terça-feira, 8 de setembro de 2020

Principais opções do Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal

 

O Governo pretende que o Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal, documento estratégico que irá contemplar as formas como o país pensa aplicar as verbas provenientes do Fundo de Recuperação da União Europeia, de resposta à pandemia, seja “dos primeiros a ser apresentado, discutido e aprovado”. Para tanto, quer apresentar a versão provisória dos planos nacionais para aceder aos fundos europeus em meados de outubro, sendo que a versão final poderá ser entregue nos primeiros meses de 2021.

Para discutir e fechar a preparação deste plano, que dará conta das reformas e investimentos a fazer com recurso à “fatia” de perto de 15 mil milhões de euros que lhe caberá do Fundo de Recuperação da UE pós-Covid-19, acordado em julho passado, três membros do Governo – Augusto Santos Silva, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Nelson de Sousa, Ministro do Planeamento, e João Nunes Mendes, Secretário de Estado das Finanças – estiveram em Bruxelas desde o dia 7 de setembro para contactos com vários membros do executivo comunitário. E, entre os interlocutores desta delegação governamental, contam-se os vice-presidentes executivos Valdis Dombrovskis e Frans Timmermans, a comissária da Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, e o comissário da Economia, Paolo Gentiloni.

É de recordar que, numa longa cimeira de líderes celebrada em julho, os 27 chegaram a um acordo sobre o plano para reerguer a economia europeia da crise provocada pela pandemia da covid-19, num pacote total de 1,82 biliões de euros: o orçamento da UE para os próximos 7 anos, no montante de 1,074 biliões de euros, e um Fundo de Recuperação de 750 mil milhões.

Deste Fundo de Recuperação, 390 mil milhões de euros serão atribuídos em subvenções (transferências a fundo perdido) e 360 mil milhões em forma de empréstimo, devendo Portugal arrecadar cerca de 15 mil milhões de euros a fundo perdido. E o acordo prevê que os Estados-membros apresentem planos nacionais de recuperação e resiliência a Bruxelas, sendo o português coordenado pelo Ministro Nelson de Sousa.

Em nota divulgada a 7 de setembro, o Ministério dos Negócios Estrangeiros releva que, além das reuniões com membros da Comissão Europeia para ultimar a apresentação do documento, o chefe da diplomacia portuguesa tem previstas reuniões de trabalho com o Alto Representante da União Europeia para a Política Externa, Josep Borrell, e com o presidente da comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento Europeu, David McAllister, no âmbito da preparação da presidência portuguesa do Conselho da UE no primeiro semestre de 2021.

Na conferência de imprensa que os referidos governantes deram ao final da tarde, em Bruxelas, sobre os resultados dos encontros, Santos Silva explicou:

Quisemos dizer à Comissão Europeia que estamos a construir o plano em plena concordância com as prioridades estratégicas que a União Europeia decidiu, com as orientações para a recuperação económica que o Conselho Europeu aprovou e em concordância com as recomendações específicas dirigidas a Portugal”.

E apontou que, entre as prioridades que irão definir o plano nacional se encontra a resiliência, nomeadamente para “responder a algumas das vulnerabilidades sociais que a pandemia colocou em evidência e fortalecer sistemas sociais como Serviço Nacional de Saúde”, bem como a transição climática, “designadamente na componente energética, de mobilidade sustentável, eficiência energética e desenvolvimento das energias renováveis”.

Assim, ficamos a saber que o fortalecimento do Serviço Nacional de Saúde e a transição climática são algumas das prioridades do plano de recuperação de Portugal.

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Ora, o processo para a realização do plano começou com o pedido do Governo a António Costa e Silva para desenvolver uma visão estratégica, documento cuja versão final será apresentada na próxima semana, após a consulta pública que terminou a 21 de agosto, e instrumento que o Governo utilizará “em diálogo com parceiros sociais e partidos políticos, para fazer o desenho das políticas e medidas em concreto que constarão do plano” de recuperação.

Sobre os resultados da referida consulta pública, Costa Silva já adiantara, no dia 31 de agosto, que o documento que apresentou em julho, a antecâmara do plano de recuperação, tinha recebido mais de 700 contributos. Porém, no dia 1 de setembro, o gabinete do Primeiro-Ministro, após ter sido questionado sobre o balanço da consulta pública ao documento “Visão Estratégia para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030”, respondeu que o documento recebeu 1153 propostas, sendo que sensivelmente dois terços tiveram origem em cidadãos “particulares” enquanto as restantes vieram de “instituições e empresas”.

