De acordo
com o respetivo comunicado, o Conselho de Ministros aprovou, a 17 de fevereiro,
a resolução que declara a situação de alerta em todo o território nacional
continental até às 23,59 horas de 7 de março de 2022 – deixando de vigorar a
situação de calamidade – e o decreto-lei que altera as medidas aplicáveis no
âmbito da pandemia. E o Presidente da República, de acordo com nota publicada na
página oficial da Presidência da República, promulgou, neste dia 18, o
decreto-lei em referência (DL n.º 23-A/2022, de
18 de fevereiro).
Assim, como
consta do predito comunicado e como anunciou Mariana Vieira da Silva, Ministra
de Estado e da Presidência, na conferência de imprensa do Conselho de
Ministros, em Lisboa, foi decidido atualizar as medidas de combate à pandemia
de covid-19 que ainda estão em vigor, na sequência da reunião com peritos de 16
de fevereiro.
A Ministra
referiu que temos um Risco de Transmissibilidade abaixo de 1 (no valor de
0,76) e em rota descendente, uma
incidência acumulada a 7 dias ainda elevada (de 1302,7 por 100 000 habitantes) mas em queda muito significativa. E regista-se uma
evolução do número de internamentos em queda face aos valores de janeiro, tendo
agora caído de 2141 para um máximo de 2560 nesta onda e de 6869 em ondas
anteriores, e de internamentos em cuidados intensivos de 142, nunca tendo atingido
a linha vermelha de 255. Todavia, como acentuou, o número de óbitos é ainda muito
elevado, com 46 óbitos no dia 16, sendo o indicador que ainda se encontra mais
distante dos objetivos definidos pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças.
Por isso, as
medidas de alívio de restrições
tomadas passam pela eliminação dos seguintes elementos de restrição: confinamento
de contactos de risco; recomendação de teletrabalho; limites de lotação em
estabelecimentos, equipamentos e outros locais abertos ao público; exigência de
apresentação de certificado digital, salvo no controlo de fronteiras; e exigência
de teste com resultado negativo para acesso a grandes eventos, recintos
desportivos, bares e discotecas, passando o acesso a ser livre.
No entanto,
mantém-se a exigência de teste negativo, salvo para portadores de certificado
de recuperação ou de certificado de vacinação completa com dose de reforço,
para acesso a instituições onde estão pessoas com especial vulnerabilidade,
designadamente em visitas a lares e em visitas a pacientes internados em
estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde; e o uso de máscara nos
espaços interiores onde é exigida atualmente.
No dizer da
Ministra, estas medidas vigorarão até se verificar uma queda significativa no
número de óbitos, só podendo ser levantadas “quando o indicador relativo às
pessoas internadas em unidades de cuidados intensivos e aos óbitos descer”. Com
efeito, presentemente, “temos 63 mortes por um milhão de habitantes a cada 14
dias e a meta proposta pelos peritos, que o Governo seguirá”, é que poderão ser
eliminadas todas as restrições “quando atingirmos as 20 mortes por um milhão de
habitantes a 14 dias, indicador do qual ainda estamos distantes”.
Depois,
Vieira da Silva referiu:
“Este é um momento muito importante,
é mais um passo para o regresso a uma vida normal que há quase dois anos foi
interrompida, o que só é possível graças ao empenho das portuguesas e dos
portugueses no cumprimento das medidas restritivas, à evolução da ciência e às
vacinas e também ao sentido cívico dos portugueses, que se vacinaram muito, ao
contributo de todos os profissionais de saúde e ao apoio dos peritos que
aconselharam o Governo e os órgãos de soberania ao longo destes dois anos”.
Porém, sublinhou
que “não é ainda o momento de dizer que a pandemia acabou, como todos sabemos,
e estes dois anos ensinaram-nos que o aparecimento de uma nova variante ou uma
alteração da duração da imunidade da vacina podem alterar”.
Esta
advertência vem alinhada com recentes declarações do Primeiro-Ministro segundo
as quais não podemos ver declarado o termo da pandemia enquanto não houver
vacinação a nível global.
É certo que
podemos entrar no regime de endemia, mas a monitorização dos casos de
sintomáticos e sobretudo dos casos graves terá de continuar. Porém, já saímos
da situação de calamidade, o que já não é mau para as atividades e para a convivência
social.
***
Obviamente as preditas decisões governamentais
vêm no seguimento das recomendações dos especialistas e do desejo expresso por
diversas correntes da política, dos agentes económicos e da Sociedade civil. E,
no geral, a eliminação das restrições foram bem aceites.
