O Presidente da República, que viajou
desde Lisboa num Falcon da Força Aérea Portuguesa, aterrou, na tarde deste dia
5 de março, às 16,50 horas locais (15,50 horas em Portugal continental), em Luanda, após escalas em Cabo
Verde e em São Tomé e Príncipe, para uma visita de Estado de quatro dias, que
se divide entre a capital, Luanda, e as
províncias de Benguela e Huíla.
À chegada, o Chefe de Estado português foi recebido na pista
do aeroporto pelo Ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Domingos
Augusto, e pelo governador da província de Luanda, Sérgio Luther Rescova, com
alas militares de cortesia.
As primeiras palavras de Marcelo (tratado pelos populares angolanos como
Tio Celito) foram de grande
otimismo relativamente a esta visita, que terá início oficial amanhã, mas tendo
feito questão de chegar hoje para participar na celebração do aniversário do
Presidente angolano, João Lourenço, que faz 65 anos. A respeito desta visita,
afirmou o Chefe de Estado português em conferência de imprensa, no Aeroporto
Internacional 4 de Fevereiro, na capital angolana:
“Regresso
a uma casa que sinto como minha”.
E, respondendo a perguntas dos jornalistas sobre o
“caso Jamaica” – o incidente entre moradores angolanos daquele bairro, no
concelho do Seixal, e a polícia, ocorrido em janeiro e que deu origem depois a
uma manifestação realizada em Lisboa, em que se registaram incidentes entre
manifestantes e polícias –, disse:
“O que é significativo não são os irritantes do passado, nem
os insignificantes do presente, são os importantes do futuro”.
Desvalorizou, assim, as divergências
entre o Ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Augusto, e o
Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, quanto
aos incidentes no bairro da Jamaica.
Manuel
Augusto assegurou ontem, dia 4, que Portugal pediu desculpa pelo “Caso Jamaica”,
o que deixou a polícia portuguesa em alvoroço, alegando que as autoridades angolanas
deviam era pedir desculpa à nossa polícia e que o Vetado Português não tem de pedir
desculpa pela atuação da polícia. No entanto, o Ministério dos Negócios
Estrangeiros não confirma o alegado pedido de desculpas e diz apenas que Santos
Silva e o seu homólogo angolano “falaram por telefone”.
Porém, Manuel
Augusto afirmou em conferência de imprensa, antes da visita de Marcelo:
“Teve [Augusto Santos Silva] a hombridade de
me ligar, não só para apresentar desculpas, mas também para sublinhar a forma,
com sentido de Estado, como as autoridades angolanas reagiram”.
Além disso,
segundo a Lusa, o Ministro das Relações Exteriores
de Angola garantiu que as autoridades
angolanas acompanharam, conjuntamente com as autoridades de Portugal, os
incidentes entre os moradores angolanos do bairro da Jamaica, no Seixal, e a
polícia, ocorridos em janeiro. E explicitou:
“O que talvez seja aqui de sublinhar é que
as autoridades angolanas não se fizeram acompanhar da imprensa, nem a chamaram
para se fazer acompanhar. A nossa embaixada e o nosso consulado, sob nossa
orientação, acompanharam a família afetada até ao tribunal que julgou o jovem
que foi indiciado [por agressões a agentes da polícia]. O resultado desse
julgamento foi aceitável e o jovem está em liberdade. Angola fez o que tinha de
fazer.”.
E
acrescentou:
“Quero aqui assegurar que o Governo
angolano, através dos seus representantes em Portugal, assumiu as suas
responsabilidades, estabeleceu pontes de diálogo com as autoridades
portuguesas, condenou o uso excessivo da força, tal como também o fez tem
relação ao respeito às autoridades (policiais portuguesas). Tivemos uma atitude
permanente, sem muito barulho, mas eficaz.”.
Contudo, num
esclarecimento enviado à agência Lusa, o gabinete do Ministro dos Negócios
Estrangeiros afirma nada reconhecer sobre o alegado pedido de desculpas e
garante que, por iniciativa de Augusto Santos Silva, ambos falaram ao telefone
“logo após os incidentes do bairro da Jamaica”, a 20 de janeiro. E, ainda segundo
a mesma agência Lusa, os ministros
voltaram a abordar o tema a 15 de fevereiro, em Luanda, tanto na reunião
bilateral como na conferência de imprensa conjunta”, mas que “em ambas as
ocasiões”, a mensagem de Santos Silva “foi sempre a mesma”, ou seja, o Ministro
dos negócios Estrangeiros português lamentou “a ocorrência daquele incidente”,
agradeceu “a forma como as autoridades angolanas – quer a embaixada em Lisboa,
quer o Ministério do Interior – reagiram” e comunicou que “Portugal manteria
Angola informada dos desenvolvimentos e conclusões dos inquéritos em curso”.
