domingo, 29 de agosto de 2021

Cabido de São Pedro centra-se na oração e animação pastoral

 

O cabido da Basílica Vaticana de São Pedro é uma instituição quase milenar cujo estatuto está em revisão. Entretanto, o Papa Francisco acabou por aprovar, a 27 de agosto, na memória litúrgica de Santo Agostinho, as normas transitórias para o Cabido de São Pedro no Vaticano, que entrarão em vigor no próximo dia 1 de outubro.

A finalidade é favorecer o início da reforma desta antiga instituição fazendo ressaltar o serviço litúrgico e pastoral dos canónicos nesta Basílica papal. Em especial, quer-se relançar o “serviço de animação litúrgica e pastoral” desempenhado até agora pelos cónegos na Basílica Vaticana, principalmente aos domingos e feriados. A reforma atual insere-se no caminho indicado por Bento XVI na sua alocação de 8 de outubro de 2007.

Os cónegos, que são pouco menos de 30, segundo as novas normas receberão, “um emolumento capitular que não pode ser acumulado com outras comissões ou outras remunerações por serviços prestados na Cúria Romana e outras instituições ligadas à Santa Sé”.

Será assim também para os coadjutores do Cabido, que exercem o seu múnus nas celebrações litúrgicas, nas obras pastorais e em outras funções.

“A administração e a gestão das atividades económicas ligadas ao Museu do Tesouro e à venda de objetos religiosos” serão confiadas à Fábrica de São Pedro, “que assume todos os funcionários contratados pelo Cabido”. Este continuará a manter e administrar “o património imobiliário e financeiro atualmente em seu nome e as relativas rendas”. Além disso, estabelece-se que os emolumentos dos cónegos e dos coadjutores em serviço “são fornecidos pela Fábrica”.

O Cabido da Basílica Papal de São Pedro no Vaticano é constituído por um colégio de sacerdotes nomeados pelo Papa no papel de cónegos, assim como os coadjutores. Nasce como instituição em 1053 com uma Bula de são Leão IX, que veio confirmar uma realidade já presente há séculos na Basílica constantiniana com o serviço litúrgico e orante desempenhado por monges pertencentes a vários mosteiros. A partir do pontificado do Papa Eugénio IV (1145-1153), o Cabido transforma-se gradualmente em comunidade autónoma, passando de uma estrutura monasterial a uma estrutura canónica.

A atividade do Cabido abarca desde o início vários campos: do litúrgico ao administrativo para a gestão do património da Basílica e das igrejas filiais; e do campo pastoral, com a atividade no bairro “Borgo”, ao caritativo, com os diversos serviços assistenciais. A partir do século XVI, quando começa a construção da nova Basílica, a história do Cabido entrelaça-se com a da Fábrica de São Pedro, duas instituições separadas, mas unidas na pessoa do arcipreste.

Nas últimas décadas – como destacou Bento XVI em 8 de outubro de 2007 – “ a atividade do Cabido na vida da Basílica Vaticana orientou-se progressivamente para a redescoberta das suas verdadeiras funções originárias, que consistem sobretudo no ministério da oração. (…) Esta é a natureza própria do Cabido Vaticano e o contributo que o Papa espera de vós: recordar com a vossa presença orante junto do túmulo de Pedro que nada se antepõe a Deus; que a Igreja toda está orientada para Ele, para a sua glória; que o primado de Pedro está ao serviço da unidade da Igreja e que ela por sua vez está ao serviço do desígnio salvífico da Santíssima Trindade”. 

A Capela do Coro do Cabido guarda as relíquias de São João Crisóstomo e ostenta a imagem Virgem Imaculada, coroada pelo Beato Pio IX em 1854 e circundada de estrelas, cinquenta anos depois, em 1904, por São Pio X.

 

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No encontro com o Cabido em outubro de 2007, Bento XVI reconheceu “a presença ininterrupta do clero orante na Basílica Vaticana desde os tempos de São Gregório Magno: uma presença contínua, intencionalmente não ostentosa, mas fiel e perseverante”.

Em seguida, sintetizou a história do Cabido: teve início em 1053, quando o Papa Leão IX confirmou ao Arcipreste e aos Cónegos de São Pedro, estabelecidos no mosteiro de Santo Estêvão Maior, os domínios e os privilégios concedidos pelos seus predecessores; com o pontificado de Eugénio IV (1145-1153) adquiriu as caraterísticas de uma comunidade bem estruturada e autónoma, uma longa e gradual passagem de uma estrutura monasterial, colocada ao serviço da Basílica para a atual estrutura canonical.

