Tem início hoje, dia 18, no
hemisfério norte, a Semana de Oração pela
Unidade dos Cristãos (vai até ao dia
25, festa da Conversão de São Paulo), que ficará marcada por diversas iniciativas em que sobressaem diversos
momentos de oração e reflexão ecuménica.
O material de subsídios para
inspirar tais ações foi preparado e publicado, em conjunto,
pelo Pontifício Conselho
para a Promoção da Unidade dos Cristãos e
pela Comissão Fé e Constituição do Conselho Mundial de Igrejas. E
é material que pode ser utilizado em qualquer ocasião do ano de 2017.
Porque passa neste ano o 500.º
aniversário da Reforma, fica em destaque a Alemanha como o país-berço deste
evento-chave dos movimentos que marcaram a vida da Igreja ocidental por vários
séculos e deram azo a uma reorientação da política geral sobretudo na Europa.
Na verdade,
no ano de 1517, Martinho Lutero sentiu fortes preocupações pelos abusos da
Igreja de Roma e exprimiu-as nas suas 95 teses, que tornou públicas.
O evento,
que foi muito mal recebido pela Igreja católica, estendeu-se por outros países da
Europa e ganhou formas e modalidades diversas conforme a opção dos diversos
reformadores e as circunstâncias específicas de cada Estado em que a Reforma se
instaurou. Nem sempre, como no caso de Inglaterra, o movimento teve uma causa
teológica global.
E a própria Igreja
Católica de Romana respondeu com o movimento de Reforma interna que os
historiadores denominaram de Contrarreforma, levado a cabo pelo Concílio de
Trento. Ao mesmo tempo, começaram a surgir Ordens e Congregações Religiosas. Entre
estas, destaca-se a Companhia de Jesus,
fundada por Inácio de Loyola. Mas há outras que apareceram movidas por
inquietações por uma genuína renovação cristã. Assim, surgiram: a Ordem dos
Teatinos (1524), austera e ascética, fundada pelos
cardeais Caetano de Thiene e Carafa; a Ordem dos Barnabitas (1534) do claustro de São Barnabé, fundada por Santo António
Maria Zacarias, auxiliado por Bartolomeu Ferreira e Morigia, com o escopo de
educar a juventude e pregar missões; os Somascos (a 1.ª casa
foi em Somasca), fundados
por São Jerónimo Emiliano, fidalgo veneziano, com alguns padres
lombardos, com a finalidade de cuidar dos órfãos, pobres e doentes; os
Oratorianos, fundados por São Filipe de Néri e pelo cardeal
Bérule; os Oblatos de Santo Ambrósio, idealizados por Carlos
Borromeo para a cura de almas e auxílio do arcebispo de Milão; os Capuchinhos como
novo tronco dos Franciscanos, alcançando grande popularidade pela
austeridade de vida, dedicação ao ensino, aos pobres e doentes; as Ursulinas,
de Angela de Merici, em Bréscia; e a Congregação de Nossa Senhora, para
formar educadoras de moças, segundo as normas de Pedro Fourier. Depois,
aparecem em Espanha Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz, que operaram a reforma
do Carmelo.
***
Mas o
evento, como reconhece o documento inspirador da Semana para 2017, tem sido
tema de controvérsia na história das relações intereclesiais na Alemanha, e não
menos nestes últimos anos. Por isso, a EKD (Igreja Evangélica na Alemanha) tem estado a preparar-se para este V centenário desde
2008, focalizando, em cada ano, um aspeto particular da Reforma, como, por
exemplo, a Reforma e a Política ou a Reforma e a Educação. E convidou os seus
parceiros ecuménicos em vários níveis para ajudar a comemorar os eventos de
1517.
Ora, depois
de extensas e, às vezes, difíceis discussões, as Igrejas na Alemanha
concordaram em que o modo para comemorar ecumenicamente a Reforma deveria ser
uma Christusfest – uma Celebração de Cristo. Colocando a
ênfase em Jesus Cristo e a sua obra de reconciliação como centro da fé cristã,
todos os parceiros ecuménicos – católicos romanos, ortodoxos, batistas,
metodistas, menonitas e outros – podem participar das festividades desse
aniversário pentassecular.
Tendo em
conta que a história da Reforma foi marcada por dolorosa divisão, esta
iniciativa das Igrejas da Alemanha constitui um importante avanço. E, neste
sentido, a Comissão Luterana-Católica Romana sobre a Unidade tem trabalhado com
afinco para produzir uma compreensão partilhada desta comemoração. O seu documento Do
Conflito à Comunhão, reconhece que ambas as tradições abordam este
aniversário numa era ecuménica, após as conquistas de 50 anos de diálogo e com
novas compreensões da sua própria história e teologia. Deixando de parte os
aspetos polémicos, nas visões teológicas da Reforma, os católicos agora são capazes
de ouvir o desafio de Lutero à Igreja, reconhecendo-o como uma “testemunha do
evangelho”. E assim, depois de séculos de condenações e
depreciações mútuas, em 2017 cristãos luteranos e católicos irão pela primeira
vez comemorar, juntos, o início da Reforma.
