sábado, 30 de agosto de 2025

Despesa das famílias e das empresas deu novo impulso ao PIB

 

O Instituto Nacional de Estatística (INE) confirmou a 29 de agosto, que, após a queda de 0,4% do produto interno bruto (PIB), nos primeiros três meses, o segundo trimestre foi de crescimento. Assim, a economia cresceu 0,6% – e 1,9%, comparativamente com o trimestre homólogo – graças ao aumento da procura interna (que inclui os gastos das famílias, das empresas e do Estado); e o crescimento das exportações, a par do aumento menor das importações, levou o contributo da procura externa líquida (diferença entre exportações e importações) a ser menos negativo.

A economia cresceu, efetivamente, 1,9%, no segundo trimestre, mas a taxa de inflação acelera para 2,8%, em agosto. O INE aponta para uma aceleração do Índice de Preços no Consumidor (IPC), refere que a taxa de desemprego baixou, para 5,8%, em julho, e alerta para a possibilidade de aumento de 2,25% das rendas, em 2026.

O primeiro trimestre foi de acentuada contração dos gastos das famílias, de diminuição do investimento e de aumento das importações, para reposição de stocks, em antecipação às tarifas recíprocas de Donald Trump), o que se traduziu na queda em cadeia de 0,4% e de um crescimento homólogo de 1,7%, abaixo do esperado. Deste modo, a nossa economia esteve mais dinâmica nos meses de abril a junho.

Com a balança comercial deficitária em volume, a procura interna tem sido o garante do crescimento económico. O consumo privado, componente da procura interna que corresponde, essencialmente, à despesa das famílias, reforçou o seu papel como dinamizador da economia nacional. As despesas das famílias contribuíram, em de 0,8%, para o crescimento em cadeia (do primeiro para o segundo trimestre) de 0,6%, penalizado pelo contributo negativo de 0,2% da balança comercial. E as despesas de consumo final das famílias, após terem disparado, em cadeia, 2,8%, no fim de 2024, graças ao aumento do rendimento disponível, e após terem recuado 1%, no arranque de 2025, voltaram a crescer, no segundo trimestre, à razão de 0,9%.

O aumento da despesa, em volume, foi mais pronunciado nos bens duradouros e na alimentação, com as famílias a aumentarem o consumo destas categorias, apesar das variações de preço.

O governo, mantendo a previsão de crescimento de 2,4% para este ano, acima das previsões de organismos independentes, como o Banco de Portugal (BdP) e o Conselho das Finanças Públicas (CFP), confia no efeito das tabelas especiais de retenção na fonte que moveram a economia no final de 2024. E, neste ano, terão impacto visível no terceiro e no quarto trimestres.

Por seu turno, o investimento aumentou, em cadeia, 0,8% no segundo trimestre, depois de ter disparado 4,8%, no início do ano, mercê da corrida das empresas à reposição de stocks, o que se repercutiu no aumento das importações.

Pondo de parte este efeito, o investimento, medido em Formação Bruta de Capital Fixo (que abrange as despesas das empresas e do Estado em bens produtivos, como infraestruturas, maquinaria, ou software, cresceu 2,1%, face ao primeiro trimestre, após a queda de 2,1%, no início do ano. O maior aumento deu-se na construção (2,9%) e nos produtos de propriedade intelectual, incluindo a investigação e o desenvolvimento (2,5%).

O investimento na componente de outras máquinas e equipamentos, incluindo sistemas de armamento, recuou 0,2%, face ao primeiro trimestre. Porém, há melhoria, face à queda trimestral de 3,3%, no início de 2025, quando Portugal se comprometeu junto da Organização do Tratado do Atlântico (NATO) com o aumento da despesa pública em defesa a 2% do PIB, já este ano.

Depois do efeito de reposição de stocks nas importações do primeiro trimestre, o segundo foi de abrandamento das compras ao estrangeiro, que cresceram ao ritmo de 0,7%. Por outro lado, as exportações, revertendo a queda do primeiro trimestre, cresceram 0,2% em cadeia, sobretudo, graças às vendas de bens para o estrangeiro, o que deu um contributo menos negativo à taxa de crescimento trimestral. Todavia, as exportações de serviços, incluindo o turismo, diminuíam 1,1%, comparativamente com o início do ano.

Em termos nominais, isto é, o valor total sem descontar o efeito da inflação, o saldo da balança comercial foi positivo, em 836 milhões de euros – uma melhoria, face ao primeiro trimestre.

