É o conselho
do Cardeal Jean-Claude Hollerich, Arcebispo do Luxemburgo e presidente da Comissão dos
Episcopados Católicos da União Europeia (COMECE), na missa da Peregrinação
Aniversária de agosto, a que presidiu em Fátima, nestes dias 12 e 13, que
assinala a 4.ª aparição de Nossa Senhora
aos três videntes, a única fora da Cova da Iria, nos Valinhos e fora do dia 13 (a 19 de agosto), e é tida como a Peregrinação dos Emigrantes já há muitos anos.
Esta Peregrinação, que trouxe a Fátima
milhares de pessoas, entre as quais muitos emigrantes portugueses e três grupos
estrangeiros organizados de Espanha (2) e
da Polónia (1), teve, nesta manhã, 90% da lotação
prevista para esta peregrinação ainda em tempo de pandemia que reuniu 47
sacerdotes, 5 bispos e 2 cardeais.
A
Peregrinação iniciou-se no dia 12, com a recitação do Rosário, às 21,30 horas;
seguiu-se a Procissão das Velas e depois a celebração da Palavra no altar do
recinto. No dia 13, às 9 horas, recitou-se de novo a oração do Rosário e, às 10
horas, celebrou-se a Missa, com a tradicional Palavra ao Doente que foi
proferida por Eugénia Quaresma, diretora da OCPM (Obra Católica Portuguesa das
Migrações); e terminou com a Procissão do
Adeus.
Também ainda neste dia 13 houve a
evocação da queda do Muro de Berlim, com uma oração integrada no Rosário
Internacional das 21,30 horas.
Inaugurado em 13 de agosto de 1994,
este monumento, no recinto de Oração, é um bloco do muro que, edificado na
noite de 12 para 13 de agosto de 1961, há 60 anos, dividiu a cidade de Berlim
durante quase 30 anos, vindo a ser demolido em novembro de 1989. O bloco, que
pesa 2,6 toneladas e mede 3,6 por 1,2 metros, foi oferecido por um português
residente na Alemanha e o seu arranjo é do arquiteto José Carlos Loureiro.
Destaque ainda para a oferta de trigo
(cumprida pela 81ª vez
nesta peregrinação de agosto), iniciativa começada a 13 de agosto de 1940, quando um grupo de jovens
da JAC (Juventude Agrária
Católica), de 17
paróquias da diocese de Leiria, ofereceu 30 alqueires de trigo destinados ao
fabrico de hóstias para consumo no Santuário de Fátima. Desde então, os
peregrinos, já não só de Leiria, mas também de outras dioceses do país, e até
do estrangeiro, têm vindo a dar continuidade, ano após ano, a esta oferta. Em
2020, foram oferecidos 4973 Kg de trigo e 504,50 Kg de farinha. Consumiram-se,
no Santuário, aproximadamente, 7000 hóstias médias, 50 hóstias grandes, cerca
de 371300 partículas e 30 partículas para celíacos. Foram celebradas 2784
missas.
***
Na tarde do
dia 12, na conferência de imprensa que antecedeu a Peregrinação Internacional
Aniversária de Agosto, o presidente da COMECE
criticou as políticas da União Europeia (UE) em relação à realidade dos refugiados e condenou o discurso contraditório
que pode conduzir a uma alienação da humanidade na Europa e mesmo a indiferença da UE em relação à questão dos
refugiados, manifestada numa certa
inércia da política europeia nesta matéria.
A este respeito, no encontro com os jornalistas, Hollerich, apontando o dedo à escravatura de trabalho e sexual de
que muitos destes refugiados são vítimas, afirmou:
“É inadmissível que as fronteiras exteriores
da União Europeia sejam lugar de grandes assembleias de refugiados, onde as
pessoas vivem em condições desumanas”.
O presidente
da COMECE expôs a contradição presente no discurso dos políticos em
relação a este drama, para o qual a Europa tem vindo a “fechar os olhos”, e
exemplificou:
“Fala-se dos valores europeus, mas
ninguém dá o passo necessário para o acolhimento. O que assistimos é a um
discurso e a uma prática totalmente diferentes.”.
