quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Em 2023, as pensões e o IAS aumentarão mais que o previsto

 

Apesar de a taxa da inflação, em novembro, ter descido ligeiramente (para 9,9%), na Zona Euro, o que pode evitar que o Banco Central Europeu (BCE) proceda a novo aumento da taxa diretora dos juros em 75 pontos base, o Governo, considerando que a taxa da inflação é bastante superior à prevista inicialmente, confirma que as pensões subirão mais em janeiro de 2023 do que a estimativa feita em setembro.

Na verdade, Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), revelou, a 30 de novembro, que a atualização das pensões até 960 euros será de mais quatro décimas do que o previsto e que o Governo tudo fará para que a atualização seja paga já em janeiro. Assim, as pensões subirão entre 3,89% e 4,83% a partir de 1 de janeiro de 2023, uma revisão em alta, face aos valores percentuais anunciados em setembro, por causa do valor final da inflação de novembro, o que acarreta um acréscimo de despesa em mais 110 milhões de euros no orçamento da Segurança Social. Nestes termos, segundo a governante, “as pensões até 960 euros terão uma atualização de 4,83%, que é, no fundo, o valor que é o diferencial necessário para cumprir exatamente o valor que está previsto na fórmula [de cálculo], complementando com a meia pensão que já foi paga”. Já nas pensões entre 960 euros e seis Indexantes de Apoios Sociais (IAS), o aumento será de 4,49% e, nas pensões de mais de seis IAS, o aumento será de 3,89%. Ficam de fora as pensões que, por lei, não são objeto de atualização anual.

Também o valor do IAS será atualizado em 8,4%, em vez de 8%, passando para 480,43 euros.

Estes ajustamentos, quer nas pensões, quer no IAS, têm por base os dados da inflação divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a 30 de novembro, que indicam que a inflação média dos últimos 12 meses, sem habitação (que tipicamente serve de referência para a atualização do IAS e das pensões) foi de 7,46%, em novembro, acelerando face aos 6,83% do mês anterior.

Em comunicado, o MTSSS refere que o IAS – indexante usado para diferenciar a atualização das pensões em função do seu valor mensal – terá em 2023 um “aumento de 8,4%, passando de 443,20 euros para 480,43 euros”. Inicialmente, o Governo tinha referido que o IAS seria atualizado em 8%, mas admitindo que o valor seria ajustado, se a inflação final fosse mais alta do que o estimado.

A taxa de inflação também terá descido, em Portugal, para 9,9% em novembro, segundo a estimativa rápida divulgada pelo INE. Os valores ainda hão de ser confirmados e, embora os preços continuem a subir, a inflação baixou, já que, em outubro, estava nos 10,1%. Assim, a taxa calculada nesta estimativa do INE é, inferior em 0,2 pontos percentuais à registada em outubro.

Com base na informação já apurada, o INE sustenta que “a taxa de variação homóloga do Índice de Preços no Consumidor (IPC) terá diminuído para 9,9% em novembro, taxa inferior em 0,2 pontos percentuais à observada no mês anterior”. Como este índice mede a evolução temporal dos preços de um conjunto de bens e serviços representativos da estrutura de despesa de consumo da população residente em Portugal, isto significa que houve uma desaceleração face a outubro, mas ainda se regista um nível de preços com uma taxa perto dos 10%.

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Já há uns tempos, a ministra garantia que havia almofada orçamental para um aumento das pensões maior do que o previsto. Porém, o Governo tem apostado em não gastar nos apoios sociais todo o excesso de receita que arrecada, em virtude da incerteza resultante do aumento da inflação, do aumento dos preços de produtos essenciais, da crise energética, agravados pelo inverno que se avizinha e pela situação de guerra na Europa sem fim à vista. Nesta atitude prudencial, o Governo é, por um lado, objeto de críticas acerbas por parte dos partidos da oposição, dos funcionários públicos e dos pensionistas, e é, por outro lado, secundado por muitos analistas e observadores.

Entretanto, em sede de discussão do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023), os deputados aprovaram, a 23 de novembro, uma proposta de alteração ao OE2023 do PS que permite nova atualização das pensões, caso a inflação seja superior ao previsto. A proposta, que foi aprovada com os votos favoráveis do Partido Socialista (PS) e mimada com o voto contra do Chega e a abstenção dos demais partidos, estabelece: “O Governo procede através de portaria à atualização das pensões e demais prestações acima das percentagens previstas n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 19/2022, de 21 de outubro, [Regime transitório de atualização das pensões] em função da evolução do IPC e do crescimento do PIB [Produto Interno Bruto].” E foi este o texto que abriu caminho a novo aumento das pensões em 2023. Porém, mereceu duras críticas por parte dos vários partidos da oposição durante o debate que, no dia 23, antecedeu as votações na especialidade.

