Advertem os
educadores que o uso de máscara por parte dos educadores e professores limita o
desenvolvimento dos alunos, estando já a provocar sérios atrasos na
aprendizagem e desenvolvimento das crianças, em especial até aos 6 anos.
Luis
Ribeiro, presidente da Associação de Profissionais de Educação de Infância (APEI), dá exemplos concretos dos entraves ao ensino que a
máscara pode causar ao educador de infância, pois “as crianças olham sempre o
rosto de forma global e o facto de a cara estar tapada limita imenso essa
leitura do rosto, nomeadamente no que diz respeito à comunicação”. E explicita:
“As crianças vão ler os lábios e pelo facto
de a comunicação ser essencialmente verbal, aos seis anos de idade, ela é muito
limitada pelo uso de máscaras. Isto tem um impacto muito significativo no
desenvolvimento das crianças e na aprendizagem de letras e de sílabas, por
exemplo.”.
Por isso,
sustenta que educadores e professores de crianças até aos seis anos possam
tirar as máscaras a partir de setembro, no início do próximo ano letivo. E
declara com pertinência:
“O que temos de colocar em cima da mesa
neste momento é se vamos continuar a prolongar esta utilização da máscara,
sabendo das consequências negativas que a utilização da máscara tem do ponto de
vista da educação, desenvolvimento e aprendizagem das crianças, ou não. (…) Do
meu ponto de vista, e falo por mim, acho que teríamos de abandonar a máscara em
setembro.”.
O
responsável da APEI argumenta com o facto de educadores e professores já
estarem vacinados e de crianças até aos 6 anos não serem grupo risco para
contrair o vírus. E conclui:
“Nós sabemos que para as crianças até aos
seis anos, e até mais velhas, a Covid praticamente não tem consequências, e
também elas são pouco transmissoras. Neste momento os docentes estão todos vacinados
com as primeiras doses e, por isso, não temos nenhuma situação de risco
associada nem aos adultos, nem às crianças, no contexto de jardim de infância.”.
A
este respeito, a reportagem do “Expresso”,
do passado dia 23 de julho, intitulada “Diz-me algo sem máscara e dir-te-ei se
aprendi”, refere, pela voz da educadora Daniela Bernardo, que a pandemia está a mudar a fala das crianças para pior,
por exemplo, “trocam o B pelo D” e “têm dificuldades no L, não valendo a pena “estar
com uma máscara a forçar LLLLLL”, pois não entendem como se movimenta a boca
para proferir tal som.
Menciona-se um estabelecimento de educação do Porto, em que as
crianças da educação pré-escolar voltaram do confinamento com atraso na
vocalização de algumas palavras e sílabas, tendo 10 das 25 crianças da sala sido
indicadas para terapia da fala, quando, em anos anteriores, ‘três era o máximo’.”
A causa está na máscara porque a criança aprende as palavras a ouvi-las, mas
precisa de as ver nos lábios e músculos faciais que ajudam a definir o seu
aspeto. E a máscara no adulto, que zela a proteção coletiva, inibe a
aprendizagem plena das primeiras letras, já que a criança não vê como são
ditas, pois, embora imite tudo, não pode imitar o que não vê.
Os especialistas vêm alertando para o impacto da máscara no
desenvolvimento (atraso) das crianças,
especialmente nos primeiros anos de vida. E a solução pode passar pela opção por
máscaras transparentes (França fê-lo) ou por tornar
opcional o uso de máscara (como fez o Luxemburgo), mas os
funcionários das creches são mais assertivos dizendo que a máscara era das primeiras
coisas que tiravam já – uma contradição difícil querer abdicar da máscara para
ensinar quando se precisa dela para proteger, sendo que proteger a criança é
também ensiná-la a falar bem. Assim, a pandemia mudou-nos as contradições tal
como o interesse por reuniões técnicas, como a deste dia no Infarmed que irá condicionar
a mudança em todo o país e nas creches.