O purpurado
considerou, de resto, “muito grave” que a UE faça regressar
indiscriminadamente os refugiados para fora das suas fronteiras, sem verificar
quem tem direito de asilo à luz da Convenção de Genebra e alertou para a perda
dos valores que edificaram a Europa, pois, como disse, “as pessoas que estão naqueles
barcos perdem a fé na Europa, porque não há quem as ajude” e, se não reagimos
com humanidade, perdemos a nossa própria humanidade”, sendo que “a construção
europeia sustentada ‘nesta humanidade’ não terá futuro”. E concluiu:
“Penso que, como europeus,
deveríamos ter um momento onde poderíamos dizer, aberta e honestamente, que
temos vergonha deste discurso que é tão diferente da política real em relação
aos refugiados”.
A
Peregrinação de Agosto, a que tradicionalmente acorrem milhares de emigrantes
de férias em Portugal, tem vindo, desde a década de 70 do século XX, a ser
lugar onde a Igreja expressa as suas reflexões em relação à condição do
migrante, na preocupação que se reflete na homilética e nas mensagens que se
fazem ouvir a partir da Cova da Iria, nesta ocasião. Assim, na conferência de
Imprensa, da responsabilidade da OCPM, falou também Eugénia Quaresma,
diretora da OCPM, que expressou a sua preocupação com a exploração de que são
alvo os migrantes imigrantes em Portugal, concretamente pelo tráfico de pessoas
para fins laborais e sexuais, fazendo saber que a pandemia teve impacto
negativo nas condições de vida das pessoas que vêm para Portugal trabalhar e
alertando para as narrativas xenófobas e racistas das redes sociais.
E o Padre
Rui Pedro, missionário scalabriniano no Luxemburgo junto da comunidade de
língua portuguesa, traçou um retrato da realidade dos portugueses emigrantes
naquele país, que viram a sua situação deteriorar-se com a pandemia.
***
Na Celebração da Palavra a que presidiu na noite do dia 12,
o Arcebispo do Luxemburgo, observou que “as numerosas
velas que ardem diante da imagem de Nossa Senhora são o sinal da consolação de
Jesus que Nossa Senhora nos traz”, desafiou os peregrinos à promoção de um mundo “mais justo” e “fraterno” e elogiou a fé das mulheres portuguesas.
E, destacando
o título ‘um nós cada vez maior’, da
mensagem do Papa Francisco para o Dia
Mundial dos Migrantes e Refugiados, que se celebra a 26 de setembro e que a
OCPM antecipa nesta 49.ª Semana Nacional dos Migrantes que se integra na
peregrinação de agosto, vincou:
“Como
cristãos, nós não somos passivos neste mundo. O mundo está-nos confiado pelo
Deus Criador, nós devemos fazê-lo frutificar. Isso pode tornar-se num
compromisso para com a ecologia, o compromisso por um mundo mais justo, por um
mundo mais fraterno, em vista de ‘um nós cada vez maior’.”.
Considerando
que “os grandes compromissos serão válidos se mostrarem os seus frutos de paz,
justiça e defesa do bem-comum, na vida concreta do dia a dia”, desenvolveu:
“O
mundo tem sede, o mundo precisa de mais amor, o mundo tem sede de amor, paz e
justiça! Não sejamos apenas daqueles que consomem a água que Deus nos oferece
para uso próprio; procuremos ajudar Deus, para que a nossa vida sirva para
partilhar esta água com os outros, os que têm fome e sede de justiça das
bem-aventuranças.”.
A partir da
liturgia, que relevou a simbologia da água no itinerário cristão, o prelado
frisou que é desta água que o mundo precisa para sarar as suas feridas, deixou
um elogio às mulheres portuguesas, que na sua religiosidade sabem saborear o
valor desta água, e disse:
“Nós
temos necessidade da água da consolação. Em muitas das igrejas que frequentamos
há habitualmente uma imagem de Nossa Senhora do Rosário de Fátima. As numerosas
velas que ardem diante da imagem de Nossa Senhora são as testemunhas das nossas
orações. São também o sinal da consolação de Jesus que Nossa Senhora nos traz.”.
Disse que “o
caráter de Maria é semelhante ao caráter de muitas mulheres portuguesas,
cabo-verdianas e brasileiras” que ele conhece no Luxemburgo, pois, “como Maria
são mulheres fortes”. E explicou:
“Como
Maria une a igreja primitiva, assim as mulheres portuguesas mantém a sua
família unida. Elas fazem-no pelo seu trabalho. Elas querem assegurar um futuro
para os seus filhos. À noite, cansadas, ocupam-se ainda da casa e cozinham
alimentos que alegram a alma e o corpo da sua família. Por vezes, como Maria,
elas têm o coração amargurado e triste, mas não o mostram para não espalharem
desolação e preocupação. Querem garantir a união.”.
