segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Aumento do salário mínimo e dos vencimentos na administração pública

O Presidente da República promulgou, neste dia 6 de dezembro, como anunciou o Palácio de Belém, os decretos do Governo que aumentam o salário mínimo nacional – atualmente designado por retribuição mínima mensal garantida (RMMG) de 665 para 705 euros e as remunerações da administração pública em 0,9%.
No atinente à RMNG, que fora decretado pelo Governo a 2 de dezembro e recebeu agora luz verde de Marcelo Rebelo de Sousa um aumento de 40 euros para 705 euros brutos mensais, estando em causa o acréscimo mais expressivo de sempre, em termos absolutos, a Ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, estima que 880 mil trabalhadores deverão ver os seus salários subirem, a partir de janeiro de 2022, à boleia desta atualização.
A par deste aumento da RMMG, o Governo preparou uma compensação para os empregadores, garantindo-lhes um apoio de 112 euros por cada trabalhador que passe da atual retribuição mínima garantida de 665 euros para a nova de 705 euros. Este subsídio segue os moldes da compensação aplicada este ano, sendo, portanto, pago uma única vez às empresas, numa data ainda a determinar. De acordo com o Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, a medida custará em torno de 100 milhões de euros.
Já no caso das empresas que paguem, neste momento, mais do que o atual salário mínimo, mas menos do que o novo, e passem a garantir esse valor (705 euros), a compensação será de 56 euros. Mas há uma exceção à regra: se as empresas já estiveram a pagar mais do que a atual retribuição mínima garantida, mas por via da contratação coletiva, e passarem a pagar o novo salário mínimo, então terão direito a 112 euros de apoio por cada trabalhador.
O relatório "Retribuição Mínima Mensal Garantida 2021", do Gabinete de Estatística e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, diz que "a incidência do salário mínimo nacional é razoavelmente mais elevada nos Trabalhadores por Conta de Outrem".
Cerca de um quarto dos trabalhadores em Portugal recebe o salário mínimo nacional (SMN), que é sobretudo auferido pelos trabalhadores precários, pelas mulheres, pelos jovens e por pessoas com menos habilitações, que trabalham maioritariamente em pequenas empresas.
É de recordar que, de acordo com o relatório “Retribuição Mínima Mensal Garantida 2021”, do Gabinete de Estatística e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, em junho de 2021 ganhavam o SMN 24,6% dos trabalhadores.
Segundo o documento, que foi distribuído na reunião da Comissão Permanente de Concertação Social de 16 de novembro, “a incidência do salário mínimo nacional é razoavelmente mais elevada nos Trabalhadores por Conta de Outrem (TCO) com contratos não permanentes do que nos TCO com contratos permanentes”. Com efeito, em 2019, nos termos do documento, “30,2% dos TCO com contratos não permanentes tinham remuneração base igual ao salário mínimo, o que compara com 17,1% dos TCO com contratos permanentes” (mais 13,1%).
Na análise feita, sobressai um padrão de continuidade do ponto de vista do sexo, sendo que a incidência da RMMG é sempre mais elevada nas mulheres do que nos homens, padrão que reflete as desigualdades salariais prevalecentes entre os dois sexos. Em junho de 2021, 27,0% das mulheres tinham remuneração base equivalente ao valor da RMMG, o que compara com 22,6% dos homens. Por escalão etário, verificou-se que, entre os jovens com menos de 25 anos, a proporção de trabalhadores com salários iguais à RMMG, nos primeiros 6 meses de 2021, se manteve perto dos 34,0%, acima do segmento dos jovens adultos (25-29 anos), tendo a proporção de pessoas abrangidas pela RMMG rondou os 26,0%.
Nos dois casos e em termos trimestrais, a variação dos últimos 3 meses face ao 1.º trimestre do ano representou uma ligeira diminuição (menos de 0,2%).
Nas pessoas com mais de 30 anos, que representavam em junho de 2021 cerca de 24,0% dos trabalhadores com remuneração declarada igual à RMMG, registou-se uma variação na mesma ordem de grandeza, de 24,0% para 23,8% entre os dois trimestres de 2021.
Segundo o relatório do GEP, na situação observada no mês de julho de 2021 e tendo em atenção as caraterísticas das pessoas empregadas e das entidades empregadoras com maior incidência do salário mínimo nacional no emprego, sobressaiu mais uma vez a incidência relativamente mais elevada da RMMG nas mulheres (29,3%) e nos jovens com menos de 25 anos (40,3%), sendo que Também os dados mostram que o peso relativo do salário mínimo é mais elevado nos trabalhadores com habilitações até ao 3.º ciclo do ensino básico (33,3%) e quase residual nas pessoas com o ensino superior (6,6%).