***
O programa oficial
da visita de Estado iniciar-se-á no dia 6 de manhã, com a deposição de uma
coroa de flores no Memorial Agostinho Neto e um encontro com João Lourenço no
Palácio Presidencial, onde haverá igualmente conversações ministeriais, seguido
de uma conferência de imprensa conjunta.
Em cima da
mesa estará certamente o tema de regularização de dívidas de Angola a empresas
portuguesas, que teve avanços durante a visita do Primeiro-Ministro português,
António Costa, a Angola, em setembro do ano passado, e na visita de João
Lourenço a Portugal, em novembro.
À tarde, o
Presidente português discursará numa sessão solene na Assembleia Nacional e
encontrar-se-á com estudantes na Universidade Agostinho Neto, onde deu aulas de
direito e impulsionou
a criação de cursos de mestrado e doutoramento.
Segundo
Evaristo Solano, vice-decano para os assuntos científicos da Faculdade de
Direito, comentou com o Jornal de Angola a influência de Marcelo:
“Hoje temos um número muito elevado de
mestres e há um número muito elevado de mestres e há um número de inscritos no
curso de doutoramento. Devo dizer que o professor Marcelo Rebelo de Sousa tem
impressão digital destes programas.”.
À noite,
terá um jantar oficial oferecido pelo Chefe de Estado e de Governo de Angola.
Entre os
dias 7 e 8, Marcelo Rebelo de Sousa deslocar-se-á ao Lubango, na província de
Huíla, e, na província de Benguela, a Benguela, Lobito e Catumbela – viajando
de comboio entre estes dois últimos municípios –, alargando os contactos
políticos aos governadores destas regiões.
No
Lobito – terra natal de João Lourenço – encerrará um fórum empresarial no dia
7. E, no último dia de visita, mais um marco simbólico: comemora em Luanda os
três anos de mandato.
Pela parte
do Governo, Marcelo Rebelo de Sousa é acompanhado pelos ministros dos Negócios
Estrangeiros, Augusto Santos Silva, Adjunto e da Economia, Pedro Siza Vieira, e
da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Luís Capoulas Santos, bem
como pela Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação,
Teresa Ribeiro.
Da parte da
Assembleia da República integra a comitiva oficial desta visita uma delegação
parlamentar constituída por três líderes parlamentares, Fernando Negrão, do
PSD, Nuno Magalhães, do CDS-PP, e João Oliveira, do PCP, e, ainda, pela vice-presidente
da bancada do PS Lara Martinho e a deputada Maria Manuel Rola, do BE, partido
que acompanha pela primeira vez uma visita oficial a Angola.
***
O Chefe de Estado português visita Angola três meses depois
de ter recebido em Portugal, também em visita de Estado, o Presidente angolano,
João Lourenço, que tomou posse em setembro de 2017, dando início a um novo
ciclo político, após 38 anos com José Eduardo dos Santos no poder. E Marcelo esteve
em Angola nessa cerimónia de posse, em que João Lourenço deixou Portugal de fora
da lista de principais países parceiros que mencionou no seu discurso.
Esta visita de Estado, considerada uma das mais importantes
do seu mandato, termina precisamente no dia 9 de março, em Luanda, onde se irá
despedir do Presidente angolano, João Lourenço, e terá um encontro com membros
da comunidade portuguesa e luso-descendente.
A passagem deste aniversário em solo angolano não é casual,
disse o Presidente à agência Lusa:
“Foi uma opção intencional minha e foi
possível conjugar o programa”.
E responde a um convite pessoal, que acontece cerca de 20
anos depois de, por acaso, ter estado do aniversário da agora primeira-dama Ana
Dias Lourenço.
Questionado sobre que prenda de
aniversário que vai oferecer ao Presidente da República de Angola, Marcelo
hesitou: “Não sei se é bonito estar a
divulgar antes de dar ao próprio”. Mas lá foi dizendo que “não é um presente, são dois presentes”.
Esta é a 13.ª visita de Estado de
Marcelo, que desde que tomou posse, em 9 de março de 2016, já se deslocou ao
estrangeiro mais de meia centena de vezes e esteve em 32 países diferentes.
O Presidente da República afirmou, em conferência de imprensa depois da sua chegada a Luanda, ao ser questionado sobre a matéria, que o Governo continua a “trabalhar a todo o vapor” para resolver a questão das dívidas do Estado angolano às empresas portuguesas, algo que, de acordo com o Ministro das Relações Exteriores de Angola, “já não é considerada uma matéria especial”. O objetivo, disse Marcelo, é “ir o mais longe possível”, pois, sendo “um processo que não para”, “está-se a trabalhar a todo o vapor e vai-se continuar”.