A educadora Paula Machado não tem dúvidas de que a máscara dificulta a
transmissão de conhecimentos, mas não é só a máscara. A própria família e o
facto de as crianças terem estado dois meses em casa também impuseram travão ao
desenvolvimento da linguagem. De facto, os pais conhecem as crianças, estão habituados
às suas palavras tortas e não as corrigem. Por isso, 2021 induz que a terapia
de preparação para alunos do 1.º Ciclo esteja indicada também para crianças
mais novas. Com 9 meses ou um ano, os bebés, que já diziam ‘olá’, estão mais
calados. O plano de ação agora é simples. Assim, se o educador/a estiver a
explicar algo ou a falar a um grande grupo, afasta-se para tirar a máscara e
falar de modo que a criança perceba.
A máscara provoca atraso no desenvolvimento da criança, sobretudo nos
primeiros anos de vida. A ciência explica: nascemos com apenas 25% do cérebro
desenvolvido; no primeiro ano, aumenta de cerca de 300 gramas chegando a pesar
1,2 kg; e, no final dos primeiros três anos, atingirá os 85% do tamanho que
terá em adulto – um crescimento brutal num lapso de tempo muito vulnerável, o
alicerce do que seremos no futuro, como se estes anos fossem as fundações da
casa que se constrói ao longo do tempo, como refere Clementina Almeida,
psicóloga clínica com especialidade em bebés. No primeiro ano de vida, para
compreender o mundo, o cérebro faz um milhão de sinapses por segundo e muito
rapidamente cria ligações entre os neurónios, ligações que dependem da
estimulação sensorial baseada na interação com humanos adultos. A isto a
psicóloga chama dar e receber, pois “o bebé olha e o cuidador responde; o bebé
faz um som e o cuidador responde”. Nesta fase, a criança não percebe o que
significam as palavras, mas está recetiva a toda a comunicação não verbal,
decifrando a fisionomia dos adultos, suas expressões e idiossincrasias. Por
isso, se, a sorrir, a chamarmos o bebé mais feio do mundo, reage ao nosso
sorriso e tom de voz, como diz o psicólogo Paulo Almeida.
Um estudo científico publicado em 2012, de que é coautor David Lewkowicz,
professor e cientista que estuda a comunicação nos bebés, conclui que,
primeiro, por volta dos 4 meses, os bebés se concentram nos olhos dos
cuidadores. E Paulo Almeida arrisca dizer que “os óculos de sol são piores”.
Aos 8 meses, essa atenção é desviada para a zona da boca, onde se concentra até
à aprendizagem da linguagem, razão por que outro estudo realizado pelo
Instituto Italiano de Tecnologia, publicado na revista científica “Frontiers in Psychology” em maio de 2021,
mostrou que crianças dos 3 aos 5 anos só são capazes de identificar
corretamente 40% das expressões faciais de um adulto com máscara.
Para os bebés a máscara limita a captação das emoções dos adultos e o seu
desenvolvimento de competências sociais. Como em boa parte dos primeiros meses
de vida permanecem em casa com os pais sem máscara, o maior problema, segundo a
psicóloga Clementina Almeida, é endémico: a creche surge muito cedo na vida da
criança. Há bebés com 6 meses a chegar à creche às 7 da manhã e a ir embora às
7 da noite – 12 horas. São bebés que preocupam por estarem grande parte do dia
em contacto com pessoas de máscara. Para contrariar o efeito barreira das horas
do dia, chegados a casa, a solução passaria por passar algumas horas de
contacto face a face, mas “se calhar a maior parte dos pais tem de dar banho,
fazer o jantar e acaba por não ter disponibilidade”. A juntar à complexidade da
rotina, o bebé é como esponja, absorve tudo e lida com “pais muito ansiosos”. E
Paulo Almeida observa:
“Se nos
primeiros meses de vida, está em causa o desenvolvimento das competências
emocionais, mais tarde, para aprender vocabulário – aquilo a que chamamos ter
uma boa consciência fonológica – é importante que haja a possibilidade de ler e
ouvir bem. As máscaras impedem a visualização e, por vezes, deturpam alguns
sons.”.
