Depois de o Parlamento britânico ter renovado a
rejeição do acordo com a UE (União
Europeia) para o Brexit e um dia depois de Angela Merkel ter prometido “lutar até
ao fim” por uma saída ordenada do Reino Unido, a Sky News dava
conta, no início da manhã deste dia 20 de março, de que a Primeira-Ministra
britânica enviara carta a Donald Tusk, Presidente do Conselho Europeu, a
solicitar um curto alargamento do prazo – apenas um pequeno adiamento de cerca
de três meses – para fechar o acordo do Brexit, algo que vai contra as
pretensões de alguns membros do Governo, que pretendiam um adiamento mais
longo.
Porém, os
três meses são apenas uma previsão, já que não tinha ainda sido confirmado o
período de tempo que May pedira. A Sky
News e fonte governamental referiam os três meses por o dia 30 de junho ser
o último em que o Reino Unido pode permanecer na UE sem participar nas eleições
europeias. E Thersa May irá, no dia 21, a Bruxelas para a última reunião com a
UE, em que se espera, segundo a Sky News,
que os 27 Estados-membros considerem o pedido de adiamento. Porém, se a UE o
aceitar, o Parlamento terá de aprovar uma mudança na lei para remover a data de
saída atual do país de 29 de março (faltam só 9
dias) para uma nova data, algo que se
poderá avizinhar difícil.
Entretanto, Downing
Street divulgou a carta enviada a Donald Tusk, onde May escreve que “informa o Conselho Europeu de que o Reino
Unido está a pedir uma extensão do artigo 50.º (…) até 30 de junho de 2019”
e, explicando qual é a sua estratégia, pede, uma vez mais, aos líderes europeus
que ajudem o Reino Unido a sair da UE com um acordo, ou seja, pretende o
reforço dos 27 Estados-membros aos documentos sobre o backstop que
May conseguiu em Estrasburgo na semana passada, para assim poder regressar
ao Parlamento britânico e apresentar de novo o seu acordo a votação.
Nesse sentido,
a Primeira-Ministra escreveu:
“Ficaria grata se o Conselho Europeu pudesse
aprovar os documentos suplementares que eu e o presidente Jean-Claude Juncker
acordámos em Estrasburgo, colocando o Governo em posição de trazer estes
acordos à Câmara [dos Comuns] e confirmar as alterações à proposta do Governo”.
A satisfação
deste pedido de May é crucial, dado que John Bercow, presidente da Câmara dos
Comuns, anunciou, esta semana, que não permitirá nova votação do acordo, a não
ser que haja alterações “de substância” na proposta. Por outro lado, sabe-se
que, ainda que os eurolíderes aprovem estes documentos, não significa que
Bercow considere que eles constituam alteração de fundo e permita que o acordo
seja votado novamente. Contudo isto significa que May recuou na intenção que
explicitara inicialmente aos deputados: pedir uma extensão curta se o acordo
fosse aprovado até hoje, dia 20, e longa caso o não fosse. Ora, mesmo sem a
aprovação do acordo, a Chefe do Governo optou pelo adiamento curto, segundo os
jornais britânicos, graças à pressão interna dos eurocéticos do Governo. A
estratégia, segundo Faisal Islam, editor da Sky
News, é pressionar um dos lados do Parlamento com “a ameaça da saída sem
acordo” e o outro com a “ameaça de não haver Brexit”. Assim, May espera que os
deputados cedam e aprovem o acordo nas próximas semanas.
Não obstante,
as reações dos deputados na Câmara dos Comuns foram, na sua maioria, negativas.
O trabalhista Jeremy Corbyn, líder da oposição, acusou May de liderar um
Governo mergulhado no “caos” e apontou que qualquer adiamento só faz sentido se
tiver “um propósito claro”. E o conservador e eurocético Peter Bone avisou a
Chefe do Executivo de que irá “trair o povo britânico” se pedir outro adiamento
para lá deste, já que a saída está, desde início, marcada para 29 de março. E sentenciou
que “a História irá julgá-la sobre este
momento”.
Aos deputados
na Câmara dos Comuns May confessou que, como Primeira-Ministra, não está
preparada “para adiar o Brexit para lá de 30 de junho”, declaração que alguns
analistas estão a interpretar como a ameaça de que pode demitir-se se o
adiamento não for aceite. Contudo, o porta-voz de Downing Street, questionado pelos
jornalistas escusou-se a esclarecer o sentido de tal declaração.
***
Não é certo
que a UE conceda qualquer adiamento. É certo que ainda ontem, dia 19, a
chanceler alemã, Angela Merkel, garantiu que a UE irá “reagir de forma adequada
e em conjunto” e disse que pretende “lutar até ao fim” para garantir um acordo
de saída ordenada do Reino Unido da UE, apesar do impasse à volta do ‘Brexit’.
Referindo, numa
conferência, em Berlim, que ainda não era capaz de dizer qual a sua posição na
cimeira de líderes europeus para discutir o impasse sobre o ‘Brexit’, prometeu
que tudo fará para encontrar uma solução, assegurando que ia lutar até ao fim,
antes de dia 29 de março, “para que haja uma saída ordenada”.
Recorde-se que,
ativado pelo Governo britânico em 2017, o artigo 50.º do Tratado da UE estipula
dois anos de negociação para um Estado-membro sair da UE, prazo que acaba a 29
de março e que está inscrito na legislação britânica; que o acordo de retirada do
Reino Unido da UE foi rejeitado por duas vezes, no Parlamento britânico; e que a
Primeira-Ministra anunciou a intenção de voltar a submetê-lo a votação. Contudo,
o presidente da Câmara dos Comuns, com base numa convenção parlamentar
originária do século XVII, disse que o Governo não poderia reapresentar para
votação o texto inalterado durante uma mesma sessão parlamentar.
Ora, esta
posição aumenta a incerteza sobre o desenlace do processo de ‘Brexit’, que os
líderes europeus discutirão no dia 21. Todavia, um alto responsável da Comissão
Europeia disse, esta semana, que, teoricamente, Londres poderá pedir o
adiamento da saída até ao último minuto do prazo do ‘Brexit’, marcado para as
23 horas do dia 29 de março.
A este respeito, Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia,
mal conheceu o teor da carta de May, advertiu formalmente a Primeira-Ministra de
que o Brexit tem de ocorrer até entre 23 e 26 de maio e não até 30 de junho
como pedido, pois a data de extensão do artigo 50.º não deve superar a data das
eleições para o Parlamento Europeu (PE), por poder causar “dificuldades institucionais e incerteza legal”. Assim,
o principal porta-voz da Comissão, no final da reunião semanal do colégio de
comissários, detalhou que Jean-Claude Juncker advertira “formalmente a
Primeira-Ministra de que não deveria incluir uma data para a extensão [do artigo
50.º] que supere a data das eleições europeias”, que decorrem entre 23 e 26 de
maio. E precisou:
“Por isso, neste telefonema, o presidente
repetiu o conselho, que já tinha plasmado na sua carta de 11 de março, de que a
saída do Reino Unido deveria estar completa antes de 23 de maio, caso contrário
arriscamo-nos a enfrentar dificuldades institucionais e incerteza legal dada a
data das eleições europeias”.
Margaritis
Schinas reiterou a posição da Comissão de que, se a saída do Reino Unido da UE,
que se mantém prevista para 29 de março, acontecer depois de 23 de maio, o país
terá de realizar eleições para o PE – declaração a coincidir com um documento
interno apresentado esta manhã ao colégio de comissários, a que a agência France-Presse teve acesso, segundo o
qual o adiamento do ‘Brexit’ até 30 de junho causaria “graves riscos jurídicos
e políticos”, ideia que já tinha sido expressa ontem pelo negociador-chefe da
UE, Michel Barnier.
No predito
documento, a Comissão sugere que Governo britânico aceite “uma curta extensão
técnica até 23 de maio de 2019”, que permita excluir o problema das eleições
europeias no fim de maio, ou uma de “duração longa” até ao fim de 2019. Neste
segundo cenário, o período podia ser “encurtado se uma solução fosse encontrada
antes do seu final”.
Enquanto o
porta-voz falava aos jornalistas na sala de imprensa da Comissão Europeia em
Bruxelas, a líder do Governo britânico dirigia-se à Câmara dos Comuns para
confirmar que pedira adiamento da data de saída do Reino Unido da UE até 30 de
junho e considerava “inaceitável” ter de realizar eleições para o PE em maio. E
declarou:
“Eu não acredito que tais eleições sejam do
interesse de ninguém. A ideia de que, três anos depois de votar a saída da UE,
o povo deste país deveria ser convidado para eleger um novo grupo de deputados
europeus é, penso, inaceitável.”.
May
esclareceu que o Governo pretende submeter, de novo e pela terceira vez, ao Parlamento
o Acordo de Saída negociado com Bruxelas para um “voto significativo”, vincando:
“Se essa votação for aprovada, a extensão
dará à Câmara tempo para considerar a lei do Acordo de Saída. Se não, a Câmara
terá que decidir como proceder. Mas como Primeira-Ministra, eu não estou preparada
para atrasar o Brexit.”.
Ainda na
manhã deste dia 20, o presidente da Comissão Europeia previa que nenhuma
decisão pudesse ser tomada na cimeira europeia de amanhã, dia 21, ironizando:
“Não haverá nenhuma decisão. Provavelmente,
teremos de reunir na semana seguinte, porque a senhora May não consegue
entendimento sobre nada, nem no Governo dela nem no Parlamento. Enquanto não
soubermos o que a Grã-Bretanha pode aprovar, não podemos tomar uma decisão.”.
Entretanto, a
agência Reuters divulgava a notícia de
que a Comissão estará contra um adiamento até 30 de junho, constando no
documento a que a agência acedeu:
“Qualquer extensão oferecida ao Reino Unido
deverá ser ou até 23 de maio de 2019 ou substancialmente mais prolongada e que
implica a realização de eleições europeias”.
Assim, para
os europeus, ou a extensão é curta para impedir a participação nas eleições
para o PE ou deve ser bastante mais dilatada no tempo. Isso mesmo foi
confirmado, pouco depois, por Daniel Ferrie, um dos assessores da Comissão, citando
o porta-voz Margaritis Schinas:
“Juncker avisou formalmente Theresa May [num
telefonema esta quarta-feira] de que não deveria escolher uma data de extensão
para lá das eleições europeias. A saída deve ocorrer antes de 23 de maio, caso
contrário enfrentaremos dificuldades institucionais e incerteza jurídica. Se a
extensão for para lá de 23 de maio, devem ocorrer eleições [europeias].”.
E o
adiamento só ocorrerá se os responsáveis dos Estados-membros aprovarem esse
pedido; caso contrário, o Reino Unido sairá da UE a 29 de março, sem qualquer
acordo de saída.
***
Neste sentido se pronunciou o Presidente
do Conselho Europeu em reação à carta de Theresa May a pedir a extensão do
artigo 50.º: adiar o Brexit por pouco
tempo depende da Câmara dos Comuns.
O dirigente do
PE interrompeu as consultas com os líderes dos 27 para assegurar a possibilidade
duma curta extensão, como requereu a Primeira-Ministra, desde que a Câmara dos
Comuns vote favoravelmente o acordo de saída nos próximos dias. Assim, após informar os jornalistas de que recebeu a carta, revelou ter
falado ao telefone e confessou:
“À luz das conversações que tive
nos últimos dias, acredito que uma extensão curta pode ser possível, mas está
dependente de um voto positivo sobre o acordo de retirada na Câmara dos Comuns”.
Sobre a duração
da extensão, afirmou que o tema “está em aberto” e que a proposta de May, de 30
de junho, “tem os seus méritos mas abre
questões legais que irão ser debatidas amanhã”.
É certo que o
presidente da Comissão advertiu que uma extensão curta não devia ultrapassar a
data das eleições europeias, que se realizam entre 23 e 26 de maio, contudo Donald
Tusk, que já defendeu a possibilidade duma extensão longa do artigo 50.º caso o
Reino Unido não encontre uma solução, mostrou-se confiante em que o processo
chegue a bom porto. E observou:
“Nesta altura não é necessário um
conselho europeu extraordinário se os líderes aceitarem as minhas propostas e
se a Câmara dos Comuns chegar a um acordo. (…) Apesar de a fadiga do Brexit estar a crescer, não
podemos desistir até ao último momento. (…) Estou confiante de que não nos vai
faltar paciência e boa vontade neste momento.”.
***
Enfim, teremos
Brexit. Resta saber se é a 29 de março ou mais tarde e se é com acordo ou sem
acordo. Resta saber ainda se os eleitores britânicos têm de
votar para o PE e se o Reino Unido terá direito a um comissário europeu e por
quanto tempo.
O povo britânico votou favoravelmente a saída da UE. Porém, não compete aos eleitores operacionalizar as condições de saída. E dá-me a impressão de que o Parlamento, em vez de se assumir como representante do povo, se estriba no seu poder para querer a Lua baralhando cada vez mais as coisas.
O povo britânico votou favoravelmente a saída da UE. Porém, não compete aos eleitores operacionalizar as condições de saída. E dá-me a impressão de que o Parlamento, em vez de se assumir como representante do povo, se estriba no seu poder para querer a Lua baralhando cada vez mais as coisas.
Uma coisa é
certa. Não podem os cidadãos britânicos estar simultaneamente na UE e fora da UE,
ou seja, com os benéficos e sem as obrigações. Esta não é opção: ainda que fosse
possível, não seria responsável e solidária!
2019.03.20 – Louro de Carvalho
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