sábado, 11 de dezembro de 2021

Portugal é o país da OCDE que mais crescerá economicamente em 2022

 

A 10 de dezembro foi divulgado pela OCDE o relatório “Economic Survey of Portugal 2021”, que vem confirmar as projeções económicas conhecidas no início deste mês.

Segundo nota da própria organização internacional, o relatório examina o impacto da crise da covid-19 e discute como assegurar uma recuperação forte e resiliente. Analisa a forma como os fundos da UE, juntamente com as reformas estruturais, podem ser utilizados para impulsionar o nosso potencial económico, tornando o crescimento mais verde e reduzindo as desigualdades. E, num capítulo especial, faz recomendações políticas sobre como aproveitar melhor a transformação digital.

Nos termos do relatório, Portugal será o país da OCDE com a maior taxa de crescimento económico no próximo ano, superando em 1,6 pontos percentuais o nível de atividade económica verificado no tempo da pré-pandemia, prevendo-se uma forte recuperação da economia nos anos seguintes. Assim, o PIB deverá aumentar 14% entre 2021 e 2023, embora a taxa de crescimento vá diminuindo:4,8% em 2021, 5,8% em 2022 e 2,8% em 2023.

E a OCDE reconhece que as diversas medidas de apoio à economia, lançadas pelo Governo, contribuíram materialmente para a rápida e acentuada recuperação económica, após a maior recessão de que há registo estatístico.

Perante esta notícia, o Portal do Governo apressou-se a emitir uma nota à comunicação social fazendo-se eco da boa nova escrita pela organização internacional que monitoriza o devir dos países membros nos setores económicos e nos que têm impacto direto ou indireto na economia, como a educação, a saúde, a justiça, as finanças e as tecnologias.  

Sobressaem as medidas adotadas em Portugal para fazer face aos efeitos socioeconómicos da covid-19, designadamente as medidas de apoio ao emprego e às empresas (manutenção de postos de trabalho, subsídios diretos, linhas de crédito e moratórias bancárias, diferimentos de impostos e contribuições…), de que resulta hoje uma taxa de desemprego situada abaixo do nível da situação de pré-crise.

Paralelamente ressalta o facto de Portugal ter a taxa de vacinação mais elevada entre todos os países da OCDE e de, por esse lado, estar a afastar vagas mais severas da doença.

Também é digna de nota a resiliência acrescida do nosso sistema financeiro face à anterior crise financeira, apesar das fragilidades inerentes à capitalização, endividamento e dimensão das empresas portuguesas.

Não obstante, a OCDE recomenda a adoção de instrumentos de quase-capital na prevenção do risco de falência das empresas afetadas pela pandemia. E o Governo, antecipando-se a essa recomendação, aprovou recentemente, no Conselho de Ministros de 9 de dezembro, “um novo instrumento de quase-capital, através dum novo regime jurídico dos empréstimos participativos”. Na verdade, o n.º 5 do Comunicado do Conselho de Ministros de 9 de dezembro explicita que “foi aprovado o decreto-lei que aprova o regime jurídico dos empréstimos participativos, uma figura inovadora no regime nacional, que estabelece que a remuneração corresponde a uma participação nos resultados do mutuário e atribui ao mutuário o direito de conversão dos créditos em capital, verificadas as condições previstas na lei e no contrato de empréstimo”. E encarece a importância deste instrumento económico nos termos seguintes:

Face à necessidade de promover a capitalização das empresas aumentando o seu nível de capitais próprios, um instrumento de quase-capital é muito relevante, atendendo à possibilidade de ser contabilizado, total ou parcialmente, como capital próprio”.

Por outro lado, o Governo destaca, neste âmbito, o Fundo de Capitalização e Resiliência (FCR), financiado através de recursos do PRR, com uma dotação inédita de 1,3 mil milhões de euros, focado na promoção do reforço da autonomia financeira das empresas, através de instrumentos de capital e quase capital.

