De acordo com informação veiculada pela agência Lusa, a Comissão Política distrital do
PSD do Porto culpa o Governo pelas falhas no arranque do ano letivo e em
particular o Ministro da Educação, cujo desempenho “negligente” deve levar o
governante a retirar as necessárias consequências políticas. Assim, esta
estrutura partidária assinala, em comunicado:
“Pelo seu desempenho negligente, porquanto
não se mostrou capaz de proporcionar às escolas as condições necessárias e
adequadas ao arranque deste ano letivo, particularmente exigente, o Senhor
Ministro da Educação, deverá retirar as necessárias consequências políticas”.
Responsabilizando o Ministério da Educação (ME) pela forma do arranque do ano letivo, salienta que,
tendo conhecimento da pandemia, pelo menos desde março, “não garantiu a efetiva
contratação de docentes e de pessoal não docente para que as escolas consigam
dar uma resposta educativa e sanitária adequada face à pandemia SARS-CoV-2 e à
doença de covid-19”. E sustenta que a inércia do ME “causou constrangimentos
vários nas escolas e um sério impacto no funcionamento da larga maioria dos
estabelecimentos de ensino”.
Aquela estrutura partidária estriba as suas conclusões
nas várias visitas que realizou em diversos pontos do Distrito do Porto,
vincando que o pessoal não docente, nomeadamente os assistentes operacionais
disponíveis nas escolas, “são claramente em número insuficiente” para aplicar
as medidas preconizadas de higiene das instalações e equipamentos, bem como de
vigilância e controlo sanitário dos alunos. E, lembrando que, há meses, anda a
ser prometida a revisão da portaria dos rácios de pessoal não docente os
sociais-democratas do distrito do Porto defendem:
“O Ministro da Educação, por incompetência e
incúria, não salvaguardou esta situação com o agilizar da contratação dos
funcionários necessários para que as escolas funcionem em tempos de covid-19,
nem tão pouco preparou atempadamente bolsas de recrutamento para que as escolas
pudessem chamar estes funcionários na medida das necessidades e de forma célere”.
Também salientam a falta de clarificação das medidas a
adotar face à comunidade considerada “grupo de risco”, sejam profissionais,
sejam alunos, bem como a sua operacionalização, tendo em conta o envolvimento
de outros serviços e entidades, nomeadamente do SNS.
Por tudo isto, veem com preocupação o facto de o
Ministério, desde 3 de julho, se recusar a reunir com as organizações
representantes de professores para solucionar o problema das faltas dos
professores que pertencem a grupos de risco, que se estimam em cerca de 10%.
O PSD acusa ainda o Governo e o Primeiro-Ministro no atinente
à disponibilização dos recursos digitais a escolas, alunos, docentes e não
docentes, lembrando que o líder socialista anunciou, no Parlamento, que escolas
e alunos teriam os recursos informáticos necessários, mas que o anúncio “não
passou de um ‘soundbite’
comunicacional para encher primeiras páginas de jornais e abrir telejornais”, sendo
que as promessas constantes no PEES (Programa de Estabilização Económica
e Social) ao nível do material informático,
com estimativas de investimento de 400 milhões de euros, “não passam disso
mesmo, sem qualquer intuito de serem cumpridas”.
O PSD denuncia ainda que as escolas, designadamente as
que têm mais procura, foram obrigadas pela DGEstE (Direção-Geral
dos Estabelecimentos Escolares) a formar
turmas até ao limite legal estabelecido (28 alunos), contrariamente ao absolutamente desejável, num
quadro de bom senso, em contexto pandémico.
***
Já a 9 de setembro, Nuno Crato, ex-Ministro
da Educação – que preside à Iniciativa Educação, promotora da
aprendizagem da leitura e do desenvolvimento do ensino profissional e que divulga
informação e conhecimento sobre Educação (“pretende
ajudar o sucesso dos jovens, apoiando projetos exemplares, com potencial efeito
multiplicador no sistema educativo e na sociedade”) –
recordava ao “educare.pt” os
constrangimentos dos últimos meses, olhava para o arranque do novo ano letivo,
falava sobre mais uma etapa escolar e entendia que, embora as novas tecnologias
sejam extraordinários auxiliares, o contacto direto era insubstituível.
Frisando que a
atenção se concentra na reabertura da escola, regresso de alunos e professores,
início de mais uma etapa escolar e entrada do país em estado de contingência a
15 de setembro por causa da pandemia, o professor
catedrático de Matemática e Estatística dizia esperar que os
medos sejam ultrapassados e se retomem as atividades letivas orientadas por
metas curriculares “claras e ambiciosas”, metas que existem, tal como existem bons
manuais escolares e os “professores e as escolas sabem que o sucesso real
implica ambição e trabalho”.
Fazendo a recuperação das
matérias não consolidadas no ano letivo passado parte dos planos da tutela nas primeiras
semanas, o antigo Ministro da Educação sustenta que não faz sentido rever
matéria em oposição a avançar na matéria, pois, a seu ver, “rever matéria no
sentido de repetir matéria dada pode ser inútil e, no extremo, prejudicial”. E assegura
que “o importante é prosseguir e colmatar dificuldades à medida que se avança e
ir testando a aprendizagem”. Por outro lado, “como em todo o ensino, o
importante é ter metas”, o objetivo do ensino, seja presencial seja remoto, não
é “entreter os alunos em atividades, muito menos em atividades dispersas e
pouco estruturadas”, mas “progredir em conhecimentos e formação”.