A partir
deste acordo e do ampliado contexto ecuménico emerge o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos
deste ano: “Reconciliação: é o amor de Cristo que nos impele (cf 2 Cor
5,14).
De facto, quando
a comissão nacional alemã de planeamento se reuniu no outono de 2014, rapidamente
ficou assente que os materiais desta Semana de Oração deveriam ter dois destaques:
uma celebração do amor e da graça de Deus, a “justificação da humanidade
somente pela graça”, refletindo a ideia principal das Igrejas marcadas pela
Reforma de Lutero; e o reconhecimento da dor das subsequentes profundas
divisões que afligiram a Igreja, com menção aberta de culpa e oferta duma
oportunidade para dar passos na direção da reconciliação.
Porém, foi a
exortação apostólica do Papa Francisco, em 2013, Evangelii Gaudium (A Alegria do
Evangelho) que deu o tema para este ano,
quando usou a citação “O amor de Cristo
nos impele” (n.º 9) Com essa
frase da Escritura (2Cor 5,14), tomada no
contexto de todo o capítulo 5 da 2.ª carta aos Coríntios, a comissão alemã
formulou o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos 2017.
***
Todos os momentos
de oração e reflexão da Semana partem do texto bíblico: 2 Coríntios 5, 14-20. Este texto enfatiza a
reconciliação como dom de Deus m prol de toda a criação. “Era Deus que em Cristo reconciliava o mundo (kosmos) consigo, não
imputando aos homens as suas faltas e pondo em nós a palavra de reconciliação” (v. 19). Como
resultado da ação de Deus, a pessoa que reconciliada em Cristo é chamada a
proclamar essa reconciliação em palavras e atos: “O amor de Jesus nos impele” (v. 14). “É em nome de Cristo que exercemos
a função de embaixadores e, por nós, é o próprio Deus que, na realidade, vos
dirige um apelo. Em nome do Cristo, nós vos suplicamos, deixai-vos reconciliar
com Deus” (v. 20). Mas esta reconciliação não é
feita sem sacrifício. Jesus deu sua vida por todos. Os embaixadores da
reconciliação são chamados, em seu nome, a dar as suas vidas de modo similar.
Não vivem mais para si, mas por aquele que morreu por eles.
Assim, aquele
texto bíblico modela as reflexões dos oito dias, que desenvolvem alguns dos
enfoques teológicos de versículos, do modo seguinte:
Dia 1: Um
morreu por todos;
Dia 2: Não
vivam mais para si mesmos;
Dia 3: Não
conhecemos ninguém à maneira humana;
Dia 4: O
mundo antigo passou;
Dia 5: Tudo
se tornou uma realidade nova;
Dia 6: Deus
nos reconciliou consigo;
Dia 7: O
ministério da reconciliação;
Dia 8:
Reconciliados com Deus.
E, à luz desta
temática, desenvolvem-se atos de culto, com oração, meditação, pedido de perdão
e canto das maravilhas de Deus; eventos de reflexão teológica e histórica;
colocação em destaque de objetos simbólicos, como a vela; campanha pela valorização
e veneração da Bíblia como Palavra de Deus; e valorização de gestos, como
evocação da queda do muro de Berlim, ou a peregrinação a Wittenberg.
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Assim,
espera-se que a Semana de Oração pela
Unidade dos Cristãos constitua um dos momentos mais frutuosos de celebração
do V centenário da Reforma.
A este respeito, há que ter em conta o que disse hoje o Papa depois da
catequese semanal de quarta-feira.
O Pontífice deu as boas-vindas à delegação do
Itinerário Europeu Ecuménico, enalteceu sua visita a Roma, que definiu como “um
importante sinal ecuménico que expressa a comunhão alcançada graças ao caminho
do diálogo nas décadas passadas. De facto, “o Evangelho de Cristo está no
centro da nossa vida e une pessoas que falam línguas diferentes, moram em
países diferentes e vivem a fé em comunidades diferentes”.
Recordando a
oração ecuménica em Lund, no dia 31 de outubro passado, na Suécia,
reconhece que, “no espírito daquela homenagem comum à Reforma, vemos mais
o que nos une do que o nos divide e continuamos juntos o caminho para aprofundar nossa comunhão e dar a ela uma
forma cada vez mais visível”.
E, assinalando a importância do movimento ecuménico
para a Europa, disse:
“Na Europa, esta comum fé em Cristo
é como uma linha verde de esperança: pertencemos uns aos outros. Comunhão, reconciliação e unidade são possíveis. Como
cristãos, temos a responsabilidade desta mensagem e devemos testemunhá-la com a
nossa vida. Que Deus abençoe este desejo de união e vele por todas as pessoas
que percorrem o caminho da unidade.”.
2017.01.18 – Louro de Carvalho
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