O regresso
às aulas decorrerá entre 14 e 17 de setembro e a ausência de regras da parte da
Direção-Geral da Saúde (DGS) e do
Ministério da Educação (ME) tem
suscitado várias reações de partidos como o PSD e o Bloco de Esquerda (BE), bem como de outras organizações, mas também do Chefe
de Estado.
Durante a
sua visita a Faro, no dia 31 de agosto, o Presidente da República comentou o
regresso às aulas que se avizinha, levantou algumas questões a que a DGS terá
de responder, frisou que estamos a 15 dias do início das aulas e recordou que
“as regras sanitárias não podem ser consideradas como regras que só meia dúzia
de eleitos é que podem perceber”.
Revelando
aos jornalistas que esteve num estabelecimento de ensino onde as regras eram
cumpridas e havia entre 100 e 200 alunos na escola, mas que a escola tem
1.100”, apontou que a “questão é saber com 1.100 como é que é”.
Para Marcelo
Rebelo de Sousa continuam por esclarecer muitas perguntas, principalmente no caso
de surgir um novo caso numa determinada escola. E o Chefe de Estado questiona:
“Quem decide o que fazer? A escola? Quem na escola? Há a audição e
intervenção de entidades a nível regional ou a nível nacional?”.
Sublinhou
que a DGS e as direções das escolas “certamente” já terão definido as regras
para este ano letivo, cujo início decorre este ano entre 14 e 17 de setembro, mas
defendeu que as mesmas “sejam esclarecidas e explicitadas bem” à comunidade
nacional, pois “é evidente que, quanto mais cedo for feito, melhor é essa
tarefa de esclarecimento”.
Pesando as
dúvidas que o assolam e aos portugueses, o Presidente destacou a necessidade de
a DGS divulgar as condições em que decorrerá o regresso às aulas. E, exigências à parte, Marcelo considera que “aquilo que se está a pedir à
DGS é muito ingrato, muito difícil e trabalhoso, é uma tarefa quase ciclópica,
mas – mal ou bem – é a missão que assumiu e tem de cumprir”.
Após a predita
visita, o Chefe de Estado deslocou-se ao museu municipal de Faro, onde
descerrou uma placa alusiva à atribuição da categoria de tesouro nacional ao
mosaico romano do deus Oceano. E a agenda terminou com um jantar de trabalho
com autarcas em Faro.
***
Por seu
turno, o presidente do PSD, Rui Rio, após uma reunião com os Bombeiros Voluntários
de Castelo de Paiva, a 27 de agosto sublinhou que “aquilo que, naturalmente, neste momento o preocupa é a forma como o
Governo vai resolver o problema do reinício das aulas, que é efetivamente
complicado”, pois “as crianças têm de ter aulas e os jovens têm de estudar”.
E o BE, pela
voz de Catarina Martins, apelou ao ME a que investisse em mais contratações. A
este respeito, diz a coordenadora do BE:
“O ano letivo está à porta e o regresso ao ensino presencial é
fundamental. Para que decorra em segurança, o Ministério da Educação deve tomar
duas medidas imediatas e que vimos reclamando desde junho.”.
O BE defende
a “contratação de mais professores, assistentes operacionais e técnicos”, mas
também o encontro, por parte das autarquias, de “espaços possíveis e
disponíveis para que exista desdobramento de turmas”.
Também a FNE
(Federação
Nacional da Educação), a CONFAP (Confederação
Nacional das Associações de Pais) e a ANDAEP (Associação
Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas) apelaram a que as orientações para o ano letivo
2020/2021 sejam “claras e coerentes”.
Por via dum
ano letivo que se perspetiva atípico, mercê da pandemia de covid-19, as três
organizações apresentaram um documento conjunto, que em breve será enviado ao
Presidente da República, ME e grupos parlamentares, onde expõem as suas
preocupações e sugestões para o ano letivo 2020/2021. E, se, por um lado,
apelam à DGS a que sejam “rigorosas, claras, coerentes e exigentes” as
orientações para o funcionamento do próximo ano letivo, por forma a
salvaguardar a comunidade escolar, por outro, pedem “rapidez” ao ME na
divulgação das mesmas orientações.
Já a FENPROF (Federação
Nacional de Professores)
responsabilizou o ME pela abertura do ano escolar em regime presencial, sem ter
assegurado as necessárias condições de segurança sanitária nas escolas. E Mário
Nogueira, o secretário-geral, considerou, numa sessão na Escola Básica do 1.º
Ciclo Solum Sul, em Coimbra, com a presença de professores e jornalistas, que
“as condições que se exigem para uma abertura das escolas não foram criadas”.
Para
Nogueira, “o ensino presencial é essencial” para devolver alguma normalidade às
escolas, já que “o ensino remoto, outra vez, seria trágico” para alunos,
professores e pessoal auxiliar.
E o
líder daquela organização sindical, em declarações aos jornalistas no final da
iniciativa com que a assinalou a abertura do ano escolar, sustentou que, face à
pandemia da covid-19 e ao risco de contágio das pessoas pelo novo coronavírus (detetado
em dezembro em Wuhan, cidade do centro da China), o início das atividades letivas, entre os dias 14
e 17, deveria ser acompanhado de “medidas rigorosas que garantam que essa possibilidade
é reduzida ao máximo”. Criticou o Governo por ter perdido dois meses (julho
e agosto) para poder
melhorar as medidas sanitárias, cumprindo as orientações da DGS, pois algumas das
medidas “não cumprem as normas da DGS”. E voltou
a defender, por exemplo, que o ME deveria ter efetuado “um rastreio à covid-19
a toda a comunidade escolar”, “prévio ao início das atividades letivas”,
cabendo ao Governo “articular com os municípios a sua realização”, de acordo
com o “Plano para a abertura segura do ano letivo 2020-2021 em regime
presencial”, proposto pelo secretariado nacional da FENPROF, a 30 de julho.
