sábado, 19 de fevereiro de 2022

Em fim de março máscaras, certificados, testes podem ser dispensados

 

De acordo com o respetivo comunicado, o Conselho de Ministros aprovou, a 17 de fevereiro, a resolução que declara a situação de alerta em todo o território nacional continental até às 23,59 horas de 7 de março de 2022 – deixando de vigorar a situação de calamidade – e o decreto-lei que altera as medidas aplicáveis no âmbito da pandemia. E o Presidente da República, de acordo com nota publicada na página oficial da Presidência da República, promulgou, neste dia 18, o decreto-lei em referência (DL n.º 23-A/2022, de 18 de fevereiro).

Assim, como consta do predito comunicado e como anunciou Mariana Vieira da Silva, Ministra de Estado e da Presidência, na conferência de imprensa do Conselho de Ministros, em Lisboa, foi decidido atualizar as medidas de combate à pandemia de covid-19 que ainda estão em vigor, na sequência da reunião com peritos de 16 de fevereiro.

A Ministra referiu que temos um Risco de Transmissibilidade abaixo de 1 (no valor de 0,76) e em rota descendente, uma incidência acumulada a 7 dias ainda elevada (de 1302,7 por 100 000 habitantes) mas em queda muito significativa. E regista-se uma evolução do número de internamentos em queda face aos valores de janeiro, tendo agora caído de 2141 para um máximo de 2560 nesta onda e de 6869 em ondas anteriores, e de internamentos em cuidados intensivos de 142, nunca tendo atingido a linha vermelha de 255. Todavia, como acentuou, o número de óbitos é ainda muito elevado, com 46 óbitos no dia 16, sendo o indicador que ainda se encontra mais distante dos objetivos definidos pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças.

Por isso, as medidas de alívio de restrições tomadas passam pela eliminação dos seguintes elementos de restrição: confinamento de contactos de risco; recomendação de teletrabalho; limites de lotação em estabelecimentos, equipamentos e outros locais abertos ao público; exigência de apresentação de certificado digital, salvo no controlo de fronteiras; e exigência de teste com resultado negativo para acesso a grandes eventos, recintos desportivos, bares e discotecas, passando o acesso a ser livre.

No entanto, mantém-se a exigência de teste negativo, salvo para portadores de certificado de recuperação ou de certificado de vacinação completa com dose de reforço, para acesso a instituições onde estão pessoas com especial vulnerabilidade, designadamente em visitas a lares e em visitas a pacientes internados em estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde; e o uso de máscara nos espaços interiores onde é exigida atualmente.

No dizer da Ministra, estas medidas vigorarão até se verificar uma queda significativa no número de óbitos, só podendo ser levantadas “quando o indicador relativo às pessoas internadas em unidades de cuidados intensivos e aos óbitos descer”. Com efeito, presentemente, “temos 63 mortes por um milhão de habitantes a cada 14 dias e a meta proposta pelos peritos, que o Governo seguirá”, é que poderão ser eliminadas todas as restrições “quando atingirmos as 20 mortes por um milhão de habitantes a 14 dias, indicador do qual ainda estamos distantes”.

Depois, Vieira da Silva referiu:

Este é um momento muito importante, é mais um passo para o regresso a uma vida normal que há quase dois anos foi interrompida, o que só é possível graças ao empenho das portuguesas e dos portugueses no cumprimento das medidas restritivas, à evolução da ciência e às vacinas e também ao sentido cívico dos portugueses, que se vacinaram muito, ao contributo de todos os profissionais de saúde e ao apoio dos peritos que aconselharam o Governo e os órgãos de soberania ao longo destes dois anos”.

Porém, sublinhou que “não é ainda o momento de dizer que a pandemia acabou, como todos sabemos, e estes dois anos ensinaram-nos que o aparecimento de uma nova variante ou uma alteração da duração da imunidade da vacina podem alterar”.

Esta advertência vem alinhada com recentes declarações do Primeiro-Ministro segundo as quais não podemos ver declarado o termo da pandemia enquanto não houver vacinação a nível global.

É certo que podemos entrar no regime de endemia, mas a monitorização dos casos de sintomáticos e sobretudo dos casos graves terá de continuar. Porém, já saímos da situação de calamidade, o que já não é mau para as atividades e para a convivência social.  

