A menos de 2 meses do termo do ano letivo, com base
em dados que o ME (Ministério da Educação) disponibiliza, alguns órgãos de comunicação social fizeram
listas que ordenam por ordem decrescente de sucesso
académico as escolas do país. Porém, o que transparece para a opinião pública
são as escolas em que houve melhor média de classificação em exames nacionais,
sendo que uns ordenam as escolas consoante as médias alcançadas
independentemente do número de provas realizadas em cada escola, enquanto
outros selecionam apenas aquelas em que houve de 100 provas em diante.
Por isso, quando o “educare.pt” coloca a
questão do que dizem ou não dizem os números dos rankings, a resposta
imediata deve ser: só dizem os resultados dos exames nacionais, mais nada.
É certo que lateralmente se comenta que, para lá
dos exames, há muito trabalho que as escolas fazem durante o ano letivo, mas
isso pouca mossa faz no público. Também o ME passou a disponibilizar dados
sobre o fator de sucesso criado em cada escola (chegou a ser contemplado nalguns rankings,
mas cedo se eclipsou) e
do sucesso direto (alunos que fazem um ciclo de estudos inteiro sem
retenção ou reprovação),
mas os comentadores ou não falam disso ou fazem-no muito ao de leve.
Publicados os rankings,
o que seria, à partida, fator de contentamento, pois a média dos exames
nacionais subiu 2 a 3 valores, em ano de pandemia, surge um inédito debate a
desvalorizá-los, a questionar as razões por que as melhores posições são
ocupadas por escolas privadas e com o Ministro da Educação a considerar “injustas
e redutoras” as listagens de escolas baseadas nas médias dos exames nacionais além
de “não refletirem a qualidade do trabalho das escolas”.
Segundo alguns, o 1.º lugar cabe à Academia de Santa
Cecília, em Lisboa, e, segundo outros, ao Colégio Nossa Senhora do Rosário, no
Porto. O colégio teve uma média de 17,6 nas provas realizadas em 2020, ficando
mais de duas décimas acima do Colégio Dom Diogo de Sousa, em Braga (o 2.º). Em todo o caso, como nos últimos anos, as escolas
com melhores médias são todas do ensino privado, dividindo-se entre os
distritos de Lisboa e Porto, havendo ainda uma no distrito de Braga e outra em
Aveiro.
Quanto às públicas, a 1.ª aparece em 34.º lugar
do ranking nacional e é repetente, a Escola
Secundária Infanta Dona Maria, em Coimbra, que obteve a melhor classificação entre
as escolas públicas, com a média de 15,01, depois de em 2019 ter ficado em 2.º
lugar no mesmo ranking.
Apesar de terem descido, as notas em escolas públicas
subiram de forma considerável em comparação com o ano passado, o que se entende
como consequência da pandemia, que originou exames diferentes, com critérios de
correção e classificação também diferentes, do que resultou inflacionou as
médias. Além disso, regista-se que as escolas que aderiram ao regime de
flexibilização curricular têm melhores desempenhos.
Também, nas últimas duas décadas, o ME disponibiliza
anualmente as classificações internas das escolas e dados de contexto. Porém,
daí apenas se tem assinalado que há discrepância entre as classificações
internas e as de exame, embora o atual Ministro tenha dito e redito que as tabelas
baseadas só em exames “são redutoras, injustas e não refletem a qualidade do
trabalho que é realizado pelas respetivas comunidades educativas” e que tenha
dito que as classificações dos alunos dependem de diversos fatores “que não têm
qualquer relação com a ação da escola”.
Além dos indicadores acima referenciados, a tutela
apresentou, este ano, um novo indicador intitulado “equidade”, que se foca nos
percursos escolares dos alunos carenciados, com ASE (apoio social
escolar), e permite observar as escolas que
se destacam por terem mais casos de sucesso entre esses estudantes. É tido,
nestes casos, em linha de conta tanto o contexto socioeconómico dos alunos e
das escolas, como a avaliação integral das aprendizagens, quer a adveniente de
exames nacionais, quer a dos professores que trabalham com os alunos.
