quinta-feira, 4 de março de 2021

Solidariedade com o Governo ou cooperação entre Governo e Presidente

 

De acordo com o respetivo comunicado, o Conselho de Ministros, em reunião deste dia 4 de março, presidida pelo Presidente da República, como estava agendado e como é possível nos termos da alínea i) do art.º 133.º da CRP, aprovou um conjunto de diplomas que reforçam a prioridade dada à reforma do setor florestal no quadro da valorização do território nacional. 

Na convicção de que “a floresta constitui um ativo de enorme relevância estratégica para o desenvolvimento económico e para a sustentabilidade ambiental”, as medidas ora aprovadas “prosseguem a estratégia integrada iniciada na anterior legislatura” com vista a “uma reforma do setor que proteja os seus recursos e promova os seus ativos”. E é de registar que as florestas estão em destaque no PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), com um envelope de €665 milhões para a transformação da paisagem dos territórios vulneráveis, criação de faixas de gestão de combustível e combate a incêndios rurais.

No final da reunião, o Chefe de Estado elogiou a tradição iniciada com o anterior Chefe de Estado por “cortesia” e “solidariedade institucional” e defendeu a “solidariedade estratégica” com o Governo não apenas no atinente às florestas, mas também e sobretudo face à pandemia e à presidência portuguesa da UE, afirmando a este respeito:  

A solidariedade é institucional, mas também estratégica porque em matéria de pandemia e presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, como na matéria que é o grande tema deste Conselho de Ministros – estratégia no domínio não só dos fogos florestais mas do ordenamento do território florestal –, é fundamental para o país que haja uma solidariedade estratégica”.

Evocando os incêndios em 2017, Marcelo frisou que desde então a estratégia do Governo foi, não só combater, mas sobretudo prevenir os fogos florestais, através duma “visão conjunta” envolvendo todos os ministérios com “cadastro” e “intervenção sobre o território”. E sublinhou que, “neste Conselho de Ministros, foram apreciados vários diplomas, mas sobretudo foi apreciada uma estratégia nacional que visa prevenir muito mais do que combater os fogos florestais, mas intervir no que é decisivo”. Assim, realçando a “estratégia de longo prazo”, que arrancou em 2017 e se prolonga até 2030, apontou os diplomas nas áreas do ordenamento do território, da gestão integrada dos incêndios florestais e sobre a Proteção Civil.

Por sua vez, o Primeiro-Ministro vincou a “cooperação estratégica” entre o Governo e o Chefe de Estado, frisando a “enorme preocupação” de Marcelo com a temática das florestas, certo de que, no seu novo mandato, que se iniciará no dia 9, será o garante, para lá desta legislatura, da continuidade da “aposta estratégica do país na reforma da floresta”. E observou:

Se queremos efetivamente ter uma floresta resiliente, que contribua para enriquecer o país, criar melhores condições de vida no interior do país e que ajude as populações a viver melhor, nós temos que agir sobretudo naquilo que são os elementos estruturais”.

Para o chefe do Governo, o mais importante que foi aprovado na reunião foram os instrumentos de ordenamento do território, da paisagem, da gestão integrada do espaço rural, o desenvolvimento das valências da Proteção Civil preventiva, da qualificação de quem combate os fogos e o reforço dos meios de combate da Força Aérea. Neste sentido, alertou:

Sabemos bem que estes são processos longos e que o maior risco que o país pode correr é que cada vez que temos sucesso nos incêndios é ir desmobilizando na determinação que tem de haver para a transformação de fundo. Houve uma grande reforma na Proteção Civil que teve resultados ao longo de uma década. Mas em 2017 pagámos com um preço brutal em vidas humanas toda a reforma da floresta que ficou por fazer.”.

Em concreto, o Governo definiu ações atinentes ao sistema de gestão integrada de fogos rurais (SGIFR), ordenamento do espaço agrícola e florestal e reforço da proteção civil.

No respeitante ao SGIFR, foram aprovados os seguintes diplomas:

- Proposta de lei que solicita à Assembleia da República (AR) autorização legislativa para estabelecer de meios de tutela para o cumprimento dos deveres de prevenção de incêndios rurais, mecanismos de responsabilização pelo incumprimento desses deveres e medidas de segurança em situações de elevada perigosidade ou perigo de incêndio rural – no âmbito do decreto-lei que cria o SGIFR e estabelece as suas regras de funcionamento;

- Resolução que aprova, na generalidade, o PNGIFR (Programa Nacional de Ação do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais), que concretiza as orientações estratégicas e os objetivos específicos do PNGIFR, identificando 28 programas e 97 projetos que terão impacto no alcance da visão do PNGIFR (“Portugal protegido de incêndios rurais graves”) e potenciando maior eficiência e eficácia das medidas previstas para a gestão do risco, com diminuição de danos e áreas ardidas e com o aumento da valorização do território e apetência para o investimento (irá a consulta pública);

- Resolução que cria três projetos-piloto para promover a organização, os recursos e a cadeia de processos no PNGIFR, cujos resultados permitirão avaliar a adequação do sistema para adoção das medidas mais adequadas a potenciar a eficácia dos processos de trabalho e o alcance das metas do PNGIFR. 

