É legítimo e
normal que os detentores de cargos públicos peçam a demissão, mas se mantenham
em exercício até que os sucessores tomem posse e iniciem funções. Não foi assim
com António Domingues. Porquê? O que o faz correr? Havia razão para o endeusar
a partir duma pretensa origem humilde e pobre, com uma subida a pulso na vida?
A sua entrada
para a CGD, com as exigências de exceção que parece ter logrado por via
negocial com o Governo e ratificadas por decreto-lei de legitimidade
controversa e a sua disposição de abandono do cargo mercê da obrigação de
declaração de rendimentos e de património junto do Tribunal Constitucional fazem-me
lembrar coisas. Obviamente que não vou entrar pelo lado da dificuldade de
encontrar forma de contornar as exigências de compatibilidade ou pela
impossibilidade de acumular a pensão de reforma haurida pelo trabalho no BPI
com o “magro” (?!) vencimento e os míseros (?!) prémios de desempenho
decorrentes da ex-sua presidência da CGD, sem saudades. Mas lembro-me do
complexo aforístico badalado até à saciedade pela opima sabedoria popular: Não sirvas a quem serviu, não peças a quem
pediu, não devas a quem deveu.
Essa de
subir a pulso é muitas vezes real e meritória, mas, não raro, é reveladora da
soberba da vida que estava encoberta pelo vulto e se descobriu quando as
circunstâncias se tornaram propícias.
Pela lógica
das coisas, do famoso decreto-lei que retirava os gestores da CGD do estatuto
de gestor público já nada resta. Se o rico teve de entregar a predita
declaração no início de mandato, também terá de a entregar no fim de mandato. Por
isso, é tão verdadeira (?!) a asserção de que A. Domingues não fica mais um dia
à frente da Caixa Geral de Depósitos para não entregar a declaração como a alegada
asserção de que não saía por causa das declarações.
Sendo assim
e porque não foi só o Governo e a oposição que andaram mal na questão da CGD,
há que dizê-lo claramente: devem ser assacadas responsabilidades a António Domingues
pelas frustrantes expectativas que criou nos clientes da CGD – muitos de nós pequenos
clientes, mas dificilmente temos outras hipóteses de clientela noutro banco – e
nos contribuintes, dado que se trata do banco público. Parece que eram avisadas
as reservas dos funcionários face à equipa!
E, se aos políticos
as contas se fazem no términus da legislatura por via eleitoral, a menos que haja
cometimento de ilícito criminal, a quem abandona inexoravelmente um cargo
público desta natureza, não se pode agradecer o trabalho, mas a indemnização
por danos imateriais, nomeadamente o goramento de legítimas expectativas.
***
Segundo o Jornal de Negócios, A. Domingues
rejeitou prolongar o seu mandato até ao final de janeiro, quando deverá entrar em
exercício a equipa liderada por Paulo Macedo, tendo informado o Ministro das
Finanças, Mário Centeno, no passado dia 30 de dezembro. E a Lusa, referiu que fonte do Ministério
das Finanças confirmara que António Domingues declinara “o pedido feito para se
manter em funções por mais uns dias”. Por isso, “o período de transição será
inteiramente assegurado pelos membros da atual administração que mantêm os
respetivos mandatos, sendo expectável que a nova equipa tome posse nos próximos
dias”.
O Jornal de Negócios revela que, na recusa
enviada a Mário Centeno, o então líder da CGD, que se demitiu a 25 de novembro,
aduz que não era possível “assegurar as condições jurídicas para aceitar o
prolongamento do mandato por mais um mês face ao final de dezembro, data em que
terminaria funções”. Boa desculpa, e só isso, a das condições jurídicas!
Para o Ministério
das finanças, o adiamento da saída efetiva acautelava a demora na entrada de
Paulo Macedo para o banco público. E, no mesmo dia 30, a equipa de gestão da
CGD liderada por Domingues indicou que permaneceria em funções até que a futura
administração, de Paulo Macedo, recebesse luz verde do Banco Central Europeu
(BCE).
Segundo a Lusa, apoiada em fonte oficial do Ministério
das Finanças, confirma-se que a transição será assegurada pelos restantes membros
da atual equipa não demissionários.
A lista
completa dos futuros administradores da CGD ainda não é conhecida, mas já foi
encaminhada pelo Governo para o BCE, que tem que dar o seu aval aos nomes
propostos, o que ainda não aconteceu. Quando Frankfurt aprovar os novos membros
do Conselho de Administração da CGD, que terá Paulo Macedo como presidente
executivo e Rui Vilar como “chairman”,
estarão criadas as condições para que os mesmos assumam os cargos.
***
Num primeiro
momento, acreditou-se que António Domingues, que apresentou, como se disse, em 25
de novembro, a sua renúncia à liderança da CGD, pelo que deveria sair do banco
público no final do ano, tinha acedido ao apelo da tutela para assegurar este
período de transição, que deverá ser relativamente curto. Pelos visto, foi uma falsa
notícia.
Porém,
na tarde do dia 30 de dezembro, o presidente
demissionário da CGD informou o Ministro das Finanças de que deixaria, de imediato,
a liderança do banco público, sem esperar pelo aval do BCE para que o seu sucessor,
Paulo Macedo, inicie formalmente funções.
Porém, o Expresso on line
noticiou, na tarde do mesmo dia 30, citando fonte do Ministério das Finanças,
que Domingues e a restante equipa tinham concordado em adiar a sua saída do
banco, de forma a acautelar eventuais atrasos na aprovação do nome de Macedo em
Frankfurt – decisão que o BCE só tomará depois de 10 de janeiro.
Assim, até à posse da nova administração, a gestão corrente da CGD passará
agora a ser assegurada pelos quatro administradores que permanecem no banco:
Rui Vilar, João Martins, Tiago Marques e Pedro Leitão – que não poderão, no
entanto, tomar decisões que, de si, exijam luz verde do conselho de
administração.
***
Entretanto, Domingues
enviou SMS a Centeno a lamentar o comportamento das Finanças. Era expectável que
Centeno, se quisesse pagar com a mesma moeda, também enviasse a Domingues um
SMS a lamentar a postura do ex-presidente da CGD.
De facto, António Domingues deixou o seu gabinete vago para Paulo Macedo no dia 23; na noite de 29, o Ministro pediu-lhe que ficasse mais um mês; no dia seguinte, Domingues disse que não. E hoje, segunda-feira, dia 2, Domingues enviou o tal SMS a Centeno.
É certo que o Ministro não faz tudo o que deseja, nem pode
tudo. Mas Domingues, por sua conta e risco, faz passar a CGD por uma história tão
insólita como degradante. E o artista gozou o Natal tranquilo a gozar os contribuintes, clientes e
colaboradores. Não voltou, reformou-se. E gozou 5 dias úteis de férias para
descansar antes de empreender o seu trabalho de reformado, eu se espera magno e
bem pago.
De facto, António Domingues deixou o seu gabinete vago para Paulo Macedo no dia 23; na noite de 29, o Ministro pediu-lhe que ficasse mais um mês; no dia seguinte, Domingues disse que não. E hoje, segunda-feira, dia 2, Domingues enviou o tal SMS a Centeno.
Homens destes não merecem nada! E quem neles confia merece?
2017.01.02 – Louro de Carvalho
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