Na verdade a
proposta apresentada ao Governo previa o fim das restrições quando o país tiver
uma ocupação por doentes covid inferior a menos de 170 camas de unidades de
cuidados intensivos (o que já acontece) e mortalidade abaixo dos 20 casos por milhão de habitantes a 14 dias, o
que poderá ser atingido dentro de um mês e pouco. Sem hesitar, a equipa que tem
aconselhado o Governo na gestão de controlo da epidemia acredita que “está na
altura de aliviar as medidas”, mantendo a “monitorização e alerta”. Neste
sentido, propôs ao Governo novos passos rumo à normalidade e que foram alvo de
decisão do Conselho de Ministros do dia 17. Não é o alívio total das restrições
(que já não
são muitas), mas o fim
pode estar próximo e acontecer no próximo mês.
A referida equipa
estabeleceu dois níveis, sendo que, face à evolução favorável de todos os
indicadores (Rt abaixo de 1, diminuição da incidência, ocupação de camas de UCI
abaixo da linha vermelha e mortalidade a estabilizar, o país pode avançar já
para o nível 1. Na prática, pode cair a exigência de um teste negativo para
entrar em recinto desportivo ou em bar ou discoteca, não será preciso
apresentar certificado digital para entrar num restaurante, espetáculo ou
hotel, não tem de haver limitações de lotação em lojas nem a proibição do
consumo de álcool na rua e pode cessar a recomendação do teletrabalho. E os
testes para o SARS-CoV-2, seriam necessários na admissão em lares e hospitais,
para despiste de sintomas, em locais de maior risco de transmissão e junto de
funcionários da educação pré-escolar, já que trabalham com crianças não
vacinadas (abaixo dos 5 anos), como explicou
Raquel Duarte, investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do
Porto e uma das autoras da proposta.
Assim, a
lógica de testagem massificada deve começar a mudar desde já. Não sendo
expectável um aumento de casos após este alívio (a previsão dos peritos aponta para
uma redução sustentada da incidência, com níveis muito baixos dentro de dois
meses), a recomendação aponta para uma
avaliação a 15 dias, com a possibilidade de se passar ao patamar subsequente
quando estiverem reunidas duas condições: ocupação em UCI por doentes covid
inferior a 170 (já estava nos 142), a
mortalidade abaixo dos 20 óbitos por milhão de habitantes a 14 dias. Neste
momento, este valor está bem acima: 63 por milhão. Contudo, dois fatores
indiciam a melhoria deste indicador: não só estagnou, como está mesmo a
diminuir se a análise se resumir aos últimos 7 dias, como indicou Pedro Pinto Leite,
da DGS, que acrescentou que a incidência a cair também entre os mais idosos (os que são
mais vulneráveis) leva a
esperar uma redução da mortalidade na próxima semana.
Na reunião
do Infarmed não foi apresentada uma data, mas, para Raquel Duarte, a previsão é
a de que se atinja um valor abaixo das 20 mortes por milhão de habitantes a 14
dias “no próximo mês e qualquer coisa”. Ou seja, até ao final de março e se
tudo correr sem imponderáveis, testes, certificados, máscaras ou o reporte
diário dos casos deixarão de ser necessários.
No caso das
máscaras, os peritos preveem apenas a promoção da sua utilização “perante
sintomas respiratórios ou perceção de risco”. Trata-se de aplicar o que se
aprendeu nestes últimos anos, nomeadamente em termos de comportamentos: não ir
ao local ao trabalho ou à escola se se está doente, usar máscara perante risco
de transmissão, manter a especial proteção de população de vulneráveis, como
residentes em lares. Mas há o aviso: a pandemia ainda não acabou e continua a
ser preciso avançar com “cautela”, monitorizando e precavendo a ocorrência de
novos surtos.
Não obstante, a decisão do Governo, apesar da previsão do alívio total
das restrições a partir do final de março, de manter o uso obrigatório de máscara nos espaços
interiores de acesso ao público, nomeadamente nas salas de aula está a merecer
críticas da parte dos pais, que não compreendem que o uso da máscara não seja
obrigatório em bares e discotecas, mas continue a sê-lo nas escolas. Na
verdade, a expetativa da CONFAP (Confederação Nacional de Associações de Pais) era a de que o Governo, através da
Ministra da Presidência anunciasse, no dia 17, o fim da obrigatoriedade de
uso da máscara dentro das salas de aula. E o presidente Jorge
Ascensão ressalva que quem sabe das condições para as medidas mais adequadas é
a DGS, mas aduz que os pais continuam sem entender o levantamento dalgumas restrições quando
noutras situações semelhantes isso não sucede e que agora havia
a expetativa da possibilidade de deixar de utilizar a máscara até “pelas dificuldades
que criam na comunicação e no diálogo”.