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O excedente orçamental público mais do que duplicou, em apenas um ano. Administrações Públicas (AP) registam o saldo global de 2327,6 milhões de euros, no período janeiro-julho, mais 147% do que um ano antes.
O saldo orçamental público medido em contabilidade de caixa (ótica dos serviços das Finanças) mais do duplicou, nos primeiros sete meses deste ano, face a igual período de 2024, revelou a Entidade Orçamental (EO), antiga Direção-Geral do Orçamento (DGO).
De acordo com a EO, tutelada pelo ministro das Finanças, no período de janeiro a julho de 2025, “as Administrações Públicas (AP) registaram um saldo global de 2327,6 milhões de euros, o que corresponde a uma melhoria de 1386,7 milhões de euros, face ao evidenciado no período homólogo (em que o saldo global foi de 940,9 milhões de euros)”, por o aumento da receita (7,1%) ter sido superior ao da despesa (5,1%). Assim, para este resultado pesou um aumento da receita de 7,1%, que foi superior ao da despesa (5,1%).
A dilatação do excedente público de 941 para 2,3 mil milhões de euros, num ano, traduz-se num aumento enorme, na ordem dos 147%. Muito mais do que duplicou.
Segundo a EO, o saldo primário, isto é, o excedente total menos a parcela de despesa relativa a juros da dívida, cifrou-se em 6908,8 milhões de euros, mais 1339,9 milhões do que em 2024; “o crescimento de 7,1% na receita das AP decorre da evolução da receita fiscal (6,9%) e contributiva (8,3%), complementada, em menor grau, pela receita não fiscal e não contributiva (5,8%)”; e o aumento da despesa primária (sem contar os juros) foi de 5,6%, “explicado, sobretudo, pelos acréscimos nas despesas com pessoal (8,8%), nas transferências (3,7%) e no investimento (19%)”.
De acordo com a EO, o crescimento da receita fiscal (6,9%) reflete, em grande medida, a execução do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) (14,4%) e do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) (9%) e, a um nível inferior, do imposto municipal de transmissão de imóveis (IMT) (30%), do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP) (12,1%) e do imposto sobre o tabaco (IT) (18,4%), atenuado pela quebra do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) (-9,1%)”.
Já a receita com contribuições para a Segurança Social (SS) também esteve de feição, avançando mais de 9%, no período em análise. “A receita não fiscal e não contributiva cresceu 5,8%, sobretudo, devido aos acréscimos das transferências (12,7%) e dos rendimentos da propriedade (31,2%).”
Do lado da despesa, o crescimento foi ditado, sobretudo, pelo aumento nos gastos com pessoal (8,8%), nas transferências (3,7%) e no investimento público (19%).
Nas despesas com pessoal (8,8%), a variação está associada a um conjunto de medidas de valorização remuneratória dos trabalhadores em funções públicas, de que se destacam “a atualização do valor dos vencimentos, a valorização de carreira específicas, nomeadamente, nas áreas da saúde, [da] educação e [das] forças de segurança, e a atualização da remuneração mínima mensal garantida [salário mínimo]”, explica a EO.
“Quanto às transferências (3,7%), evidenciam-se os encargos com pensões e [com] outros complementos do regime geral da Segurança Social e do regime de proteção social convergente da Caixa Geral de Aposentações [CGA], reflexo das atualizações regular e extraordinária das pensões, bem como com as restantes prestações sociais da Segurança Social, em particular, as destinadas às Instituições sem fins lucrativos, o complemento solidário para idosos [CSI] e as prestações de desemprego.”
Releva também o acréscimo da contribuição para o Orçamento da União Europeia (UE).
E, no atinente ao investimento (19%), é de realçar o subsetor da Administração Local (AL), com investimentos na habitação e noutras construções, assim como os investimentos do setor da Defesa, em particular, a aquisição de aeronaves A-29N Super Tucano e KC-390 e a aquisição de novos navios de patrulha oceânicos.
A receita fiscal do Estado totalizou 35553,6 milhões de euros, até julho, um aumento de 2126,6 milhões de euros, face ao período homólogo, de acordo com a EO.
Já o excedente da Segurança Social subiu para 3214,9 milhões de euros, nos primeiros sete meses do ano, valor superior aos 2712,4 milhões de euros reportados no período homólogo. No entanto, até junho, o excedente estava em 3673,9 milhões de euros, pelo que se verificou um recuo, face ao mês anterior.