E, digo eu, vem a propósito referir que, na mesma data, o Executivo aprovou o decreto-lei que altera “o Sistema de Apoio à Reposição da Competitividade e Capacidade Produtivas, encurtando o prazo durante o qual devem ser mantidos os investimentos realizados neste âmbito, afetos à atividade e na localização geográfica definida na operação, permitindo que novas opções de negócio sejam materializadas com maior celeridade”. A pari, alterou os “regimes jurídicos do Fundo de Contragarantia Mútuo (Fundo) e das Sociedades de Garantia Mútua (SGM), atualizando os diplomas que impunham uma estrutura pesada na atividade de concessão de garantias”. Relativamente ao Fundo, altera-se o “tipo de operações e percentagem que pode garantir” e alarga-se a “dimensão das empresas beneficiárias, sempre no estrito cumprimento das regras de auxílios de Estado em vigor a cada momento”; e, em relação às SGM, transforma-se o “respetivo capital social para capital variável” e atribui-se-lhes o “direito de aquisição das ações dos sócios beneficiários que não têm qualquer operação em curso há determinado período de tempo”. Visa-se, com estas alterações, que “o Fundo e as SGM contribuam de forma ainda mais decisiva para a concretização dos desígnios da política económica definida pelo Governo no que respeita, nomeadamente, à promoção do investimento dinamizador do tecido empresarial, à criação de emprego e, consequentemente, ao crescimento económico, essencialmente pelas componentes do investimento e das exportações”.

A OCDE defende a manutenção de políticas públicas que suportem a atividade operacional e o crescimento de empresas economicamente viáveis. E diz o Governo que essa posição vem muito em linha com o que já está a ser feito. Em paralelo, assinala a importância duma rápida e eficaz implementação dos fundos provenientes da resposta extraordinária da UE perante a pandemia, NextGenerationEU, entre os quais se distingue o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) nacional, que já se encontra em execução.

Nas recomendações de reformas para Portugal, o relatório elenca a importância da melhoria da gestão financeira pública, nomeadamente a implementação da lei de enquadramento orçamental, apressando-se o Governo a afirmar ter incluído a modernização da Gestão Financeira Pública como uma importante reforma e investimento previsto no PRR. É prestada especial atenção ao turismo, sobretudo pela sua relevância para o futuro e para a competitividade da economia portuguesa, indicando-se o sucesso das medidas adotadas para proteger o setor durante a pandemia (por exemplo, o Programa IVAucher) e o modo como ajudaram a manter a capacidade produtividade das empresas de Restauração e Alojamento. Salienta-se ainda a importância da reforma do regime de insolvências e da agilização da reestruturação empresarial, áreas em que o Governo já desenvolveu iniciativas legislativas e que consubstanciam prioridades inscritas no PRR nacional. E aponta-se também a importância do reforço do sistema de saúde, sobretudo em profissionais como, por exemplo, enfermeiros.

No entanto, o Governo sublinha que os últimos dados da OCDE em relação ao número de enfermeiros dizem respeito ao ano de 2018, não considerando o aumento significativo do número de enfermeiros no SNS nos últimos 3 anos. Segundo os dados disponíveis no Portal da Transparência do SNS, há agora mais de 7000 enfermeiros do que 2018 (aumento de 17%). Resta saber se são contratos por tempo indeterminado ou se a termo, bem como se divisam progressão na respetiva carreira. O mesmo se diga de médicos e outros técnicos.

E o capítulo temático do relatório é dedicado à avaliação da transição digital do país, observando que o país alcançou progressos impressionantes na transição digital na última década, equiparando-se aos países da OCDE com melhor desempenho em algumas áreas.

Visto que, durante a crise covi-19, as empresas se têm voltado cada vez mais para ferramentas digitais, como o e-commerce e o teletrabalho, para manter e expandir a atividade económica, o relatório destaca igualmente que as tecnologias digitais podem ajudar Portugal a enfrentar os novos desafios como a recuperação da crise pandémica e os desafios de longo prazo, apontando recomendações nesse sentido. E considera que as disparidades na adoção das TIC entre empresas e pessoas continuam a ser significativas, pelo que o Plano de Ação para a Transição Digital, que endereça esta divisão digital, é bem-vindo.

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A mescla de informações da OCDE com medidas do Governo pode prejudicar a perceção do interesse do relatório e não pode nem deve servir para se entender que o Governo se está a desculpabilizar de algo ou pretende mostrar que está a fazer tudo bem. Nada disso é necessário. Por isso, convém deixar perorar a OCDE que não nos deixa mal, embora queira mais.