E sucede que os alunos mais carenciados só conseguem
superar as expectativas em metade dos concelhos do país, como revela o novo
indicador, segundo conclui a Lusa
numa análise do indicador de equidade, tendo em conta o tempo esperado dos 1.º
e 2.º ciclos e dos percursos diretos de sucesso no 3.º ciclo e no ensino secundário.
Com efeito, em média e ao longo da escolaridade obrigatória, os alunos mais
carenciados tendem a ficar ligeiramente atrás dos outros colegas, embora haja
exceções, mas em relação às expectativas de sucesso escolar, só em cerca de
metade dos municípios é que essas foram superadas. E representam, na prática, a
média nacional dos alunos com o mesmo nível de partida à entrada de cada ciclo
de estudos, sendo que nem todos conseguem ter desempenhos superiores aos
colegas com o mesmo perfil.
Logo no 1.º ciclo, cerca de 82% dos mais de 26 mil
alunos com ASE que deviam ter terminado o 4.º ano no ano letivo de 2018/19
fizeram-no sem retenção em nenhum dos anos, pouco menos em comparação com a
taxa nacional de conclusões no tempo esperado (87%). Por outro lado, só em 118 dos 213 municípios analisados neste nível de
ensino é que os alunos, em média, igualaram ou superaram as expectativas. Nos
restantes (45% do total), as
crianças tiveram desempenhos ligeiramente inferiores aos colegas com o mesmo
perfil. A tendência repete-se no nível seguinte: entre os cerca de 33.700
estudantes carenciados no 6.º ano, cerca de 29 mil (89%) terminaram o 2.º ciclo nos dois anos letivos
expectáveis. E, apesar de melhores em relação aos mais novos, só em 60% dos 245
municípios com dados disponíveis os estudantes conseguiram desempenhos iguais
ou superiores à média com o mesmo perfil. A partir do 3.º ciclo, o cenário
torna-se mais preocupante, à semelhança do que sucede com a generalidade dos
alunos.
Os diretores escolares criticam os rankings por ocultarem muito do trabalho feito continuamente
por alunos e professores e “compararem realidades incomparáveis”, que podem
desmotivar a comunidade escolar. Assim o disse à Lusa Filinto Lima, presidente
da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas), observando que estas listagens feitas com base em médias
de exames “revelam apenas uma ínfima parte do trabalho diário das escolas e
alunos”, havendo “escolas que fazem um trabalho de excelência e ficam mais para
baixo nestas tabelas”, o que “é muito injusto”. E Manuel Pereira, presidente da
ANDE (Associação
Nacional de Diretores Escolares), lamenta a
comparação de realidades escolares muito distintas.
Também Jorge Ascenção, presidente da Confap (Confederação
Nacional das Associações de Pais, relativiza
as listagens agora publicadas. Com efeito, os encarregados de educação, dizendo
que os rankings devem ser olhados com ponderação e
relativizados, admitem a sua utilidade para as escolas perceberem como podem
melhorar a partir dos bons exemplos que possam recolher umas das outras, o que é
escasso, a meu ver, pois as médias não espelham o tipo de trabalho.
Ricardo Paes Mamede frisou que mais uma vez os rankings são publicados sem que sejam disponibilizados
dados sobre a composição socioeconómica dos alunos dos colégios privados. E, aludindo
a uma realidade paralela, o economista explana:
“Enquanto assim for, os rankings apenas
sugerem que escolas frequentadas por filhos de famílias com mais recursos
económicos e culturais têm melhores notas nos exames. É um ótimo momento de
publicidade grátis para alguns colégios, mas diz-nos pouco sobre o que funciona
bem e o que se pode melhorar no sistema de ensino.”.
