sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Plano Ferroviário Nacional levará o comboio às capitais de distrito

 

De acordo com o respetivo comunicado, o Conselho de Ministros aprovou na generalidade, a 17 de novembro, o Plano Ferroviário Nacional (PFN), para sujeitar a consulta pública.

É um documento estratégico que define uma visão de longo prazo para a ferrovia em Portugal, assente no objetivo de fazer chegar o comboio a todas as capitais de distrito e às localidades de maior dinâmica demográfica, económica e funcional. É o instrumento que, estabelecendo a rede ferroviária, assegura as comunicações de interesse nacional e internacional e confere estabilidade ao planeamento da rede ferroviária para um horizonte de médio e longo prazo, para o que importa identificar as necessidades de acessibilidade, de mobilidade, de coesão e de desenvolvimento a que o transporte ferroviário dará resposta adequada nos diferentes territórios. Assim, pretende-se criar as condições para acelerar a transferência modal, de passageiros e de mercadorias, para a ferrovia. E o caminho-de-ferro será o modo de transporte de elevada capacidade e sustentabilidade ambiental, tornando-se o elemento estruturante da rede de transportes.

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Na sessão de apresentação do PFN no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa, o primeiro-ministro valorizou o documento nestes termos: “Precisamos de ter um Plano Ferroviário Nacional que, sabemos, levará décadas a executar, mas que deve ser uma bússola comum para sabermos o norte em matéria de investimento ferroviário.”,

Não escondendo que, no Conselho de Ministros, há várias opiniões sobre a matéria, nem sempre convergentes, acautelou: “O que aqui apresentamos não é uma proposta fechada.” E convidou todos a participar na sua discussão “para que tenhamos um plano mais refletido, mais ponderado, mais consensualizado, o melhor passo para que, de um plano, possamos chegar à obra”.

Precisou que, ao falarmos de sistema de transportes, não falamos “só de uma infraestrutura, mas de algo que condiciona a sociedade, o ordenamento do território, as dinâmicas de vida, de desenvolvimento económico”. Portanto, como se trata de “um tema de cidadania, de economia, de ordenamento do território, de ambiente”, sendo necessário discuti-lo “nesta diversidade”, o PFN, discutido em Conselho de Ministros, voltará a ele, após a consulta pública, mas, depois, “é decisivo que seja discutido na Assembleia da República, porque transcende muitas legislaturas”.

O chefe do Governo frisou que “é fundamental que o país fique dotado de um desenho da ferrovia e, consoante as disponibilidades, a evolução do conhecido, a dinâmica de reinvenção do setor”, seja capaz de adaptar a sua execução ao longo do tempo – um desenho que transcenda o Programa Ferrovia 2020, “em velocidade de cruzeiro”, e o Programa Nacional de Investimentos 2030.

António Costa enquadrou o PFN no primeiro dos quatro grandes objetivos estratégicos do Governo que “é enfrentar as alterações climáticas”, vincando que “Portugal é dos países onde a emergência climática se coloca de forma mais dramática porque, em todas as consequências das alterações climáticas, somos de alto risco: pela erosão costeira, pela seca e pelo risco de incêndio florestal”. Observando a necessidade de intervirmos “em todas as frentes” – fontes de produção de energia mais sustentáveis (hoje, já 59% da eletricidade que consumimos tem origem em fontes renováveis, mas a meta é chegar ao final da legislatura com 80%) –, cuidar dos grandes sumidouros de carbono (oceanos e floresta) e alterar os padrões das atividades que mais consomem energia, pela “eficiência energética” dos edifícios e pela “mudança na mobilidade”.

Vincando que o Plano Nacional de Energia e Clima fixou, para a década que termina em 2030, a “redução de 40% nas emissões de gases com efeito de estufa nos transportes e mobilidade”, frisou que tal redução postula o automóvel elétrico ou a células de combustível e a mudança para “o transporte coletivo”. Para tanto, “houve e há um grande investimento no transporte urbano, com expansão das redes de metro de Lisboa e Porto, no acesso ao transporte público, com a redução muito significativa do seu custo e com o relançamento do investimento estrutural na ferrovia”.

