sábado, 26 de setembro de 2020

Afinal, destino do Banco Montepio poderá ditar a fusão com o BCP

 

O Banco Montepio (BM), liderado desde fevereiro por Pedro Leitão, avançou com um pedido de estatuto de empresa em reestruturação ao MTSSS (Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social), que este diz já estar em análise por parte do ISS (Instituto da Segurança Social) e do IAPMEI (Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação) e que permitirá ao banco avançar com uma redução significativa de pessoal e o encerramento de balcões, o que em nada difere de reestruturações operadas em entidades congéneres, por exemplo, o Novo Banco (NB) e a Caixa Geral de Depósitos (CGD), que que apresentaram planos de saídas de colaboradores de larga escala e fecho de agências, em virtude das penosas reestruturações impostas por Bruxelas.

Juntamente com o pedido, o banco apresentou um projeto que demonstra que a dimensão da reestruturação, necessária à viabilidade económica e financeira da empresa, obriga a ultrapassar o balizamento até agora estabelecido. E a predita análise determinará a rejeição do pedido ou a aprovação do estatuto que permite à instituição financeira a flexibilização da quota de que dispõe, em função da sua dimensão, para acordos com trabalhadores com vista a uma rescisão amigável, mantendo estes o direito ao subsídio de desemprego.

Está em causa um plano que prevê a saída de 800 trabalhadores (número indicativo, pois a margem situa-se entre os 600 e os 900), num universo de cerca de 3.560 trabalhadores no final de junho, sendo que, até final do ano, o banco deverá avançar com um programa de reformas antecipadas, tendo sido identificados 160 trabalhadores elegíveis, para lá de cerca de quatro dezenas de agências redundantes geograficamente, que fecharão portas. E, quanto às saídas através de rescisões por mútuo acordo (RMA), o banco, que recebeu as estruturas de trabalhadores, só as informou das saídas através de reformas antecipadas, este ano, não tendo adiantado qualquer número, que está dependente da decisão do Governo sobre o pedido de estatuto de empresa em reestruturação.

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Entretanto, a administração do BM já comunicou a todos os trabalhadores, por e-mail, que o plano de reestruturação prevê a redução de pessoal de entre 600 e 900 trabalhadores. Com efeito, no e-mail enviado no dia 25, Carlos Tavares (chairman) e Pedro Leitão (presidente executivo), com base nos cenários analisados e para um quadro plurianual, estimam “um intervalo máximo indicativo de redução de pessoas entre 600 a 900, tendo para o efeito sido requerida junto das entidades competentes a possibilidade de alargamento de quota para subsídio de desemprego”. Argumentando com as circunstâncias atuais e incertezas futuras, bem como os desafios que se colocam ao banco, ao setor e ao país, dizem ser necessário ajustar objetivos e medidas previstos no Plano de Transformação – ora em fase de consulta com os parceiros sociais e estruturas representativas dos trabalhadores a apresentar formalmente a todos os colaboradores no dia 6 de outubro (não há listas de pré-selecionados), com a adoção de um rigoroso programa de ajustamento multidimensional e plurianual” com vista a tornar o Montepio “um banco eficiente e rentável”.

O SNQTB (Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários) defende que o plano de redução de pessoal “se deve concentrar exclusivamente em reformas antecipadas e rescisões voluntárias de trabalhadores”. E, para o efeito, elaborou uma moção, que foi aprovada pela FECEC (Federação Europeia dos Quadros das Instituições de Crédito e Financeiras) a enviar ao Parlamento Europeu, referindo que “os sindicatos devem constituir-se como parceiros sociais essenciais neste processo”, que “nenhum plano poderá ser estabelecido sem a sua participação” e que a comissão executiva do BM deve dar o exemplo, começando por reduzir a sua folha de pagamento.

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A situação do BM tem sido deveras complexa. Desde as giravoltas da sua acionista maioritária, a Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG), aos prejuízos e aos esforços para captar contratos de crédito à habitação com a oferta de bónus, passando pela instabilidade na administração, começando pela dificuldade em recrutar e selecionar um CEO até chegar à dança de cadeiras dos administradores executivos.   

Na verdade, o banco, que em tempos comprara o Finibanco, fechou o 1.º semestre do ano com prejuízos de mais de 50 milhões de euros devido à pandemia, embora tenha negado os efeitos da pandemia sobre o devir da instituição, já vinha enfrentando há mais tempo desafios do ponto de vista da rentabilidade, de geração de capital e da limpeza do malparado. Por outro lado, o acionista maioritário, a AMMG, que nos últimos anos tem vindo a injetar dinheiro no banco, também se encontra numa situação particularmente desafiante, como sublinharam os auditores da instituição. É Pedro Leitão o CEO do Banco Montepio desde fevereiro, após um longo período de indefinição na liderança do banco, e agora Dulce Mota, administradora responsável pela rede comercial, está de saída para a sociedade gestora de fundos do Montepio.

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Segundo o Expresso, deste dia 26, o BCP mostrou disponibilidade para uma fusão com o BM, caso seja necessária uma intervenção, disponibilidade já comunicada ao Governo em reunião entre administração do BCP e João Leão. Efetivamente, o Ministro das Finanças teve reuniões bilaterais com vários banqueiros para discutir as moratórias do crédito, medida aprovada, no dia 24, em Conselho de Ministros, e o tema do Montepio acabou por surgir sempre.

