sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Mascarenhas Barreto, um português polivalente

Morreu em Lisboa, no passado dia 3 de janeiro, Mascarenhas Barreto – de seu nome completo Augusto Cassiano Neves Mascarenhas de Andrade Barreto, que o mundo do fado assume como seu. Mas ele era historiador, musicólogo, poeta de fado e tradutor. Tinha 93 anos (faltavam 24 dias para completar os 94), muitos deles dedicados à escrita e à tradução de livros, sobretudo policiais (uma das suas maiores paixões), mas também à poesia para fado, onde se notabilizou ao lado do fadista e compositor António dos Santos. E também foi cantado por Carlos Ramos, Carlos do Carmo e outros fadistas a partir dos anos 60 até aos dias de hoje. Foi o autor de livros de investigação sobre o fado e as suas origens. São dele as obras “Fado, A Canção Portuguesa” (1959), “Portugal do Fado” (1960) – este em parceria com Carlos Branco, um arrojado livro que juntava fotografias e poesia – e “O Fado – Origens Líricas e Motivações Poéticas” (1980).
Recentemente, vários jovens fadistas incluíram poemas de Mascarenhas Barreto nos seus discos – nomeadamente Marco Oliveira, “Gaivotas em Terra” e Ricardo Ribeiro “Fado é Canto Peregrino” e “Partir é Morrer um Pouco”) – todos eles extraídos do reportório de António dos Santos. Também editou livros sobre tourada, como “Breve História da Tauromaquia em Portugal”, e, nas últimas décadas, notabilizou-se por vários livros em que sustenta a sua polémica tese de que Cristóvão Colombo era, afinal, português. Em meados dos anos 60 foi o organizador, com José Freire, de uma coletânea em LP “The Styles of Fado”, edição da Estúdio, que reunia gravações de Francisco Carvalhinho, Armandinho, Plínio Sérgio, Maria José da Guia, Maria da Fé, Manuel de Almeida, Glória, Adriano Franco e Nuno de Aguiar.
A agência Lusa referia que falecera “o investigador, romancista, tradutor e poeta Augusto Mascarenhas Barreto, de 93 anos, autor da obra “O Fado – Origens Líricas e Motivações Poéticas”. E à mesma agência Lusa dizia o fadista Ricardo Ribeiro: “Morreu um grande fadista, um português de talento, um erudito”.
Ricardo Ribeiro gravou, de Mascarenhas Barreto, “Fado é Canto Peregrino”, uma criação de António dos Santos, intérprete que, deste autor, gravou também “Partir é Morrer um Pouco”. O recém-finado, que ia completar 94 anos no próximo dia 27, é autor, entre outras obras históricas, de “O Português Cristóvão Colombo, Agente Secreto do Rei D. João II” (1988), da Editora Referendo, que foi editada em inglês sob o título “The Portuguese Columbus – Secret Agent of King John II” (1992), da Editora McMillan (Grã-Bretanha). E foi um destacado investigador sobre as origens de Cristóvão Colombo, que apontava como portuguesas. Segundo Mascarenhas Barreto, Colombo não era genovês, mas português, natural de Cuba, no Baixo Alentejo, filho de D. Fernando, duque de Beja e de Viseu, e de Isabel Gonçalves Zarco, tendo sido um espião ao serviço do rei D. João II. No âmbito desta problemática investigatória, publicou “Colombo português: Provas Documentais” (1997), em dois volumes”, da Editora Arrancada.
A sua tese é compartilhada por Manuel Luciano da Silva, médico e pesquisador luso-norte-americano, que publicou, juntamente com a mulher, Sílvia Jorge da Silva, o livro “Cristóvão Cólon (Colombo) Era Português”.
As principais conclusões do seu trabalho são que Cristóvão Colombo não era genovês, mas português, natural de Cuba, Alentejo; era filho de Dom Fernando, duque de Beja e de Viseu, e de Isabel Gonçalves Zarco; o nome de Cristóvão Colombo era um criptónimo de Salvador Fernandes Zarco; sendo filho de Dom Fernando, era neto do rei de Portugal; foi também neto de João Gonçalves Zarco, um dos descobridores de Porto Santo e da Madeira; e foi uma espécie de espião, ao serviço de sua majestade, neste caso, El Rei D. João II (que a história consagrou como “Príncipe Perfeito”), cuja missão bem-sucedida, foi a de desviar a atenção dos Reis de Castela, Fernando e Isabel, do caminho marítimo para a Índia, oferecendo-lhes “de bandeja” um caminho alternativo, presumivelmente mais curto, pelo Ocidente, e um novo continente que já constava já nos mapas portugueses.
Pretendia-se que os Reis Católicos acreditassem que tinham chegado à Índia, tese que Cristóvão Colombo, sempre fiel à coroa portuguesa, defendeu – por lealdade para com o rei de Portugal, que o recebeu no regresso da primeira expedição – até à sua morte em 1506.