Por sua vez, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, que interveio na sessão, afirmou que o PFN, apresentado para discussão pública, “é o instrumento que faltava ao país”, que põe a ferrovia “no centro do debate nacional”. E precisou: “Aquilo que o Plano Ferroviário Nacional nos permite, [é], mais uma vez, colocarmos no centro do debate nacional a importância da ferrovia.” Depois, acrescentou: “Este é o instrumento que faltava ao país e que nós percebemos desde o início, e é um compromisso eleitoral e do programa de Governo do PS e, por isso, estamos a dar cumprimento a esse compromisso.”

E, no dia 18 de novembro, à margem da cerimónia de formalização do acordo, entre o município do Porto e o Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), para reabilitar as ilhas da Lomba, explicou que o PFN não é um plano de investimentos de curto prazo, nem um plano de financiamento desse investimento, mas um plano que recebeu 318 contributos de participação pública. Por isso, espera que associações, coletividades, autarquias, [enfim,] “todo o país” participe na discussão do Plano Ferroviário Nacional, apresentado no dia 17 para discussão pública. Com efeito, “é muito importante que o país todo participe nessa discussão”, sublinhou.

 “Isto é uma proposta para discussão pública, ela no final não tem de ficar exatamente igual, […] e é instrumento de planeamento que perdurará”, através dos seguintes governos, apontou o ministro, que indicou o comboio movido a energia elétrica como “o maior contribuinte para a transição climática”, que resolve também outro tipo de problemas, como o congestionamento dos centros urbanos, com excesso de carros, de horas perdidas no trânsito e de número de acidentes.

Segundo o ministro, o plano já espelha o trabalho que está a ser feito no quadro do Ferrovia 2020 e plasma o que está a ser previsto para o Plano Nacional de Investimentos (PNI) 2030, que são a linha de alta velocidade (AV), para ligar Lisboa ao Porto e Porto a Vigo, em Espanha, a eletrificação da totalidade da rede e a “resolução de bloqueios nas duas áreas metropolitanas”.

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A adoção do PFN está prevista no programa do XXII Governo Constitucional, que define como objetivos levar a ferrovia a todas as capitais de distritoreduzir o tempo de viagem entre Lisboa e Porto e promover melhores ligações da rede ferroviária às infraestruturas portuárias e aeroportuárias. Além desses objetivos, deverá assegurar uma cobertura adequada do território e a ligação dos centros urbanos mais relevantes, bem como as ligações transfronteiriças ibéricas e a integração na rede transeuropeia. Deverá ainda garantir a integração do modo ferroviário nas principais cadeias logísticas nacionais e internacionais.

Pretende-se a progressiva transferência modal de passageiros e de mercadorias para a ferrovia, dando importante contributo para os objetivos de descarbonização, de proteção do ambiente, de desenvolvimento económico e de melhoria geral da qualidade de vida das pessoas.

A principal meta é que os comboios de AV sirvam as dez maiores cidades portuguesas, além de fazerem as ligações a Espanha. Não há um prazo fixado, mas considera-se o ano 2050 como horizonte temporal. E, assumindo a concretização de todas as obras necessárias, prevê-se o “fim das ligações aéreas domésticas no território continental”.

O PFN adota a nova linha Évora-Elvas (em curso), para criar condições para que surjam novos serviços de AV entre Lisboa e Madrid. A linha de AV Porto-Lisboa (servindo as cidades de Lisboa, Leiria, Coimbra, Aveiro e Porto) criará um eixo de elevado desempenho e de elevada capacidade que inclui nova linha AV, linha do Norte e do Oeste, e a primeira fase da nova linha Porto-Vigo (incluindo os troços Braga-Vigo e Porto-Aeroporto, servindo as cidades de Braga e Guimarães). Espera-se, ainda, a nova linha Aveiro-Viseu-Guarda-Vilar Formoso, o que permitirá a inclusão das dez maiores cidades do país nos serviços de AV e tornará possível a ligação de Lisboa e Porto a Madrid em cerca de três horas. Há, ainda, duas alternativas em estudo para a ligação AV Lisboa-Algarve, uma delas incluindo as cidades Évora, Beja e Faro.

