De acordo com o respetivo relatório
de 2013, do Conselho Nacional de Educação, que faz o retrato do estado do setor, verifica-se um aumento, de forma
reiterada, das notas internas dos alunos e suspeita-se de retenções seletivas a
pensar nos exames. Noutros termos, as escolas estão a ser acusadas de duas
coisas: inflacionar deliberadamente as classificações de frequência atribuídas
pelos professores nas diversas disciplinas (nesta ótica, os professores estarão
a dar melhores notas do que aquilo que os alunos merecem), sobretudo no ensino
secundário; e reter alunos que eventualmente reprovariam em exame organizado
sob tutela do MEC, pelo agora independente IAVE, IP – uma prática
diametralmente oposta à anterior.
Os professores teriam em vista, segundo este detrator documento, reduzir
a diferença entre as notas de exame (habitualmente menores) e as de frequência
(habitualmente mais avantajadas), já que as escolas cuja diferença entre
avaliação externa (em exame nacional ou prova final) e avaliação interna (feita
pelos professores) for significativa, são penalizadas, por exemplo, com menor
atribuição de horas no denominado crédito horário, que tem por finalidade permitir às
escolas adequar a implementação do respetivo projeto educativo à realidade
local, com autonomia pedagógica e organizativa e, naturalmente, a recuperação e reforço das
aprendizagens. Por outro lado, garantindo uma melhor média no ensino secundário
e nas disciplinas de ingresso, facilitariam a entrada dos alunos no ensino superior.
E ainda obteriam um lugar mais confortável nos rankings nacionais.
No atinente ao ensino básico, impedir que alguns alunos não se sujeitem a
provas finais nacionais nas disciplinas de Português e de Matemática garante
lugar confortável nos rankings nacionais,
esbate a diferença entre avaliação externa e interna e testifica a imagem de
escola.
No entanto, há que referir que o predito crédito horário é também
condicionado por outras variáveis, conforme o estipulado no despacho normativo
n.º 6/2014, de 26 de maio.
As suspeitas práticas de seletividade, que visam assegurar uma “maior
proporção de aprovações em exame”, poderão estar na origem de um aumento das
retenções nos últimos dois anos, em contraciclo com a tendência que se mantinha
desde a década de 90 do pretérito século.
Sintetizando, o Conselho
Nacional de Educação (CNE) – órgão consultivo da Assembleia da República, no
qual está representada toda a comunidade educativa – acusa escolas de
manipularem deliberadamente as notas dos seus alunos, mas nem sempre no
interesse destes (E quais serão os legítimos e verdadeiros interesses dos
alunos?). E a suspeita fica a pairar no ar e a lançar umas calculadas pazadas
de lama sobre não se sabe quem: todas as escolas, algumas, poucas, muitas? O
relatório não diz quantas nem quais as escolas. E o presidente do CNE, David
Justino, também não o quis precisar. Por seu turno, o gabinete de comunicação
deste antigo ministro da Educação remeteu as devidas respostas para conferência
de imprensa, a realizar no próximo dia 22 de setembro.
***
Repare-se, em
primeiro lugar, que o aumento das retenções acontece desde 2011. Porém, poucos
se lembrarão de que, tendo já começado o processo de exames e provas finais
nacionais, naquele ano, o MEC deu indicações de maior exigência na apreciação
das provas. Quem o confessou publicamente foi o então responsável pela
estrutura organizativa das provas, quando as informações sobre a avaliação em
provas nacionais costumam ser dadas (e foram-no) nos finais do primeiro período
e no início do segundo. E algumas disciplinas passaram por testes intermédios
na maior parte das escolas. É caso para perguntar qual o objetivo de tais e tão
artificiosas indicações de rigor. Será um objetivo pedagógico ou um objetivo
político encapotado num esquema de exame ou coisa parecida?
Convém frisar que os exames e
provas nacionais representam um peso de 30% da avaliação global nas disciplinas
sujeitas àquela modalidade de avaliação externa. Não compreendo, por isso, como
se lhes dá um relevo quase absoluto, a ponto de MEC e editoras se centrarem na
produção de materiais e preparação dos alunos para o exame / prova final. Será
que pretendem fazer das escolas umas unidades de preparação para exame como
acontece com as escolas de condução, que praticamente não ensinam a conduzir,
mas preparam para exame e para a carta?
Os programas de ensino deveriam
então passar a programas de exame e as escolas a funcionar durante uns três
meses em cada ano!
Por outro lado, o exame / prova
final demora 90 minutos, 120 minutos e 135 minutos, conforme os casos. Ora, o
objeto de avaliação num circunscrito período de tempo, como os indicados, tem
de ser necessariamente limitado e condicionado por vicissitudes várias (barulho
do exterior, nervosismo, disposição, doença, sorte, etc.). Os professores, ao
longo do ano e do ciclo de estudos, dispõem de várias oportunidades,
instrumentos e modalidades de avaliação e mesmo objeto de avaliação – a
vertente cognitiva, a aplicação, a oralidade, os valores, atitudes e
comportamentos. Ademais, os exames / provas finais deveriam constituir um fator
de aferição do ensino, uma consecução dos mínimos nacionais e o instrumento de
certificação para aqueles que escaparam ao regime de frequência (caso em que o
seu peso é total). Não se afigura, assim, justo penalizar, de forma leve, as
escolas em que se evidenciem diferenças significativas entre a avaliação
externa e a interna, a não ser que houvesse razões apuradas em processo de
inquérito.
