quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Razões para um novo surto de declarações de situação de contingência

 

De acordo com o respetivo comunicado e com as pertinentes e subsequentes declarações do Primeiro-Ministro, o Conselho de Ministros, na sua reunião deste dia 10 de setembro de 2020, aprovou a resolução que declara a situação de contingência em todo o território nacional continental, no âmbito da pandemia da doença de covid-19, a partir das 00,00 horas de 15 de setembro de 2020 até às 23,59 horas de 30 de setembro de 2020.

Trata-se, sem mais, de estender a todo o território do continente o regime da situação de contingência que vigora para a Área Metropolitana de Lisboa, o que pode reeditar-se se a evolução da pandemia o exigir – avaliação que será feita com uma periodicidade quinzenal.

Em síntese, que pode ler-se no aludido comunicado, em conformidade com o estipulado na Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, e cuja última alteração foi introduzida pela Lei n.º 80/2015, de 3 de agosto, as medidas mais relevantes são: a limitação das concentrações a 10 pessoas, salvo se pertencentes ao mesmo agregado familiar, na via pública e em estabelecimentos; a proibição da venda de bebidas alcoólicas em áreas de serviço ou em postos de abastecimento de combustíveis e, a partir das 20 horas, nos estabelecimentos de comércio a retalho, incluindo supermercados e hipermercados; a proibição do consumo de bebidas alcoólicas em espaços exteriores dos estabelecimentos de restauração e bebidas após as 20 horas, salvo no âmbito do serviço de refeições; a aplicação a todo o território nacional da opção de atribuir, em regra, ao presidente da câmara municipal territorialmente competente a competência para fixar os horários de funcionamento dos estabelecimentos da respetiva área geográfica, ainda que dentro de determinados limites – das 20 horas às 23 horas – e mediante parecer favorável da autoridade local de saúde e das forças de segurança; a passagem da lotação máxima, nos estabelecimentos comerciais, de uma pessoa por 20 m2 para uma pessoa por 13 m2, para evitar concentrações de pessoas à porta; a imposição, nos restaurantes, cafés e pastelarias a 300 m das escolas, bem como áreas de restauração de centros comerciais, do limite máximo de 4 pessoas por grupo, salvo se pertencentes ao mesmo agregado familiar; a definição do mesmo limite máximo de 4 pessoas por grupo; a criação de equipas distritais de intervenção rápida para contenção e estabilização de surtos em lares; o estabelecimento de regras específicas de organização de trabalho nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, determinando-se a obrigatoriedade de serem adotadas medidas de prevenção e mitigação dos riscos decorrentes da pandemia, como escalas de rotatividade de trabalhadores entre o regime de teletrabalho e o trabalho prestado no local de trabalho habitual, e o desfasamento de horários.

Assim, os estabelecimentos comerciais – com exceção de ginásios, cabeleireiros ou pastelarias, por exemplo – só devem abrir a partir das 10 da manhã. E os supermercados, hipermercados ou cafés podem permanecer abertos até às 23 horas, mas esta decisão, relativa ao período entre as 20 e as 23 horas, poderá ser alterada pelas autarquias (neste caso, os municípios).

Foi garantido que, até ao final do mês, estarão operacionais 18 brigadas de emergência (Uma por distrito?) – constituídas por médicos, enfermeiros e técnicos de diagnóstico, num total de 400 pessoas – para agir de forma rápida nos surtos em lares, de forma a evitar o que sucedeu em Reguengos e Monsaraz. Tarde, mas vale mais tarde que nunca!

Mantém-se a medida de proibição de acesso do público aos recintos desportivos, o que evidentemente desagradará aos clubes, mas justificável pelos excessos de exaltação.   

Como se torna evidente, nos termos do aludido comunicado governamental, há algumas medidas específicas para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, onde se concentram a maioria dos casos de covid-19. Na sequência, o Governo aprovou um diploma – e vai dialogar com os parceiros sociais – com medidas para que, nas empresas, os trabalhadores fiquem, rotativamente, em teletrabalho e trabalho presencial (espelho), bem como preconiza medidas de teor análogo para o desfasamento de horários dos trabalhadores, ou seja, quer horários diferenciados de entrada e saída e horários diferenciados para pausas e refeições. Trata-se de duas medidas que têm por objetivo a redução dos grandes movimentos pendulares nas duas áreas metropolitanas do país.

O uso de máscara na rua, uma dúvida que se levantava neste pacote de medidas, não avança, mantendo-se a situação atual em que o uso de máscara é obrigatório nos espaços fechados.

Por outro lado, o Conselho de Ministros aprovou o decreto-lei que estabelece um regime excecional e transitório de reorganização do trabalho, com vista à minimização de riscos de transmissão da covid-19 no âmbito das relações laborais, bem como a proposta de lei que altera o prazo de submissão da proposta do orçamento municipal para 2021.

Sobre a predita proposta de lei o Governo esclarece que “o alargamento do prazo, de 31 de outubro para 30 de novembro, fundamenta-se na incerteza económica decorrente da situação originada pela epidemia SARS-CoV-2, importando que os orçamentos municipais venham a ser aprovados com a informação o mais atualizada possível, evitando-se alterações e retificações por factos que venham ocorrer em 2020”.

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As razões que subjazem a esta excecional tomada de medidas no quadro da declaração da situação de contingência são o crescimento de novos casos diários de contágio da doença, o início do ano letivo escolar e o aumento expectável de pessoas em circulação, designadamente, nos transportes públicos em áreas com elevada densidade populacional.