Tendo como referência as caraterísticas das entidades empregadoras, sobressaem, por apresentarem uma incidência elevada de pessoas abrangidos pela RMMG, as atividades das famílias empregadoras de pessoal doméstico e atividades de produção das famílias para uso próprio (45,4%), o setor do alojamento, restauração e similares (45,3%) e a agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca (44,0%), seguidas pelas atividades imobiliárias (35,2%) e pela construção (34,6%).
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Quanto aos trabalhadores da Administração Pública, os que recebem atualmente pelo nível remuneratório mais baixo beneficiarão de um aumento de 40 euros, por efeito da subida do salário mínimo nacional. Os demais verão os ordenados subirem 0,9%.
Convém recordar que o Governo chegou a mostrar abertura para ir além dos referidos 0,9%, caso a inflação anual registada em novembro superasse a esperada, mas o valor provisório desse indicador divulgado pelo INE (Instituto Nacional de Estatística) no início da outra semana indica que tal não aconteceu.
De acordo com a Ministra da Administração Pública, Alexandra Leitão, 110 mil funcionários públicos serão abrangidos pelo aumento do salário mínimo – o que implica um custo de 80 milhões de euros – enquanto os salários de 612 mil trabalhadores do Estado terão subidas de 0,9%, atualização que custará 225 milhões de euros.
Na verdade, o Governo aprovou em Conselho de Ministros, no passado dia 2, a subida do salário mínimo para 705 euros a partir de 1 de janeiro. E a Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social disse na ocasião que a aprovação do aumento do salário mínimo nacional para 2022 para 705 euros aconteceu “na sequência da auscultação dos parceiros sociais” e cumprindo o compromisso assumido em 2015 e renovado em 2019 para “chegar a 2023 com 750 euros”.
O Governo aprovou igualmente, no dia 2, uma atualização de 0,9% nas remunerações da Administração Pública (AP).
Este decreto-lei, segundo o respetivo comunicado do Conselho de Ministros, “atualiza as remunerações da Administração Pública e aumenta a respetiva base remuneratória, a qual é revista em linha com a atualização da retribuição mínima mensal garantida”, então aprovada.
Com este diploma, “os valores dos níveis da tabela remuneratória única (TRU) da Administração Pública, bem como das demais remunerações base mensais existentes na AP são atualizados em 0,9%”, sendo a medida “aplicável aos trabalhadores de entidades administrativas independentes e aos de empresas públicas do setor público empresarial que não sejam abrangidos por instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho em vigor”.
Relativamente ao número de trabalhadores da função pública em teletrabalho, recomendado a partir do dia 2, no âmbito do novo estado de calamidade, Alexandra Leitão disse ainda não haver dados, mas lembrou que, em momentos semelhantes vividos desde o início da pandemia, a perspetiva do Governo rondou os 40.000.
A governante ressalvou, porém, que o universo de trabalhadores públicos abrangidos se resume aos que têm funções compatíveis com teletrabalho.
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O Presidente da República considerou que “a situação crítica pós-pandémica explica a solução” do Governo para o aumento do salário mínimo nacional em 2022, que, no seu entender, todos gostariam que se “fosse mais longe”.
O Chefe de Estado falava aos jornalistas, neste dia 5, à saída da sede da Academia Portuguesa da História, em Lisboa, onde participou numa sessão comemorativa dos 300 anos da fundação da Academia Real da História Portuguesa, horas depois de ter promulgado os susoditos decretos do Governo que aumentam o salário mínimo nacional e as remunerações da Administração Pública.
A propósito do aumento do salário mínimo nacional para 705 euros a partir de 1 de janeiro de 2022, Marcelo começou por referir que “alguns ambicionariam que se fosse mais longe, outros pensavam que não se devia ir tão longe” neste momento. E, colocando-se do lado daqueles que gostariam que se fosse mais longe, observou que “há um conjunto de pequenas e médias empresas e há uma situação crítica pós-pandémica que explica a solução” tomada de forma moderada, algo contida.
Questionado sobre a eventual criação de um salário mínimo europeu, o Presidente respondeu que essa “é uma ideia que ainda está em estudo na Europa” e que “ainda precisa de ser aprofundada”.
Segundo o Chefe de Estado, “há que esperar para ver; e ver se o que vai acontecer não é haver um quadro geral que depois permite aos países e às várias economias terem os regimes próprios”. Com efeito, como apontou, as economias são muito diferentes, com situações diferentes”, sendo que, desta feita, se respondeu “a uma situação concreta da economia portuguesa”.
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Menos de uma semana depois de o Governo confirmar a subida da RMMG para 705 euros em 2022, a OCDE recomenda, no “Economic Outlook”, a Portugal que evite aumentos rápidos da RMMG, já que que tal pode reduzir as oportunidades laborais sobretudo para os trabalhadores menos qualificados e contribuir para altos custos de trabalho, ineficientes, a longo prazo.