Na esteira deste trabalho de investigação sobre o Colombo Português, Manuel da Silva Rosa esclarece detalhadamente o caso com a publicação, em 2009, do livro “Colombo Português – o Homem que enganou os reis espanhóis e serviu o genial rei D. João II”, da Editora Ésquilo, cujo editor afirma que “algo está a mudar na historiografia portuguesa” e com prefácio de Joaquim Veríssimo Serrão. Mas a sua tese, embora afirme a nacionalidade portuguesa do navegador, dá-lhe outra identidade.
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Na edição do passado dia 10 de janeiro do semanário “O Diabo”, Brandão Ferreira, oficial Piloto Aviador, não é parco em loas a Mascarenhas Barreto, destacando nele a honra, a parcialidade e a portugalidade e considerando-o “um Homem de caráter e um Português inteiro”, de que nos dá o perfil biográfico.
Nascido em 27 de janeiro de 1923, em Lisboa, terminou o curso liceal no Liceu Pedro Nunes com a idade de 17 anos. E, querendo ir para África, preparou-se na Escola Superior Colonial, que frequentou por 2 anos ao mesmo tempo que cursava árabe na Faculdade de Letras de Lisboa. E, em 1944, partiu para Angola onde serviu como secretário do Governador-Geral e do Governador do Congo. Ali, colaborou nos jornais “Província de Angola” e Diário de Luanda” e escreveu algumas obras.
Regressado à Metrópole em 1949, cumpriu o serviço militar no Regimento de Lanceiros 2 e ingressou na GNR onde atingiu o posto de capitão, mas vindo a abandonar a vida militar para ingressar na RTP em 1958, onde ocupou o lugar de chefe de serviço dos estúdios, no que lhe foi útil o curso de Rádio Televisão e Radar, que tirou durante a prestação do serviço militar, ministrado na Escola Eletromecânica de Paço d’ Arcos.
Interrompeu, por 2 anos, o serviço na RTP para desempenho dum cargo no SNI (Secretariado Nacional de Informação), que visava dar início ao turismo, tendo criado as primeiras zonas turísticas do país. 
Regressou à RTP, onde se manteve até ao ano de 1974, ano da revolução abrilina que lhe ofereceu um despedimento por “justa” causa. Passou a lecionar, sucessivamente, no Instituto de Novas Profissões e no Instituto do Designe Marketing, em Lisboa, tendo deixado a lecionação aos 75 anos.
Foi escolhido, em 1983, para responsável de um dos núcleos da XVII Exposição de Arte, Ciência e Cultura, que teve como centro expositor a Torre de Belém, em Lisboa.
Além de ter estudado russo e tétum no Instituto de Ciências Ultramarinas (hoje Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, da Universidade de Lisboa) e medicina social, foi um emérito desportista, praticando hipismo, boxe, esgrima, pentatlo militar, vela e tiro – vindo a ficar em 1.º lugar em várias competições internacionais e tendo participado nas Olimpíadas de Helsínquia, em 1952. Também tirou o brevet de piloto particular de aviões e foi pegador de touros, durante 11 anos, no Grupo de Forcados de Vila Franca de Xira e no Grupo de Forcados de Cascais.
Com os livros dedicados a Colombo, quebrou a tese plurissecular da origem genovesa do almirante das Américas ou das Índias Ocidentais a ponto de os académicos, não abertos à reabertura da investigação sobre temas “conseguidos”, começarem a responder dizendo que este discurso não passava da mera ficção, provavelmente por não ser tratar de um quadro ilustre das Academias. É o domínio do politicamente correto ou do cientificamente instalado.
Seja como for, Mascarenhas Barreto, como diz Brandão Ferreira, “relançou o debate sobre aquela figura maior da História Universal, aproximando-se muito de poder provar inequivocamente que aquele navegador era um nobre português, que esteve ao serviço de D. João II”. Denunciou a instalação de muitos interesses, aguentou muitos debates e controvérsias e proferiu dezenas de conferências no país e no estrangeiro, tendo sido apoiado por numerosas individualidades, ao mesmo tempo que suportou inúmeros ataques desferidos contra si.
Pelo seu desempenho na investigação sobre a vida de Colombo, era membro honorário da Associação Cristóvão Colon, cujo objetivo é provar a nacionalidade portuguesa do “descobridor” do novo mundo.
Era efetivamente um português polivalente e amante da vida e da atividade.

2017.01.13 – Louro de Carvalho

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