E, de facto, numa altura em que têm saído notícias sobre um plano de reestruturação do Montepio, com a dispensa de trabalhadores, que pode chegar a várias centenas, ganham nova atualidade as preocupações dos banqueiros e das Finanças.

Nem o BCP nem o Ministério das Finanças comentam esta informação de disponibilidade para com o BM, confirmando apenas as reuniões. Assim, o gabinete de João Leão deixou por responder todas as outras perguntas colocadas pelo Expresso, nomeadamente sobre a eventual disponibilidade de outros bancos (além do BCP) para participarem numa solução para o Montepio, o grau de preocupação com que as Finanças olham para este dossiê ou como lidará o Governo em cenário em que tenha a AMMG problemas de equilíbrio financeiro comprometedores das responsabilidades com as poupanças dos seus associados.

Na verdade, mesmo sem o dizer explicitamente, a gestão do BCP já tinha aberto a porta a uma eventual operação de consolidação, em julho, na apresentação de resultados do banco. Nessa altura, a propósito da eventual aquisição do NB, o presidente Miguel Maya referiu que o BCP não tem interesse “nenhum em crescer em Portugal e no estrangeiro por via de aquisições”, mas também alertou que, “em qualquer operação que vá ao mercado, é dever de uma gestão diligente olhar para ela”.

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De facto, a situação no Montepio é confusa. O presidente executivo terá escondido o plano de reestruturação que já entregou ao Banco de Portugal e confirmou aos sindicatos da banca que o plano existe. Refira-se que está em jogo a dispensa estimada de 800 trabalhadores, entre saídas por reformas antecipadas e rescisões por mútuo acordo, bem como o fecho de cerca de 40 balcões, número que, segundo o Expresso, passa para 80 balcões. Porém, o BM, apesar das várias insistências, não confirma nem desmente os números avançados pelo jornal online “ECO”. E, questionado sobre o que explica a necessidade duma reestruturação desta dimensão, se o banco vai precisar de capital e se, como dizem algumas fontes, o plano não foi aprovado em Conselho de Administração, mas apenas na Comissão Executiva, também não respondeu.

É certo que, no dia 24, houve uma reunião do Conselho de Administração do banco, mas não se sabe se o plano de reestruturação terá ido a essa reunião e se terá sido aprovado.

No dia 23, houve uma reunião de Pedro Leitão como o SNQTB (Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários), o SIB (Sindicato Independente da Banca) e o SBN (Sindicato dos Bancários do Norte), aos quais foi dito que vai haver um plano de reestruturação, mas nada lhes foi dito quanto ao número de saídas, apenas que o mesmo “contempla um plano alargado de reformas antecipadas e de rescisões de contratos de trabalho por mútuo acordo [RMA]” até 2021. E, considerando que a situação “é muito preo­cupante”, os sindicatos prometeram analisar “com detalhe o plano apresentado”, o que fizeram, como foi referido, no dia 25. Por outro lado, segundo o Expresso, há cerca de 200 trabalhadores cedidos pelo banco à AMMG, mas quanto a estes, segundo os sindicatos da banca, não se sabe se “vão ser abrangidos”.

A AMMG, dona maioritária do banco, ao ser questionada se foi informada do plano, quais as razões invocadas pela Comissão Executiva e se a situação do banco não irá implicar um reforço de capital, respondeu que “acompanha a vida do Banco Montepio, ainda que, naturalmente, existam maté­rias que se inscrevem na gestão do banco e do seu regulador”, e adiantou que “os processos de ajustamento, as suas dinâmicas de implementação e os impactos associados não deixam, contudo, de ser definidos e orientados no respeito pelos valores que inspiram a Associação Mutualista e todo o Grupo Montepio, garantindo, como tal, atenção particular às pessoas e às necessárias condições de aceitação e satisfação”. Já no atinente a eventuais necessidades de capital, a Mutualista diz que “acompanha o estudo das necessidades” e que “há soluções que passam pela otimização do capital existente no contexto regulatório”.

Por fim, é de frisar que o Banco de Portugal acompanha de perto o que se passa no BM. Pedro Leitão apresentou-lhe o plano de reestruturação em julho, embora só tenha dado entrada como documento a 15 de setembro, nomeadamente no que concernente à sua aprovação apenas pela Comissão Executiva, bem como à existência de eventuais necessidades de capital, mesmo havendo nesta altura uma flexibilização dos rácios por causa da pandemia.

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E era este banco em que a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa queria investir em grande na perspetiva de socorro aos pobrezinhos acreditando que, metendo dois dos seus elementos na administração do banco, o salvariam por milagre, milagre que nem Deus faz, pois não joga nestes tabuleiros da compra e venda de dinheiro, do lucro destemperado, que dá bota!

Virá a acontecer que estejamos perante mais um caso de resolução bancária do género da do BES ou da do Banif? Nestes casos, Costa não é muito diferente de Passos. E os contribuintes cá estarão para pagar. Não se aflijam, nós somos ricos…

2020.09.26 – Louro de Carvalho

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