***

Obviamente as preditas decisões governamentais vêm no seguimento das recomendações dos especialistas e do desejo expresso por diversas correntes da política, dos agentes económicos e da Sociedade civil. E, no geral, a eliminação das restrições foram bem aceites.

Na verdade a proposta apresentada ao Governo previa o fim das restrições quando o país tiver uma ocupação por doentes covid inferior a menos de 170 camas de unidades de cuidados intensivos (o que já acontece) e mortalidade abaixo dos 20 casos por milhão de habitantes a 14 dias, o que poderá ser atingido dentro de um mês e pouco. Sem hesitar, a equipa que tem aconselhado o Governo na gestão de controlo da epidemia acredita que “está na altura de aliviar as medidas”, mantendo a “monitorização e alerta”. Neste sentido, propôs ao Governo novos passos rumo à normalidade e que foram alvo de decisão do Conselho de Ministros do dia 17. Não é o alívio total das restrições (que já não são muitas), mas o fim pode estar próximo e acontecer no próximo mês.

A referida equipa estabeleceu dois níveis, sendo que, face à evolução favorável de todos os indicadores (Rt abaixo de 1, diminuição da incidência, ocupação de camas de UCI abaixo da linha vermelha e mortalidade a estabilizar, o país pode avançar já para o nível 1. Na prática, pode cair a exigência de um teste negativo para entrar em recinto desportivo ou em bar ou discoteca, não será preciso apresentar certificado digital para entrar num restaurante, espetáculo ou hotel, não tem de haver limitações de lotação em lojas nem a proibição do consumo de álcool na rua e pode cessar a recomendação do teletrabalho. E os testes para o SARS-CoV-2, seriam necessários na admissão em lares e hospitais, para despiste de sintomas, em locais de maior risco de transmissão e junto de funcionários da educação pré-escolar, já que trabalham com crianças não vacinadas (abaixo dos 5 anos), como explicou Raquel Duarte, investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto e uma das autoras da proposta.

Assim, a lógica de testagem massificada deve começar a mudar desde já. Não sendo expectável um aumento de casos após este alívio (a previsão dos peritos aponta para uma redução sustentada da incidência, com níveis muito baixos dentro de dois meses), a recomendação aponta para uma avaliação a 15 dias, com a possibilidade de se passar ao patamar subsequente quando estiverem reunidas duas condições: ocupação em UCI por doentes covid inferior a 170 (já estava nos 142),  a mortalidade abaixo dos 20 óbitos por milhão de habitantes a 14 dias. Neste momento, este valor está bem acima: 63 por milhão. Contudo, dois fatores indiciam a melhoria deste indicador: não só estagnou, como está mesmo a diminuir se a análise se resumir aos últimos 7 dias, como indicou Pedro Pinto Leite, da DGS, que acrescentou que a incidência a cair também entre os mais idosos (os que são mais vulneráveis) leva a esperar uma redução da mortalidade na próxima semana.

Na reunião do Infarmed não foi apresentada uma data, mas, para Raquel Duarte, a previsão é a de que se atinja um valor abaixo das 20 mortes por milhão de habitantes a 14 dias “no próximo mês e qualquer coisa”. Ou seja, até ao final de março e se tudo correr sem imponderáveis, testes, certificados, máscaras ou o reporte diário dos casos deixarão de ser necessários.

No caso das máscaras, os peritos preveem apenas a promoção da sua utilização “perante sintomas respiratórios ou perceção de risco”. Trata-se de aplicar o que se aprendeu nestes últimos anos, nomeadamente em termos de comportamentos: não ir ao local ao trabalho ou à escola se se está doente, usar máscara perante risco de transmissão, manter a especial proteção de população de vulneráveis, como residentes em lares. Mas há o aviso: a pandemia ainda não acabou e continua a ser preciso avançar com “cautela”, monitorizando e precavendo a ocorrência de novos surtos.