O Governo confirmara aos parceiros sociais que a RMMG subiria, a partir de janeiro de 2022, para 705 euros – um acréscimo de 40 euros, acompanhado duma compensação de 112 euros por trabalhador para as entidades empregadoras. Essa contrapartida custará aos cofres do Estado cerca de 100 milhões, o triplo do gasto com a compensação concedida este ano às empresas.
No seu relatório, a OCDE mostra-se, por outro lado, contra a reversão das reformas laborais, avisando que tal poderá constituir uma ameaça à sustentabilidade da recuperação económica. “É importante evitar a reversão das reformas do mercado laboral passadas, o que poderia minar a sustentabilidade da recuperação”, alerta a organização liderada por Mathias Cormann. Aí vem ao encontro do Parlamento que recentemente votou várias alterações à lei laboral propostas pela esquerda no sentido de “combater a precariedade e reforçar os direitos dos trabalhadores“, limitando, por exemplo, a contratação a prazo e revertendo o polémico alargamento do período experimental que fez parte da revisão de 2019 do Código do Trabalho, sendo que tais medidas acabaram por ser rejeitadas, com os votos desfavoráveis da direita e do PS, partido que as tinha viabilizado, na generalidade. Em contrapartida, no final de outubro, o Governo aprovou em Conselho de Ministros, a poucos dias da votação da proposta de Orçamento do Estado para 2022, que viria a ser reprovada, a Agenda do Trabalho Digno, pacote de alteração à legislação do trabalho que incluía nomeadamente a reposição do valor pago pelo trabalho suplementar a partir da 120.ª hora anual e a subida da compensação pela cessação dos contratos a termo.
Com a dissolução do Parlamento, decretada no dia 5, a Agenda do Trabalho Digno não deverá chegar “ao terreno”, uma vez que teria de passar pelo crivo dos deputados.
Num outro ponto do seu relatório, a OCDE frisa que o reforço do regime de insolvência poderia reduzir os obstáculos ao sucesso da reestruturação de empresas viáveis e ao fim das empresas não viáveis, o que inclui facilitar procedimentos extrajudiciais, aliviando o congestionamento dos tribunais face a um potencial disparo das falências. Ademais, a OCDE frisa que alguma “realocação de atividades e empregos” será inevitável, face às mudanças nas preferências e comportamentos das pessoas, por força da crise pandémica, defendendo que as políticas deverão estar focadas estritamente nos empregos e nas empresas viáveis. E, a este respeito, explicita:
Ainda que sejam esperadas perdas de emprego significativas em certos setores, noutros haverá um aumento das vagas, cujo preenchimento poderá não ser fácil por efeito da desadequação entre os empregos e as competências dos trabalhadores. Essa realocação laboral pode ser facilitada pelo fortalecimento dos serviços públicos de emprego e por programas de qualificação..
Ainda sobre o mercado laboral, a organização liderada por Mathias Cormann prevê que o aumentará devagar, pois “muitos empregos foram protegidos por sistemas de retenção de emprego, e empresas responderam aumentando as horas de trabalho, pelo menos inicialmente”.
Na secção dedicada a Portugal, a OCDE inclui previsões para o PIB nacional, que vê a crescer 4,8% em 2021, 5,8% em 2022 e 2,8% em 2023. Assim, a estimativa para este ano está em linha com o Governo, mas a relativa ao próximo ano supera a projeção de João Leão.
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O aumento do salário mínimo é eminentemente tímido, dado que o custo de vida não para de subir. É certo que as microempresas e as instituições do setor social e solidário experimentam contrições de todo o tipo e esta é uma delas. Por outro lado, os patrões queixam-se da estagnação da economia e da falta de competitividade e acusam o Estado de ter entre os seus trabalhadores um enorme bolo de funcionários a ser remunerados com o salário mínimo nacional. Ora, a competitividade não depende do trabalho compensado com baixas remunerações, mas da qualificação dos trabalhadores, da qualificação dos patrões, da escolha de bons gestores e sobretudo da boa organização e planeamento do trabalho. Por outro lado, os governos deveriam intervir na moderação dos custos de produção, induzindo a redução de, por exemplo, preços de eletricidade e telecomunicações, bem como anulação de desperdícios e aproveitamento de combustíveis não fósseis. Nada justifica que se desista do trabalho digno e compatível com a vida pessoal e familiar ou que as rendas de casa estejam a preço inacessível.
Falta cuidar a sério da subida do salário médio e da valorização dos técnicos superiores!

2021.12.06 – Louro de Carvalho


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