domingo, 20 de julho de 2014

A promoção da natalidade e os benefícios para as/os avós

Por ocasião do último congresso do PSD, o presidente daquela formação partidária anunciou a criação de um grupo de trabalho presidido pelo Professor Doutor Joaquim Azevedo, da UCP, para o estudo de medidas a propor para combater o decréscimo galopante de nascimentos em Portugal ou, pela positiva, para viabilizar a promoção da natalidade.
O estudo está vertido já num relatório publicitado na semana passada e que, entre outras medidas, propõe a redução de IRS (incluindo a dedução, em sede de IRS, das despesas de educação e de saúde suportadas pelas/os avós), e o cálculo do IMI e do imposto sobre veículos consoante o número de filhos do agregado familiar.
O predito relatório – cujas conclusões foram apresentadas, no Porto, no passado dia 15 – foi desenvolvido durante quatro meses por uma comissão com 11 personalidades de várias áreas, coordenada pelo professor universitário indigitado por Passos Coelho. A Comissão faz um diagnóstico preocupante da natalidade em Portugal e vem delineando várias hipóteses de solução para resolver o problema, que se tornarão viáveis se houver suficiente vontade política de todos os serviços do Estado e das autarquias e grande mobilização da sociedade civil.
Portugal, segundo o diagnóstico constante do documento apresentado no Porto, tem um dos índices de natalidade mais baixos da Europa. O relatório “Por um Portugal amigo das crianças, das famílias e da natalidade (2015-2035): remover os obstáculos à natalidade desejada” dá conta de um número de nascimentos abaixo das projeções mais negativas – um cenário que se tornará “insustentável” se não forem tomadas as medidas adequadas. Mas o grupo de trabalho está convicto de que é possível repor os índices de natalidade até ao nível do desejável no decurso de vinte anos.
Acresce referir que, embora nem tenham saído do papel, algumas destas medidas já não são inéditas, já que, por exemplo, ainda em outubro do ano transato, o PSD apresentou na Assembleia da República um projeto que preconizava a redução do imposto sobre veículos para famílias com três ou mais filhos. Por outro lado, sabe-se – e o Presidente do referido grupo de trabalho o denunciou abertamente – há muitos empresários que não só não cumprem os normativos legais de proteção à maternidade, à parentalidade e à infância, como tentam prevenir a existência de situações que os confrontem com a necessidade do cumprimento da lei (vg: não admitindo mulheres na empresa ou obrigando-as ao compromisso de não assunção da maternidade durante considerável lapso de tempo).
Mas também é de relevar que a Comissão encarregada do estudo da reorganização do IRS também apresenta soluções amigas da família e das crianças. Por exemplo, o índice conjugal dos rendimentos para aferir os rendimentos dos membros do agregado familiar, que atualmente leva ao divisor 2, passaria a ser acrescido de 0,3 ou 0,6 ou 0,9, conforme o agregado tenha um dois ou três filhos, respetivamente
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A propósito, deixa-se aqui o enunciado das principais medidas atinentes ao combate ao decréscimo da natalidade ou à promoção e incentivação da mesma, na certeza de que nem elas esgotam o elenco das possíveis medidas nem vale a pena aterem-se os interessados e os poderes somente a uma ou outra. Todas e cada uma delas são necessárias para a necessária materialização do nobre desígnio maternal e nenhuma delas deve ser posta de parte, muito menos ridicularizada (Já se diz por aí que não será pelo facto de os casais beberem menos água que passarão a ter mais filhos ou que os ministros casados deste governo já são exemplo no incremento da prole própria!).
