sábado, 9 de agosto de 2014

Por terras de Nossa Senhora da Corredoura, São Pelágio e São Sebastião

No passado dia 7 de agosto, minha mulher e eu deslocámo-nos ao território de algum modo referenciado em epígrafe. Trata-se da outrora vila de Fráguas e da já mais que centenária Vila Nova de Paiva, a velha Barrelas, embora nos tenhamos aproximado de outra vila de outrora, a de Alhais em deslocação-relâmpago.
Era o dia escolhido pela comunidade de Fráguas, por iniciativa do abade José Justino Lopes, para comemorar, em ambiente festivo, os 500 anos da outorga do seu curioso foral. Fráguas, no entanto, não se sentiu sozinha, até porque hoje, no quadro do sistema de organização das freguesias, não é uma unidade territorial autónoma, como não o é Alhais nem Vila Nova de Paiva. Com efeito, a Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, instituiu uma unidade territorial política e administrativa ou nova freguesia, designada por “União das Freguesias de Vila Nova de Paiva, Alhais e Fráguas”, com sede em Vila Nova de Paiva, como consta do seu Anexo I – por agregação das velhas freguesias de Vila Nova de Paiva, Alhais e Fráguas, no desenvolvimento do processo de reorganização administrativa do território das freguesias preconizado pela Lei n.º 22/2012, de 30 de maio, sua lei-quadro. E o Presidente da Junta de Freguesia, senhor Ilídio Afonso Cruz, de Alhais, lá esteve com a sua palavra e sentido do apoio logístico, bem como aquela incansável senhora cujo nome me penalizo de não recordar, como o Presidente da Câmara Municipal, Dr. José Morgado, com participação lúcida e ativa no painel que a Rádio Escuro organizou em Fráguas, como o Dr. Manuel Brito Proença, colega de velhas andanças no campo da docência, e como o já mencionado padre José Justino Lopes, pároco de Vila Nova de Paiva e de Fráguas e presidente da Assembleia Geral da Rádio Escuro. Outras pessoas ali se encontravam, algumas das quais já não encontrava há muitos anos.
Esta agregação de freguesias, determinada por lei, foi a única no concelho de Vila Nova de Paiva, ficando incólumes as outras quatro freguesias: Pendilhe, que também teve foral manuelino em 21 de abril de 1514 (com Aveloso, Canelas, Parada, Trevões, Vale de Ladrões, hoje Vale Flor, Vale Longo, Várzea, Vidigal e Vilarouco); Queiriga; Touro; e Vila Cova-à-Coelheira, que também teve foral manuelino em 21 de julho de 1514.
Não obstante, a lei-quadro da reorganização administrativa das freguesias pretende a preservação da identidade, história e cultura das velhas freguesias. Por isso, aqui fica memória a Alhais, com foral de 18 de junho de 1514, que se agrega em torno da Igreja da Senhora da Corredoura, onde se procedeu à supressão das cerimónias de Batismo e subsequente registo do escritor Aquilino Gomes Ribeiro em 7 de novembro de 1885, que fora batizado na casa onde nascera, no Carregal, Sernancelhe, por motivo de "necessedade", a 13 de setembro do mesmo ano; a Fráguas, com foral de 16 de julho de 1514, cuja vida rememora o “rego do concelho” e se reabastece espiritualmente ao redor da igreja de origem românica de São Pelágio, o pequenino galego feito mártir em Córdova; e a Vila Nova de Paiva, que, sob o topónimo de Barrelas, se celebrizou pelo juiz e pela feira e se congrega regularmente aos pés de São Sebastião, o oficial romano mártir da fé e o orago desta sua igreja de origem românica.
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Foi efetivamente Fráguas e seu foral que motivaram a visita a esta localidade, muito populosa neste período estival e, ao mesmo tempo, vestida de cores festivas, exibindo as marcas do trabalho e as notas do lazer à beira do Paiva ou em roda dançante e/ou gastronómica e ainda eivada daquela linguagem e hábitos denotadores de fé e referência ao divino.
Porém, houve uma coisa singular, que me chamou a atenção: uma brochura editada pelo Padre José Justino Lopes, em abril deste ano, sob o título Páscoa – Na Arte da Igreja Paroquial de Fráguas e Vila Nova de Paiva. Ofereceu-me um exemplar, que agradeço.
Confesso que nunca tinha visto um trabalho deste género: em dimensões reduzidas, um complexo repositório de saudação pascal, oração de bênção da casa, leitura evangélica e um oitavário de mensagens pascais e eucarísticas adequadas à temática de cada um dos anos contemplados (1999-2006), com especial referência ao ano do idoso (1999), ao ano jubilar do milénio (2000) e ao ano do voluntariado (2001). E termina com a tradicional oração do Angelus, ou melhor, do Regina Caeli, a oração às ave-marias no Tempo Pascal.
Mas não só os textos, de teologia e espiritualidade profundas, expostas de forma muito simples. Vale a brochura – e muito – pela coleção de reprodução imagética de motivos artísticos das duas igrejas em causa, com ligação à Semana Santa, à Páscoa e à Eucaristia. Logo a capa exibe uma bela imagem do Ressuscitado com a bandeira da vitória, embora com as marcas visíveis da Paixão, cuja cruz enquanto instrumento de ignomínia fica eclipsada. Por seu turno, a contracapa reproduz outro trecho, um portal de sacrário de boa talha, recheado e emoldurado por figuras angélicas ou similares, verdadeiras testemunhas da Ressurreição e adoradores da Eucaristia. É o sacrário, do século XVIII, da Igreja Paroquial de Vila Nova de Paiva.
No interior, podemos degustar com o olhar e com o espírito, da igreja paroquial de Fráguas: o sacrário da igreja paroquial; o Aleluia (pintura de caixotão do teto da capela-mor); a Fração do Pão (pintura de caixotão do teto da capela-mor); o Lava-pés (pintura em pano de estopa, séc. XVIII); o Pelicano (pintura de caixotão do teto da capela-mor); o Agnus Dei (pintura de caixotão do teto da capela-mor); a Última Ceia (pintura em pano de estopa, séc. XVIII); e a igreja paroquial, de origem românica, de São Pelágio.
Do interior da igreja de Vila Nova de Paiva, temos: um pormenor da talha da igreja paroquial (séc. XVIII); uma tela da Santíssima Trindade (séc. XVIII); o Lava-pés (pintura de caixotão, séc. XVIII); o Cristo Ressuscitado (pintura de caixotão, séc. XVIII); o Cordeiro (séc. XVIII); a Última Ceia (pintura de caixotão, séc. XVIII); um sacrário de altar lateral (séc. XVIII); outro sacrário de altar lateral (séc. XVIII); e a igreja paroquial, de origem românica, de São Sebastião.
Enfim, uma memória artística religiosa mergulhada no essencial do Kérigma evangélico – Aleluia, o Senhor morto pelos homens ressuscitou, está connosco, dá-se em alimento a todos e suscita o amor fraterno simbolizado no lava-pés – acessível aos olhares mais simples e agradável para os mais exigentes!

Foi, além do convívio com as gentes em terra de São Pelágio, a lição que recolhi em Fráguas. Parabéns ao padre Justino e ao sacerdote que se encarregou do design da brochura, o padre Hermínio Lopes!  

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