Depois, chama a atenção para determinados grupos de crianças com
patologias, dizendo que é acrescido o risco em crianças com perturbações do
espectro do autismo, porque “têm mais dificuldades em fazer a leitura da mente
e em olhar nos olhos”. Também as crianças com perturbação hiperativa e défice
de atenção, menos atentas e focadas nas interações, perdem informação com a
barreira da máscara. E o especialista defende que “poderiam beneficiar se os
educadores, cuidadores e interlocutores usassem máscaras transparentes”, como foram
adotadas por creches francesas. A medida foi proposta já há meses, mas agora há
quem queira ir mais longe e tornar opcionais as máscaras nestes espaços, como
se faz no Luxemburgo desde o início do ano. E Clementina Almeida, apoiada pelas
educadoras Daniela e Paula, discorre:
“Se calhar
deveríamos assumir que não podemos querer risco zero, porque não existe. Há
aqui outros aspetos também importantes postos em causa.”.
Alexandra Lopes, socióloga e
professora universitária, confrontada com um vídeo, que ficou viral, duma criancita que andava pela rua ao
encontro de quanto lhe parecesse um dispensador de álcool-gel e questionada
sobre se as regras vigentes, incluindo a máscara, influenciarão a geração
nascida em pandemia, assenta em que já andávamos a higienizar-nos antes
da pandemia procurando ambientes assépticos, esterilizados. Porém, a covid-19 levou-nos
a viver a hipérbole da higienização, dificultando-se a relação com o exterior e
multiplicando-se as situações de afastamento. Ora, quem está nas primeiras
fases de socialização, está a construir os primeiros referenciais, os referenciais-âncora,
para o resto da vida pessoal e comunitária, pelo que a obsessão com a
desinfeção e com a proteção contra um inimigo invisível é marca que pode ficar
como uma das âncoras principais de identidade destes miúdos.
Quanto ao facto de o cérebro das crianças ser
elástico e poder surgir mais tarde a perceção de que estes tempos são
excecionais, sustenta que, em adultos, não somos
muito capazes de ter consciência dos referenciais construídos na fase de
referenciais-âncora. E explicita:
“É como se
estivéssemos a formar uma pele. Essa pele passa a fazer parte da nossa
identidade, não temos consciência dela. Uma coisa é eu, em adulta, perceber que
há uma interrupção da minha vida normal e ter a expectativa de retomar essa
vida, um dia. Tal só acontece porque o meu referencial não combina com o que
vivo hoje em dia.”.
No atinente às diferenças se podem notar na
vivência do dia a dia destas crianças, podendo perpetuar-se como hábitos na sua
vida futura, refere que as crianças recebiam bem a asserção de que são fofinhas
e o aperto das bochechas, mas o que poderá suceder a crianças que vivem os primeiros anos de vida em
pandemia é não receberem bem o estranho que chegue perto delas e lhes toque. A
geração covid está a crescer com referencial de normalidade diferente do nosso.
Durante muito tempo se lhes disse que não podiam ver os avós ou que só podiam
vê-los pela janela ou pelo ecrã do telemóvel. São comportamentos que são
terrível referência, tal como ver as pessoas de máscara.
Na
verdade, os especialistas
e representantes das áreas da educação e da psicologia lançam o alerta: os
bebés nascem com cerca de 25% do cérebro desenvolvido e as crianças mais
pequenas passam muitas horas com os cuidadores e professores que usam máscara. Ora, como é com esses adultos que os bebés e crianças deviam aprender a ler
os rostos e expressões faciais e a articular palavras, com a máscara é como se
ficassem privados dessas informações, o que está a levar alguns bebés a ficar
aquém dos marcos de desenvolvimento esperados para as suas idades. Por
isso, Clementina Almeida sugere uso de máscara transparente para permitir
que as crianças pequenas não percam o acesso a informação não verbal importante
para o seu crescimento.