O Presidente da República afirmou, em conferência de imprensa depois da sua chegada a Luanda, ao ser questionado sobre a matéria, que o Governo continua a “trabalhar a todo o vapor” para resolver a questão das dívidas do Estado angolano às empresas portuguesas, algo que, de acordo com o Ministro das Relações Exteriores de Angola, “já não é considerada uma matéria especial”. O objetivo, disse Marcelo, é “ir o mais longe possível”, pois, sendo “um processo que não para”, “está-se a trabalhar a todo o vapor e vai-se continuar”.
Segundo
os dados do Ministro das Finanças de Angola, Archer Mangueira, já divulgados,
o processo de certificação em curso das dívidas do Estado angolano ao setor
empresarial abrange 24 empresas portuguesas estando confirmados 270 milhões de euros de dívidas.
***
Para o Presidente angolano, as relações entre os dois
países “no pico da montanha”. Marcelo chegou a Luanda para receber
banhos de multidão e com uma agenda económica no bolso. A sua visita é um sinal
político forte.
Depois
de terem batido no chão por causa do processo de Manuel Vicente, é suposto esta
visita ser a celebração de uma amizade recuperada, mas com ingredientes
económicos: enquanto Angola precisa de capital, de divisas e de investidores
para gerar emprego, Portugal precisa de exportar.
O Jornal de Angola, o jornal do poder
cujos editoriais foram em muitas circunstâncias muito duros para Portugal, dá
quatro páginas à relação luso-angolana e titula assim: “Visita está à altura das relações especiais entre os dois países”,
como afirmou o Ministro das Relações Exteriores – apesar de, na mesma
conferência de imprensa, ter falado de um alegado pedido de desculpas do MNE
português sobre os incidentes no bairro da Jamaica (já desmentido por Santos Silva – um
incidente antes mesmo de a visita ter começado).
A
visita do Chefe de Estado português tem sobretudo significado político e
antecipa-se a maior receção de sempre a um líder estrangeiro. Com efeito,
Marcelo Rebelo de Sousa disse, no dia 4, em Cabo Verde que o objetivo é “consolidar
este novo ciclo a todos os níveis, económicos, financeiros, sociais, culturais,
educativos e políticos”, cujos dossiês foram trabalhados “em tempo
recorde, isto é, cerca de seis meses, em todos os domínios”.
Por
outro lado, para Angola e Portugal, a componente empresarial é fundamental e
não é por acaso que o Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, está com o Ministro
da Agricultura, Capoulas Santos, na comitiva: em cima da mesa está obviamente a
recuperação das dívidas do Estado angolano às empresas portuguesas,
possibilidades de investimento em áreas como o agroalimentar e as dívidas de
companhias portuguesas ao fisco angolano. Esta última questão foi levantada na
conferência de imprensa de Manuel Augusto, que disse:
“Quando
falamos da dívida, não estamos só a falar da dívida de Angola com Portugal, mas
também da regularização da dívida fiscal de empresas portuguesas para com o
Estado angolano”.
Embora
ressalvando que “a dívida já não constitui
o assunto principal nas relações entre Angola e Portugal”, ela, para o
Ministro, não deixará de ser assunto.
E o
Presidente angolano apelou aos empresários portugueses em entrevista à RTP de
hoje, dia 5:
“Gostaríamos
de ver maior presença do empresariado português na agricultura, nas indústrias,
na indústria transformadora, nas várias indústrias, não especificamente na
indústria extrativa, mas sobretudo na indústria transformadora, no turismo.
Sobretudo nessas áreas.”.
Do
ponto de vista político e diplomático, o enfoque estará nos instrumentos de
cooperação que os dois governos vão fechar, como disse Marcelo, que referiu a
“assinatura” de “cerca de 50 acordos” que devem ter “resultados efetivos em
termos financeiros para os empresários portugueses e angolanos”, mas que também
envolvem “cooperação em formação dos professores, em matéria de saúde, em
domínios que vão desde administração interna à justiça, um pouco de tudo”.
***
Não há
dúvida de que a visita de Marcelo a Angola tem forte significado político e
diplomático. Terá mesmo fortes consequências económicas, sociais e culturais.
Mas o excesso de acordos – cerca de 50 – fazem desconfiar de que muitos não
passem do papel ou levem a evocar o adágio “muita
parra, pouca uva”. Todavia, enquanto se visitam mutuamente, os Estados não
se guerreiam e fazem bons discursos.
2019.03.05 –
Louro de Carvalho
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