Está a decorrer, em Fátima,
a peregrinação internacional aniversária de maio de 2015 (dias 12 e 13) sob a
presidência do cardeal arcebispo de
Aparecida D. Raymundo Damasceno Assis, marcada pela entronização no Santuário
de Fátima de Fátima de uma Imagem de Nossa Senhora de Aparecida na abertura da
peregrinação.
As
linhas de força da peregrinação do ano de 2015, no 70.º aniversário do termo da
devastadora II Guerra Mundial, são: tema do ano, Santificados em Cristo; subtema do mês de maio, “A Mãe de Jesus” (At 1,14); frase
inspiradora, “rezai, rezai muito e
fazei sacrifícios pelos pecadores”; núcleo teológico, Deus Santo; elemento catequético,
a Igreja como Comunhão dos Santos; atitude
crente, oração.
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Em entrevista concedida a
Leopoldina Simões em março deste ano, D. Raymundo Damasceno refletiu sobre esta
ligação Fátima-Aparecida e sobre a sua vinda a Fátima.
Começou
por afirmar que a imagem da Senhora
Aparecida se tornou “muito querida do povo brasileiro” nestes quase 300
anos de permanência, “de mãos postas em oração, a partir do seu encontro
bendito nas águas do rio Paraíba do Sul”.
Depois,
assinalou a coincidência providencial de
Fátima celebrar o seu “jubileu centenário” na mesma época. Por isso, a “réplica
da Imagem da Mãe Aparecida oficialmente entronizada no Santuário de Nossa
Senhora de Fátima” constitui “uma graça inesperada”. Neste sentido, augura que a
sua entronização em Fátima transborde em “aparecimento” ou “irrompimento seu” no
coração e na vida dos irmãos e irmãs.
Vê, por outro lado, “na multiplicidade da
procedência de seus peregrinos”, que “Fátima tem as dimensões do mundo”. Assim,
espera que “alargue até às últimas extremidades da terra as
dimensões da ‘rede’, dos corações humanos nos quais quer
aparecer para até ali abrir caminho para o seu e nosso Salvador único, Jesus
Cristo”.
Quanto ao conhecimento da história
e da mensagem de Fátima pelo Brasil, assegura que o seu povo conhece ao
menos os “pontos mais significativos”, já que, em Fátima, é a
Virgem que, na Aparecida, convoca os “seus filhos e filhas para a oração” – ambas
com mãos em prece, mas integrada com a penitência. Assim, “nos acolhe junto de
si, mas almeja algo bem mais profundo”: que encontremos ou reencontremos Deus e
reforcemos os “laços vitais com Ele”. Dito de outro modo: Ela “acolhe-nos, mas,
tendo o seu coração centrado em Deus pela prece, é a Ele que de facto nos quer
conduzir”, para que, a Ele convertidos, “ao Seu coração de Pai, regressemos
renovados para junto dos irmãos a fim de com eles edificarmos o mundo da
fraternidade, da justiça, da paz, à luz do evangelho”.
No atinente à espiritualidade comum
vivida em Fátima e em Aparecida e em termos de mensagem para o mundo,
explicita que enquanto “sinal que ‘aparece’ no céu ou que o céu
nos aponta”, Fátima e Aparecida nos desvelam a predileção divina pelos
pequeninos, com os quais ela pode contar (Mt 11,25-26): em Fátima, busca três pobres pastorinhos
a quem “aparece”; em Aparecida, são três pescadores, igualmente pobres, em
cujas malhas se deixa enredar e, assim, se manifesta àqueles corações e àquelas
vidas prontamente acolhedores.
Ambas, em
suas imagens, aparecem de mãos postas em oração, a dizer-nos que as atitudes
orantes nos elevam para Deus, porque só Ele nos satisfaz plenamente. E
Aparecida, sendo imagem de mãe grávida, nos aponta que ela mesma e cada um de
nós, seus filhos e filhas, devemos seguir e imitar Jesus, o Filho Salvador que,
na força do Espírito, nos conduz ao Pai.
Quanto à mensagem que traz a Fátima
a 12 e 13 de maio, deseja que os peregrinos, vindos de todos
os lados, “representando o mundo todo”, experimentem o acolhimento materno e
alegre desta “Mãe única de todos e de cada um”. Mais deseja que, “nestas duas imagens
distintas, representativas das duas nações, Portugal e Brasil se sintam “irmanados
a partir da mesma Mãe”. Pretende que as duas nações representem a inteira
humanidade, pois esta foi a filha que Maria acolheu, como testamento, dos
lábios do Filho agonizante na cruz. Fátima e Aparecida devem reforçar e
propagar aos quatro ventos a dimensão universal da sua mensagem e proposta.