***
O uso de
máscara em Portugal só é obrigatório a partir dos 10 anos, embora o Ministério
da Educação tenha indicado às escolas que disponibilizem máscaras comunitárias
para os alunos do 1.º ciclo. Mas o problema reside no uso dessa proteção por
parte dos cuidadores e professores.
Há meses, o “Público” citava um estudo feito na China
sobre os efeitos do SARS em 2003 e 2004, que concluía que a máscara trouxe
“atrasos linguísticos, motores e nas competências sociais”. O estudo foi usado numa
carta aberta de profissionais da educação e da psicologia publicada pelo jornal
francês “Le Figaro” apontando para
uma “catástrofe anunciada” graças ao uso de máscara nestes contextos. Em
Portugal, a Sociedade Portuguesa de Pediatria já tinha alertado garantindo
que as máscaras não só atrasam o desenvolvimento como, se forem usadas por
menores de dois anos, podem ser perigosas, dado o risco de asfixia.
***
De acordo
com a evidência disponível, crianças pequenas têm menor suscetibilidade à
infeção que os adultos e baixo nível de transmissibilidade, não tendo papel
importante na propagação do vírus. Assim, o uso de máscaras em crianças deve
ser ponderado atendendo aos potenciais danos que o uso contínuo pode acarretar,
tais como viabilidade e desconforto, bem-estar emocional e social da criança e considerando
questões de comunicação (ficam comprometidas com o uso contínuo de máscara).
Desta forma, a OMS alerta as autoridades nacionais para
que respeitem os princípios gerais de saúde pública e sociais, como: não causar
danos à criança, devendo ser priorizado o seu melhor interesse, saúde e
bem-estar; não causar impacto negativo sobre o desenvolvimento e a
aprendizagem; e considerar a viabilidade de implementar recomendações em
diferentes contextos ou grupos específicos.
A OMS e a UNICEF aconselham a aplicação dos seguintes
critérios para a decisão sobre o uso ou não de máscaras em crianças:
Crianças até 5 anos não devem usar máscaras, atendendo
aos marcos de desenvolvimento da infância, aos desafios de conformidade e à autonomia
necessária para usar corretamente a máscara. Para crianças entre 6 e 11 anos,
devem ser seriamente ponderados os riscos/benefícios da decisão de usar ou não máscara,
devendo considerar-se: a intensidade da transmissão na área onde a criança se
encontra e as evidências disponíveis sobre o risco de infeção e transmissão
nesta faixa etária (os dados apontam para baixo risco); o impacto negativo do uso contínuo de máscara no
bem-estar emocional e social da criança, na sua aprendizagem e no seu
desenvolvimento integral; a capacidade e a maturidade da criança para cumprir o
uso apropriado de máscara e a disponibilidade de supervisão apropriada de um
adulto (abaixo dos
12 anos essa maturidade não está totalmente adquirida pelo que o uso contínuo e
errado de máscara poderá aumentar o risco de infeção em vez de o diminuir); e as adaptações para ambientes específicos, como
escolas, atividades desportivas ou para crianças com deficiência ou com doenças
pré-existentes.
Acima dos 12 anos, a OMS recomenda que se sigam as
orientações para os adultos. No entanto, apela à necessidade de adaptações para
ambientes especiais como escolas, no desporto ou para crianças com deficiência
ou com doença pré-existente. E alerta que, para crianças de qualquer idade com
distúrbios de desenvolvimento, deficiências ou outras condições de saúde
específicas que possam interferir no uso da máscara, esse uso não pode ser
obrigatório e deve ser avaliado caso a caso pelo educador e pelo médico da
criança.
2021.07.27 –
Louro de Carvalho
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