A Assembleia
da República (AR) debateu, na tarde de 21 de julho, o
Estado da Nação relativo à 2.ª Sessão
Legislativa da XIV Legislatura, que foi transmitido em direto pelo Canal
Parlamento.
Este debate, de política geral – criado em 1992, durante a maioria absoluta
do PSD de Cavaco Silva, mas iniciado a 1 de julho de 1993 – que se realiza em data a fixar por acordo
entre o Presidente da AR e o Governo, numa das últimas dez reuniões plenárias, inicia-se
com uma intervenção do Primeiro-Ministro (tem
até 40 minutos), com perguntas dos grupos
parlamentares e dos Deputados únicos representantes dum partido, seguindo-se
o debate encerrado por um membro do Governo (que
dispõe de 10 minutos) designado pelo Primeiro-Ministro.
Em ano difícil, marcado pela pandemia,
foi destacado pela positiva o plano de vacinação contra a Covid-19 e todos
profissionais que se empenharam no combate à crise sanitária; e, entre os
aspetos negativos, as oposições consideraram o desgoverno e o desgaste do
Executivo, as decisões tardias e os apoios que nunca chegaram a famílias e
empresas e ao SNS.
A
ordem de intervenção dos parlamentares foi: PSD, PS, BE, PCP, CDS-PP, PAN, PEV,
Chega e Iniciativa Liberal. O primeiro pedido de esclarecimento de cada força política pôde durar 5
minutos. Os restantes puderam prolongar-se por 2 minutos. Rui Rio esteve ausente por causa da morte de um familiar próximo.
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Costa começou
por dizer que o país está na corrida contra o tempo entre vacinação e sucessão
de novas variantes”, mas que se têm cumprido as metas, de modo que em meados de
agosto 73% da população adulta terá a vacinação completa. E, embora se aguarde
decisão da DGS, há condições para vacinar as crianças e jovens com mais de 12 anos,
ainda antes do ano letivo (570
mil crianças e jovens),
para que este se inicie sem risco de interrupções.
O Governo quer
para os próximos dois anos letivos um plano com maior autonomia pedagógica das
escolas e aumentar o número de professores e técnicos especializados, no apoio
a alunos com mais dificuldades (investimento de 900 milhões de euros). E pretende “recuperar as aprendizagens resultantes da suspensão das atividades
letivas presenciais”, devido à pandemia.
Porém, não
podemos ficar-nos no combate à pandemia. Por isso, o PRR será focado, na área
da saúde, no reforço dos programas de saúde mental e oral, dos meios complementares
dos centros de saúde e das camas de cuidados continuados. E o Primeiro-Ministro
salientou a necessidade de regular o teletrabalho e o trabalho em plataformas
digitais e combater a enorme desproteção social que a precariedade acarreta,
pois todo o trabalho tem de ser reconhecido e valorizado e ter proteção e
dignidade. E criticou as empresas de trabalho temporário que, sendo instrumento
de flexibilidade, “não podem ser instrumento de precarização das relações
laborais”.
No plano
económico, o Chefe do Governo salientou a importância do PRR e do programa
PT2030, o que dá “40 mil milhões de euros ao serviço da transformação da nossa
economia”. E, tendo o nosso PRR sido o primeiro aprovado na UE, já estão
lançados alguns concursos e celebrados alguns protocolos. Com efeito, o desafio
é recuperar da crise pandémica e resolver “os problemas estruturais” do país. Depois,
o Primeiro-Ministro abordou a “nova geração de políticas de habitação”, com um
“parque público de habitação para arrendamento a custos acessíveis”, para
ajudar os mais jovens e assegurar habitação condigna às famílias, realojando 36
mil famílias até ao dia 25 de abril de 2024”. Frisou a aposta no tecido
empresarial tentando aproximar o lado empresarial da ciência, bem como no
empenho em reforçar competências nos campos de agricultura e mar e no apoio à
formação de jovens. Assim, vão ser apoiados 30 mil jovens em cursos
profissionais nas áreas emergentes e em cursos superiores.
No quadro do
combate às alterações climáticas, António Costa destacou a aposta na mobilidade
sustentável e eficiência energética dos edifícios, com investimentos “sem
precedentes”, até porque são “as duas principais fontes de emissões de CO2” do
país.
Quanto à
coesão territorial, elogiou o reforço dos portos e “a maior compra de comboios
da história da CP”.
E terminou com
o balanço de um ano e meio de luta contra a covid-19. Se, há um ano, “o estado
da nação era o de uma nação em luta”, agora estamo-nos a reerguer com a dor do
luto e com as cicatrizes dos sacrifícios de todos, mas “determinados a
construir um país melhor, mais resiliente e mais preparado para vencer os
desafios do futuro”. E o Primeiro-Ministro louvou os esforços dos profissionais
de saúde e o empenho de professores, alunos e famílias, e de todos os
trabalhadores que estiveram na linha da frente e assegurou que agora “é tempo
de olhar em frente e pôr mãos à obra, para responder às prioridades e superar
os desafios”.
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Seguiu-se a
troca de galhardetes críticos entre as oposições e o Chefe do Governo, com este
a responder a maior parte das vezes ad
hominem e os deputados do PS a porem o pescoço no cepo pelo Governo.