E define a
missão da Virgem em consonância perfeita com o desígnio divino e os dramas do
homem:
[Maria] anseia ser mãe e irmã
da humanidade, discípula-modelo no seguimento do Salvador! Quer viver sua
missão ímpar: trazer Deus do céu e fazê-Lo aparecer e acontecer no coração e na
vida de todos nós humanos! E, a seguir, de nós seus peregrinos, fazer
verdadeiros discípulos missionários e portadores dessa mesma experiência a
nossos irmãos e comunidades de origem!
***
Esta
peregrinação aniversária fica marcada pela morte por atropelamento de cinco
peregrinos a pé, provindos de Mortágua. Por isso, foi celebrada, pelas 18,30 horas
do dia 11 de maio, na Basílica da Santíssima Trindade, uma eucaristia especial
pelos peregrinos que faleceram no passado dia 2 deste mês a caminho de Fátima,
na estrada de Coimbra, perto de Cernache.
Na
saudação inicial, foram pronunciados, pelo presidente da celebração, o padre
Sérgio Henriques, capelão e diretor do Serviço de Pastoral Litúrgica do
Santuário, os nomes de cada um deles, assim como foi sublinhada a dor que
acompanhou este momento.
Foram
igualmente lembrados os “que se encontram feridos invocando a graça de rápida
recuperação” e “os familiares que vivem o momento de dor e se interrogam sobre
o porquê do acontecido para que Nossa Senhora, nossa Mãe, a todos console”.
Na homilia,
o padre Sérgio referiu a força que o Espírito nos dá para ultrapassar momentos
difíceis como estes: “o Espírito Santo não nos dá uma resposta filosófica ou
científica, mas dá-nos aquela certeza que advém da verdade de Jesus Cristo:
unidos a ele na morte seremos vencedores pela Sua ressurreição”. E terminou a
sua alocução com o desejo de que “Nossa Senhora, que a todos acolhe no seu
Santuário, seja agora conforto e auxílio e na sua intercessão alcance de seu Filho
e de Deus Pai tudo aquilo de que tendes necessidade e que vos trouxe a este
local sagrado”.
Também, a
partir de 13 de maio, a Imagem
Peregrina de Nossa Senhora passará por todas as dioceses de Portugal, numa
grande peregrinação festiva, que pretende assinalar o I Centenário das
Aparições. A este respeito, o reitor do Santuário, Padre Carlos Cabecinhas,
exprimiu o seguinte voto:
“Desejaríamos
que esta grande peregrinação da imagem de Nossa Senhora fosse uma forte
experiência de fé, através das celebrações, momentos de oração e expressões de
piedade popular; desejaríamos que fossem atingidas todas as faixas etárias e
que todos tivessem oportunidade de aprofundar o conhecimento e vivência da
mensagem de Fátima”.
A viatura oficial que transportará a Imagem
Peregrina da Senhora de Fátima foi benzida na tarde de 11 de maio, junto do
Posto de Socorros do Santuário de Fátima. A imagem será enviada para as
dioceses de Portugal no final da Eucaristia da peregrinação internacional de
maio, no dia 13. A oração de envio será proferida pelo bispo de Leiria-Fátima,
D. António Marto.
***
Da homilia
do Presidente da Peregrinação na missa da vigília em 12 de maio, respigam-se
algumas ideias-força, em registo livre.
- A santa Mãe de Deus, de pé,
junto da cruz, da qual pende, entre cruéis sofrimentos no corpo e na alma, o
seu divino Filho, muito mais do que Ele desejou e pediu na agonia no Jardim das
Oliveiras, desejava Ela que o Filho fosse salvo, poupado daquela morte cheia de
dor e ignomínia. Porém, a Santa Mãe, unida a seu Filho, submeteu-se como Ele à
vontade do Pai.
- Assim, a compaixão de Maria é
verdadeira, porque efetivamente tomou sobre si a dor do Filho e aceitou com Ele
a vontade do Pai, na obediência que dá a genuína vitória contra o sofrimento.
- Esta compaixão da Virgem está
no coração da devoção à Senhora, tanto sob o título de Aparecida, quanto sob o
de Fátima: em Aparecida, com justiça viu-se na cor negra da imagem a compaixão
e a solidariedade com os sofridos escravos e seus descendentes; em Fátima, a
oração e os sacrifícios pelos pecadores, como nos recorda a frase inspiradora
ligada ao tema deste ano, “rezai, rezai
muito e fazei sacrifícios pelos pecadores”.