A nossa economia está a recuperar bem da crise, graças à “resposta política rápida e eficaz e ao sucesso da vacinação”. Porém, à medida que a recuperação avança, é importante prosseguir com os investimentos e as reformas estruturais que melhorarão as condições de vida, reforçar as finanças públicas e favorecer uma trajetória de “crescimento sustentável, forte e resiliente”.

Com o envelhecimento demográfico e paralela diminuição da população ativa, o crescimento futuro dependerá de ganhos de produtividade. E Portugal deveria aproveitar o PRR, financiado pela UE, não para conter a curto prazo, o défice ou a dívida, mas para acelerar a transição ecológica e digital, concentrando-se nos projetos com maior impacto económico e social. Na verdade, como afirmou Mathias Cormann, secretário-geral da OCDE, “Portugal está a recuperar rapidamente de um choque económico profundo e a previsão é de que essa recuperação irá continuar”. Por conseguinte, “será fundamental otimizar a intensidade e a qualidade da recuperação, através de uma maior produtividade e acelerando as transições digital e verde”, constituindo o PRR “uma oportunidade para atingir esse objetivo, pelo que deverá ser implementado de forma rápida e eficiente”.

A pandemia desferiu duro golpe na economia portuguesa. Após a queda de 8,4 % em 2020, o PIB português deverá voltar a crescer 4,8 % em 2021 e 5,8 % em 2022, também graças ao facto de quase 90 % da população já estar completamente vacinada, a taxa mais elevada da OCDE.

Contudo, a atividade económica em setores fundamentais da economia (turismo, Transportes, hotelaria…) continua muito aquém dos níveis anteriores à crise. Por isso, importa que “os apoios dirigidos às famílias e às empresas sejam mantidos e adaptados à evolução da pandemia”, se reforce “o apoio aos jovens e aos trabalhadores pouco qualificados à procura de emprego”, para que eles se adaptem às mudanças no mercado de trabalho, e se deem “mais apoios à capitalização das empresas viáveis”.

Portugal deve reduzir os desequilíbrios macroeconómicos para conferir uma base mais sólida à recuperação. Como a relação dívida-PIB disparou, situando-se entre as mais altas da Europa, “à medida que a recuperação avança, será importante adotar um plano claro e credível para o ajuste orçamental a médio prazo”, pois “são necessárias reformas para o país obter uma redução da população ativa e melhorar o desempenho da administração pública”. Por outro lado, é de referir que “ainda há margem para reforçar a sustentabilidade a longo prazo do sistema de pensões”.

A pandemia aumentou os riscos financeiros no setor empresarial e os bancos enfrentam um elevado nível de empréstimos não produtivos, pelo que se “recomenda o reforço dos incentivos aos bancos para reduzirem o nível de ativos de alto risco”.

Será fundamental acelerar a transição digital para adaptar a economia ao mundo pós-pandémico e promover o crescimento da produtividade, que se tem mantido abaixo da média da OCDE, praticamente nas duas últimas décadas. Para tanto, é necessário “ajudar as empresas na adoção de novas tecnologias, dotar a população de competências digitais e melhorar o acesso a serviços de banda larga de alta qualidade”.

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Enfim, o relatório económico da OCDE sobre Portugal não está repleto de cartões vermelhos, como pretendem os profetas da desgraça sempre que uma instância internacional se pronuncia, nem está enxameado de cartões verdes como querem dizer certos apaniguados deste Governo. O documento reconhece, por um lado, a situação difícil do país e, por outro, os esforços significativos para debelar e conter a crise. Porém, reconhece fragilidades no quadro das desigualdades, na falta de qualificações e produtividade e na insuficiência das reformas estruturais. Isto sem nos declarar à beira do abismo. E, obviamente, faz as recomendações que se impõem na conjuntura e que devem ter efeitos para lá da conjuntura. Para isto, exige-se vontade política, capacidade de atração do investimento, contenção nos custos de produção e anulação da dificuldade burocrática e do peso fiscal em excesso, bem como maiores qualificações de empresários e de trabalhadores, eficiente organização do trabalho, planeamento rigoroso e melhores condições laborais, salariais e sociais. Enfim, trabalho digno e empresas com responsabilidade social, solidária e cultural.   

2021.12.11 – Louro de Carvalho

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