Assim,
a título de exemplo, é de recordar que o PSD, acusando Governo de estar gasto,
diz que não tem mão para erguer o país, que houve desinvestimento no SNS e
falta apoio às empresas, ao que o Governo contrapôs a política de saúde deste
partido e, comparativamente com o tempo da troika, assinalou mais de 5 mil
milhões de apoio às empresas (contra o zero de então) e
uma taxa de desemprego de 7,1% (contra os mais de 18% de então). E enfatizou
que mesmo os dinheiros alocados ao Estado central e aos municípios revertem, na
maior parte dos casos para as empresas, pois são elas que executam as obras que
as entidades públicas põem em programação.
O BE
acusou a direita de estagnação e questionou o Governo sobre as leis laborais e
o reforço do SNS, dando a entender que o Governo estava a dar os apoios já
anteriormente previstos, mas agora a pretexto da bazuca – questões que António
Costa relativizou e a que opôs a política definida e seguida Executivo.
Também
o PCP questionou o Governo sobre salários em via de congelamento, vulnerabilidades
laborais e ameaças de despedimento, ao que António Costa respondeu com a permanente
atenção do Governo a estas questões, referindo que não quer congelar salários e
que aposta no trabalho digno, como preconiza o PCP no seu projeto de lei em
discussão na especialidade.
O CDS
agitou o caso da festa do Sporting mencionando o despacho de autorização do MAI
com conhecimento ou à revelia de Costa, que disse não conhecê-lo, como acusou o
Governo de executar mal o PRR, o que o Primeiro-Ministro desmentiu.
O PAN
questionou o Governo sobre os apoios sociais, as alterações climáticas, a
corrupção e o bem-estar animal, o que o Primeiro-Ministro respondeu convenientemente.
Entre
outras coisas, o Chega criticou a atuação do Ministro da Administração Interna,
sublinhando a inépcia do Ministro, que esteve mudo e saiu calado, e a passividade
do Primeiro-Ministro que, perante as críticas de seus ministros fragilizados,
foge como o para-raios. E Costa contrapôs com o aumento da segurança no país e
mostrou-se espantado como, no meio deste clima que o deputado vê tempestuoso, consegue
pôr um para-raios a fugir.
Obviamente
que os ataques e as defesas continuaram com Governo e PS a tentar pôr no lugar
a direita, mormente a bancada socialdemocrata sob os rótulos de estagnação e
falta de empenho.
Destaco
a intervenção do deputado do PS Capoulas Santos, que elogiou o desempenho da presidência
portuguesa da UE realçando o encerramento de “dossiês” importantes durante a mesma
e apontando nomeadamente para a Cimeira Social do Porto, o certificado digital
de vacinação e a aprovação dos primeiros PRR. E declarou:
“Todos
elogiaram a presidência portuguesa tantas vezes subvalorizada e até mesmo denegrida
por alguns em Portugal”.
Por seu
turno, o Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza
Vieira, recordou como nos últimos meses se disse que “o colapso do país está
iminente e que o Governo está esgotado”, sendo que, neste debate, se voltaram a
ouvir discursos desse teor.
Ainda que não
se possa negar “o impacto adverso desta pandemia”, o Ministro ironizou que “agora
o que anuncia o apocalipse é o fim das moratórias” como “a nova Barca do
Inferno da economia portuguesa”. Porém, salientou os apoios já dados (“o Governo foi sempre estendendo
apoios, já renovámos apoios a atividades encerradas como os de animação noturna”) e afirmou que é preciso continuar a
trabalhar, “não lamentando os tempos”, referindo que três milhões de pessoas
beneficiaram dos apoios sociais, tendo sido isso que permitiu que o consumo
privado crescesse.
Siza Vieira
assumiu que o objetivo do Governo “não era eliminar o impacto da crise”, mas
sim permitir que as empresas conseguissem responder à procura quando ela
acontecesse.
Depois,
destacou a performance do Governo, sobretudo na renovação dos apoios às atividades
que se encontram encerradas, nomeadamente as de diversão noturna, e “as
exportações de bens aumentaram a competitividade”.
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O encerramento
do debate coube ao Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Augusto
Santos Silva, que, entre outros itens, abordou a problemática da revisão constitucional
e do sistema eleitoral, que o PSD propõe, e acusou a oposição em termos de
conjunto de ser “preguiçosa” e sem alternativas políticas. E disse:
“O
maior partido da Oposição mostra-se coerente em dois pontos críticos do
equilíbrio constitucional: um é o desejo de reduzir perdas eleitorais através
da mudança ad hoc do sistema
eleitoral e à custa da representação dos pequenos partidos e das regiões de
baixa densidade; o outro é a permanente fixação em pôr em causa a independência
do nosso poder judicial.”.
Para Santos
Silva, a atual conjuntura não permite equívocos nas prioridades, pelo que
bradou:
“O
tempo não é de questionar a Constituição, mas de cumprir a Constituição. O
tempo não é de trazer para o debate político as questiúnculas, mas sim os
problemas. Não é de assimilar a agenda populista ou normalizar o discurso de
ódio, é sim de construir soluções políticas capazes de apoiar e acelerar a
recuperação nacional.”.
***
O debate parlamentar
do Estado da Nação fez-se, embora com as limitações habituais da guerrilha partidária.
Falta, porém, fazer-se o debate eficaz no tecido social e na malha empresarial
e, sobretudo, importa que o país se reerga desta crise sistémica e cresça,
cresça, cresça de forma sustentável. Na verdade, não é admissível que os
deputados e os líderes das associações sindicais e empresariais não leiam demoradamente
o PRR. Pois que o façam, para maior conhecimento e melhor execução, como
recomendou o Primeiro-Ministro a um determinado deputado das oposições. Não sei
se a recomendação se deve estender aos deputados que apoiam o Governo…
2021.07.23 – Louro de Carvalho
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