quarta-feira, 13 de maio de 2015

Fátima: peregrinação aniversária de maio de 2015

Está a decorrer, em Fátima, a peregrinação internacional aniversária de maio de 2015 (dias 12 e 13) sob a presidência do cardeal arcebispo de Aparecida D. Raymundo Damasceno Assis, marcada pela entronização no Santuário de Fátima de Fátima de uma Imagem de Nossa Senhora de Aparecida na abertura da peregrinação.
As linhas de força da peregrinação do ano de 2015, no 70.º aniversário do termo da devastadora II Guerra Mundial, são: tema do ano, Santificados em Cristo; subtema do mês de maio, “A Mãe de Jesus” (At 1,14); frase inspiradora, “rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores”; núcleo teológico, Deus Santo; elemento catequético, a Igreja como Comunhão dos Santos; atitude crente, oração.
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Em entrevista concedida a Leopoldina Simões em março deste ano, D. Raymundo Damasceno refletiu sobre esta ligação Fátima-Aparecida e sobre a sua vinda a Fátima.
Começou por afirmar que a imagem da Senhora Aparecida se tornou “muito querida do povo brasileiro” nestes quase 300 anos de permanência, “de mãos postas em oração, a partir do seu encontro bendito nas águas do rio Paraíba do Sul”.
Depois, assinalou a coincidência providencial de Fátima celebrar o seu “jubileu centenário” na mesma época. Por isso, a “réplica da Imagem da Mãe Aparecida oficialmente entronizada no Santuário de Nossa Senhora de Fátima” constitui “uma graça inesperada”. Neste sentido, augura que a sua entronização em Fátima transborde em “aparecimento” ou “irrompimento seu” no coração e na vida dos irmãos e irmãs.
Vê, por outro lado, “na multiplicidade da procedência de seus peregrinos”, que “Fátima tem as dimensões do mundo”. Assim, espera que “alargue até às últimas extremidades da terra as dimensões da ‘rede’, dos corações humanos nos quais quer aparecer para até ali abrir caminho para o seu e nosso Salvador único, Jesus Cristo”.
Quanto ao conhecimento da história e da mensagem de Fátima pelo Brasil, assegura que o seu povo conhece ao menos os “pontos mais significativos”, já que, em Fátima, é a Virgem que, na Aparecida, convoca os “seus filhos e filhas para a oração” – ambas com mãos em prece, mas integrada com a penitência. Assim, “nos acolhe junto de si, mas almeja algo bem mais profundo”: que encontremos ou reencontremos Deus e reforcemos os “laços vitais com Ele”. Dito de outro modo: Ela “acolhe-nos, mas, tendo o seu coração centrado em Deus pela prece, é a Ele que de facto nos quer conduzir”, para que, a Ele convertidos, “ao Seu coração de Pai, regressemos renovados para junto dos irmãos a fim de com eles edificarmos o mundo da fraternidade, da justiça, da paz, à luz do evangelho”.
No atinente à espiritualidade comum vivida em Fátima e em Aparecida e em termos de mensagem para o mundo, explicita que enquanto “sinal que ‘aparece’ no céu ou que o céu nos aponta”, Fátima e Aparecida nos desvelam a predileção divina pelos pequeninos, com os quais ela pode contar (Mt 11,25-26): em Fátima, busca três pobres pastorinhos a quem “aparece”; em Aparecida, são três pescadores, igualmente pobres, em cujas malhas se deixa enredar e, assim, se manifesta àqueles corações e àquelas vidas prontamente acolhedores.
Ambas, em suas imagens, aparecem de mãos postas em oração, a dizer-nos que as atitudes orantes nos elevam para Deus, porque só Ele nos satisfaz plenamente. E Aparecida, sendo imagem de mãe grávida, nos aponta que ela mesma e cada um de nós, seus filhos e filhas, devemos seguir e imitar Jesus, o Filho Salvador que, na força do Espírito, nos conduz ao Pai.
Quanto à mensagem que traz a Fátima a 12 e 13 de maio, deseja que os peregrinos, vindos de todos os lados, “representando o mundo todo”, experimentem o acolhimento materno e alegre desta “Mãe única de todos e de cada um”. Mais deseja que, “nestas duas imagens distintas, representativas das duas nações, Portugal e Brasil se sintam “irmanados a partir da mesma Mãe”. Pretende que as duas nações representem a inteira humanidade, pois esta foi a filha que Maria acolheu, como testamento, dos lábios do Filho agonizante na cruz. Fátima e Aparecida devem reforçar e propagar aos quatro ventos a dimensão universal da sua mensagem e proposta.