Costa e Silva, professor do Instituto Superior Técnico e CEO da Partex, tinha classificado o número de contributos de “muito interessante” por ser um sinal “muito bom” sobre a discussão pública do plano de recuperação na sociedade portuguesa. Além disso, tinha dito que houve contributos de todas as áreas, o que se confirma nos dados do Executivo e é positivo.

O gabinete do Primeiro-Ministro confirma também que a sessão de balanço da consulta pública se realizará no dia 15 de setembro e que “serão convidados todos os que participaram na consulta”, com vista a retirar dos contributos, no dizer de Costa Silva, “o que é essencial para melhorar a visão estratégica”.

Este é mais um passo que o Governo dá até ao desenho dum esboço do plano de recuperação que o Executivo deverá enviar à Comissão Europeia até 15 de outubro, sendo que a versão final terá de ser entregue até 30 de abril do próximo ano, mas que o Governo quer entregar quanto antes. Após a avaliação de Bruxelas, Portugal deverá ter acesso a 12,9 mil milhões de euros ao abrigo do Instrumento de Recuperação e Resiliência do próximo orçamento europeu.

Dos 10 eixos definidos por Costa Silva, segundo o Gabinete do Primeiro-Ministro, o que gerou mais interesse, dado o número de propostas, foi “Qualificação da População, a Aceleração da Transição Digital, as Infraestruturas Digitais, a Ciência e Tecnologia”, com 187 propostas. Seguem-se “Coesão do Território, Agricultura e Floresta”, com 157, e “Uma Rede de Infraestruturas Indispensáveis”, com 156 propostas. E também receberam mais de 100 propostas o eixo relativo ao Estado Social e o eixo sobre a “Reindustrialização do País – Uma Indústria Competitiva e de Futuro”.

São de recordar aqui os “10 eixos estratégicos em que está estruturado o documento “Visão Estratégia para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030: Rede de Infraestruturas indispensáveis; qualificação da população, a aceleração da transição digital, as infraestruturas digitais, a Ciência e Tecnologia; Saúde e o futuro; Estado Social; Reindustrialização do país; Reconversão industrial; Transição energética e eletrificação da economia; Coesão do território, Agricultura e Floresta; Novo paradigma para as cidades e a mobilidade; e Cultura, Serviços, Turismo e Comércio.

O Governo diz que, partir desta visão estratégica, “será desenhado o Plano de Recuperação, a apresentar à Comissão Europeia, com vista à utilização dos fundos europeus disponíveis”, cuja alocação “deve assentar num pensamento estratégico sobre o futuro do país”. E conclui:

Trata-se, pois, de formular uma visão para Portugal no horizonte de uma década, visão essa que enformará a estratégia de recuperação económica da crise provocada pelo novo coronavírus, servindo ainda de referencial para o modelo de desenvolvimento do país num contexto pós-covid”.

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Considerando tudo isto, o grupo parlamentar do PS entende que é chegado o “momento adequado” para debater na Assembleia da República (AR) o plano de recuperação económica 2020/30, delineado por Costa Silva. Por isso, já requereu a “audição urgente” do consultor do Governo António Costa Silva, autor do plano de recuperação económica 2020/30, na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, levando esta problemática ao debate político na AR, de modo a tornar esta abordagem ainda mais abrangente, com reflexão mais diversificada, baseada em diferentes visões de distintos quadrantes políticos, capaz de ajudar a gerar um entendimento vasto e um consenso sólido a favor do país”.

O texto de Costa e Silva, que se pretende assumir como o documento “enquadrador das opções e prioridades que deverão nortear a recuperação dos efeitos económicos causados pela atual pandemia da covid-19”, será depois trabalhado pelo Governo, antes de ser entregue em Bruxelas em outubro em versão provisória e, em definitivo, nos primeiros meses de 2021.

Para já estão escolhidas como primeiras prioridades o Serviço Nacional de Saúde e a transição climática. Boa escolha, sem dúvida, mas não pode ser descurada qualquer das vertentes que para elas convirjam. Além disso, contra o que geralmente acontece nos gabinetes ministeriais e quejandos, a atenção dos portugueses tem de requerer forte vontade política, finura ética, sentido de justiça, agudeza científica, capacidade técnica, disponibilidade económica e engenharia financeira. Vamos ver!

2020.09.08 – Louro de Carvalho

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