Assim, o grupo de trabalho, também designado por comissão, propõe:
 – Reduzir em 1,5% a taxa de IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) para o primeiro filho e 2% para o segundo filho e seguintes, em todos os escalões de rendimentos, e alterar a forma de apuramento das deduções à coleta de IRS, tendo em conta as despesas suportadas por cada membro do agregado familiar;
– Deduzir em sede de IRS as despesas de educação e de saúde suportadas pelas/os avós;
– Introduzir alterações no IMI (imposto municipal sobre imóveis) para “permitir aos municípios reduzir a taxa que é aplicada anualmente, tendo em conta o agregado familiar”;
– Reduzir o imposto sobre veículos para famílias com três ou mais filhos, como consta do teor de projeto apresentado pelo PSD na Assembleia da República, em outubro do ano passado, como já se afirmou;
– Otimizar a capacidade de “conciliar o trabalho com a família”, sendo este considerado um dos pontos essenciais apontados pela comissão para a promoção da natalidade, como, por exemplo, permitindo à mãe trabalhar em part-time durante um ano e receber a totalidade do salário, repartido em 50% pelos encargos da empresa e 50% a cargo do Estado;
[O valor que a empresa deixaria de pagar à mãe passaria a ser percebido por um/a trabalhador/a desempregado/a contratado/a pela empresa – o que, no dizer dos autores do relatório, constituiria uma forma de “minorar custos e potenciar benefícios a todos os intervenientes”, possibilitando-se que a mãe continuasse a receber o ordenado na totalidade, a empresa mantivesse um trabalhador a tempo inteiro sem custos adicionais e fosse aberta mais uma oportunidade de trabalho para desempregados. Desta forma, o Estado promoveria a natalidade “com custo baixo, ou mesmo nulo”.]
– Possibilitar que a partilha da licença parental possa ser partilhada pelos pais (por exemplo, o pai passar a trabalhar 20 horas por semana e a mãe outras 20), sobretudo quando do afastamento dos pais do local de trabalho puderem resultar penalizações familiares e/ou laborais;
– Criar condições para reduzir, entre duas a quatro horas, o horário laboral de trabalhadores/as com filhos até aos seis anos de idade e apoiar a contratação de mulheres grávidas ou com filhos até aos três anos, isentando as empresas do pagamento da Taxa Social Única (TSU);
– Incentivar as empresas a que distribuam vales sociais, isentos de IRS e TSU, que se destinem ao pagamento das despesas com os filhos, tais como creches e escolas;
– Apelar a um aumento, por parte das autarquias e das instituições de solidariedade social, de oferta de serviços de babysitting e estruturas de apoio às famílias durante as férias escolares;
– Promover a dinamização das ATL em horários desencontrados dos das creches e, de preferência, ao fim de semana, enquanto o horário das creches deve ser flexível e ter custos mais reduzidos, comparticipados pelo Estado de acordo com a dimensão da família;
– Flexibilizar as tarifas da água em função do agregado familiar;
– Dar prioridade nas escolas aos irmãos, evitando a frequência de escolas distintas;
– Criar condições vantajosas para a aquisição dos passes sociais e dos manuais escolares, revendo as condições de validade e durabilidade destes e criando nas próprias escolas bancos de manuais:
– Atribuir um médico de família a todas as grávidas;
– Alterar a condição de recursos para beneficiar da isenção de taxas moderadoras e aumentar os apoios em situações de infertilidade, por exemplo, comparticipando a 100% os medicamentos; e
– Alargar a idade de tratamentos para infertilidade para os 42 anos na mulher.
Indubitavelmente estas medidas têm impacto necessariamente orçamental, que a comissão não quantifica, por entender que tal não faz parte das suas competências. Fazer tais contas, diz o documento, está “nas mãos dos serviços do Estado” e é uma tarefa para os governos que quiserem aplicar as ideias sugeridas. Tal é tão verdade que, se a desculpa da falta de dinheiro for invocada como inevitável e inibidora, estamos a esquecer que a política se faz de opções conforme as prioridades que se vão legitimamente definindo, de acordo com a avaliação que se faça das necessidades da coletividade. Não sendo assim, perguntar-se-á para que servem os políticos e os poderes.