Pior sorte teve uma iniciativa do Partido Comunista Português (PCP) que previa a atualização para todas as pensões em 8% do seu valor, com um montante mínimo de 50 euros por pensionista, a partir de 2023. O plenário confirmou, no dia 23 de novembro, a rejeição, na especialidade, da proposta de alteração ao OE2023 do PCP sobre aumento das pensões, após um debate em que oposição acusou Governo de não cumprir a lei.

A proposta, avocada para votação em plenário, foi rejeitada pelos votos contra de PS e Iniciativa Liberal (IL), tendo recolhido o voto favorável de PCP, Chega, Bloco de Esquerda (BE), Partido Pessoas Animais e Natureza (PAN) e Livre e a abstenção do Partido Social Democrata (PSD).

A votação da proposta foi precedida por um debate em que vários partidos da oposição acusaram o Governo e o PS de estar a “rasgar a lei” e a cortar no rendimento dos pensionistas perante o contexto de inflação elevada. Para o PCP era a “oportunidade de repor a verdade na relação entre o Estado e pensionistas” e de repor o poder de compra, tendo Alfredo Maia acusado o Governo de insistir “numa efabulação” que “equivale a dizer que não há perda de poder de compra dos pensionistas” em 2023. “Rasgar a lei” foi a forma usada por Pedro Filipe Soares, líder da bancada do BE, para se referir à solução do Governo em relação às pensões, notando que tal acontece ao invés do que sucedeu nos anos anteriores, em que o PS não tinha maioria absoluta.

Porém, Gabriel Bastos, secretário de Estado da Segurança Social, respondeu às acusações, dizendo que “governar é bem diferente do que colar cartazes com base em cenários hipotéticos criados sabe-se lá com que intenção”. “As pensões não foram cortadas em 2022, não serão cortadas em 2023”, vincou, para frisar que, em 2024, haverá oportunidade para falar quando se conhecer o resultado do grupo de trabalho que avalia a sustentabilidade do sistema. “Falaremos em 2024 com o pressuposto de que este Governo não falha com os compromissos assumidos pelos portugueses”, prometeu, lembrando que o PS apresentou a proposta de alteração ao OE2023 que permite ajustamentos à atualização prevista, se a inflação ficar acima do previsto.

Também o líder da bancada do PS, Eurico Brilhante Dias, precisou que as pensões aumentaram de forma consecutiva desde 2016 – vincando a diferença com o Governo anterior – e afirmou que as pensões aumentaram nesses anos com os votos do PS e, “em algumas circunstâncias”, com os do BE e do PCP. E vincou que aumentarão em 2023, “mas com os votos do PS”, que o PS não aceita lições, sendo com o Governo do PS que os pensionistas “continuarão a contar em 2024 para aumentar as pensões”.

Pelo Chega, Jorge Galveias, lembrou a proposta do seu partido de aumentar a pensão mínima até ao valor do salário mínimo nacional até ao final da legislatura, para assinalar que este tipo de medidas e de preocupações não são um exclusivo da esquerda.

Inês Sousa Real, do PAN, defendeu a necessidade de se reforçarem os apoios aos pensionistas, referindo que esta é a faixa etária “mais afetada” pela inflação, e Rui Tavares, do Livre, precisou que a única forma de se evitar que pensionistas percam poder de compra “é cumprir a lei”.

Pela IL, Rodrigo Saraiva apontou críticas aos partidos de esquerda por omitirem que “há problemas de sustentabilidade” da Segurança Social, e ao Governo por ter apresentado, em poucos meses, “quatro cenários distintos” sobre a sustentabilidade do sistema.

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Segundo a lei acima referida, o Governo decidiu atribuir, neste ano, aos pensionistas o valor equivalente a meia pensão, pago em outubro, e uma atualização, a partir de janeiro de 2023, que varia entre 4,43% e 3,53% em função do valor da pensão de reforma ou de aposentação. Contudo, tais percentagens são inferiores às que resultariam da aplicação da lei de atualização das pensões. Porém, o Governo comprometeu-se a fazer um ajuste aos valores definidos na lei, caso a inflação supere o previsto, sendo esta promessa concretizada através da proposta do PS aprovada nas votações, na especialidade, do OE2023. A fórmula de atualização considera o crescimento médio anual do PIB dos últimos dois anos, terminados no terceiro trimestre, e a variação média dos últimos 12 meses do IPC, sem habitação, disponível em dezembro ou em 30 de novembro.

Segundo o INE, a inflação média dos últimos 12 meses sem habitação foi, em outubro, de 6,83%, valor que compara com os 5,43% de agosto, quando o Governo aprovou o modelo de aumento das pensões em 2023 e o referido pagamento extra de meia pensão em outubro deste ano.

O OE2023 teve a sua aprovação final global no dia 25 de novembro, mas, apesar da boa vontade do Parlamento, muitos pensionistas terão de optar entre a alimentação e a medicação. Governar é difícil e discute-se muito, mas o povo tem cada vez menos e sofre demais.

2022.11.30 – Louro de Carvalho

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