***
Entretanto, também foi noticiado que a IGEC (Inspeção-Geral
da Educação e Ciência) instaurou,
nos últimos dois anos, 66 processos disciplinares por irregularidades na
atribuição de notas, tendo aplicado 64 sanções disciplinares a escolas, desde
repreensões escritas à suspensão de funções.
A informação foi avançada à Lusa pelo gabinete do ME, que fora questionado sobre a intervenção
da IGEC junto das escolas que sistematicamente inflacionam as notas no ensino secundário,
prática que pode permitir a um estudante passar à frente no acesso ao ensino
superior. E, segundo a tutela, a obviar à situação, os inspetores instauraram,
desde o ano letivo de 2019/20, passaram a ser presença regular nas escolas onde
normalmente são identificados estes problemas e instauraram os preditos processos
que desembocaram nas referidas sanções aplicadas em escolas particulares e
cooperativas, tendo havido dois processos suspensos, nos termos da lei, por
aposentação ou cessação de funções dos arguidos.
Os inspetores detetaram situações em que houve
“deficiente elaboração de critérios de avaliação” e “incorreta aplicação”
desses mesmos critérios. Diretores escolares, diretores pedagógicos de colégios
e docentes foram apontados como os responsáveis e, por isso, sobre eles recaíram
as sanções como “a repreensão escrita, a multa e a suspensão de funções”.
Este ano, o ME não apresentou novos dados sobre as
escolas que inflacionam notas, pois não era alegadamente possível calcular esse
indicador, porque, em 2020, os exames foram aplicados só para efeitos de acesso
ao ensino superior e nas disciplinas escolhidas por cada aluno. Mas até era,
pois também houve classificações internas nas disciplinas que foram objeto de
exame.
Desde 2015 que o ME divulga o indicador que compara as
notas internas dos alunos de cada escola com as classificações atribuídas pelas
outras escolas do país a alunos que tiveram resultados semelhantes nos exames
nacionais. Pela comparação feita ao longo de 5 anos, podem identificar-se
as escolas que inflacionam as notas. Assim, todos os anos se identificam cerca
de duas dezenas de escolas que dando notas acima do que deveriam.
Invariavelmente, a maioria é privada e situa-se no norte do país. Há, pois, 9 escolas
que surgem todos os anos nas listas, que analisam a situação desde 2009:
a Escola Secundária de Fafe, o Colégio Dom Diogo de Sousa e o Externato
Carvalho Araújo (em Braga), o Externato
Camões e o Colégio Paulo VI (ambos em Gondomar), os colégios Dom Duarte, Luso-Francês e Ribadouro (os 3 no Porto) e o Colégio da Trofa. E, sobre a ação desenvolvida
junto das escolas, o ME revelou:
“Nos últimos anos verificou-se uma melhoria significativa do indicador
do alinhamento das notas internas, designadamente em algumas das escolas
referidas. As que continuaram a apresentar fragilidades estão enquadradas no
trabalho que tem sido desenvolvido pela IGEC, ou seja, a Inspeção interveio de
forma preventiva ou de forma sancionatória, em função dos factos encontrados em
cada uma das situações.”.
Além dos processos disciplinares e sanções, a tutela
sublinhou que “a ação da IGEC continua em curso junto das escolas” para que “a
avaliação dos alunos seja cada vez mais rigorosa e transparente”. E, mercê da pandemia
que obrigou ao encerramento temporário das escolas e implementação do ensino à
distância, a IGEC iniciou uma atividade de acompanhamento do trabalho das
escolas, cujo foco foi a avaliação pedagógica no ensino secundário.
