Realizou-se
entre os dias 27 e 31 de janeiro, no Centro de Estudos do Sumaré, no Rio de
Janeiro/RJ, organizado pela respetiva arquidiocese, o 29.º Curso Anual para os
Bispos do Brasil, sob o tema “A
dinâmica humana e espiritual da formação permanente dos presbíteros”, com
119 participantes, sendo 66
arcebispos e bispos titulares de dioceses, bispos auxiliares e eméritos e
vigários episcopais do Rio.
Neste ano,
assinala-se também o centenário de nascimento de Dom Eugénio Sales, criador e
incentivador da proposta, que, segundo o Cardeal Dom Orani Tempesta, Arcebispo
do Rio de Janeiro, tem como marcas o zelo presbiteral, a coerência, a santidade
e a unidade com o magistério de Pedro.
Os
participantes aprofundaram as temáticas concentradas em dois documentos: Ratio Fundamentalis, publicada em 8 de
dezembro de 2016 pela Congregação para o Clero, e Ratio
Nacionalis, aprovada pela Assembleia Geral da CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil)
e publicada em 12 de outubro de 2019, como Documento n.º 110.
O tema
da formação dos presbíteros fora debatido na 56.ª Assembleia Geral da CNBB, em
Aparecida (SP),
de 11 a 20 de abril de 2018, em torno do tema “Diretrizes para a formação dos presbíteros na Igreja no Brasil”,
passando a vigorar em 12 de outubro de 2019.
O
Documento, lançado no ano passado, traz orientações para a formação de novos
presbíteros no Brasil e a necessidade de formação permanente e refere que o
novo presbítero precisa de ter características como “coragem de alcançar todas
as periferias geográficas e existenciais que precisam da luz do Evangelho, em
uma atitude acolhedora e misericordiosa”. Trata-se de um texto inspirado na Ratio Fundamentalis – O dom da vocação
presbiteral e suas quatro características que devem ser destacadas: a formação
deve ser única, integral, comunitária e missionária. Publicado no dia 8 de
dezembro de 2016, atualiza as orientações de 1985. As atuais diretrizes visam
enriquecer a formação espiritual, humana, intelectual e pastoral dos futuros
sacerdotes “com novos impulsos vitais, consoantes com a índole peculiar do
nosso tempo”.
O
Cardeal Dom Orani Tempesta, aquando da programação do encontro, exprimia este
voto:
“Que o nosso Encontro de Bispos seja inspirado para que na maturidade da
formação presbiteral e na vivência de uma espiritualidade do serviço sacerdotal
pleno possam os nossos presbíteros verdadeira e coerentemente viver e
testemunhar a dinâmica humana e espiritual da formação permanente dos presbíteros”.
Os
conferencistas deste ano foram Dom Jorge Carlos Patrón Wong, Arcebispo
secretário da Congregação para o Clero; Dom Jaime Spengler, Arcebispo de Porto
Alegre (RS) e 1.º vice-presidente da CNBB e
membro da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de
Vida Apostólica; o padre Stanislaw Morgalla, professor da Pontifícia
Universidade Gregoriana, em Roma, e diretor do Centro de St. Peter Favre, para
formadores do Sacerdócio e da Vida Consagrada; o padre Luiz Fernando Ribeiro
Santana, do clero do Rio de Janeiro, e mestre em Teologia pela PUCRio, onde é
professor; e a doutora Luciana Campos, professora do seminário São José, de
Niterói, e autora de livros como “Resiliência
e Habilidades Sociais”, “A dor
invisível: A Síndrome de Burnout e depressão entre os Religiosos” e a “A Dor Invisível dos Presbíteros”.
***
Dom Orani João Tempesta, Arcebispo do Rio de Janeiro e anfitrião, esclareceu que “o curso
não é uma assembleia para decisões, mas um tempo em que os bispos aproveitam o
período de férias para descansar, rezar e partilhar, num clima de muita
fraternidade, sendo os temas de cada ano “relacionados com a vida da Igreja” e
havendo conferencistas de renome internacional e do Brasil que ajudam a pensar
e ver como aplicar o conteúdo nas dioceses.
Segundo o
mesmo cardeal, o Curso dos Bispos, nos seus 30 anos de existência, tem uma
história de serviço à Igreja. Esta é apenas a 29.ª edição, porque não se
realizou o curso em 1991, devido à proximidade do curso anterior e, em 2007,
devido à Conferência de Aparecida. Neste período, levando em consideração a
presença, em média, de cem bispos em cada um, o curso já reuniu 2.900 bispos,
embora muitos tenham participado várias vezes.
O curso que,
tal como foi referido, é iniciativa de Dom Eugenio de Araujo Sales, na sua
primeira edição, contou com a presença do então Cardeal Joseph Ratzinger. Desta
feita, foi organizado por Dom Karl Josef Romer, bispo emérito da Arquidiocese
do Rio, e Dom Joel Portela, bispo auxiliar do Rio e secretário-geral da CNBB,
aos quais Dom Orani agradeceu todo o trabalho de organização e condução.
Dom Joel
Portela vincou que, após a publicação da “Ratio Fundamentalis”, a CNBB foi a
primeira a fazer as diretrizes em âmbito nacional, a “Ratio Nacionalis”. Recordou
que a formação permanente é um processo muito amplo, eminentemente catecumenal,
e que os dois documentos contemplam com destaque o princípio antropológico. E observou:
“Dois princípios que sempre estiveram presentes na vida da Igreja, mas
que agora sobressaíram nesses dois documentos. A formação é um processo que
deve percorrer a vida toda. Não é apenas o tempo de seminário, que é intenso,
mas é um tempo curto, levando em consideração que se exerce o sacerdócio, em
média, por 60 anos. A formação começa do nascer e vai até ao último suspiro. A
pessoa humana é mais importante do que qualquer concretização. Antes de ser
seminarista ou padre, é um ser humano.”.