E define a missão da Virgem em consonância perfeita com o desígnio divino e os dramas do homem:
[Maria] anseia ser mãe e irmã da humanidade, discípula-modelo no seguimento do Salvador! Quer viver sua missão ímpar: trazer Deus do céu e fazê-Lo aparecer e acontecer no coração e na vida de todos nós humanos! E, a seguir, de nós seus peregrinos, fazer verdadeiros discípulos missionários e portadores dessa mesma experiência a nossos irmãos e comunidades de origem!
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Esta peregrinação aniversária fica marcada pela morte por atropelamento de cinco peregrinos a pé, provindos de Mortágua. Por isso, foi celebrada, pelas 18,30 horas do dia 11 de maio, na Basílica da Santíssima Trindade, uma eucaristia especial pelos peregrinos que faleceram no passado dia 2 deste mês a caminho de Fátima, na estrada de Coimbra, perto de Cernache.
Na saudação inicial, foram pronunciados, pelo presidente da celebração, o padre Sérgio Henriques, capelão e diretor do Serviço de Pastoral Litúrgica do Santuário, os nomes de cada um deles, assim como foi sublinhada a dor que acompanhou este momento.
Foram igualmente lembrados os “que se encontram feridos invocando a graça de rápida recuperação” e “os familiares que vivem o momento de dor e se interrogam sobre o porquê do acontecido para que Nossa Senhora, nossa Mãe, a todos console”.
Na homilia, o padre Sérgio referiu a força que o Espírito nos dá para ultrapassar momentos difíceis como estes: “o Espírito Santo não nos dá uma resposta filosófica ou científica, mas dá-nos aquela certeza que advém da verdade de Jesus Cristo: unidos a ele na morte seremos vencedores pela Sua ressurreição”. E terminou a sua alocução com o desejo de que “Nossa Senhora, que a todos acolhe no seu Santuário, seja agora conforto e auxílio e na sua intercessão alcance de seu Filho e de Deus Pai tudo aquilo de que tendes necessidade e que vos trouxe a este local sagrado”.
Também, a partir de 13 de maio, a Imagem Peregrina de Nossa Senhora passará por todas as dioceses de Portugal, numa grande peregrinação festiva, que pretende assinalar o I Centenário das Aparições. A este respeito, o reitor do Santuário, Padre Carlos Cabecinhas, exprimiu o seguinte voto:
“Desejaríamos que esta grande peregrinação da imagem de Nossa Senhora fosse uma forte experiência de fé, através das celebrações, momentos de oração e expressões de piedade popular; desejaríamos que fossem atingidas todas as faixas etárias e que todos tivessem oportunidade de aprofundar o conhecimento e vivência da mensagem de Fátima”. 

A viatura oficial que transportará a Imagem Peregrina da Senhora de Fátima foi benzida na tarde de 11 de maio, junto do Posto de Socorros do Santuário de Fátima. A imagem será enviada para as dioceses de Portugal no final da Eucaristia da peregrinação internacional de maio, no dia 13. A oração de envio será proferida pelo bispo de Leiria-Fátima, D. António Marto.
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Da homilia do Presidente da Peregrinação na missa da vigília em 12 de maio, respigam-se algumas ideias-força, em registo livre.
- A santa Mãe de Deus, de pé, junto da cruz, da qual pende, entre cruéis sofrimentos no corpo e na alma, o seu divino Filho, muito mais do que Ele desejou e pediu na agonia no Jardim das Oliveiras, desejava Ela que o Filho fosse salvo, poupado daquela morte cheia de dor e ignomínia. Porém, a Santa Mãe, unida a seu Filho, submeteu-se como Ele à vontade do Pai.
- Assim, a compaixão de Maria é verdadeira, porque efetivamente tomou sobre si a dor do Filho e aceitou com Ele a vontade do Pai, na obediência que dá a genuína vitória contra o sofrimento.
- Esta compaixão da Virgem está no coração da devoção à Senhora, tanto sob o título de Aparecida, quanto sob o de Fátima: em Aparecida, com justiça viu-se na cor negra da imagem a compaixão e a solidariedade com os sofridos escravos e seus descendentes; em Fátima, a oração e os sacrifícios pelos pecadores, como nos recorda a frase inspiradora ligada ao tema deste ano, “rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores”.
