sábado, 14 de outubro de 2023

“Em Fátima, não há estrangeiros nem fronteiras”

 

É uma das poderosas asserções lapidares do cardeal D. Américo Aguiar, bispo eleito de Setúbal, na homilia da Missa da Peregrinação Internacional Aniversária de 13 de outubro, pedindo a todos os peregrinos oração pela paz, pelo Papa e pelo Sínodo dos Bispos e apresentando Fátima como lugar de encontro e de comunhão.

***

Decorreu, nos dias 12 e 13 de outubro de 2023, a 6.ª e última Peregrinação Internacional Aniversária deste ano de 2023 – um ano particularmente marcado pela presença dos jovens e do Papa –, sob a presidência do mais novo dos cardeais portugueses e do segundo mais novo do Mundo, sendo a segunda vez que preside a uma peregrinação internacional aniversária em Fátima (a primeira foi em junho de 2021, ainda condicionada pela pandemia).

Na tarde do dia 12, o reitor do Santuário, Padre Carlos Cabecinhas, apresentou aos jornalistas presentes na Cova da Iria dados sobre a afluência de peregrinos, neste ano de 2023, que registou um aumento significativo na presença de grupos na Cova da Iria. Cerca de 4,4 milhões de peregrinos estiveram em Fátima, entre maio e outubro de 2023.

Nesse encontro com os jornalistas, o responsável pelo Santuário adiantou que as intenções pela paz no Mundo e pela Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos – com que o Santuário quer estar sintonizado, fariam parte das orações desta peregrinação.

Ao lembrar a enorme recuperação no número de peregrinos que se registou em 2022, após os anos de pandemia, Carlos Cabecinhas referiu que, entre 1 de maio e 10 de outubro deste ano, estiveram na Cova da Iria cerca de 4,4 milhões de peregrinos. “É um aumento significativo, em relação a 2022, mas que nos deixa um pouco aquém dos números que se verificaram em 2019”, comparou, dando nota da recuperação no número de grupos de peregrinos estrangeiros, com a Espanha a ser a nacionalidade com maior expressão, seguida da Itália e da Polónia. Sobre a afluência de peregrinos, o padre Cabecinhas sublinhou a presença de grupos vindos da Ucrânia; o regresso dos grupos provenientes da Ásia, em especial da Coreia do Sul; e a “presença muito significativa” de grupos provenientes dos Estados Unidos da América (EUA).

O Santuário de Fátima recebeu 3107 grupos de 97 países, incluindo de Portugal; houve 1.417 grupos da Europa e 295 grupos da Ásia, com particular destaque para a recuperação da presença de sul-coreanos em números “muito significativos”.

O padre Carlos Cabecinhas notou que Espanha é o país com maior participação de grupos, quase equivalente aos EUA, e que da Ucrânia chegaram 14 grupos,  com 2.460 peregrinos, “apesar do contexto da guerra”.

Questionado sobre as intenções que se terão presentes nesta Peregrinação, o reitor do Santuário adiantou que o tema da paz e a Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, que decorre em Roma, acompanharão a oração que se fizer na Cova da Iria, por estes dias: “Tínhamos o drama da guerra na Ucrânia e, agora, temos o drama da guerra em Israel e nos territórios palestinianos, nomeadamente na Faixa de Gaza. São situações que nos preocupam de forma muito especial e às quais não podemos, de modo algum, ficar indiferentes.”

No final, sublinhou o facto de a peregrinação ser presidida pelo cardeal D. Américo Aguiar, que foi também o responsável pela Jornada Mundial da Juventude de Lisboa 2023 (JMJ Lisboa). “Ao convidar o senhor D. Américo para esta peregrinação era também objetivo manter o tema da JMJ Lisboa presente no horizonte da Igreja em Portugal e de Fátima. Foi um acontecimento marcante para o país e para a Igreja em Portugal e cujo dinamismo não queremos deixar perder.”