Já os diretores
das escolas veem no fim do isolamento dos contactos de risco uma medida
essencial para a melhoria da saúde mental do aluno. Filinto Lima, presidente da ANDAEP
(Associação
Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas), valoriza a queda do
isolamento para os contactos de risco, que melhorará o processo
educativo por favorecer o ensino cara a cara:
“Teremos
mais os alunos em regime presencial. Alguns alunos ficaram em casa por os pais
terem testado positivo, por estarem em contato mais direto com um colega, e
esta mudança vai beneficiar o processo educativo.”.
Segundo ele, a decisão terá impacto no
bem-estar emocional dos alunos, que estarão em contacto com os professores,
olhos nos olhos, com repercussões positivas na socialização e saúde mental.
E Mário Nogueira, líder da FENPROF,
crê que a
decisão é equilibrada “tendo em conta que é sustentada na
opinião dos especialistas, porque esta é uma questão de saúde publica,
claramente”.
Referindo que “os números têm vindo a
baixar, mas se nos lembrarmos das vagas anteriores em que os números andavam
nos 16/17 mil casos por dia, ainda estamos acima”, Nogueira diz que o Governo faz bem “em ir aliviando
regras, mas não o fazer com todas de uma só vez”, porque as salas de aula “não têm
distanciamento social, nunca o houve”, problema que sempre se
colocou.
Ao invés, a Iniciativa Liberal
criticou o Governo por, apesar do alívio das medidas devido à Covid-19, ter
mantido obrigatório o uso das máscaras em espaços fechados, nomeadamente nas
escolas, considerando que esta é “uma falha grave” e “é especialmente hipócrita
a exibição diária de políticos em espaços fechados sem máscara quando continua
a ser imposto via poder político este sacrifício às crianças e
jovens num país com altíssima taxa de vacinação e já numa fase de transição
para endemia”.
Porém, a Associação de Discotecas Nacional aplaude decisão.
O
epidemiologista Ricardo Mexia defende que o objetivo de manter o uso de máscara
nas salas de aula “não é castigar as crianças, é protegê-las”. Já a psicóloga
clínica Catarina Mota alerta que a manutenção da obrigatoriedade “pode fomentar
alguma desobediência” dos alunos.
Mexia
confessa ter “alguma dificuldade em perceber esta relutância em proteger os
alunos” com o uso obrigatório de máscara, até porque “há vários outros espaços
em que se mantém”. E, sendo o objetivo do uso da máscara proteger as crianças, pois “estão durante um longo período de tempo num
espaço fechado”, diz que “é
sensato continuar a proteger estes grupos etários” que “ainda têm uma das
incidências mais elevadas”. Todavia, admite que “talvez a questão passe
menos pela obrigatoriedade e mais pela recomendação” do uso de máscara nas
salas de aula, espaços em que advoga ser “necessário melhorar as condições de
ventilação para reduzir a potencial transmissão da doença”. Ademais, como observa, “enquanto não se melhorar substantivamente a
cobertura vacinal das crianças, que ainda é baixa, é complicado eliminar
completamente o uso da máscara”.
Catarina
Mota constata que “as crianças
estão a começar a relativizar o uso da máscara” e não ser
obrigatório noutros contextos “vai fazer com que se torne um problema” na
escola. E adverte, frisando que os alunos podem rejeitar a imposição em
ato de rebeldia, no sentido da afirmação:
“Podemos ter os professores a não permitir que
os alunos frequentem a aula sem máscara e os alunos a recusarem-se. Pode
fomentar alguma desobediência e criar situações de confronto com os professores.”.
Sublinha
que, após um ano de aulas à distância, os jovens não estão a saber lidar com professores e com regras.
Muitos adaptaram-se ao isolamento e começaram a viver mais nas redes sociais,
até fingindo sintomas de infeção pelo
medo de ir para a escola e socializar. Por outras palavras, os “jovens vivem mais com máscaras virtuais
do que com máscaras faciais”.
2022.02.18 – Louro de Carvalho
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