O purpurado
luxemburguês está certo de que “é ao pé de Jesus e de Maria que estas mulheres
portuguesas encontram a sua força e a sua alegria”, mulheres marcadas “pela sua
tenacidade na defesa da fé”. E, a este respeito, enfatizou:
“Elas
mostram-nos o que é ser cristão: beber nas fontes da salvação, saborear já aqui
as alegrias da eternidade. Elas sabem que esta água fresca que Deus nos
oferece, deve ser partilhada com outros.”.
Deixando-lhes
um bem explícito agradecimento pelo seu testemunho, disse:
“Caras
mulheres, peregrinas de Fátima que aqui estais com vossas famílias: muito
obrigado pelo vosso magnífico testemunho”!
E, prosseguiu
salientando:
“Partilhar
a água, partilhar a graça, é um grande desafio; é necessário criar canais
de irrigação, é necessário projetar os terrenos,
com visão e criatividade”.
Por fim,
exortou:
“Rezemos
a Nossa Senhora do Rosário de Fátima para que, dos nossos lamentos e das nossas
feridas, possa brotar a água da vida. Queridas irmãs, queridos irmãos
migrantes e refugiados: deixemos que Deus transforme os nossos desertos em
terrenos cultivados porque irrigados pela beleza e bondade do Deus de Jesus
Cristo, nosso Senhor e nossa água Viva.”.
***
Na
manhã do dia 13, o Arcebispo do Luxemburgo desafiou migrantes a usar a sua fé
para devolver Deus à Europa e, elogiando a fé dos portugueses, nomeadamente dos emigrantes, disse que são “um
sinal de esperança” para a Igreja. Mais disse que a fé e a religiosidade do
povo português devem ser postas ao serviço da Igreja. E dirigiu-se aos diversos
tipos de peregrinos:
“Caros
amigos, portugueses, caros emigrantes, caros refugiados, com as vossas mãos,
trabalho, suor do rosto, inteligência, sacrifício das vossas famílias, tendes
ajudado a construir a riqueza económica e cultural dos países que, por esse
mundo fora, vos acolhem”.
A partir disto pretendeu desafiar os
emigrantes portugueses a fazer o mesmo no que toca à fé.
“A
Europa hoje vive longe de Deus, esqueceu-O! Com o vosso espírito de serviço,
com a vossa fé e vossa religiosidade procurai continuar a ajudar os países que
vos acolhem para viver a não perderem a esperança” – disse o cardeal
luxemburguês, que destacou:
“As
paróquias precisam de homens e mulheres, jovens e adultos, dispostos a servir o
Evangelho e o próximo; na catequese não é necessário ter um doutor em teologia,
mas uma fé viva é bem mais importante e fecunda na transmissão da fé aos mais
novos ou adultos; nos grupos de solidariedade cristã são precisas pessoas
abertas que favoreçam o acolhimento dos refugiados e migrantes”.
“Irmão,
Irmã: a Igreja precisa de Ti!” – exortou o purpurado expressou uma grande
simpatia pelo povo português, que conhece bem já que preside a uma diocese que
tem entre os seus residentes um sexto de portugueses. E, vincando que os
migrantes são fundamentais para o desenvolvimento dos diferentes países, deu o
seu próprio testemunho sobre estas pessoas:
“Eu
próprio tenho a alegria de poder encontrar frequentemente muitas famílias
portuguesas e lusófonas que vivem na arquidiocese do Luxemburgo. As comunidades
portuguesas são um sinal de esperança para a Igreja de Cristo que peregrina no
Grão-Ducado do Luxemburgo.”.
O cardeal elegeu a “comunhão e a
interculturalidade” como fatores de renovação da Igreja e agradeceu o serviço
prestado por todos os migrantes “ao bem-comum da sociedade e da Igreja”.
A partir da liturgia proclamada na
Missa, sublinhou o poder da oração e da sua influência na conversão dos
corações. E, lembrando que “aprendemos a confiar” com Maria, interpelou:
“Será
que acreditamos mesmo na ressurreição de Jesus e na ressurreição dos mortos?
Vós dir-me-eis: talvez, com certeza, pois, de outro modo, não estaríamos aqui
em Fátima, mas em nossa casa.”.