***

Na homilia da Celebração da Palavra da noite do dia 12, D. Américo Aguiar pediu aos peregrinos que rezem à “mãe do Céu” pelo “dom da paz” para a Ucrânia, para a “Terra de Jesus e para todos os sítios onde falta a paz”. “Quando falamos de Fátima, falamos de paz e, infelizmente, este é um dom que está a faltar: está a faltar na nossa querida Ucrânia e à nossa querida terra de Jesus. Por isso, queremos pedir à nossa mãe, à mãe do Céu, o dom da paz para a Ucrânia, para a Terra de Jesus e para todos os sítios onde falta a paz”, disse o bispo-eleito de Setúbal na reflexão que fez durante a Vigília, que decorreu no Recinto de Oração.

“Dá-nos a paz mãe do Céu, intercede junto do teu Filho para que tenhamos o dom da paz nos nossos corações”, rezou, deixando algumas interpelações, tais como: “Podemos perguntar porque é que há guerra no Mundo, não sei explicar. A quem faz jeito esta nova guerra, esta nova agenda de guerra? Não sei...Quem fica a ganhar com esta nova guerra? Não sei responder. Mas sei quem fica a perder: as crianças, os jovens, as mulheres, os pobres, os últimos, os de sempre.”

Por isso, exortou: “Rezai e escutai o que o Senhor nos diz. E façamos a paz à nossa volta; que ela seja uma presença constante nas nossas comunidades.”

E aos 180 mil peregrinos que participaram na Vigília da noite na Cova da Iria, entre eles cerca de  120 grupos inscritos, de 35 nacionalidades, confidenciou: “Não sei, nem posso adivinhar o que se passa nas vidas e nos corações de todos vós que me escutais. Mas tenho a certeza de que precisamos de nos inclinar perante o Senhor, de ouvir a sua voz.”

Por conseguinte, declarou: “Nesta noite, peço-vos que rezemos pela paz, que sejamos capazes de pedir a paz sem cessar, sem esmorecer, com confiança e com esperança.”

O novo purpurado da Cúria Romana (agora no Dicastério para a Comunicação) agradeceu ainda o envolvimento de todos na concretização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), de norte a sul de Portugal, incluindo as Regiões Autónomas, bem como a todos os grupos que ajudaram na organização do evento. “Muito obrigado a todos os jovens e a todas as dioceses do nosso país”, declarou, numa passagem da homilia saudada pela multidão com uma salva de palmas. “Fiz-me peregrino convosco;  há dois dias que ando no coração da mãe de Deus. É a gratidão que aqui me traz. Deixo uma palavra de gratidão a este Santuário: foram inexcedíveis no envolvimento da JMJ e no acolhimento dos jovens”, disse, garantindo: “No coração da Mãe, cabem sempre todos.”

A peregrinação prosseguiu com a Vigília, durante a noite e a madrugada, que terminou com a procissão Eucarística no Recinto de Oração. No dia 13, às 9h00, foi rezado o terço e, logo depois, teve início a Missa internacional que integrou a palavra e a bênção aos doentes e terminou com a Procissão do Adeus.

***

Na homilia da Missa do encerramento da peregrinação, no dia 13, proclamou: “Somos peregrinos de Fátima, unidos pelo Amor a Nossa Senhora. Um Amor sem fronteiras, um amor rezado em todas as línguas, feito de súplicas e gratidão. […] Em Fátima, não há estrangeiros nem fronteiras. E a oração do Rosário, na recitação repetida da Avé-Maria e do Pai-Nosso, permite-nos viver a condição de irmãos, filhos do mesmo Deus, gratos pela presença da Mãe, que desceu do Céu para nos revelar a dimensão do Amor puro e gratuito que Jesus nos deu e viveu.”

O apelo à oração pela paz foi o centro da homilia do presidente da Peregrinação, que, já na noite anterior, havia lembrado os emergentes conflitos do mundo atual. Nesta ocasião, reiterou o pedido de oração pela paz na Ucrânia, na Terra Santa e “em todas as geografias onde é derramado o sangue de inocentes”, lembrando também o drama da migração no Mediterrâneo e apontando cada peregrino como construtor da paz esperada.

“Fátima sóis vós. Há pouco, ouvimos dizer, no Evangelho, que Jesus entregou a chave do Reino dos Céus. Se fosse hoje, Jesus entregava uma password e essa password seria ‘amor’ […] Sejamos essa password para o Reino dos Céus”, exortou o prelado, ao evocar também a Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, que decorre em Roma até ao final de outubro.