Os governos legítimos deverão estimar os impactos orçamentais das medidas sugeridas pelos grupos de trabalho que forem constituídos por quem de direito (os quais não devem ultrapassar as competências para que foram criados) e o gradualismo com que devem ou pretendem aplicar as medidas propostas.
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Quanto à possibilidade de dedução em sede de IRS das despesas de educação e de saúde suportadas pelas/os avós – aliás a medida que deu azo a esta reflexão, como se pode ver pela referência epigráfica – cumpre tecer algumas considerações.
É certo que as/os avós se desvelam em ternura pelos netos, como, por vezes, se excedem em facilidades e satisfação dos gostos e caprichos infantis – chegando mesmo a contrariar a vontade e a ação dos progenitores. Muitas/os das/os avós veem-se a obrigadas/os a tratar dos netos (sustento, saúde, educação e tempos livres) porque os pais estão desempregados ou o rendimento não é suficiente (casos em que disponibilizam as suas magras economias para sustento também dos filhos), porque os pais não têm disponibilidade de tempo e as creches, os centros de atividades (ATL) de tempos livres não dão resposta ou porque os pais faltaram (morreram, abandonaram, estão no estrangeiro, desentenderam-se).
Pela análise diversificada que se pode fazer da situação, não é difícil concluir como as medidas propostas pela comissão e outras que vierem a ser definidas têm de ser todas mobilizadas porque o combate ao decréscimo da natalidade e a consequente promoção da fértil e sadia parentalidade tem de fazer-se em diversas frentes.
Desde já desistir dos cortes das pensões e repor, se possível, os valores cortados facilitará a sobrevivência condigna das/os avós idosas/os, reformadas/os, aposentadas/os ou jubiladas/os e fornece uma mais-valia à saúde, à educação, ao sustento e ao conveniente ludismo dos netos, bem como reforço ao apoio aos filhos, mormente se desempregados. A medida de dedução em IRS atinente às/aos avós, por mais positiva que seja, revela-se, no mínimo, como insuficiente e insignificante.
Por outro lado, não deve o Estado, em nome de causas, valores ou necessidades, alimentar ou favorecer uma apetência não regulada das/os avós que tendam a tomar consta dos netos fundamentalmente por gosto ou excessiva tentação de substituir os filhos, no pressuposto não raro apregoado de que os avós são pais e as avós são mães duas vezes. Isto para já não falar dos casos absolutamente condenáveis dos casos de avós e de outros familiares que lutam, às vezes, criminosamente pela guarda das crianças, na busca intempestiva dos subsídios e outros apoios públicos percebidos habitualmente pelos pais, sem que se almeje o genuíno superior interesse das crianças.
Como é óbvio, as medidas de apoio ao desemprego e à consecução de emprego, como as concernentes a creches, ATL e taxas moderadoras não são dispensáveis.
E, quando, os pais faltam, nomeadamente pelos motivos apontados acima entre parêntesis, então, sim, às/aos avós ou a quem comprovar que tem vindo a tomar conta das crianças devem ser prestadas todas as ajudas ou todos os apoios financeiros, técnicos e logísticos previstos e a prever para os progenitores, incluindo obviamente as deduções em sede de IRS.
Se os pais não podem cuidar das crianças por falta de tempo ou por incompatibilidade entre a vida familiar e o trabalho, há que tomar dois tipos de medidas: gerar essa compatibilidade e/ou reforçar os apoios aos pais, que, por seu turno, deverão compensar as/os avós ou outros prestadores dos cuidados às crianças, adolescentes e jovens em idade escolar.
Penso que assim teremos umas medidas que, inseridas no ordenamento jurídico e social, aparecerão rodeadas da componente do justo equilíbrio e não eivadas da indevida vertente da ternura ou malícia que lhes retiraria racionalidade e credibilidade.

Pela proliferação da sadia maternidade e pelo lídimo superior interesse das crianças! 

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