Vistas mais à lupa as
suas declarações, ressaltam vários pontos a considerar.
Desde logo, no atinente
ao arranque desta etapa escolar, é de ter em conta que “o ambiente vai ser dominado pelo
receio de contágio e por dificuldades de manter as normas”, mas com a esperança
de que “tudo seja ultrapassado e rapidamente se retomem as atividades letivas
orientadas por metas curriculares claras e ambiciosas”.
Crato é, pois, crítico
da recuperação de aprendizagens (chama-lhe revisão da
matéria, expressão não utilizada da documentação oficial enquanto Ministro) do 3.º período do
passado ano letivo, sustentando:
“Por
um lado, pode esmorecer os alunos, por sentirem que estão a repetir coisas já
tratadas. Por outro lado, cria habitualmente uma falsa sensação de confiança,
pois os alunos, ao ouvirem coisas repetidas, sentem que já sabem tudo sobre o
que está a ser discutido. Ou seja, o importante é ir avançando e colmatando as
dificuldades à medida que se avança. E ir testando a aprendizagem, que é uma
das melhores formas de a solidificar.”.
É óbvio que tem razão no que
sustenta, mas em circunstâncias normais, esquecendo que esta é anormal. E,
embora se tenha propalado que o aluno, com os agrupamentos de escolas, passa a
desenvolver-se integrado num projeto educativo do 1.º ao 12.º ano, há muitas
mudanças de escola ao nível do percurso escolar. Basta referir que muitos agrupamentos
escolas não ministram o ensino secundário e o projeto educativo tem um
horizonte temporário curto. Para mais a reta final do ano letivo anterior foi
problemática: a necessidade de a escola, os professores e os alunos se
adaptarem ao tele-ensino contou com muitas dificuldades e falhas que o ME reconhece,
muito embora aprecie o esforço realizado. E o professor catedrático dá dois
exemplos. No de alunos com dificuldade em somar dois números de um dígito cada,
o que já foi ensinado e a maioria da turma domina, fará sentido, ao ensinar a
adicionar números com dois dígitos ou mais, ir verificando as dificuldades da
turma e dos ditos alunos e ajudando-os a colmatar deficiências, o que é aceitável.
Já daquele em que se estudaram os rios da Península Ibérica, não valendo a pena
repetir ‘ipsis verbis’ o estudado,
mas discutir as vias de comunicação e integrar as vias fluviais nesse estudo
reforçando o que devia estar sabido, é de referir que se trata de exemplo bem
salazarento. Ora, em circunstâncias normais, antes de cada unidade de
ensino/aprendizagem, faz-se a avaliação diagnóstica sobre a situação de cada
aluno face aos pressupostos e pré-requisitos para poder avançar. E será, penso
eu, o que os professores farão nas primeiras 5 semanas, que não passam dum
horizonte indicativo.
Porém, tem razão ao dizer que é
mais difícil fazê-lo online do que presencialmente, mas que “é importante ir
questionando os alunos e testando-os, para poder reforçar alguns conteúdos”.
Sobre a autonomia da escola, que
todos proclamam e que Nuno Crato também cerceou, deixando-lhes
significativamente a escolha entre tempos letivos de 50 ou de 5 minutos, mas
definindo que o professor com horário completo tem um horário semanal letivo de
1100 minutos (divisível obviamente por um divisor 50 e não 45), diz: “Com certeza, com respeito pelas normas gerais e com a vigilância, a
iniciativa e a adaptabilidade necessárias”.
Quanto a evidências expostas pela pandemia, destaca “a grande dedicação dos professores e escolas e a grande adaptabilidade dos alunos e famílias”, bem como a existência de famílias e alunos com grandes dificuldades”, dificuldades que “se agravaram sem o ensino presencial”, pelo que, ao invés das antigas ideias e especulações “sobre a revolução no ensino provocada pelas novas tecnologias, que podem ser auxiliares extraordinários, ficou nítido que “o contacto direto é insubstituível”. Pareceu-lhe boa medida recorrer às emissões televisivas #EstudoEmCasa como complemento ao ensino à distância, embora não conheça “nenhuma avaliação deste programa”. E, sobre a suspensão das provas do 9.º ano e de aferição, diz ser “melhor avaliar do que não avaliar”. E, no atinente a desmotivação pela escola e abandono escolar e à eventual tendência de agravamento em regime de ensino não presencial, crê que “tudo recomeçará de forma natural”, sendo difícil “passar de novo de um regime presencial para um regime a distância, se isso for necessário”, pelo que “o ensino presencial e o ensino à distância não devem seguir, no essencial, princípios diferentes”, mas os mesmos no fundo: “ensino estruturado, metas claras, bons materiais de apoio, nomeadamente manuais, exposições claras, interação com os alunos, tarefas claras, devidamente espaçadas, testes formativos e testes sumativos, atenção às dificuldades…”(Abusa dos testes).