Por tudo isto, o Governo promete aumentar a capacidade de testagem do Serviço Nacional de Saúde (SNS) dos 14 mil testes que se estão a fazer diariamente para os 21 mil diários. Assim disse o Primeiro-Ministro, em conferência de imprensa após o Conselho de Ministros:

Reforçamos significativamente ao longo destes meses a capacidade do SNS. Inicialmente realizavam-se dez mil testes por dia e, neste momento, só no SNS, estão a ser feitos 14 mil. Com os investimentos previstos, ao longo das próximas semanas, e só no SNS, aumentaremos para mais de 21 mil os testes feitos por dia.”.

Para lá dos serviços públicos de saúde, há 102 laboratórios privados que estão a realizar testes. E o António Costa adiantou que o Governo está a “concluir a assinatura de um protocolo” com a FFMS (Francisco Fundação Manuel dos Santos) e com o IMMM (Instituto de Medicina Molecular) que vai “permitir aumentar de forma muito significativa a capacidade de testagem”, visto que “temos de ter a capacidade de, assim que há um caso suspeito, testá-lo rapidamente”.

O Chefe do Governo avançou que foi ultrapassada a barreira dos dois milhões de testes. Com efeito, até 6 de setembro, foram realizados 2,186 milhões de testes; e, no dia 8 de setembro, foi batido um recorde de 20.527 testes diários, visto que “hoje temos o dobro dos laboratórios que tínhamos no início da crise”.

Estas declarações do Primeiro-Ministro foram proferidas no contexto das novas restrições que se aplicam em todo o país, que voltarão a ser ainda mais apertadas em Lisboa e Porto, bem como junto às escolas, não se registando qualquer alívio de regras, nem no desporto, antes advindo um ligeiro aperto para todos, embora sem máscaras obrigatórias nas ruas. Mas a mensagem para os portugueses é clara: “é preciso um esforço, porque não é possível fechar tudo outra vez”. Com efeito, António Costa, que deu a cara pelas novas medidas de restrição, que apertam o país – todo ele – de novo em estado de contingência, já a partir do dia 15, apareceu com uma mensagem determinada, a justificar esta constrição nas regras:

Temos uma linha vermelha: não podemos voltar a fechar as escolas, não podemos voltar a fechar a economia”.

Há uma parte das novas regras que o Chefe do Governo não desvendou no seu todo, as que aplicará só nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto para levar as empresas ao desfasamento de horários e de trabalho em espelho, de forma a aliviar um pouco os transportes públicos e os espaços de trabalho. Ficou apenas a formulação genérica, porque o diploma terá de passar pelas mãos dos parceiros sociais por obrigação legal, por ser matéria laboral. De resto, embora a estratégia seja mais de não aliviar nada (por exemplo, a entrada de público nos espetáculos desportivos está adiada sine die), há mais clareza em alertar para a necessidade de manter o distanciamento físico, mais até do que em apertar muito mais as medidas face ao que o país já conheceu.

Assim, Costa disse, por exemplo, nada ter contra festas, mas sublinhou que incumbe “a cada um de nós” garantir que a pandemia não se descontrola de novo, já que, nos próximos meses o país vai viver numa dança com o vírus que terá muitas variações de local para local.

Com um aperto nas regras, que não chegou à máscara obrigatória nas ruas (como em Paris, por exemplo), foi para cada cidadão e para cada empresa que o Primeiro-Ministro quis passar a responsabilidade, apelando a que todos descarreguem a aplicação Stayaway Covid, visando a deteção rápida de casos e surtos, evitando fecho generalizado de estabelecimentos, pois, como disse aos jornalistas, “não há melhor fiscal do que cada um de nós”. No entanto, disse contar, no caso das empresas, com o reforço dos inspetores do trabalho para o cumprimento das normas. e lembrou que, desde início de agosto. os casos voltaram a subir:

Nas últimas semanas, desde início de agosto tem havido crescimento sustentado de novos casos. Este período de férias, seja por natural relaxamento do comportamento, seja por aumento de deslocação e encontros, tem contribuído para esses novos casos.”.

Porém, foi dando a segurança de que o sistema de saúde foi reforçado, a capacidade de testagem foi e será reforçada e o país está hoje mais preparado do que em março ou abril.

E, questionado sobre as “linhas vermelhas” que podem levar o Governo a apertar medidas, apontou a evolução do número de óbitos, a capacidade de resposta dos cuidados intensivos nos hospitais, vincando:

A primeira linha tem a ver com a evolução dos óbitos, não há bem maior do que a vida. Em segundo lugar, a capacidade de resposta dos cuidados intensivos. Se de repente todos necessitarmos de cuidados intensivos, o sistema não tem capacidade de resposta. Isso é um indicador importante.”.

Costa tinha destacado que, apesar do aumento de novos casos em Portugal, 97,6% das pessoas infetadas não necessitaram de tratamento hospitalar, 2,1% estiveram em internamento e “só 0,3% têm necessidade de intervenção nos cuidados intensivos”. E, depois, reiterou que o aumento do número de novos casos também está relacionado com uma maior capacidade de testagem, pois continuamos a ser “um dos países que mais testa os seus habitantes”. Com efeito, a 8 de setembro, foram realizados 20 527 testes, um valor recorde.

Segundo os números avançados pelo líder do Executivo no total foram realizados, até ao último domingo, 2 milhões 186 mil testes, o que mostra tanto a gravidade da situação como o esforço do Estado em conter a pandemia. Porém, é de acentuar que há mais doenças – e letais – para lá da covid-19, que não podem ser descuradas como até agora. Necessitas obligat!

2020.09.10 – Louro de Carvalho

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