No ordenamento do espaço agrícola e florestal, o Governo aprovou:

- A alteração do RJIGT (Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial), visando assegurar a conclusão da adoção das regras de classificação e qualificação do solo nos planos municipais ou intermunicipais, através de diploma que introduz ajustamentos neste regime, decorridos mais de 5 anos desde a sua aprovação, por exemplo no atinente às medidas preventivas adotadas para a elaboração, alteração ou revisão de programas especiais ou em matéria de reclassificação do solo, quando se destine a áreas de localização empresarial junto ao solo urbano;

- O PITFGICNF (Plano de Investimentos para os Territórios Florestais sob Gestão do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), para enquadrar as diferentes medidas e ações a desenvolver nos próximos 4 anos, medidas assentes em eixos estratégicos orientados para a gestão, recuperação e valorização dos territórios florestais;

- Os projetos de restauro e valorização de habitats naturais, com prevenção estrutural contra incêndios, nos Parques Naturais do Litoral Norte, do Alvão, da Serra da Estrela, de Sintra-Cascais e do Vale do Guadiana, apoiando a realização da 4.ª geração de projetos com enfoque na conservação ativa de áreas protegidas, associando o investimento direcionado ao restauro e valorização de habitats naturais com a prevenção estrutural contra incêndios, garantindo a dotação dos meios e equipamentos necessários para esse efeito, ficando abrangido um total de 19 áreas protegidas e passam as verbas dedicadas a estes projetos de 21 para €26 milhões;

- O Projeto de promoção da cogestão em áreas protegidas de âmbito nacional, para dinamizar, em 3 anos, a adoção, desenvolvimento e execução do modelo de cogestão, dotando cada uma das 32 áreas protegidas de âmbito nacional de financiamento que permita um apoio técnico e operacional, dedicado à implementação das atividades prioritárias na promoção da cogestão;

- Resolução que aprova medidas para os territórios vulneráveis para promover a atividade agrícola, o dinamismo dos territórios rurais e a criação de valor na inovação e na segurança alimentar – ações que assumem particular importância nos territórios de baixa densidade, permitindo reposicionar o interior como espaço de nova atratividade, apostar no seu potencial para acolher investimento empresarial inovador e competitivo, bem como responder ao desafio estratégico da governação de contrariar o declínio demográfico nestes territórios;

- Criação do Prémio Nacional das Florestas, bianual, no valor de 50 mil euros, para dinamizar e divulgar o conhecimento produzido na área da floresta, as técnicas e boas práticas de gestão florestal e a boa informação, bem como a promoção da resiliência dos territórios e a valorização sustentável dos seus ativos, mobilizando a sociedade e o desenvolvimento de processos colaborativos, e, ainda, o reforço da consciência cívica sobre o valor dos territórios florestais.

E, para o reforço da proteção civil, foram aprovados os seguintes diplomas:

- Estratégia Nacional para uma Proteção Civil Preventiva 2030 (irá a consulta pública), que define 5 objetivos estratégicos atinentes aos riscos – fortalecer a governança na sua gestão, melhorar o conhecimento sobre eles, implementar estratégias para a sua redução, melhorar a preparação face à sua ocorrência e envolver os cidadãos no seu conhecimento dos riscos – que se traduzem em projetos e atividades a implementar pela Administração Central e Local;

- Resolução que estabelece um conjunto de medidas para a reformulação do modelo de ensino e formação em proteção civil, com vista a fomentar o conhecimento e a formação técnica dos elementos dos corpos de bombeiros, dos restantes agentes de proteção civil e das entidades que compõem o sistema de proteção civil, prevendo-se a integração da oferta formativa prestada pela Escola Nacional de Bombeiros com a das instituições de ensino superior, laboratórios colaborativos e unidades de investigação relevantes nesta área e fomentando o desenvolvimento de parcerias e projetos educativos comuns e o reforço da formação profissional;

- Constituição da Reserva Estratégica de Proteção Civil, para garantir uma reserva de material e de equipamentos de apoio que permita uma resposta célere, adequada e eficaz quer à assistência a populações sinistradas, em Portugal ou no estrangeiro, quer à própria sustentação operacional das forças de resposta da ANEPC (Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil)

- Decreto-lei que procede à alteração das orgânicas da AGIFR (Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais), do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas) e da ANEPC, visando o reforço da capacidade de resposta operacional, alargando o universo de recrutamento e consolidando o regime de carreiras do pessoal da FEPC (Força Especial de Proteção Civil);

- Resolução de aquisição de meios aéreos próprios e permanentes do Estado (incluindo 6 helicópteros ligeiros, 6 helicópteros bombardeiros médios e 2 aviões bombardeiros anfíbios pesados) e a locação dos meios aéreos para o DECIR (Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais) de 2023 a 2026, assegurando-se a estabilização dos meios aéreos afetos ao dispositivo de meios aéreos de combate aos incêndios rurais, a assentar na conjugação entre meios próprios e locados.

***

Depois da aprovação de todas as medidas elencadas supra, não há razão para que haja mais incêndios rurais e florestais de grandes proporções. Esperemos que nada empanque na execução das medidas tomadas, nas guerrinhas a nível dos departamentos do Estado ou das autarquias e que os interesses de negociata instalados não se sobreponham aos interesses gerais.

A propósito, é de questionar, para mais em ano de eleições autárquicas, porque é que, até agora, três municípios se candidataram à linha de crédito deste ano para limpeza da floresta. É caso para perguntar para que se criam estes apoios, se não são aproveitados.

Os incêndios não virão apenas após as eleições, sejam em outubro, sejam em dezembro!

2021.03.04 – Louro de Carvalho

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