministro da Justiça Antunes Varela deu-lhe um cartão que lhe permitia a entrada em todas as cadeias, tarefa que não descurava. Mas só em 1982 é que foi nomeado coordenador nacional da assistência religiosa nas cadeias portuguesas, cargo que já vinha exercendo de há uns anos para cá e embora houvesse padres que fizessem algum trabalho pastoral nas cadeias. Todavia, usualmente os presos eram lembrados apenas na Páscoa e no Natal.
Em 1987, cria “O Companheiro”, instituição que tem por escopo o auxílio aos ex-reclusos, porque, como capelão da cadeia da zona prisional da Polícia Judiciária, encontrava rapazes conhecidos de outras cadeias e que se lamentavam de que ninguém os ajudara. Agora assistem a umas sete dezenas de pessoas, que não têm com quem viver.
Nas cadeias, além da missa, aliás pouco frequentada, multiplicam-se os encontros em grupo e a título individual e fala-se de tudo o que possa contribuir para a valorização da pessoa.
Nos anos 90, criou a FIAR (Fraternidade das Instituições de Apoio a Reclusos) e ligou o movimento português ao movimento Prison Fellowship International, que pugna por uma justiça restaurativa em vez da justiça vingativa, ainda predominante entre nós. Para ajudar a inverter essa tendência, entende útil a colaboração de juristas na pastoral presidiária.
Manifesta-se claramente contra a distinção entre voluntariado e assistência religiosa:
Não podemos separar o capelão dos visitadores. Se eu não tivesse os visitadores era muito mais pobre. Num ambiente de uma cadeia, estou a trabalhar com leigos que são para mim indispensáveis. Principalmente, porque há muitas senhoras, com mais de 45 anos, que os reclusos veem nelas uma espécie de mães. – In Voz da Verdade, 5 de julho de 2009.
Entende que a humanização da prisão se faz com amor, amizade, empatia – aceitando, escutando. É preciso abandonar a dicotomia – recluso/visitador – e sentir na pele o sofrimento do outro como sendo nosso.
Acha que a condecoração que recebeu teve o mérito de chamar a atenção para a pastoral prisional, dando ânimo aos grupos de visitadores e sobretudo aos padres, porque – diz – há poucos padres que têm vocação para se dedicar às cadeias.
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 Contudo, este sacerdote é uma voz na Rádio Renascença e declara que “O principal na Renascença é falar de Jesus”. Oxalá que a Administração o ouça!
Tendo, em 1977, sido convidado para falar aos doentes, propôs também um apontamento aos reclusos e sobre os reclusos. Teve pena de que tivesse acabado, mas os programas não têm vida eterna. Fez muitas coisas na RR, mas o principal foi falar de Jesus, de diversas maneiras. Continuou com o “Meditando”, ao final do dia, na Rádio Sim, e o apontamento diário “Caminhos da Vida”, às 2h30 da madrugada, na Renascença.
À pergunta se a rádio é também uma paixão sua, responde:
Sim, mas sabe, eu agradeço a Jesus porque não há nenhum padre – ou talvez muito poucos no mundo – que já tenha, há 33 anos, uma rádio como púlpito. Que grande graça que recebi de Jesus! Eu fico calado quando penso nisto… - cf id et ib.
Que Deus o conserve, mas não calado!
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Como bem se pode perceber, não é necessário ser bispo ou ascender ao Sumo Pontificado para se sentir em Igreja em saída às periferias existenciais, quer até junto das pessoas que andam atrás de Nossa Senhora, quer até às pessoas de coração empedernido, que um retiro ou um curso podem ajudar a voltar para Cristo, quer junto dos doentes, que sofrem ora resignados ora revoltados, quer junto dos reclusos, que alguns consideram o mundo à parte, o dos condenados e vingados. E também na Rádio ou na televisão (vi-o na RTP em dois programas ainda há pouco tempo).

Não é pois, necessário ser o Papa Dâmaso I ou o Papa Francisco (Que o argentino me desculpe!) para trabalhar na causa de Cristo, mas é preciso ter fibra de apóstolo e estar atento a todos e a tudo!

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