sábado, 19 de fevereiro de 2022

Novo Banco continua a açambarcar dinheiro público cargo do FdR

 

Apesar de ter abandonado a era dos prejuízos e passado à dos lucros, o Novo Banco (NB) prepara mais um pedido de capital ao Fundo de Resolução (FdR) com o objetivo de repor o rácio de capital.

Mesmo depois de um ano em que terá registado lucros de cerca de 200 milhões de euros, o NB, como refere o Jornal Económico (acesso pago), alega que precisa de um montante de cerca de 100 milhões, embora o montante exato ainda está a ser discutido.

O rácio de capital CET1 do banco está protegido nos 12%. Ora, segundo o acordo do mecanismo de capital contingente, é necessário injetar capital na instituição quando o rácio desce abaixo deste patamar. E esta necessidade surge quando ainda existem divergências por resolver entre o NB e o FdRnomeadamente sobre o impacto da venda da sucursal em Espanha e da reavaliação das participações do banco nos fundos de reestruturação.

António Ramalho, CEO do Novo Banco, já admitia um novo pedido em maio de 2021, na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco, se o valor passado pelo FdR com base nas contas de 2020 fosse de 430 milhões de euros, aquém dos 598 milhões que tinha pedido, o que acabou por se verificar, pois o FdR só veio a injetar 430 milhõesNa altura, o gestor apontou uma possibilidade de novo pedido “à volta dos 100 milhões de euros”.

Porém, o FdR, com base nas contas preliminares de 2021, tem a “forte convicção de que não seja devido qualquer pagamento” ao NB.

Além disso, o FdR, a entidade responsável pelas injeções no NB, liderada por Máximo dos Santos, ainda não recebeu qualquer indicação sobre o exercício desta nova cal ao abrigo do acordo de capitalização contingente e esclareceu, ao ser questionado, que nos termos do referido acordo, tais pedidos são submetidos com base nas contas anuais auditadas do NB. Ora, as contas do banco relativas a 2021 ainda não estão fechadas nem auditadas.

Todavia, a predita entidade já “conhece uma versão preliminar das contas, que estão ainda sujeitas a alguns fatores de incerteza”. Ainda estão em análise, prossegue Máximo dos Santos, “pelo que é prematuro fazer comentários” sobre uma nova injeção no banco. No entanto, como acrescentou, “é possível reafirmar-se, com base nos dados disponíveis, a forte convicção de que não seja devido qualquer pagamento pelo Fundo de Resolução relativamente às contas de 2021”.

É de recordar que o mecanismo de capital contingente foi criado em 2017, aquando da venda do NB pelo FdR ao fundo norte-americano Lone Star com vista a proteger o NB das perdas registadas num conjunto determinado de ativos problemáticos herdados do BES, vigorando até 2026.

Ao abrigo deste acordo, o FdR ficou obrigado contratualmente a compensar o NB num montante que poderá ascender, no máximo, a 3,89 mil milhões de euros.

O valor poderá ser mais baixo, visto que o FdR terá de injetar no banco o mais baixo de três valores: o montante de 3,89 mil milhões de limite máximo previsto pelo mecanismo; o montante correspondente às perdas reportadas pelo banco com a carteira de ativos problemáticos; as necessidades de capital decorrentes das perdas com aquela carteira para o cumprimento dos rácios de capital.

Até agora, apesar das contundentes críticas dos partidos da oposição e do mal-estar manifestado por vários quadrantes da opinião pública, já foram realizadas injeções no valor de 3,4 mil milhões. E os 430 milhões injetados no ano passado, não estavam explicitamente previstos no OE 2021, mas na margem de manobra que o FdR possui.

A isto Rui Rio chama “uma trágica novela que o Governo suporta e a Justiça contempla”. E, numa mensagem partilhada na rede Twitter, parodiou o hino da mocidade portuguesa para deixar críticas: “Lá vamos, cantando e rindo / Levados, levados, sim / Por impostos que vão subindo / De quem lhes não vê fim. E questionou: Que haverá mais para dizer desta trágica novela que o Governo suporta e a Justiça contempla?.

É óbvio que tudo começou mal para continuar e acabar mal. E nem o partido de Rio nem o de Costa, como o agora desaparecido do Parlamento, podem sacudir a água (da responsabilidade) do capote.

O BES/GES conheceu a talvez mais crítica e irresponsável gestão praticada no país, em face da qual a gestão pública (mais grave por ser pública) de Sócrates se compara à de um mero aprendiz, mas que bem aprendeu a lição à vista de quem o ovacionava aos quatro ventos e a alta voz.

O BES não quis – sabe-se agora porquê – aproveitar as verbas disponibilizadas à banca pela troika e o Banco de Portugal (BdP) e a CMVM fizeram vista grossa ao problema do BES pela sua exposição ao GES. E o Dono Disto Tudo, não conseguindo o tão falado apoio do Governo de Passos/Portas, promoveu um excecional aumento de capital e fez constar, até pela voz do então Presidente da República, que o banco gozava de boa saúde financeira. Enfim, tal como tantos, incluindo o então Chefe de Estado, não viram nada de ilegal na gestão de Sócrates, também os supervisores não viram nada de anormal na de Salgado ou entenderam que não podiam fazer nada, o que só alegaram mais tarde.

Assim, o BCE impôs unilateralmente, no verão de 2014, a resolução do banco com o disfarce fornecido pelo Governo de Passos/Portas através de dois decretos-lei: um aprovado no Conselho de Ministros da 1.ª sexta-feira de agosto e nesse dia promulgado, referendado e publicado; e outro aprovado no Conselho de Ministros do 1.º domingo de agosto e promulgado e referendado nesse dia. E, embora tenha sido publicado só na primeira segunda-feira de agosto e entrado em vigor no dia seguinte, a decisão de resolução – de que resultou um banco mau e um banco bom, o NB –, foi comunicada nesse domingo à noite pelo BdP para entrar em ação na segunda-feira.

Entretanto, o Governo sob cuja égide foi levada a cabo a resolução, nomeou um especialista – um ex-Secretário de Estado – para promover a venda do NB a partir da sede do BdP. E, alegadamente após várias tentativas sem êxito, o NB foi vendido ao fundo Lone Star em condições altamente gravosas para o Estado. O até então acionista único, o FdR, alienou 75% do capital por um milhão de euros e ficou com os restantes 25%, mas com a responsabilidade pelas perdas rotuladas de capital contingente. Enfim, vendeu-se e continua a pagar-se o resultado de má gestão, perdas e caprichos. A venda foi homologada pelo Governo de Costa apesar das críticas das oposições, sendo que os corifeus do maior partido da oposição sempre criticaram o Governo pelo mau acordo, mas entendiam que os contratos devem cumprir-se porque o Estado tem de ser pessoa de bem e não se pode incorrer num quadro de indemnizações por incumprimento. Provavelmente uma boa forma de concordar com a política governativa para salvar a honra do convento.

Por isso, falar agora de “uma trágica novela que o Governo suporta e a Justiça contempla” só faz sentido se se envidarem esforços para denunciar as irregularidades dos acordos, requerer e conseguir a sua anulação, provocar a indemnização ao estado e responsabilizar, nos diversos âmbitos, todos os responsáveis pela saga. E não se vê forma e vontade para tal na PGR.

De outro modo, o Governo aguenta com as críticas, o NB escusa de se arrepender dos erros cometidos, o Parlamento continuará a debater e a inquirir e o povo vai pagando e votando (Parece que às vezes falha! – Isabel dixit!). O povo cumpre; quem o representa nem sempre.

2022.02.19 – Louro de Carvalho

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