quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Violência nas escolas: das notícias dos casos às estatísticas


Andreia Lobo publicou no “educare.pt”, a 12 de fevereiro, um texto em que analisa os números das estatísticas da violência nas escolas transparecendo uma contradição entre os sucessivos casos divulgados pela comunicação social e as estatísticas do programa “Escola Segura”, registando este uma diminuição das ocorrências.
Assim, com base nos dados que constam do último Relatório Anual de Segurança Interna 2018, apresentado em março de 2019, no ano letivo de 2017/2018 (ano de referência), o programa “Escola Segura”, a PSP e a GNR registaram 6422 ocorrências em ambiente escolar (contra 7066 ocorrências em 2016/2017), a maioria das quais atinentes a ofensas à integridade física, furtos, ameaças e injúrias. E, desses mais de seis milhares de ocorrências, 64% foram de natureza criminal, sendo que 3005 ocorreram no interior da escola e 1100 no exterior. Em termos estatísticos, os agentes policiais foram chamados 17 vezes por dia a uma escola do país.
No Dia Internacional da Não Violência e da Paz nas Escolas de 2020, assinalado a 31 de janeiro, os analistas lançaram um olhar sobre as estatísticas oficiais, pois são elas que servem de enquadramento aos relatos de incidentes trazidos a público. Entre os mais recentes, destacam-se a notícia da aluna de 16 anos agredida pelo ex-namorado no interior da Escola Secundária de Almeida Garrett, em Vila Nova de Gaia, a 5 de fevereiro, agressão de que resultou a hospitalização da jovem, e a notícia do aluno de 17 anos esfaqueado no pescoço por um colega da mesma idade após uma discussão à porta da Escola Secundária Alberto Sampaio, em Braga, a 23 de janeiro, agressão que redundou na suspensão dos dois alunos.
O aludido texto não se pronuncia sobre eventuais processos criminais, nem sequer refere se foram instaurados. E, quanto à suspensão dos preditos dois alunos, nada se diz sobre se a pena disciplinar foi igual para os dois ou não.
Ainda que as estatísticas de casos de violência na escola fossem residuais, só o facto de a escola poder ser palco de violência deveria gerar preocupação dos responsáveis e não dar azo ao discurso de que os casos de violência registados estão a diminuir ou são casos isolados.
É certo que, nos termos do referido relatório, as estatísticas do sistema de segurança interna mostram que o número de casos de violência em contexto escolar está a diminuir, comprovando os números uma redução global de ocorrências criminais e não criminais na ordem dos 9,1%. E o Ministério da Educação (ME) confirma esta tendência de diminuição da violência. Aludindo a dados recolhidos já durante 2019, mas ainda no âmbito do programa “Escola Segura”, o ME assegurava à agência Lusa, em outubro, que as situações de violência grave nas escolas eram “residuais”. Não obstante, a perceção pública é diferente por duas razões: primeiro, porque muitas das vezes os casos não são participados – pois há órgãos de gestão que, não havendo recurso aos serviços de saúde, tentam que fique o conhecimento entre muros (para não prejudicar a imagem da escola e não serem incomodados); depois, porque muitas vítimas não apresentam queixa por alegadamente não valer a pena, porque raramente acontece uma punição que valha a pena.
Por outro lado, há certos casos particulares que têm enfoque mediático na esfera pública. Com efeito, há casos que fizeram tinir as campainhas na comunicação social como os mais recentes ocorridos em estabelecimentos de ensino de Braga e Vila Nova de Gaia, várias notícias de agressões a professores e a funcionários e o caso singular do professor que agrediu o aluno numa escola de Lisboa. E houve outros incidentes de agressões a funcionários e a professores, situações que originaram de imediato reações das associações de pais e diretores escolares – o que parece desmentir o aparente cenário de violência decrescente nas escolas.
Entretanto, Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas), em declarações à agência Lusa, afirmava que “dá ideia de que as escolas públicas são um campo de batalha, mas não são”. E lembrava que para mais de cinco mil escolas em todo o país tinham sido conhecidos cinco casos (Isso é o que ele diz).
Também Jorge Ascensão, presidente da CONFAP (Confederação Nacional das Associações de Pais), partilhando a posição partilhada de Filinto Lima, garantia à Lusa: “A escola é uma das instituições públicas mais seguras que o país tem”. Gostava de o lá ver no quotidiano!
E Maria Emília Brederode dos Santos, presidente do Conselho Nacional de Educação, também quis analisar a situação de violência nas escolas portuguesas em virtude do mediatismo dos casos de agressões. E disse em entrevista à Lusa:
Do que vi não há um problema de violência crescente, pode haver um problema de indisciplina crescente, mas de violência, lá está, as estatísticas dizem que não. Dá jeito saber e comparar números. Apesar de tudo são sintoma de um certo mal-estar. São casos pontuais, mas são sintoma de um mal-estar, que obviamente tem que se lhes dar atenção.”.
Segundo o que espelha o texto de Andreia Lobo, os incidentes de que se fala são, na sua maioria, as ocorrências são ofensas à integridade física (1521); seguem-se os furtos (904) e as ameaças e injúrias (701). E as forças policiais registam ainda o vandalismo e dano (150), as ofensas sexuais (120), o passe e consumo de estupefacientes (110), o roubo (86), o passe e uso de arma (55) e, por último a ameaça de bomba (2 casos).
Depois, vêm os muitos casos de indisciplina, sendo que alguns configuram comportamentos desviantes que se aproximam em muito da violência. Obviamente os casos de agressão entre alunos em sala de aula ou no recreio entre alunos raramente são apontados, bem como os casos de insolência e agressão verbal e psicológica a funcionários e professores – desde o 2.º Ciclo ao Ensino Secundário, com especial ênfase em curso do ensino profissional. Com efeito, a indisciplina e os comportamentos desviantes próximos da violência são a maior causa de doença e doença prolongada dos professores. E, se há muitos e bons exemplos de aula e escola atiladas e produtivas, não vale, entretanto, a pena fazer como a avestruz enterrando a cabeça na areia e alegar residualidade ou as eventualidades destes casos, que muitas vezes não configuram responsabilidade criminal em razão da idade dos infratores. É tapar o sol com a peneira.
É de considerar que, nestes aspetos, não existe apenas uma realidade portuguesa. A esmagadora maioria das ocorrências acontece no distrito de Lisboa: 2498. Seguem-se Porto 977 e Setúbal 704. Juntam-se aos anteriores os distritos de Aveiro com 305 ocorrências, Faro com 288, Braga com 236 e Leiria com 214. E, com muito menos ocorrências, seguem-se os restantes distritos do Continente e as regiões autónomas. Mas não deixa de haver escolas problemáticas.
E o que tem sido feito? Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna, em 2018, as equipas do programa nacional “Escola Segura” fizeram quase 27 mil ações de sensibilização junto das escolas. Estas e outras atividades das forças de segurança, destinadas a promover a segurança em meio escolar, abrangeram um total de 1 831,815 alunos e mais de 8000 estabelecimentos.
Porém, apesar deste esforço, no Dia Internacional da Não Violência e da Paz nas Escolas de 2020, as agressões em ambiente escolar voltaram a dominar as notícias. A escola tem de construir um caldo de cultura e autoridade de modo que não seja precisa a polícia.
2020.02.13 – Louro de Carvalho

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