Segundo o ME, tratou-se de uma “ação preventiva e
dissuasória”, que decorreu antes do período das avaliações finais e épocas de
exames, permitindo acompanhar o trabalho feito até então, dadas as
circunstâncias especiais decorrentes da interrupção e posterior regresso às
atividades letivas presenciais. Os inspetores atuaram junto de 100 escolas
públicas e privadas, com entrevistas aos “100 diretores e a 300 professores,
bem como questionários ‘online’ a 6.389 alunos dos 11.º e 12.º anos”. Apontaram
algumas falhas, nomeadamente nas classificações atribuídas em disciplinas como
Educação Física e algumas disciplinas de opção no 12.º ano, que defenderam ser
necessário melhorar. E sustentaram que é preciso, por exemplo, diversificar as
tarefas e instrumentos que permitam recolher informação sobre as aprendizagens
desenvolvidas e dar mais formação contínua aos professores na área da
avaliação.
Após a ação desenvolvida no ano passado, a IGEC
regressou este ano a 26 das 100 escolas “que apresentaram mais fragilidades, no
sentido de verificar o cumprimento das recomendações”. Segundo o ME, este
trabalho passou a fazer parte da atividade regular da IGEC. Mas o ME tem de
reforçar o quadro de inspetores para que o novo trabalho seja feito sem se descurar
o que tem sido feito até ao início da pandemia.
***
Tiago Brandão Rodrigues, perorando, a 18 de maio, na
Conferência Mundial da UNESCO sobre “Educação para o Desenvolvimento
Sustentável”, que decorreu em formato virtual de 17 a 19 de maio, enalteceu o papel da Educação
para que a sustentabilidade nunca “saia de moda”, vincando o compromisso
do país em dar aos estudantes as competências necessárias para tal.
Considerando que “a melhor forma de assegurar que agimos
de forma sustentável é recusando que a sustentabilidade é uma tendência”, disse
que, se ela for entendida dessa forma, é necessário trabalhar para assegurar
que “não saia de moda” e seja inscrita no nosso ADN por todos nós. E, além de não
concordar com a sustentabilidade como tendência, o Ministro da Educação
observou que ela não se extingue na ecologia e na proteção ambiental,
envolvendo antes uma grande diversidade de outras questões. Assim, a
sustentabilidade postula que “tomemos conta do planeta”, mas exige-nos muito
mais: a intervenção em questões como a equidade, a participação ativa na
sociedade, a interculturalidade, a criatividade e a inovação…
E, frisando que “é aqui que a Educação tem um papel a
desempenhar”, apontou que as escolas e o ensino têm o potencial para agir como
promotores de sociedades coesas e inclusivas “e, consequentemente mais
sustentáveis”. No entender do governante, a importância deste papel e a
necessidade de reforçar esta visão foi vincada no último ano, pois a pandemia expôs
“a urgência para respostas coordenadas de políticas públicas globais, também
elas sustentáveis”.
Foi nesse sentido que reforçou o compromisso em dar aos
estudantes os conhecimentos e as competências para promover o desenvolvimento
sustentável, e o prazo é 2030. E, além da promoção do desenvolvimento
sustentável, quer que os estudantes sejam capazes de promover a cultura de paz,
a cidadania global, e de valorizar a diversidade cultural e o reconhecimento do
contributo da cultura para atingir o destino comum de prosperidade partilhada,
que “não pode deixar de se cumprir”, pois a sustentabilidade tem de fundar cada
uma das nossas decisões.
***
Bela teoria desmentida pelos rankings e pela inflação
de notas a que a IGEC não consegue pôr cobro! Os exames são o meio ideal, de
que não se prescinde, para o acesso seletivo ao ensino superior, ao alcance de
quem tem posses para colocar os filhos em colégios, que selecionam quem lhes
interessa ou em escola pública em que a elite (que teima em a utilizar) se vale do recurso a explicadores que encaminham
tudo, desde cedo, para o teste, o exame. Mais: é o culminar dum processo que se
inicia no 1.º CEB: programas obesos, com uma série de fichas para casa que só
criança com apoio em pais ou avós é capaz de cumprir. E quem não pode ou não
sabe? Depois, enchem a boca com a igualdade de oportunidades…
2021.05.21 – Louro de Carvalho
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