Quanto ao modo de proceder destas
entidades que emitem parecer, fazem recomendações, elaboram relatórios e
informam a comunidade nacional, há que opor vivamente o mais vivo protesto.
Primeiro, não é preciso ser membro do CNE para ler mapas estatísticos e chegar
a conclusões brilhantes; segundo, quem responde por um órgão, deve saber gerir
a informação, evitando efeitos indesejáveis; e terceiro, é preciso ter
autoridade moral e política para falar.
Por isso, em relação ao primeiro
motivo, não contesto o relatório nem as conclusões. A grande questão que
levanto é em relação ao segundo motivo. O CNE deveria remeter o relatório à
tutela política (a Assembleia da República), que chamaria o Ministro respetivo
para audição, e à tutela administrativa (MEC), que mandaria fazer a competente
investigação. Depois, conhecidos os casos e devidamente punidos (a começar por
escolas privadas, não se esqueçam), informar a comunidade nacional, quantificando
as escolas que infringiram os normativos, em que aspetos, por culpa de quem a
que punição foram sujeitas. Desta forma, teríamos as denúncias feitas, os
efeitos produzidos, o bom nome de quem não prevarica salvaguardado. Não
concordam? É mais fácil falar, falar e sem nada fazer para inverter a situação.
***
Por fim, aqui fica uma palavra,
quanto à autoridade política (já que não me compete pronunciar sobre a
autoridade moral). Não esqueço que Justino foi Ministro da Educação mais de 2 anos!
Salientemos, antes de mais: os
cortes nas despesas com a Educação, as alterações drásticas para pior nos
planos de estudos, a sobrecarga dos professores que se mantêm no sistema, a
rarefação intempestiva dos corpos docentes, a desautorização recorrente dos
professores, o galope de outros interesses sobe as escolas, as enervantes e quase
permanentes alterações legislativas e instrucionais… E já não é pouco! Quem tem
culpa de tudo isto? Os definidores das políticas educativas, os altos
administradores da educação, aqueles que fazem dos diretores instrumentos dos
caprichos do poder, aqueles que jogam à autonomia de escola regulada até ao ínfimo
pormenor (com a ressalva de tudo o mais que está no quadro da autonomia – o
quê?!). Depois, admiram-se das retenções!
Autoridade para falar. Um
professor, no consulado da condenada em 1.ª instância, denunciou, no programa
televisivo “Prós e Contras”, a pressão sobre os professores para dar boas notas
numa determinada escola apontando o dedo a um senhor inspetor. A consequência
não foi o apuramento da verdade e das responsabilidades em inquérito, mas uma
carta dirigida pelo próprio à RTP a desmentir-se! E aprece que a pressão
alastrante não é um mito…
Não quererá o senhor Presidente
do CNE desmentir-se ou pedir desculpa pelo labéu levianamente lançado de forma
não especificada (quase generalizada) sobre as escolas portuguesas? Seguiria,
sem custos, o exemplo do Senhor Ministro da Educação!
É que o senhor Presidente do CNE
foi Ministro da Educação no consulado de Durão Barroso. Não conseguiu fazer
passar na Presidência da Republica a Lei de Bases da Educação (Aprovada na
Assembleia da República, foi vetada por Jorge Sampaio). Queria estabelecer o
ensino infantil, o ensino básico (de 6 anos) e o secundário (de 6 anos). E que
fez? Começou por fazer novos programas para o ensino secundário de três anos
(que já foram substituídos). Mais nada, além dos respetivos decretos e
portarias.
Criou o mais brutal problema de
colocação de professores desde 1976, porque juntou todas as candidaturas num
único momento (desde a educação pré-escolar, passando pelo 1.º ciclo até aos
2.º e 3.º ciclos e secundário; concurso interno e concurso externo…); entregou
a tarefa a uma empresa de informática que não possuía experiência na matéria; e
não promoveu a disciplinação no diálogo entre a equipa dos procedimentos, do
lado do Ministério da Educação, e a dos informáticos, do lado da empresa. E o
sistema andou “engalinhado”, deitando erros para a opinião pública, desde maio
a outubro, até que a sua sucessora, Maria do Carmo Seabra, já no consulado de
Santana Lopes (a quem ainda há dias alguém na Comunicação Social atribuiu, errada
e injustamente, a origem do problema), resolveu o problema, acompanhando-o de
perto e chamando outros técnicos de procedimentos e outra firma de informática
(trabalhando bastante rapidamente, uns dias).
E o senhor Presidente do CNE,
então Ministro da Educação, não resolveu o problema da majoração de notas em
ensino privado e recorrente, que encontrou e não ultrapassou. Quem não se
lembra do caso da “filha do ministro”, que fez cair dois ministros (o da
Ciência e do Ensino Superior e o dos Negócios Estrangeiros: a menina era filha
deste senhor)?
E a escola sabe que aluno retido
pode autopropor-se a prova final (2.ª fase) e a exame (1.ª e 2.ª).
Portanto, quanto a autoridade
política sobre acusação a escolas estamos conversados.
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