Não obstante, a decisão do Governo, apesar da previsão do alívio total das restrições a partir do final de março, de manter o uso obrigatório de máscara nos espaços interiores de acesso ao público, nomeadamente nas salas de aula está a merecer críticas da parte dos pais, que não compreendem que o uso da máscara não seja obrigatório em bares e discotecas, mas continue a sê-lo nas escolas. Na verdade, a expetativa da CONFAP (Confederação Nacional de Associações de Pais) era a de que o Governo, através da Ministra da Presidência anunciasse, no dia 17, o fim da obrigatoriedade de uso da máscara dentro das salas de aula. E o presidente Jorge Ascensão ressalva que quem sabe das condições para as medidas mais adequadas é a DGS, mas aduz que os pais continuam sem entender o levantamento dalgumas restrições quando noutras situações semelhantes isso não sucede e que agora havia a expetativa da possibilidade de deixar de utilizar a máscara até “pelas dificuldades que criam na comunicação e no diálogo”.

Já os diretores das escolas veem no fim do isolamento dos contactos de risco uma medida essencial para a melhoria da saúde mental do aluno. Filinto Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas)valoriza a queda do isolamento para os contactos de risco, que melhorará o processo educativo por favorecer o ensino cara a cara:

Teremos mais os alunos em regime presencial. Alguns alunos ficaram em casa por os pais terem testado positivo, por estarem em contato mais direto com um colega, e esta mudança vai beneficiar o processo educativo.”.

Segundo ele, a decisão terá impacto no bem-estar emocional dos alunos, que estarão em contacto com os professores, olhos nos olhos, com repercussões positivas na socialização e saúde mental.

E Mário Nogueira, líder da FENPROF, crê que a decisão é equilibrada “tendo em conta que é sustentada na opinião dos especialistas, porque esta é uma questão de saúde publica, claramente”.

Referindo que “os números têm vindo a baixar, mas se nos lembrarmos das vagas anteriores em que os números andavam nos 16/17 mil casos por dia, ainda estamos acima”, Nogueira diz que o Governo faz bem “em ir aliviando regras, mas não o fazer com todas de uma só vez”, porque as salas de aula “não têm distanciamento social, nunca o houve”, problema que sempre se colocou.

Ao invés, a Iniciativa Liberal criticou o Governo por, apesar do alívio das medidas devido à Covid-19, ter mantido obrigatório o uso das máscaras em espaços fechados, nomeadamente nas escolas, considerando que esta é “uma falha grave” e “é especialmente hipócrita a exibição diária de políticos em espaços fechados sem máscara quando continua a ser imposto via poder político este sacrifício às crianças e jovens num país com altíssima taxa de vacinação e já numa fase de transição para endemia”.

Porém, a Associação de Discotecas Nacional aplaude decisão.

O epidemiologista Ricardo Mexia defende que o objetivo de manter o uso de máscara nas salas de aula “não é castigar as crianças, é protegê-las”. Já a psicóloga clínica Catarina Mota alerta que a manutenção da obrigatoriedade “pode fomentar alguma desobediência” dos alunos.

Mexia confessa ter “alguma dificuldade em perceber esta relutância em proteger os alunos” com o uso obrigatório de máscara, até porque “há vários outros espaços em que se mantém”. E, sendo o objetivo do uso da máscara proteger as crianças, pois “estão durante um longo período de tempo num espaço fechado”, diz que “é sensato continuar a proteger estes grupos etários” que “ainda têm uma das incidências mais elevadas”. Todavia, admite que “talvez a questão passe menos pela obrigatoriedade e mais pela recomendação” do uso de máscara nas salas de aula, espaços em que advoga ser “necessário melhorar as condições de ventilação para reduzir a potencial transmissão da doença”. Ademais, como observa, “enquanto não se melhorar substantivamente a cobertura vacinal das crianças, que ainda é baixa, é complicado eliminar completamente o uso da máscara”.

Catarina Mota constata que “as crianças estão a começar a relativizar o uso da máscara” e não ser obrigatório noutros contextos “vai fazer com que se torne um problema” na escola. E adverte, frisando que os alunos podem rejeitar a imposição em ato de rebeldia, no sentido da afirmação:

Podemos ter os professores a não permitir que os alunos frequentem a aula sem máscara e os alunos a recusarem-se. Pode fomentar alguma desobediência e criar situações de confronto com os professores..

Sublinha que, após um ano de aulas à distância, os jovens não estão a saber lidar com professores e com regras. Muitos adaptaram-se ao isolamento e começaram a viver mais nas redes sociais, até fingindo sintomas de infeção pelo medo de ir para a escola e socializar. Por outras palavras,  os “jovens vivem mais com máscaras virtuais do que com máscaras faciais”.

2022.02.18 – Louro de Carvalho

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