sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Dia Mundial Humanitário – Futuro pede Ecologia Humana Integral

 

Assinalou-se, no passado dia 19, o Dia Mundial Humanitário, também conhecido como o Dia Mundial da Ajuda Humanitária ou o Dia da Memória dos Trabalhadores Humanitários, que foi comemorado pela primeira vez em 2009, após a Assembleia Geral da ONU ter decretado o dia em sessão plenária em dezembro de 2008, com o objetivo de homenagear todos os voluntários do mundo pelo seu trabalho em prol da humanidade e divulgar as obras realizadas pelas organizações humanitárias espalhadas pelo globo, apesar de todas as dificuldades vividas e, em especial, prestar tributo a todos os funcionários e trabalhadores humanitários que foram mortos no exercício do seu trabalho.

Neste dia, cujo mote é ajudar o próximo, podem fazer-se donativos ou aderir a uma organização humanitária local ou global, bem como divulgar nas redes sociais a data e as causas urgentes. Com efeito, há mais de 130 milhões de pessoas a precisar de ajuda humanitária para sobreviver.

A escolha do dia 19 de agosto prende-se com o desejo de homenagear o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Sérgio Vieira de Mello (1948-2003) e os outros 21 funcionários e colaboradores da ONU falecidos no Iraque em 2003 em missão de paz.

Na verdade, com apenas 21 anos de idade, Sérgio Vieira de Mello iniciou a sua trajetória no trabalho humanitário, tendo a sua carreira começado no ACNUR (Agência da ONU para Refugiados), cuja principal missão é proteger pessoas forçadas a deixar tudo para trás para escapar a guerras, conflitos e perseguições.

É de recordar que Vieira de Mello nasceu no Rio de Janeiro e se mudou para a França, no início dos anos 60, para estudar filosofia em Paris, onde participou nas manifestações de maio de 68. Tornou-se funcionário da ONU em 1969, quando tinha 21 anos. Passou a maior parte da sua carreira em missões do ACNUR, nomeadamente em crises humanitárias em Bangladesh, Sudão, Chipre, Moçambique e Camboja, trabalhando com refugiados e em campos de guerra.

No Sudão, participou diretamente nas operações do ACNUR para o transporte aéreo de bens domésticos e alimentos para refugiados sudaneses e repatriados após a assinatura do acordo de paz que pôs fim a 17 anos de guerra civil. No Camboja, uma das operações mais complexas do ACNUR até então, coordenou a repatriação de 360 mil cambojanos refugiados. Foi responsável pela operação de repatriação e reintegração de moçambicanos que deixaram o país durante a guerra. E, então, aos 28 anos, assumiu a direção do escritório do ACNUR em Moçambique, tornando-se um dos mais jovens representantes do ACNUR em operação de campo. Entre 1999 e 2002, liderou a missão da ONU que acompanhou a transição de Timor Leste para a independência. O então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, afirmava que ele era “a pessoa certa para resolver qualquer problema”. O seu compromisso com as causas humanitárias guindou-o a Alto Comissário das Nações Unidas para Direitos Humanos em 2002.

Porém, em 2003, enquanto atuava como representante oficial do Secretário-geral das Nações Unidas para o Iraque na procura de solução para o violento conflito que assolava o país, foi vítima de um ataque fatal à sede da ONU em Bagdad.

A memória e legado de Vieira de Mello estão vivos em todos quantos dedicam as suas vidas às causas humanitárias e em todos que cultivam valores de paz, tolerância e cooperação. A sua história é um marco para o ACNUR e para o mundo; e as lições que sua vida inspira trarão a esperança de um mundo melhor. Por isso, desde 2003, o ACNUR implementa a Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM) em cooperação com centros universitários de todo o Brasil e com o Comité Nacional para Refugiados (CONARE). Ao longo dos anos, a Cátedra tem-se revelado um fator fundamental para garantir que pessoas refugiadas e solicitantes de refúgio tenham acesso a direitos e serviços no Brasil, oferecendo ainda apoio ao seu processo de integração local.

De acordo com a Web página da Cáritas Portuguesa, neste Dia Mundial Humanitário, marcado por múltiplas crises, a Caritas Internationalis recorda que o caminho passa pela Ecologia Humana Integral. Por conseguinte, exorta os decisores políticos a tomarem medidas corajosas para abordar as diferentes questões particularmente relacionadas com as alterações climáticas, o impacto da pandemia e a turbulência política no Afeganistão e no Líbano, pois, sem vontade política determinada, a vida humana está em perigo e parte da humanidade está destinada a sofrer e a viver em condições desumanas.

Assim, esta confederação de Cáritas nacionais apela aos líderes e decisores políticos a que:

- Garantam a segurança dos afegãos e o atendimento das necessidades básicas do povo libanês.

- Aloquem fundos suficientes para as comunidades locais se envolverem em atividades desenvolvidas numa base comunitária, tanto agrícolas como não agrícolas, para garantirem os seus meios de subsistência e a sua segurança alimentar.

- Deem primordial importância à gestão de desastres nas comunidades locais, sobretudo em ações de redução de risco, para garantia da segurança das pessoas através de sistemas de alerta precoce.