A ideia passa por melhorar a quota modal da ferrovia no transporte de passageiros, passando dos 4,6% para 20%, ou seja, levar a população a usar mais o comboio, e elevar a quota modal das mercadorias dos atuais 13% para 40%. Com esse objetivo e considerando os planos europeus para a neutralidade carbónica, que implicam a “transferência de 50% do tráfego rodoviário de passageiros e de mercadorias acima de 300 quilómetros para o caminho-de-ferro até 2050 (30% das mercadorias até 2030)”, o PNF define que a AV servirá as dez maiores cidades e que o comboio chegará aos 28 centros urbanos regionais mais significativos, incluindo “todas as capitais de distrito” e “potenciando o seu desenvolvimento”. Está em causa a melhoria da mobilidade da população. A rede ferroviária “cobre as zonas mais povoadas”, vivendo “82% da população a menos de 15 minutos de uma estação ou apeadeiro”. Porém, há linhas sem serviço de passageiros ou com serviço fraco e alguns territórios não têm acesso à rede ferroviária.

Estão em estudo duas hipóteses para ligar Lisboa ao Algarve em linha AV: modernização da linha existente para reduzir a viagem em 30 minutos; ou criar um eixo que inclua Évora, Beja e Faro.

Em curso está já a recuperação e modernização da nova linha Évora-Elvas, para a criação de serviços AV diretos entre Lisboa e Madrid e o prolongamento de IC (intercidades) a Elvas.

Prevê-se a construção de novas linhas a nível regional e suburbano, além da reabertura de vários troços, bem como um novo acesso ferroviário a Lisboa a partir de Torres Vedras, passando em Loures e reduzindo, em cerca de 30 minutos, o acesso da zona Oeste a Lisboa.

Está prevista a criação de eixo IC Lisboa-Valença, com serviços frequentes. E a eletrificação da atual rede levará ao prolongamento de IC a Portalegre e à retoma de serviços diretos Lisboa-Beja.

Está em curso a recuperação e modernização das linhas que fazem a concordância da Mealhada, com a criação de ligações IC entre o Porto e a Beira Interior, e a eletrificação da Linha do Algarve, do Oeste (Meleças-Caldas da Rainha) e do Douro (Marco Canaveses-Régua). Com efeito, importa que os serviços interurbanos (IC e regionais) ofereçam ligações frequentes e competitivas com o automóvel, chegando aos 28 centros urbanos mais significativos.

Além da terceira ponte ferroviária sobre o Tejo, prevê-se a criação dos eixos ferroviários Sintra-Setúbal e Cascais-Azambuja, pela “conversão de ligações radiais em ligações diametrais, facilitando ligações rápidas”, bem como a construção de novo acesso da Linha do Oeste a Lisboa, com passagem por Loures, e a ligação à ponte 25 de Abril, criando novo eixo Torres Vedras – Setúbal, bem como o atravessamento de Lisboa intercetando as linhas de Metro.

Na Área Metropolitana do Porto, prolongar-se-á a Linha de Aveiro para a Linha de Leixões e para o Aeroporto Sá Carneiro, a inclusão da Linha do Vouga na rede suburbana e a criação de serviços para Barcelos. Tornar-se-á Braga “o terminal dos Regionais do Minho”, far-se-á a ligação a Paços de Ferreira e a Felgueiras, pela Linha do Vale do Sousa, bem como a ligação a Amarante, com Linha de Trás-os-Montes, e criar-se-á um “sistema de mobilidade ligeira” na zona do Cávado-Ave, com origem na Póvoa de Varzim, podendo chegar a Braga, Fafe e Felgueiras.

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É plano ambicioso o plano. E o mais certo é estender-se no tempo, se tiver a coragem de sair do papel. E não se percebe se e porque se mantém, na ferrovia, a bitola ibérica em vez da europeia.

2022.11.18 – Louro de Carvalho

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