No entanto,
há coisas a atender –
diz – “mais difíceis de conseguir no ensino remoto”:
“Os alunos devem perceber com clareza em que
ponto se está e para onde se caminha; devem perceber sem ambiguidades o que se
espera que completem no que se refere ao seu estudo e às suas tarefas; devem
estar constantemente a praticar a recuperação (‘retrieval’, na terminologia
internacional), ou seja, a fazer pequenos testes e a responder a perguntas,
para se verificar e verificarem o que sabem e para solidificarem o que sabem,
devem ter atividades curtas e espaçadas, devem intercalar (‘interleave’) as
atividades e estudos de matérias diversas, em vez de concentrarem horas e horas
seguidas no mesmo tema”.
Tendo isto em conta, sustenta para
o ensino remoto:
“É decisivo simplificar: ter atividades
curtas e focadas, se possível ter também aulas mais curtas, mais focadas e mais
frequentes, ter práticas de estudo e de treino alinhadas com a matéria tratada
nas aulas e com a progressão dos manuais”.
E, como o site ED_ON, da
Iniciativa Educação, tem publicado artigos sobre a investigação científica
recente relacionada com o ensino à distância, sugere a professores, pais e demais
interessados a educação a consulta desses artigos, breves sínteses de temas
importantes.
Por fim, considera
que a subida das médias dos exames nacionais do Ensino Secundário era “um
cenário expectável perante a mudança de regras”, ou seja, “é um sinal de que as provas não foram feitas de
forma a poderem ser comparadas com as anteriores e isso é sempre negativo, pois
perde-se uma medida de evolução do sistema” – do que discordo, pois a avaliação
dum momento de aprendizagem difícil deve ser adequada ficando para mais tarde o
ajuste necessário.
***
Com as ressalvas introduzidas,
parece que, apesar de tudo, a postura de Crato nesta matéria representa um
contributo a ter em conta no arranque do ano letivo e em termos educativos.
Já a estrutura partidária acima
referenciada parece esquecer a gravidade do momento presente, não de ponto de vista
sanitário, que é consensual, embora sem que haja certezas sobre a sua extensão
e debelação, mas sobre a forma de encaixar, de forma generalizada, ensino
presencial necessário num regime de pandemia estacionário ou em agravamento com
instalações escolares a rebentar pelas costuras, muito por via do encerramento
de estabelecimentos escolares e de novas construções (e
mantiveram outras) sem
o dimensionamento ora reconhecido como necessário pelo imperativo de
distanciamento físico.
Enquanto o PSD, tal como o PS,
encerrou escolas, criou agrupamentos e centros escolares, fez escolas com
poucas salas, aumentou – ou manteve o aumento – o número de alunos por turma e
teve graves problemas no arranque dos anos letivos com falta de funcionários e
com a criação da BCE de fraca memória, com um arranque do ano letivo de
2004/2005 depois da trágica colocação de professores, até agora pouco fez ouvir
a sua voz, exceto na alegada falta de publicação das normas da DGS para as escolas,
que agora publicou um extenso manual de procedimentos, depois de, em julho ter
publicado, em parceria com a DGE e a DGEstE, as normas de convivência nas escolas
e a partir das escolas.
É óbvio que o Governo e o ME apresentam
falhas graves do ponto de vista dos sindicatos e das oposições, que eu
subscrevo, mas têm escoramento na maioria dos diretores escolares, segundo o
presidente da ANDAEP, bem como dos pais representados pela CONFAP e mesmo do
comentador político Marques Mendes, que salientava, a 13 de setembro, a boa prestação
do Ministro da Educação, em alegado detrimento da DGS (Por
Ministra e Diretora-geral serem mulheres?).
Só me interrogo se as autarquias,
cuja apetência pelos temas da educação é crescente, fizeram tudo o que podiam para
otimizar as medidas que a DGS, a DGE e a DGEstE delinearam em julho ou se ficaram
mais interessadas em arranjar alternativas às festas de verão que a pandemia
impediu de se realizar. As escolas podiam ter nas salas separadores acrílicos,
os transportes podiam estar organizados e podiam ter sido contratados os assistentes
operacionais onde as câmaras têm essa responsabilidade…
A postura de indiferença ou de
demolição é tudo menos vantajosa para a causa da educação ora obnubilada pela
polémica em torno da formação em Cidadania e Desenvolvimento.
E Marcelo Rebelo de Sousa vem
tardiamente dizer que o sucesso do próximo ano letivo é um objetivo nacional e
que, em vez de encerrar escolas, é preciso corrigir o que está mal. Ora, ele
que fala de tudo por antecipação, aqui vem com atraso de quase 6 meses. E como
manter uma escola aberta no caso de um surto epidémico?
Mesmo assim, venha daí o ano
letivo e que o SNS se convença de que há mais vida para lá das escolas e da
covid-19, sendo imperativo que ninguém fique para trás nas USF, nos hospitais,
em casa, nos lares, nas repartições públicas (Uma vergonha o
que se passa no IRN)!
2020.09.16 – Louro de Carvalho
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