- Os pobres e os pecadores estão no coração da Mãe amorosa, que soube estar ao lado da Cruz de seu Filho e sabe continuar ao lado dos filhos que dela mais precisam.
- A nossa solidariedade – com os pobres e/ou com os pecadores – dificilmente consegue ultrapassar o simples compadecer-se e chegar a sofrer de verdade com os que sofrem.
- Devemos, pois, rogar a Maria que reúna em nós os sentimentos que configuram a verdadeira compaixão – a solidariedade, para que os sofredores consigam vencer o sofrimento; e uma verdadeira submissão à vontade de Deus, que sempre é vontade de amor.
- As palavras “Eis aí a tua mãe”, ouvidas pelo discípulo amado, dirigem-se a todos nós. Nelas vemos a mãe compassiva que nos é dada de novo.
- O Papa Francisco, antes do início da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, no dia 24 de julho de 2013, quis ir ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, como romeiro (ou peregrino). Com isso, Francisco confiou a Nossa Senhora a Jornada que teria início no dia seguinte, a Igreja no Brasil e todo o povo Brasileiro; e convidou-nos a conservar a esperança, a deixarmo-nos surpreender por Deus e a viver na alegria.
- Sobre o achamento da Imagem de Nossa Senhora Aparecida no rio Paraíba em 1717, o Papa recordou que, no início do milagre da pesca, está a experiência da fraqueza e do fracasso. Não era tempo de pesca, os três pescadores eram pobres, os seus barcos e as suas redes eram muito frágeis e simples. Mas eles perseveraram na esperança; e Deus revelou a sua presença de um modo inesperado: fez refletir a sua bondade numa imagem da Virgem Maria. E, além disso, a imagem estava já escurecida pelas águas e pelo lodo do rio em que fora jogada.
- Em Fátima, a Virgem Maria apareceu a três crianças simples, humildes e pobres: “Deus entra sempre nas vestes da pequenez”.
- O Papa tirou algumas conclusões:
. A imagem foi encontrada em dois lances de redes e em lugares diferentes, primeiro, o corpo e, depois, a cabeça, que foram unidos posteriormente: nestes factos, Deus dá a mensagem de recomposição e de unidade, que requer da nossa parte paciência;
. Seguidamente, os pescadores levaram para casa o “achado misterioso”: é que o povo simples e piedoso encontra sempre espaço nas suas vidas para a manifestação de Deus;
. Os primeiros devotos da imagem cobriram-na com um manto: manifestação de que Deus nos cobre com sua proteção, mas, antes, Ele faz-Se mendigo do nosso acolhimento;
. Em oração, os pescadores convidaram os vizinhos para partilharem a contemplação do mistério, pois, a experiência de Deus – a fé – quando é autêntica, traz consigo a necessidade de ser partilhada.
- Por isso, o Santo Padre concluía que a Igreja não pode “desaprender” a lição de Aparecida;
- Damasceno acrescenta a lição das Aparições de Fátima:
. A fragilidade é o meio escolhido por Deus para realizar a sua obra;
. A Igreja deve sempre lembrar-se de que não pode afastar-se da simplicidade.
- Nesta imagem simples de Nossa Senhora de Fátima, veneramos algo de grandioso: a mãe de Deus e nossa, o amor misericordioso de Deus, que se manifestou por meio daquela que foi chamada por Isabel de “bendita porque acreditou” (Lc 1,45).
- Reconhecidos por tão singulares provas do amor divino, seremos sempre gratos ao Senhor, que partilhou connosco a filiação de seu Pai, concedendo-nos a condição de filhos de Deus gerados no Batismo, permitindo que com Ele digamos: “Pai nosso”.
- Igualmente partilhou connosco a sua filiação materna – “Eis aí tua mãe!” – a qual, como Mãe solícita e compassiva, continua ao nosso lado, solidária com os que sofrem e com os pecadores.
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Depois da homilia do purpurado – alinhada com as intenções reveladas na susodita entrevista de março – que tão bem estabeleceu o paralelo entre a espiritualidade de Fátima e a de Aparecida, em sintonia com o discurso papal, não restam dúvidas da missão de Maria, Virgem e Mãe, na economia da Salvação e da obrigação dos crentes da sua estreita ligação a Deus Pai, a Cristo irmão, ao amor no Espírito Santo e à comunhão fraterna sob o olhar materno de Maria e no seu acolhimento amoroso e compassivo, modelo de todo o acolhimento e de toda a missão.

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