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A taxa de inflação aumentou 2,8% em agosto, ficando 0,2% acima da variação de julho, segundo a estimativa provisória divulgada, a 29 de agosto, pelo INE. Porém, esta informação ainda está sujeita a revisão, aponta para uma aceleração do IPC.
Depois de em julho a diferença no índice em relação ao mesmo mês do ano passado ser de 2,64%, a taxa passou para 2,78%, neste mês, como indica o INE na síntese estatística.
O indicador de inflação subjacente – o índice total excluindo os produtos alimentares não transformados e energéticos – registou a variação de 2,5%, face ao valor do índice, em agosto de 2024. Neste caso, a diferença é igual à de julho.
“A variação do índice relativo aos produtos energéticos foi -0,2% (-1,1% em julho) e o índice referente aos produtos alimentares não transformados terá voltado a acelerar para 7,0% (6,1%, no mês anterior)”, detalha o INE.
A variação global do IPC, em relação a julho (em cadeia) foi negativa, com a diferença mensal a ser de -0,2%. A descida foi menor do que a registada de junho para julho, que foi de -0,4%.
Já o Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) português, que permite fazer comparações com outros países europeus, registou a variação homóloga de 2,5%, tendo a diferença ficado num “valor idêntico” ao de julho.
O INE publicará os dados definitivos da inflação de agosto, a 10 de setembro, altura em que se ficará a saber se os valores provisórios agora divulgados são os mesmos ou se sofrem revisão.
Por seu turno, a taxa de desemprego diminuiu, para 5,8% em julho, face ao mesmo mês de 2024 (-0,7%) e ao mês anterior (-0,3%).
De acordo com o INE, a taxa de subutilização do trabalho foi estimada em 10%, valor inferior ao de junho (0,3%), ao de três meses antes (0,5%) e ao do mesmo mês do ano anterior (1,1%).
No mês em análise, a população empregada (5260,4 mil) alcançou o valor mais elevado, desde fevereiro de 1998. Já a população desempregada (323,1 mil) diminuiu em relação aos três períodos de comparação: mês anterior (15,7 mil; 4,6%), três meses antes (23,8 mil; 6,8%) e mesmo mês de 2024 (28,8 mil; 8,2%).
Segundo o INE, a população ativa (5583,6 mil) aumentou, relativamente a junho de 2025 (1,8 mil, a que correspondeu uma variação relativa quase nula), a abril do mesmo ano (15,6 mil; 0,3%) e a julho de 2024 (173,2 mil; 3,2%).
Também a população inativa (2456,4 mil) aumentou, em relação ao mês anterior (6,7 mil; 0,3%) e a três meses antes (8,9 mil; 0,4%), e diminuiu, face ao mês homólogo (59,1 mil; 2,4%).
Ao divulgar as estatísticas de julho, ainda provisórias, o INE fixou valores definitivos para o mês de junho, tendo revisto, ligeiramente em alta, a taxa daquele mês, face ao anteriormente divulgado, passando-a de 6% para 6,1%.
A taxa de desemprego continua a ser maior entre as mulheres do que entre os homens, com 6,2% de desemprego entre a população feminina, em julho, face a 5,3% entre os homens.
Entre os jovens, em junho e julho deste ano, a taxa de desemprego (18,9%) registou o valor mais baixo, desde junho de 2023 (18,5%), enquanto a taxa de desemprego de adultos, no mês de julho (4,8%), foi o valor mais baixo, desde fevereiro de 2022 (4,7%).
O valor das rendas poderá aumentar 2,25%, em 2026. Nos últimos 12 meses até agosto, a variação média do índice de preços, excluindo a habitação, foi de 2,25%, valor que serve de base ao coeficiente utilizado para a atualização anual das rendas para o próximo ano, ao abrigo do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU). Contudo, o valor efetivo de atualização das rendas – aplicável tanto ao meio urbano como ao meio rural – só será apurado em 10 de setembro, quando o INE divulgar os dados definitivos referentes ao IPC de agosto, tendo depois de ser publicado, em Diário da República, até 30 de outubro. E, só após a publicação em Diário da República, os proprietários poderão anunciar aos inquilinos o aumento da renda, só podendo ocorrer a subida 30 dias depois deste aviso.
A taxa deste ano, para aplicar em 2026, representa uma aceleração face ao ano passado (aplicada às rendas de 2025), quando se fixou em 2,16%.

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A previsão do governo para o PIB é mais otimista do que as das restantes entidades que se pronunciam obre o assunto. Em abril, o executivo previa um crescimento do PIB, para este ano, de 2,4%. Porém, as projeções das principais entidades nacionais e internacionais que acompanham a economia portuguesa, publicadas, desde o início de maio, ficam todas abaixo da fasquia dos 2%, oscilando entre 1,6% (BdP) e 1,9% (OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico), com a Comissão Europeia a esperar 1,8%.

A grande razão para as previsões em baixa é a queda sofrida pela economia portuguesa no primeiro trimestre do ano, quando recuou 0,5%, face aos últimos três meses de 2024. Foi a maior queda trimestral, desde a crise pandémica, depois do forte crescimento, no final de 2024, impulsionado por fatores pontuais. E essa queda tem forte efeito de arrastamento para baixo da economia portuguesa em 2025, que o governo parece não ter incorporado.

É certo que, no segundo trimestre, a economia voltou a crescer em cadeia e, mesmo, em termos homólogos – evolução suportada pela procura interna (consumo e investimento). Porém, na frente externa, há maior incerteza. Por isso, estes números são insuficientes para impulsionar a economia lusa para um maior crescimento, em 2025. E, apesar da possibilidade de surpresas, até pelo encaixe de dinheiro pelos contribuintes, graças à descida do IRS, sobretudo, a nível da retenção na fonte, um crescimento do PIB que chegue aos 2%, neste ano, é pouco provável.

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O governo devia saber que prudência e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.

2025.08.29 – Louro de Carvalho

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