As normas atinentes às diversas fases de desconfinamento
em contexto de pandemia de covid-19, tanto em 2020 como este ano, deram origem
a que as esplanadas de cafés e pastelarias pudessem funcionar ainda antes de os
estabelecimentos poderem servir no seu interior.
Por isso e para minimizar os prejuízos daqueles
estabelecimentos e satisfazer as necessidades de consumo dos clientes, as
autarquias foram, em geral, pródigas em autorizar a multiplicação de
esplanadas, de que resultou, em muitos casos, empecilho para os transeuntes a pé,
os quais têm, para não passarem por cimas das pessoas, de contornar as
esplanada servindo-se da rua, com os perigos inerentes a tal usança mercê da circulação
rodoviária.
É certo que tantas declarações de estado de emergência
com base na verificação de calamidade pública, com eventuais períodos bastante
prolongados de confinamento geral, estão a cansar cada vez mais os cidadãos
saturados de estar prisioneiros em casa.
E, se formos a ver em pormenor, a regulação da abertura
das esplanadas com uma lotação progressiva do número de pessoas por mesa não
tem grande racionalidade, a menos que lhe queiramos aplicar à letra as
caraterísticas do desconfinamento: prudência, gradualidade e progressividade –
o que dificilmente se justifica neste caso.
Na verdade, com a segunda fase de desconfinamento, a 5
de abril, autorizou-se
a abertura das esplanadas com limitação máxima de 4 pessoas por mesa; com a
terceira fase, a 19 de abril, autoriza-se a reabertura de restaurantes, cafés e
pastelarias, com lotação máxima de 4 pessoas, ou 6 por mesa em esplanadas, até
às 22 horas ou 13 horas ao fim de semana e feriado; e, com a quarta fase, a 3 de
maio, autoriza-se a reabertura de restaurantes, cafés e pastelarias, com
lotação máxima de 6 pessoas ou 10 por mesa em esplanadas, sem limite de horários.
Se é razoável a progressividade de abertura dos estabelecimentos,
em vez do limite de lotação das mesas, deveria atentar-se na observância da
distância de segurança, na disciplinação do uso da máscara, na etiqueta respiratória
e na moderação do tom de voz nas conversas – para evitar a eventual transmissão
do SARS CoV 2.
Creio que muitos dos espaços utilizados como esplanadas
não têm condições para funcionar como tal, pois, na verdade, o que são é
passeios para trânsito de peões. Ora, como o licenciamento de um estabelecimento
de restauração, café ou pastelaria deve ter em conta o espaço físico disponível
e não outro, não vejo motivo para alterar ad
hoc o licenciamento, sobretudo se causa incómodo a terceiros.
No entanto, a imprensa tem dado voz aos empresários dos estabelecimentos da
restauração, que estão preocupados com o incumprimento por parte de muitos
clientes do uso da máscara nas esplanadas pedindo ao Governo e às autoridades
de saúde a clarificação das regras para a restauração e para o comércio em
geral – nomeadamente a obrigatoriedade de afixação das mesmas à entrada dos
estabelecimentos para evitar retrocesso no desconfinamento – e que dizem ser
precisas medidas urgentes do Governo para que os clientes que frequentam as
esplanadas que abriram no dia 5 de abril respeitem o uso de máscara.
Daniel
Serra, presidente da PRO.VAR, Associação Nacional de Restaurantes, em
declarações à TSF, defende que,
tal como tem afirmado o Primeiro-Ministro, quando um cliente usa uma
esplanada, deve manter a máscara posta e só a deve retirar nos
momentos em que vai comer e beber. Porém, como refere o empresário, “muito embora muitos estabelecimentos estejam
a comunicar, até com avisos, para que os clientes a usem, isso está a ser
praticamente totalmente ignorado”.
Assim, a Associação
Nacional de Restaurantes pede ao Governo medidas urgentes para evitar que os
clientes que usam as esplanadas desrespeitem as regras sobre o uso de máscara,
pois tal desrespeito poderá originar recuo no desconfinamento. Disse à Lusa o presidente da PRO.VAR:
“Nos últimos dias, observámos o que estava a
acontecer. Nós recebemos esta preocupação dos estabelecimentos da restauração e
do comércio em geral. Na restauração tem a ver com o uso das máscaras e com o
facto de os clientes não estarem a respeitar o pedido, e muitos empresários
estão a pedir, que sempre que não estejam a consumir mantenham a máscara
colocada. (…) Por isso, pedimos uma clarificação das regras de forma urgente
para que se possa evitar um retrocesso no desconfinamento.”.
Segundo
Daniel Serra, um terço dos estabelecimentos estão a operar e dois terços aguardam
por 19 de abril e por 3 de maio para poderem voltar a normalidade, mas com uma
preocupação generalizada: os empresários estão com o coração nas mãos porque não
conseguem impor-se e muitos clientes quase de forma inconsciente acabam por
incumprir.
Pedem que o
comércio em geral e os estabelecimentos da restauração tenham obrigatoriamente
uma indicação das regras covid nos estabelecimentos, o que não existe. É
mais fácil para o empresário fazer cumprir se estiver afixado. E, em termos de
concorrência, se for obrigação que todos têm de cumprir da mesma forma, não há
concorrência desleal, mas se uns cumprem, e outros não, as coisas não funcionam.
