A Câmara do
Comércio e Indústria Portuguesa (CCI) encomendou a um conjunto alargado de juristas e economistas um estudo
denominado “Ideias para Portugal”, que contou
com a participação de várias personalidades próximas do PS e do PSD, entre as
quais Óscar Gaspar, Mário Centeno, Brilhante Dias, Luís Pais Antunes e Sofia
Galvão.
Trata-se de um estudo que parece vir em
contraponto com o cenário macroeconómico elaborado pelos sábios mobilizados por
António Costa, vertido em relatório sob o título Uma Década Para Portugal, para servir de base de trabalho para
desenho do programa eleitoral do PS.
“Ideias para Portugal” abrange uma série de áreas
sobre as quais incide a governação e define uma série de caminhos possíveis
para reformar o País (apresenta mais de uma centena de ideias), salientando-se três áreas: a da Segurança Social, proteção do emprego e
mercado de trabalho; a da Saúde; e a da competitividade.
As reflexões para a área da Segurança Social e mercado
de trabalho foram coordenadas por Luís Pais Antunes, advogado e antigo
secretário de Estado da Segurança Social de governo do PSD/CDS; na área da
competitividade, os trabalhos foram conduzidos por Pedro Madeira Rodrigues, da
CCI; e, na área da saúde, a liderança foi confiada a Guilherme Magalhães, da
José de Mello Saúde. Entre o painel de sábios consultados e citados na sessão
de apresentação do estudo, constam nomes como o de Mário Centeno, que coordenou
o já referido cenário macroeconómico para o PS (cuja menção pública causou mal-estar
nos bastidores do Partido Socialista), Óscar Gaspar, Brilhante Dias, Jorge Bravo, Sofia Galvão, Henrique Gomes
e Pitta e Cunha.
Segundo o que escreve o Diário Económico e o que se ouviu na RTP1, os peritos apontam
quatro soluções possíveis para garantir a sustentabilidade da Segurança Social:
o corte das pensões em pagamento, o aumento da idade da reforma, o reforço das fontes de financiamento e o alargamento da base contributiva. Além
disso, defendem o fim dos regimes especiais (há corporações que têm condições de
aposentação mais favoráveis que a generalidade), a criação de contas individuais (cada trabalhador desconta
exclusivamente para as suas eventualidades) e a harmonização das taxas contributivas (contra a existência de muitos setores
que não pagam a taxa social única completa).
No âmbito da competitividade empresarial, equacionam,
entre outras medidas, a necessidade de reduzir “os exagerados impostos sobre o
trabalho”.
No campo da saúde, preconizam, por exemplo, a
separação das funções de financiamento da saúde das da prestação de cuidados,
com o escopo de permitir que haja mais contratualização de serviços com o setor
privado – mais entrega de serviços ao setor privado.
***
O mal-estar no PS pela menção pública de
Centeno, sobretudo no atinente à defesa do corte de pensões, é contornado pelos responsáveis do estudo, que garantem que nenhum dos
peritos ligados ao PS, oportunamente ouvidos, teve “qualquer responsabilidade”
nas conclusões finais. Paes Antunes garante: “O texto é meu, ponto
final. É da minha exclusiva responsabilidade”.
O ex-secretário de Estado da Segurança Social do
Governo de Durão Barroso é efetivamente o coordenador das propostas de “Ideias
para Portugal” nas áreas do Emprego e da Proteção Social. É certo que não
esteve sozinho, pois, a fim de delinear o conjunto de medidas que garantem, na
sua ótica, a sustentabilidade da Segurança Social, ouviu personalidades de
várias áreas políticas. Entre elas, figura Mário Centeno, figura de proa no
relatório Uma Década para Portugal.
Depois da sessão de apresentação do estudo “Ideias
para Portugal”, que decorreu na manhã de hoje, 28 de maio, em Lisboa, choveram
telefonemas e mensagens pedindo explicações para o facto de Centeno ser
alegadamente coautor de um estudo que defendia preto no branco a “redução do
valor médio das pensões em pagamento”. Rosário Gama, dirigente da APRE (Associação de
Pensionistas, Reformados e Aposentados) e
membro da comissão política do PS foi uma das recetoras das mensagens de
indignação – refere Rosa Pedroso Lima no Expresso
on line, hoje.