- Incentivem os governos a cooperarem com as organizações da sociedade civil locais e a fortalecerem os seus mecanismos de resposta com destaque para a ação humanitária para que esta possa lidar com as consequências das alterações climáticas.

- Garantam o acesso aos cuidados básicos de saúde integrais para os mais vulneráveis, incluindo vacinas contra doenças mortais.

- Se comprometam já com um conjunto, económico e industrial, de políticas globais a fim de minimizar o impacto sobre o aquecimento global e a degradação dos ecossistemas.

A Caritas Internationalis, confederação de 162 membros que trabalham com as comunidades de base em 200 países e territórios, testemunha os incalculáveis sofrimentos ​​causados ​​pelas crises naturais e pelas provocadas pelo homem. Por isso, alinhada com o ensinamento do Papa, neste Dia Mundial da Humanidade, recorda que a única resposta adequada é a Ecologia Humana Integral, colocando o interesse e a dignidade da pessoa humana no centro de todas as decisões e atividades. E adverte que, sem vontade política determinada por parte dos líderes e decisores políticos, não haverá mudanças e não pode ser garantido o bem-estar dos mais pobres.

Ao mesmo tempo, considera que a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021 (COP26) deve encarar esta situação como uma prioridade e apresentar soluções tangíveis e adequadas com a alocação de meios apropriados para as realizar.

Neste ano de 2021, o Dia Mundial Humanitário fica marcado por muitas crises, quer as causadas pelo homem, quer as provenientes de desastres naturais.

Acabámos de assistir à tomada do Afeganistão pelas forças Talibã e ao trágico terremoto no Haiti, que até agora fez 1.500 vítimas. Além disso, há o colapso económico e a instabilidade sociopolítica no Líbano, o seu pior momento desde a guerra civil, e as muitas crises prolongadas em países como Ucrânia, Venezuela, Síria e Moçambique (Cabo Delgado). E, a nível global, as alterações climáticas continuam a causar danos graves e irreparáveis, incluindo milhões de migrantes, e a pandemia de covid-19 paralisou social e economicamente o mundo globalizado.

Neste grave contexto, a Caritas Internationalis relembra que decisões políticas com base em interesses investidos causam sofrimentos incalculáveis ​​aos mais pobres e exorta os decisores políticos a tomarem as medidas corretas e necessárias.

O Afeganistão é exemplo vivo em que o mundo inteiro testemunha descarada e silenciosamente a situação e o desespero dos afegãos inocentes ora entregues às mãos de senhores da guerra, não democráticos e implacáveis, ​​após 20 anos de acompanhamento político.

Dignidade das mulheres, direitos das crianças e proteção dos mais vulneráveis ​​não passam de boas intenções de simpatizantes, quando no Afeganistão e em outros lugares em crise, inúmeros cidadãos indefesos são ignorados e abandonados à própria sorte.

De igual modo, a crise libanesa mostra como uma sociedade estável pode ser destruída por líderes corruptos, que acumulam riquezas e reduzem 4 milhões de pessoas ao empobrecimento, mesmo sem alimentos tão básicos como pão.

Por seu turno, as catástrofes naturais que atingem as nações mais empobrecidas constituem um apelo a mais atenção para proteger, defender e salvar vidas através duma ação política determinada. Por exemplo, o recente terremoto no Haiti, já a viver uma situação de caos político e económico, representa um grande desafio humanitário.

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Também Francisco, num tuíter, compartilhou o tema do Dia Mundial Humanitário da ONU, lembrando aqueles que vivem em situação de pobreza como os mais vulneráveis a eventos climáticos extremos e acompanhando o apelo da Caritas Internationalis à garantia de segurança e apoio à população do Afeganistão e do Haiti e ao fornecimento de bens de primeira necessidade ao povo do Líbano. Na verdade, como refere o Vatican News, o mundo, cada vez mais ameaçado pelas mudanças climáticas, está numa encruzilhada. E o Papa salienta que “a emergência climática gera cada vez mais crises humanitárias e os pobres são os mais vulneráveis a eventos climáticos extremos”, pelo que “a solidariedade baseada na justiça, na paz e na unidade da família humana é urgentemente necessária”.

E António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, enfatiza que a humanidade pode sair vitoriosa ou derrotada da encruzilhada representada pela mudança climática. Por isso, neste dia, pretende-se incentivar a reflexão sobre a mudança climática que, tal como escreve o Papa na encíclica “Laudato si”, é “um problema global com sérias implicações ambientais, sociais, económicas, distributivas e políticas”. Com efeito, estima-se que até 2021, também devido à pandemia, mais de 235 milhões de pessoas precisarão de assistência e proteção humanitária.

E são, como diz Guterres, muitas as situações de emergência suscitadas por fenómenos naturais ou pelos homens que causam transtorno, sobretudo aos países mais pobres do mundo: pandemia de covid-19, degradação ambiental, aumento do nível do mar, secas, inundações, incêndios florestais e agora, a crise no Afeganistão e Líbano e o terremoto no Haiti – emergências que confirmam que a “ecologia humana integral” evocada por Francisco “é a única solução”.

2021.08.20 – Louro de Carvalho

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