Sobre a motivação da vinda dos
peregrinos a Fátima e o genuíno escopo do encontro, observou:
“Estou
certo de que muitos de nós, peregrinos de Fátima, viemos a este Santuário, com
o mesmo género de orações: pela saúde dos familiares, os problemas do trabalho,
a preocupação com o sucesso escolar dos filhos e netos, as incertezas da emigração,
entre outras. (…) Também nós, como Maria, temos a feliz oportunidade de, agora
e aqui – neste lugar sagrado – reencontrar Jesus na Palavra de Deus, nesta
solene Eucaristia e na Sagrada comunhão. Este encontro encerra uma força de
mudança nas nossas orações: elas são invadidas pelo sentimento da presença real
de Jesus, e a nossa oração de súplica pode atingir a oração de louvor.”.
E salientando que “nós podemos viver
a mesma experiência aqui de consolação, da esperança”, e que, “se, como Maria,
queremos atingir a consolação da esperança, temos que nos colocar ao serviço
dos outros”, lançou o seguinte apelo:
“Apelo-vos
a alargar este espírito de serviço aos vossos vizinhos, às pessoas com quem vos
cruzais habitualmente, aos vossos amigos. Porque não roubar tempo ao tempo para
visitar os irmãos doentes ou idosos? A verdade é que a fé sem espírito de
serviço não passa de um sentimento... e os sentimentos são passageiros.”.
***
Depois da comunhão, na palavra dirigida
ao doente, Eugénia Quaresma deu graças pelo “Deus de Amor, que se faz presente
nas visitas, nos cuidados de familiares, profissionais e voluntários que, por
vocação, se dedicam a salvar vidas” e “pela delicadeza de tantos anónimos,
que se fazem inesperadamente próximos, como o Bom Samaritano e o Estalajadeiro”.
Com referência ao tema pastoral que
dá mote a este ano pastoral no Santuário de Fátima, “Louvai o Senhor que levanta os fracos”, a diretora da OCPM convidou
os doentes a, com ela, rezarem para compreender e aceitar a
vulnerabilidade humana que a doença traz, “com o sentido que o Senhor mais
anseia: um coração disponível para se compadecer, converter e amar”.
***
No final da celebração, na
tradicional mensagem aos peregrinos, o Cardeal Dom António Marto, Bispo de
Leiria-Fátima – que agradeceu a presença e a mensagem do Cardeal Jean-Claude
Hollerich, presidente da Peregrinação deixou, elogiando o seu empenho na defesa
da “dignidade e dos direitos dos migrantes e refugiados” – sublinhou dois
aspetos da Peregrinação, ao considerá-la “uma experiência viva da fraternidade
universal” e uma “evidência de que a oração do Santuário está ligada à
geografia do mundo, a todas as necessidades e problemas de todos os povos e
países, de onde parte e chegam todos os emigrantes e refugiados”. E disse:
“É
belo fazer esta experiência aqui no Santuário Aqui, na casa da mãe, senti-nos
todos irmãos. (…) A nossa oração é universal e torna o nosso coração universal
também… E aqui recebemos, por intercessão de Maria, o dom da consolação, da
esperança, da fortaleza e da alegria, para caminharmos e construirmos juntos um
futuro de justiça e de paz.”.
Por fim, agradeceu a presença dos
peregrinos mais pequenos, a quem desejou boas férias e enviou uma bênção
especial aos doentes que seguiram a celebração pelos meios de comunicação
social.
***
E assim prossegue o Santuário no seu
melhor: o cumprimento da missão evangelizadora e retemperadora da espiritualidade.
Sem desânimo, antes com ardor renovado e reforçado.
2021.08.13 – Louro de Carvalho
Bem, a ideia de usar a Fé como mensagem missionária numa época de primado da razão com a qual Deus nos dotou e mandou desenvolver, é que não me parece lá grande coisa. Independentemente da religião que cada um adote para o guiar naquelas coisas da vida para as quais não encontra resposta, parece-me que a questão primeira da existência do Criador deve ser, preferencialmente, abordada do ponto de vista da demonstração lógica do que da aceitação dogmática baseada, unicamente, naquilo que os redatores dos textos fundamentais de cada fé religioda há muito escreveram.
ResponderEliminarSe o tema lhe interessar, sugiro uma leitura refletida do pequeno texto que publiquei no Mosaicos em Português, em https://mosaicosemportugues.blogspot.com/2021/07/afinal-deus-existe.html, e que desde já o convido a comentar.
Desejo-lhe um bom Domingo!