Ora, Paes Antunes, ao garantir que o texto é seu e que
não compromete rigorosamente nenhuma das outras personalidades com quem falou,
não se limita a esclarecer o assunto. Tenta sobretudo pôr água na fervura “que
ameaçava transbordar”. E, referindo-se ao caso concreto de Centeno, garante: “Até
nem falei sobre Segurança Social com ele”. Assume, a propósito do texto final,
que “este não é o resultado de um trabalho de reflexão de um grupo de pessoas;
é só meu”.
Todavia, adianta ainda que “ninguém viu o documento,
antes de o acabar”, mas também nenhum dos académicos auscultados “objetou a que
fosse citado”. Segundo o que afirma, o texto original continha um esclarecimento
que acabou por ser suprimido pelos organizadores e que acabou por dar origem às
maiores dúvidas. Nesse esclarecimento se explicitava que o teor do documento e
o que as medidas “possam ter de errado ou controverso – é da minha exclusiva
responsabilidade, sendo injusto atribuí-las àqueles com quem, brevemente,
troquei ideias sobre os temas em causa”. Por outro lado, “seria também injusto
não mencionar todos aqueles que me deram o prazer de trocar algumas ideias
sobre estes temas, em particular Fernando Ribeiro Mendes, Francisco Lima, Jorge
Bravo, Jorge Gaspar, Mário Centeno, Miguel Teixeira Coelho, Pedro Portugal e
Ricardo Campelo de Magalhães”.
De modo similar se poderá falar dos militantes
socialistas Eurico Brilhante Dias e Óscar Soares, citados no mesmo documento,
mas na parte das medidas dedicadas à Saúde, coordenada por Guilherme Magalhães,
que também recolheu as opiniões de personalidades diversas. Assim, não se pode atribuir
àqueles dois militantes do PS, que figuram como “personalidades ouvidas”, a
responsabilidade pela defesa da manutenção da ADSE como subsistema público de
apoio na doença ou a defesa da “dedicação preferencial e não a exclusividade” dos
profissionais de saúde no setor público.
***
Por seu turno, Raul Vaz, no Diário Económico
on line, de hoje, lança a seguinte questão/repto: Importam-se de explicar o buraco da Segurança Social?
Em torno da questão, o colunista entende que tanto o Governo como o PS já
perceberam que há “um buraco na Segurança Social” e “sabem que estão obrigados
a explicar ao país a verdade a que temos direito”. Todavia, Vieira da Silva, que
foi Ministro da área e que está por dentro do assunto, alinha-se com política
oficial da direção do partido e avançou com a ideia de mais um Livro Branco.
Mas o estudo
que António Costa encomendara a prestigiados economistas não permite mais
ilusões. Basta lê-lo para perceber que é preciso mexer a sério no sistema de
pensões.
E não precisamos
de fazer do dito estudo um livro divinamente inspirado – uma Bíblia ou um Corão!
O Governo – no quadro do Passismo –
diz Urbi et Orbi que o problema existe
e que é grave e informou Bruxelas, através do Programa de Estabilidade, que “é
preciso cortar 600 milhões nas pensões”. Mas, quando a ministra das
Finanças disse, ipsis verbis, que a
solução para a sustentabilidade do sistema a curto prazo “pode passar por
cortar nas pensões em pagamento”, a campanha eleitoral entrou em aeremoto. Vieram
logo em socorro da hipocrisia política Pedro Mota Soares, pelo CDS, e Marco
António Costa, pelo PSD, a apagar o incêndio doméstico:
“Não, ninguém vai cortar
nada sem um amplo consenso com o PS, sem um acordo na Concertação Social, sem
uma proposta estruturada que ainda não existe, e sem ter em conta as linhas
apontadas pelo acórdão do Tribunal Constitucional”.
Porém, ninguém
da área governativa afastou liminarmente o corte nas atuais pensões, desde que
integrado numa reforma estrutural do sistema.
Também o estudo de António Costa admite
cortar pensões no futuro para compensar a baixa da TSU.
E que pensará o Presidente de todos
os portugueses? E já agora, que dizem à matéria os candidatos presidenciais?
Estaremos perante casos de falta de
coragem política ou perante falta de imaginação governativa?
Parem de mentir, de ocultar a verdade
ou de dourar a pílula, senhores governantes e senhores candidatos a governantes!
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