- Os pobres e os pecadores estão
no coração da Mãe amorosa, que soube estar ao lado da Cruz de seu Filho e sabe
continuar ao lado dos filhos que dela mais precisam.
- A nossa solidariedade – com os
pobres e/ou com os pecadores – dificilmente consegue ultrapassar o simples compadecer-se
e chegar a sofrer de verdade com os que sofrem.
- Devemos, pois, rogar a Maria
que reúna em nós os sentimentos que configuram a verdadeira compaixão – a
solidariedade, para que os sofredores consigam vencer o sofrimento; e uma
verdadeira submissão à vontade de Deus, que sempre é vontade de amor.
- As palavras “Eis aí a tua mãe”, ouvidas pelo
discípulo amado, dirigem-se a todos nós. Nelas vemos a mãe compassiva que nos é
dada de novo.
- O Papa Francisco, antes do
início da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, no dia 24 de julho
de 2013, quis ir ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, como romeiro
(ou peregrino). Com
isso, Francisco confiou a Nossa Senhora a Jornada que teria início no dia
seguinte, a Igreja no Brasil e todo o povo Brasileiro; e convidou-nos a
conservar a esperança, a deixarmo-nos surpreender por Deus e a viver na
alegria.
- Sobre o achamento da Imagem de
Nossa Senhora Aparecida no rio Paraíba em 1717, o Papa recordou que, no início
do milagre da pesca, está a experiência da fraqueza e do fracasso. Não era
tempo de pesca, os três pescadores eram pobres, os seus barcos e as suas redes
eram muito frágeis e simples. Mas eles perseveraram na esperança; e Deus
revelou a sua presença de um modo inesperado: fez refletir a sua bondade numa
imagem da Virgem Maria. E, além disso, a imagem estava já escurecida pelas
águas e pelo lodo do rio em que fora jogada.
- Em Fátima, a Virgem Maria
apareceu a três crianças simples, humildes e pobres: “Deus entra sempre nas
vestes da pequenez”.
- O Papa tirou algumas
conclusões:
. A imagem foi encontrada em dois
lances de redes e em lugares diferentes, primeiro, o corpo e, depois, a cabeça,
que foram unidos posteriormente: nestes factos, Deus dá a mensagem de
recomposição e de unidade, que requer da nossa parte paciência;
. Seguidamente, os pescadores
levaram para casa o “achado misterioso”: é que o povo simples e piedoso
encontra sempre espaço nas suas vidas para a manifestação de Deus;
. Os primeiros devotos da imagem
cobriram-na com um manto: manifestação de que Deus nos cobre com sua proteção,
mas, antes, Ele faz-Se mendigo do nosso acolhimento;
. Em oração, os pescadores
convidaram os vizinhos para partilharem a contemplação do mistério, pois, a
experiência de Deus – a fé – quando é autêntica, traz consigo a necessidade de
ser partilhada.
- Por isso, o Santo Padre
concluía que a Igreja não pode “desaprender” a lição de Aparecida;
- Damasceno acrescenta a lição
das Aparições de Fátima:
. A fragilidade é o meio
escolhido por Deus para realizar a sua obra;
. A Igreja deve sempre lembrar-se
de que não pode afastar-se da simplicidade.
- Nesta imagem simples de Nossa
Senhora de Fátima, veneramos algo de grandioso: a mãe de Deus e nossa, o amor
misericordioso de Deus, que se manifestou por meio daquela que foi chamada por
Isabel de “bendita porque acreditou” (Lc 1,45).
- Reconhecidos por tão singulares
provas do amor divino, seremos sempre gratos ao Senhor, que partilhou connosco
a filiação de seu Pai, concedendo-nos a condição de filhos de Deus gerados no
Batismo, permitindo que com Ele digamos: “Pai nosso”.
- Igualmente partilhou connosco a
sua filiação materna – “Eis aí tua mãe!” – a qual, como Mãe solícita e
compassiva, continua ao nosso lado, solidária com os que sofrem e com os
pecadores.
***
Depois da homilia do purpurado – alinhada
com as intenções reveladas na susodita entrevista de março – que tão bem
estabeleceu o paralelo entre a espiritualidade de Fátima e a de Aparecida, em
sintonia com o discurso papal, não restam dúvidas da missão de Maria, Virgem e
Mãe, na economia da Salvação e da obrigação dos crentes da sua estreita ligação
a Deus Pai, a Cristo irmão, ao amor no Espírito Santo e à comunhão fraterna sob
o olhar materno de Maria e no seu acolhimento amoroso e compassivo, modelo de
todo o acolhimento e de toda a missão.
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