Depois, fez referência às funções capitulares. Sob a orientação do Arcipreste, a atividade dirigiu-se, desde as origens, a vários campos de empenho: o litúrgico para a celebração coral e para os cuidados diários dos serviços anexos ao culto; o administrativo para a gestão do património da Basílica e das igrejas filiais; o pastoral, no qual ao Cabido era confiado o cuidado do bairro “Borgo”; o campo caritativo, no qual o Cabido desenvolvia formas assistenciais próprias e de colaboração com o hospital Santo Espírito e outras instituições.

O bairro “Borgo” fica situado entre o rio Tibre e a Cidade do Vaticano e centra-se no Castel Sant'Angelo. Originalmente o mausoléu de Adriano e, mais tarde, uma fortaleza, um palácio papal e uma prisão, o castelo é agora um museu com vista panorâmica da cidade a partir do terraço. A ampla Via della Conciliazione, que conduz à Piazza San Pietro, está ladeada de vendedores de comida e lembranças.

E Bento XVI recordou que, desde o século XI até 2007, são 11 os Papas que fizeram parte do Cabido Vaticano e entre eles, os Papas do século XX, Pio XI e Pio XII. A partir do século XVI, no momento em que começou a construção da nova Basílica (no ano de 2006, celebrou-se o 5.º centenário da colocação da primeira pedra), a história do Cabido Vaticano entrelaça-se com a da Fábrica de São Pedro, instituições unidas na pessoa do Arcipreste, que zela por garantir uma recíproca e proveitosa colaboração.

No século XX, especialmente nas últimas décadas, a atividade do Cabido progressivamente orientou-se para a redescoberta das suas verdadeiras funções originárias, que consistem sobretudo no ministério da oração, pois, se a oração é fundamental para todos os cristãos, para os cónegos, é uma tarefa, por assim dizer “profissional”.

A este respeito, o Papa Ratzinger mencionou do conteúdo da sua viagem à Áustria que “a oração é serviço ao Senhor, que merece ser sempre louvado e adorado e é, ao mesmo tempo, testemunho para os homens”, sendo que “onde Deus é louvado e adorado com fidelidade, a bênção não falta”. E definiu a natureza própria do Cabido Vaticano: recordar com a sua presença orante junto do túmulo de Pedro que nada se antepõe a Deus; que a Igreja toda está orientada para Ele, para a sua glória; que o primado de Pedro está ao serviço da unidade da Igreja e que ela por sua vez está ao serviço do desígnio salvífico da Santíssima Trindade.

Enfim, é de esperar “a Basílica de São Pedro possa ser um autêntico lugar de oração, de adoração e de louvor ao Senhor”. Com efeito, “neste lugar sagrado, aonde chegam todos os dias milhares de peregrinos e turistas de todo o mundo”, torna-se necessário o testemunho de que, “ao lado do túmulo de Pedro, esteja presente uma comunidade estável de oração, que garanta a continuidade com a tradição e ao mesmo tempo interceda pelas intenções do Papa no hoje da Igreja e do mundo”.

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Por falar em cabido, recordo que foi em 1967 – tinha eu 15 anos, não tinha ainda feito os 16 – no cumprimento dum voto secular feito pelo Cabido da Catedral de Lamego, uma jornada a pé do Seminário Maior à ermida de São Domingos de Fontelo, que eu fumei o primeiro cigarro.

Era proibido fumar. Porém, como o proibido é, muitas vezes, o mais apetecido, um grupo de seminaristas que ia mais adiante foi ficando para trás e partilhou uma cigarrada às ocultas dos superiores, que iam mais à frente. E eu, que vinha mais atrasado, atrevi-me a pedir-lhes um cigarro. Hesitantes, a princípio, pois o “santinho” não podia prevaricar, mas decididos, a seguir, porque o “também faltoso” não os iria acusar, lá me deram o cigarro que acendi e fumei. E foi começo da fumaça que durou até 25 de julho de 2000.

É um dos resultados de se confiar a outrem a execução dos votos seus ou do facto de a oração própria duma coletividade ceder o passo a uma jornada folclórica porque era necessário cumprir a todo o custo, por nós ou pelos outros, ou da irrequietude juvenil. Claro, há tempo para tudo, menos para rezar.

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Bela lição do Cabido de São Pedro!

2021.08.29 – Louro de Carvalho

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