Dom Jorge
Carlos Patrón Wong, na sua primeira conferência, abordou “O discipulado como processo de configuração com o Cristo Bom Pastor –
sobre a formação e o acompanhamento nos seminários”; na segunda, sobre “Espiritualidade, vida e ministério do
presbitério diocesano junto ao povo de Deus e ao lado do seu bispo”, fez um
resgate de elementos da espiritualidade cristã, comuns a todos os batizados,
que estão na base da espiritualidade episcopal e sacerdotal, e que constituem
passos na caminhada até o chamado de Deus; e, na terceira, falou sobre “O processo de acompanhamento dos sacerdotes
durante a formação permanente”, que tem um caráter comunitário e se
desenvolve com a colaboração de um inteiro presbitério e seu
pastor.
Dom Jaime
Spengler apresentou o processo de elaboração do Documento 110 em três tópicos:
o histórico, os elementos a considerar na aplicação e considerações gerais
sobre formação.
O Padre Stanislaw Morgalla proferiu três conferências
durante o curso. Na primeira, sobre “Antropologia
da vocação cristã”, abordou o paradoxo da vida cristã no seu contexto
antropológico, espiritual e aspetos psicológicos; na segunda, sobre “Celibato e obediência do sacerdote, em meio
aos desafios da vida quotidiana”, refletiu sobre o modo de viver a
afetividade (sexualidade), em virtude
da opção vocacional; e, na terceira, sobre “A
formação inicial e permanente, uma realidade unitária”, sustentou que não é
possível separar a formação permanente do presbítero da sua formação inicial.
Na sua
conferência sobre “O esgotamento
existencial dos presbíteros: causas e pistas para ação das dioceses na
prevenção e tratamento”, a psicóloga Luciana Campos partilhou a sua
experiência no atendimento a sacerdotes de todo o Brasil, salientando a
Síndrome de Burnout como “o esgotamento emocional, psíquico e laboral” originado
pelo excesso de trabalho e referindo que “as pessoas em geral não imaginam que
os sacerdotes são acometidos por esses problemas”, do que decorre “a
importância de dar visibilidade à temática”. Contou que procura ajudar os
sacerdotes a serem menos centralizadores, a aprenderem a delegar e a confiarem
nos outros, porque é impossível uma pessoa só dar conta de tudo. E observou:
“Preparado para ser pastor 24 horas por dia, o sacerdote é sugado todo o
tempo e dá-se desmedidamente, até que começa a sentir os efeitos dessa doação
desacerbada. Muitas vezes, ele começa a sentir-se frustrado, irritado e perdido
a ponto de se isolar, a ter crise de fé e de questionar a própria vocação.”.
Segundo a psicóloga,
a Síndrome de Burnout é uma doença silenciosa e, para não deixar que ela se
instale, é preciso proceder a mudanças, ter uma agenda com horários específicos
que incluam momentos de descanso, lazer e, sobretudo, de socialização. A
socialização entre pares é útil para discutir “problemas comuns e caminhos para
o resgate da saúde emocional”.
Nesta linha,
Dom Orani referiu que o sacerdote também tem as suas necessidades e limitações,
chegando a irritar-se às vezes e a ficar tenso com algumas situações que
enfrenta, pelo que precisa de alguém que o compreenda e o ajude a dar passos. E
frisou:
“Só seremos perfeitos no céu. Enquanto estamos aqui, precisamos de nos
ajudar mutuamente. Por isso, a necessidade de rezar, compreender e acompanhar a
vida e a missão do sacerdote, e neste aspeto, a comunidade paroquial pode ajudar
a transformar a realidade.”.
Por fim, o padre Luiz
Fernando Ribeiro Santana apresentou a última conferência do curso, sobre “A escuta e a direção espiritual como partes
da formação permanente dos novos e dos atuais presbíteros”. Firmado na sua
experiência de quase três décadas na direção espiritual de leigos, religiosos
e, de modo particular, com presbíteros, assegurou que a direção espiritual é
parte integrante da formação permanente e sustentou:
“É importante redescobrir o valor da direção espiritual na formação
permanente dos presbíteros, sobretudo, na dimensão da escuta. Tem sido um
desafio e um treinamento de colocar-se disponível no acolhimento, em cada
encontro inteiramente único.”.
***
Acresce referir
que, no dia 29 de janeiro, os bispos visitaram o túmulo do Servo de Deus Guido
Schäffer, instalado na Paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Durante a
visita, que foi concluída com a Oração de Vésperas, presidida por Dom José Luiz
Majella Delgado, Arcebispo de Pouso Alegre (MG), os bispos ouviram o testemunho de Nazareth Schäffer, mãe do Servo de
Deus, médico e seminarista, e o andamento do processo a cargo do delegado
arquidiocesano para a causa dos santos, Dom Roberto Lopes, OSB.
E foi agendado
o próximo curso dos Bispos para 25-29 de janeiro de 2021, também no
Sumaré, cujo tema gravitará em torno da catequese, sendo um dos conferencistas Dom
Rino Fisichella, presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova
Evangelização.
***
Está visto
que os bispos não podem e não devem reunir-se apenas para tomar decisões; devem
também reunir para aprenderem uns com os outros e com especialistas nas
diversas matérias. Aliás como podem ser o núcleo duro da função docente da
Igreja se não estão disponíveis para continuar a aprender, ou seja, para o
discipulado contínuo? Se calhar, a CNBB é um exemplo!
2020.02.06 –
Louro de Carvalho
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