Neste dia em que se celebra a solenidade do aniversário da dedicação da Basílica da Senhora do Rosário, o presidente da celebração elogiou a “capacidade da Humanidade de construir templos”, dando pelas “pedras vivas” que edificam “a Igreja de Jesus, o templo espiritual que supera todos os templos”.  

E, no final da homilia, o cardeal pediu a oração dos peregrinos também pelo seu ministério enquanto pastor diocesano.

Na Palavra ao doente, durante o momento de adoração ao Santíssimo Sacramento, a irmã Inês Vasconcelos, religiosa das Servas de Nossa Senhora de Fátima, apontou a confiança da presença de Deus e a fé perseverante como atitude ideal na doença e na privação.

“Hoje, como há dois mil anos, Jesus estás connosco e diz-nos: tem confiança, meu filho, a tua fé te salva! […] Ele conhece o nosso íntimo e aquilo que pode dar plenitude à nossa existência. Ele é o médico divino. Não permitamos que o sofrimento ou dor nos roubem a alegria da esperança ou nos separem do amor de Cristo. Jesus está sempre connosco, para nos ressuscitar”, disse a também responsável pelo Centro de Escuta do Santuário de Fátima, ao lembrar a presença materna e segura que Nossa Senhora garantiu aos Pastorinhos. “À casa da Mãe viemos à procura de paz e conforto para o nosso caminho, muitas vezes atribulado e percorrido em deserto. Como aos santos Pastorinhos, hoje a Mãe diz-nos: ‘o meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus’.”

No final da celebração, o reitor do Santuário de Fátima agradeceu, em nome do bispo de Leiria-Fátima – ausente na Cova da Iria, por estar a participar na Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, em Roma – a presidência e as palavras do cardeal D. Américo Aguiar, nesta peregrinação de 12 e 13 de outubro. “Não tenho dúvidas de que estes peregrinos continuarão a rezar pelos bons frutos da Assembleia Sinodal e também para que Nossa Senhora venha em auxílio do seu ministério pastoral, como bispo de Setúbal”, garantiu o padre Cabecinhas, ao deixar um último apelo à oração pela paz no Mundo, de modo muito especial na Terra Santa e na Ucrânia.

O cardeal, depois da Procissão do Adeus, ofereceu, na Capelinha das Aparições, a Nossa Senhora de Fátima o báculo que usou na peregrinação (fora-lhe oferecido na Terra Santa em visita no âmbito da JMJ), a cruz episcopal da JMJ, o anel e o solidéu cardinalícios e o lenço branco do adeus (que usou, momentos antes) – um múltiplo gesto despojamento, de entrega e de gratidão, que vale pelo simbolismo, pois, outros báculos, cruzes, anéis, solidéus e lenços brancos não lhe faltarão para o exercício do múnus pastoral. 

“Este báculo foi-me oferecido pela Cáritas de Jerusalém, em Belém, por ocasião da minha visita, em julho passado, por causa da JMJ Lisboa 2023. Vou oferecê-lo a Nossa Senhora, pedindo-Lhe a sua muito especial intercessão pela paz na terra de Jesus, na Ucrânia e em tantas outras geografias e corações”, escreveu, em nota prévia, onde também justificou as restantes ofertas, que depositou aos pés da Imagem de Nossa Senhora de Fátima: “Faço-o como sinal de gratidão pelo apoio incondicional de Nossa Senhora ao que foi a JMJ: preparação e vivência e o que terá de continuar a acontecer nos corações dos jovens peregrinos […] O anel cardinalício quer significar a consagração desta nova missão ‘inesperada’ à nossa Mãe.”

Provavelmente, a expressão “missão inesperada” referir-se-á à missão como cardeal e como bispo de Setúbal.

***

Fiquemo-nos com a declaração do Reitor: “Vamos rezar pela paz, e é inevitável que o tema da guerra volte a estar presente na peregrinação porque está presente no dia a dia. O drama da guerra na Ucrânia, agora o drama da guerra na Terra Santa, em Israel e nos territórios palestinos, na Faixa de Gaza. São situações que nos preocupam e às quais não podemos ficar indiferentes.”

2023.10.13 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário