quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

“É o amor de Cristo que nos impele”

Tem início hoje, dia 18, no hemisfério norte, a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos (vai até ao dia 25, festa da Conversão de São Paulo), que ficará marcada por diversas iniciativas em que sobressaem diversos momentos de oração e reflexão ecuménica.
O material de subsídios para inspirar tais ações foi preparado e publicado, em conjunto, pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos e pela Comissão Fé e Constituição do Conselho Mundial de Igrejas. E é material que pode ser utilizado em qualquer ocasião do ano de 2017.
Porque passa neste ano o 500.º aniversário da Reforma, fica em destaque a Alemanha como o país-berço deste evento-chave dos movimentos que marcaram a vida da Igreja ocidental por vários séculos e deram azo a uma reorientação da política geral sobretudo na Europa.
Na verdade, no ano de 1517, Martinho Lutero sentiu fortes preocupações pelos abusos da Igreja de Roma e exprimiu-as nas suas 95 teses, que tornou públicas.
O evento, que foi muito mal recebido pela Igreja católica, estendeu-se por outros países da Europa e ganhou formas e modalidades diversas conforme a opção dos diversos reformadores e as circunstâncias específicas de cada Estado em que a Reforma se instaurou. Nem sempre, como no caso de Inglaterra, o movimento teve uma causa teológica global.
E a própria Igreja Católica de Romana respondeu com o movimento de Reforma interna que os historiadores denominaram de Contrarreforma, levado a cabo pelo Concílio de Trento. Ao mesmo tempo, começaram a surgir Ordens e Congregações Religiosas. Entre estas, destaca-se a Companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola. Mas há outras que apareceram movidas por inquietações por uma genuína renovação cristã. Assim, surgiram: a Ordem dos Teatinos (1524), austera e ascética, fundada pelos cardeais Caetano de Thiene e Carafa; a Ordem dos Barnabitas (1534) do claustro de São Barnabé, fundada por Santo António Maria Zacarias, auxiliado por Bartolomeu Ferreira e Morigia, com o escopo de educar a juventude e pregar missões; os Somascos (a 1.ª casa foi em Somasca), fundados por São Jerónimo Emiliano, fidalgo veneziano, com alguns padres lombardos, com a finalidade de cuidar dos órfãos, pobres e doentes; os Oratorianos, fundados por São Filipe de Néri e pelo cardeal Bérule; os Oblatos de Santo Ambrósio, idealizados por Carlos Borromeo para a cura de almas e auxílio do arcebispo de Milão; os Capuchinhos como novo tronco dos Franciscanos, alcançando grande popularidade pela austeridade de vida, dedicação ao ensino, aos pobres e doentes; as Ursulinas, de Angela de Merici, em Bréscia; e a Congregação de Nossa Senhora, para formar educadoras de moças, segundo as normas de Pedro Fourier. Depois, aparecem em Espanha Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz, que operaram a reforma do Carmelo.
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Mas o evento, como reconhece o documento inspirador da Semana para 2017, tem sido tema de controvérsia na história das relações intereclesiais na Alemanha, e não menos nestes últimos anos. Por isso, a EKD (Igreja Evangélica na Alemanha) tem estado a preparar-se para este V centenário desde 2008, focalizando, em cada ano, um aspeto particular da Reforma, como, por exemplo, a Reforma e a Política ou a Reforma e a Educação. E convidou os seus parceiros ecuménicos em vários níveis para ajudar a comemorar os eventos de 1517.
Ora, depois de extensas e, às vezes, difíceis discussões, as Igrejas na Alemanha concordaram em que o modo para comemorar ecumenicamente a Reforma deveria ser uma Christusfest – uma Celebração de Cristo. Colocando a ênfase em Jesus Cristo e a sua obra de reconciliação como centro da fé cristã, todos os parceiros ecuménicos – católicos romanos, ortodoxos, batistas, metodistas, menonitas e outros – podem participar das festividades desse aniversário pentassecular.
Tendo em conta que a história da Reforma foi marcada por dolorosa divisão, esta iniciativa das Igrejas da Alemanha constitui um importante avanço. E, neste sentido, a Comissão Luterana-Católica Romana sobre a Unidade tem trabalhado com afinco para produzir uma compreensão partilhada desta comemoração. O seu documento Do Conflito à Comunhão, reconhece que ambas as tradições abordam este aniversário numa era ecuménica, após as conquistas de 50 anos de diálogo e com novas compreensões da sua própria história e teologia. Deixando de parte os aspetos polémicos, nas visões teológicas da Reforma, os católicos agora são capazes de ouvir o desafio de Lutero à Igreja, reconhecendo-o como uma “testemunha do evangelho”. E assim, depois de séculos de condenações e depreciações mútuas, em 2017 cristãos luteranos e católicos irão pela primeira vez comemorar, juntos, o início da Reforma.
A partir deste acordo e do ampliado contexto ecuménico emerge o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos deste ano: “Reconciliação: é o amor de Cristo que nos impele (cf 2 Cor 5,14).
De facto, quando a comissão nacional alemã de planeamento se reuniu no outono de 2014, rapidamente ficou assente que os materiais desta Semana de Oração deveriam ter dois destaques: uma celebração do amor e da graça de Deus, a “justificação da humanidade somente pela graça”, refletindo a ideia principal das Igrejas marcadas pela Reforma de Lutero; e o reconhecimento da dor das subsequentes profundas divisões que afligiram a Igreja, com menção aberta de culpa e oferta duma oportunidade para dar passos na direção da reconciliação.
Porém, foi a exortação apostólica do Papa Francisco, em 2013, Evangelii Gaudium (A Alegria do Evangelho) que deu o tema para este ano, quando usou a citação “O amor de Cristo nos impele” (n.º 9) Com essa frase da Escritura (2Cor 5,14), tomada no contexto de todo o capítulo 5 da 2.ª carta aos Coríntios, a comissão alemã formulou o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos 2017.
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Todos os momentos de oração e reflexão da Semana partem do texto bíblico: 2 Coríntios 5, 14-20. Este texto enfatiza a reconciliação como dom de Deus m prol de toda a criação. “Era Deus que em Cristo reconciliava o mundo (kosmos) consigo, não imputando aos homens as suas faltas e pondo em nós a palavra de reconciliação” (v. 19). Como resultado da ação de Deus, a pessoa que reconciliada em Cristo é chamada a proclamar essa reconciliação em palavras e atos: “O amor de Jesus nos impele” (v. 14). “É em nome de Cristo que exercemos a função de embaixadores e, por nós, é o próprio Deus que, na realidade, vos dirige um apelo. Em nome do Cristo, nós vos suplicamos, deixai-vos reconciliar com Deus” (v. 20). Mas esta reconciliação não é feita sem sacrifício. Jesus deu sua vida por todos. Os embaixadores da reconciliação são chamados, em seu nome, a dar as suas vidas de modo similar. Não vivem mais para si, mas por aquele que morreu por eles.
Assim, aquele texto bíblico modela as reflexões dos oito dias, que desenvolvem alguns dos enfoques teológicos de versículos, do modo seguinte:
Dia 1: Um morreu por todos;
Dia 2: Não vivam mais para si mesmos;
Dia 3: Não conhecemos ninguém à maneira humana;
Dia 4: O mundo antigo passou;
Dia 5: Tudo se tornou uma realidade nova;
Dia 6: Deus nos reconciliou consigo;
Dia 7: O ministério da reconciliação;
Dia 8: Reconciliados com Deus.
E, à luz desta temática, desenvolvem-se atos de culto, com oração, meditação, pedido de perdão e canto das maravilhas de Deus; eventos de reflexão teológica e histórica; colocação em destaque de objetos simbólicos, como a vela; campanha pela valorização e veneração da Bíblia como Palavra de Deus; e valorização de gestos, como evocação da queda do muro de Berlim, ou a peregrinação a Wittenberg.
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Assim, espera-se que a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos constitua um dos momentos mais frutuosos de celebração do V centenário da Reforma.
A este respeito, há que ter em conta o que disse hoje o Papa depois da catequese semanal de quarta-feira.
O Pontífice deu as boas-vindas à delegação do Itinerário Europeu Ecuménico, enalteceu sua visita a Roma, que definiu como “um importante sinal ecuménico que expressa a comunhão alcançada graças ao caminho do diálogo nas décadas passadas. De facto, “o Evangelho de Cristo está no centro da nossa vida e une pessoas que falam línguas diferentes, moram em países diferentes e vivem a fé em comunidades diferentes”.
Recordando a oração ecuménica em Lund, no dia 31 de outubro passado, na Suécia, reconhece que, “no espírito daquela homenagem comum à Reforma, vemos mais  o que nos une do que o nos divide e continuamos juntos o caminho para aprofundar nossa comunhão e dar a ela uma forma cada vez mais visível”.
E, assinalando a importância do movimento ecuménico para a Europa, disse:
“Na Europa, esta comum fé em Cristo é como uma linha verde de esperança: pertencemos uns aos outros. Comunhão, reconciliação e unidade são possíveis. Como cristãos, temos a responsabilidade desta mensagem e devemos testemunhá-la com a nossa vida. Que Deus abençoe este desejo de união e vele por todas as pessoas que percorrem o caminho da unidade.”.

2017.01.18 – Louro de Carvalho

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