Segundo
Daniel Serra, devem ser afixadas indicações importantes como a lotação, regras
básicas do uso da máscara e da desinfeção das mãos. No fundo trata-se de regras
básicas. E todos os estabelecimentos devem ser obrigados a comunicar para que
seja mais fácil essa implementação e que haja um natural desconfinamento sem
qualquer sobressalto, pois tem de haver um equilíbrio entre o controlo da pandemia
e a economia. Ninguém quer voltar a uma situação anterior. Com efeito, são 13
meses de enorme dificuldade que o setor está a enfrentar e seria catastrófico
voltar a confinar.
No dia 6, após
a reunião com 7 autarcas de municípios com maior incidência de casos, António
Costa insistiu em que é preciso cuidado no uso das esplanadas e disciplina
no desconfinamento.
E referiu que, estando
mais do que uma pessoa na mesma mesa – o limite é quatro –, os clientes
poderiam tirar a máscara à vez para fazer comer ou beber. E, no dia 1, aquando
do anúncio das atividades que iriam abrir no dia 5, segunda fase do
desconfinamento, recomendou que se mantenham “todas as cautelas”. “As
esplanadas poderão abrir” – disse o Primeiro-Ministro na conferência de
imprensa após o Conselho de Ministros, no qual o executivo decidiu avançar com
a segunda fase do plano de desconfinamento, conhecido em 11 de março –, “mas
gostaria de recordar que não pode haver grupos com mais de quatro pessoas e
que, mesmo na esplanada, devemos manter todas as cautelas”. E acrescentou o
governante:
“Obviamente, quando estamos a tomar o café,
seguramente não estaremos com máscara. Quando permanecemos no café, mesmo ao ar
livre, devemos manter a máscara.”.
No âmbito da
segunda fase de desconfinamento no contexto da pandemia de covid-19, que arrancou
no dia 5, os restaurantes, pastelarias e cafés com esplanada reabriram, mas com
grupos limitados a um máximo de 4 pessoas por mesa, encerrando às 22,30 horas
de segunda a sexta e às 13 horas ao fim de semana e feriado.
Também as
lojas com porta para a rua com menos de 200 metros quadrados deixam de ter de
vender só ao postigo e passam a poder ter as suas portas franqueadas ao
público, para, de acordo com a rotação e as regras da Direção-Geral da Saúde,
poderem fazer atendimento presencial. E reabriram ainda os ginásios, mas sem
aulas de grupo.
Além dos
abusos notados em festas com aglomeração de pessoas, algumas delas
interrompidas pela intervenção das forças de segurança, notam-se acumulações em
jardins e parques, para não falar de praias, e sobretudo nas esplanadas. E, como
referi no princípio, para lá das acumulações de pessoas que impedem a passagem
de transeuntes, as pessoas estão sem distanciamento, sem máscara, falando alto
e tendo dificuldade em observar a etiqueta respiratória.
A este respeito, por exemplo, Paulo Arsénio, presidente da Câmara Municipal
de Beja, espera que o incumprimento das regras, verificado em esplanadas na
cidade, não se venha a repetir, depois de fotos partilhadas nas redes sociais
terem causado polémica. Com efeito, têm surgido,
nas redes sociais, fotografias de pessoas, na sua maioria jovens, em esplanadas
da cidade de Beja, junto à zona universitária, a não cumprirem as regras de
proteção contra a vovid-19.
Questionado
pela Rádio Pax sobre esta matéria, o
presidente do município sublinhou que “são jovens muito bem informados sobre os
riscos” e “as formas de contágio”.
Paulo
Arsénio referiu que “existem regras que devem ser cumpridas, também, nas
esplanadas, que os proprietários estão a par das mesmas e que as autoridades
deverão aplicar contraordenações sempre que considerarem que as regras não
estejam a ser cumpridas”.
“Pontualmente
têm havido situações em que, aparentemente”, as regras não são cumpridas, disse
o autarca, mas considerando que “não se deve ter uma atitude de policiamento
mútuo porque todos nós poderemos cometer algum erro ou lapso”. E disse: “Vamos esperar que depois desta febre inicial
de desconfinamento e de abertura de esplanadas que estas situações não se
repitam”.
Concordo que
não devemos armar-nos em polícias uns dos outros. Não obstante, temos de nos
aconselhar mutuamente no sentido de se evitar a reversão do desconfinamento.
Não entendo
qual a clarificação de regras que a PRO.VAR quer do Governo. Elas são suficientemente
claras; falta é cumpri-las. Os empresários não têm força para imporem o seu cumprimento?
Não percebo porquê. Os supermercados e os quiosques conseguem. Fazem o que é
correto. Expõem as regras sanitárias em lugar de boa visibilidade, bem como os horários,
disponibilizam meios de desinfeção das mãos e têm o solo marcado com sinalética
orientadora de distanciamento e sentido de deslocação. Em caso de falha,
advertem. Não sendo acatada a advertência, avisam as autoridades. Aliás, não é só
em esplanada que se infringe a regra do uso da máscara e do distanciamento.
Os empresários
de restauração e similares podem fazer o mesmo sem estar à espera do Governo e
da autoridade de saúde. Certamente que a associação tem autoridade sobre os
seus associados. E as autarquias também podem intervir. Suponho que será
ridículo estar à espera que venha a ASAE medir os espaços a fita métrica ou
mandar fechar a boca aos utentes de esplanada. O imperativo cívico ainda deve
suplantar a necessidade de policiamento. Porém, para grandes males grandes remédios!
Não me conformo,
no entanto, com dois itens pela sua irracionalidade: a restrição de funcionamento
do quer que seja até às 13 horas em fim de semana e feriado, por originar acumulação
desmedida no tempo de funcionamento; e a febre desenfreada do uso de esplanada
ou o uso como tal do que não é nem pode ser esplanada.
2021.04.12 –
Louro de Carvalho
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