Acusando
que “não há rastreio, não há distanciamento, não há pequenos grupos de alunos e
também falta pessoal” e que o ME “esteve dois meses a dormir”, Mário Nogueira
disse que a FENPROF “voltou a pedir”, no
dia 28, uma reunião com o ME para analisar estes problemas, depois de nos
últimos meses ter feito várias vezes a mesma solicitação sem sucesso. Idêntico
pedido foi dirigido à DGS, por oito vezes, mas a organização sindical não
obteve resposta.
***
Posto
isto, é assentar em que todas críticas ao Governo e à DGS são admissíveis,
pois, face à onda pandémica que assola o país e o mundo, ninguém pode eximir-se
às falhas que os cidadãos comuns anotam e o mais fragilizados sofrem. Não
obstante, é de referir que a DGS prepara um manual par uniformizar
procedimentos, mas lembrou,
neste dia 1, no Twitter, que a Orientação conjunta da DGEstE, da DGE e da DGS,
sobre o ano letivo 2020-21 está disponível e é pública desde julho, embora
reconheça que, a todo o momento, possa haver necessidade de ajustes. E o ME vem
dizer que, desde julho, a DGEstE (Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares) forneceu às escolas orientações precisas e que são públicas. Isto,
além de cada agrupamento ou escola não agrupada ter em marcha o seu plano de
contingência desde março, obviamente ajustável.
Isto não quer dizer que as
organizações ligadas à Educação que se sentem insatisfeitas não tenham razão.
Mas a grande falha, neste aspeto, não é da DGS, mas do ME e das autarquias que,
pela não ampliação e duplicação dos espaços escolares e pela não contratação de
mais pessoal docente e não docente, não possibilitam a observância cabal da
regra do distanciamento físico. E também as autoridades regionais e locais de
saúde não têm revelado a prontidão suficiente para obviar a situações que
porventura venham a verificar-se, pois, se já é tão difícil a prestação de
cuidados de saúde básica…
Quanto ao Chefe de Estado, a síndrome
da índole solitária do exercício do cargo, testemunhada em minirreportagem do Público do dia 23 de agosto, parece estar
a fazer com que Sua Excelência sinta necessidade de intervir a tempo e a
destempo. Dizendo que não comenta, já comentou tudo. Ou, apontando que não
interfere no devir dos outros órgãos e instituições, já interferiu. Até parece
desenvolver uma ação governativa paralela à do Governo através da comunicação
social, a ponto de não ser de estranhar a pergunta da senhora que o interpelou
– não sei se espontaneamente – na Feira do Livro do Porto: “Quem manda é o Governo ou o Presidente?”.
Pronuncia-se obrigatoriamente quando
veta diplomas da AR, até com pretensões interpretativas da lei, como sucedeu
com o diploma dos festivais ou com o que procede à 3.ª alteração do estatuto do
gestor público, mas também se pronuncia muitas vezes – e sem necessidade – quando
promulga diplomas da AR ou do Governo ou quanto veta diplomas do Governo, como
opina antes de o processo legislativo chegar ao fim.
Alguns gostam de que ponha ministros
em sentido, como fez várias vezes com Centeno e recentemente com Ana Godinho. O
partido do Governo aprecia que o Presidente esteja a seu lado a legitimar a
geringonça ou o Governo; e a oposição, que detesta o apoio do Presidente ao
Governo, ama que o Presidente critique o Governo e dê espaço à crítica
oposicionista, o que o Governo obviamente não aprecia, mas vai calando enquanto
pode.
Porém, tirar partido duma DGS
fragilizada e com uma tarefa ciclópica pela frente, como o próprio Chefe de
Estado veio a reconhecer, a meu ver, tardiamente não quadra à veia democrática
e humanista que Marcelo professa. E exigir que se publique o que está
publicado, talvez só porque o material ainda não lhe chegou para ler tudo de
fio a pavio, como faz questão de sublinhar, legitima a questão, a saber: “se
isso é febre de informação ou febre de controlo”.
Quanto à
escola, hoje todos os clientes da educação – que não são apenas uns quantos
“eleitos” – acedem a todo o material que ali é produzido ou ali chega, em papel
ou em suporte digital.
Se
calhar, era preferível ser o Chefe de Estado habitualmente mais institucionalista
– representando a República Portuguesa, garantindo a independência nacional, a unidade
do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e sendo, por
inerência, Comandante Supremo das Forças Armadas (vd CRP, art.º
120.º) – e guardando
a palavra sábia e oportuna para momentos de crise grave. Com efeito, as
presidências de excessiva simpatia popular são de má memória
(vg: Carmona e Tomás)
e os factos poderão desnecessariamente virar-se contra Marcelo, o que seria de lamentar,
pois não se duvida de suas boas intenções, como, por exemplo, desmitificar a
figura presidencial.
2020.09.01 –
Louro de Carvalho
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