domingo, 12 de fevereiro de 2017

Nossa Senhora de Lourdes e o XXV Dia Mundial do Doente

Por carta de 13 de maio de 1992, de João Paulo II ao cardeal Forenzo Angelini, então Presidente do Conselho Pontifício para a Pastoral dos Agentes Sanitários (depois transmutado em Pontifício Conselho para Pastoral no Campo da Saúde e que hoje integra o Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral) foi instituído o Dia Mundial do Doente ou Dia Mundial do Enfermo, a celebrar a partir de 11 de fevereiro de 1993. O objetivo deste dia é chamar a atenção da Igreja e da sociedade para as condições de tratamento das pessoas enfermas.
Dado que, a 11 de fevereiro, se celebra a memória litúrgica de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira dos doentes (dada a acorrência de muitos ao seu santuário em França, alguns miraculados) e embora a jornada seja vivida, refletida e celebrada em toda a Igreja, o seu epicentro é o Santuário de Lourdes, quer por vontade do Pontífice que a instituiu quer dos seus sucessores.
Na referida carta (n.º 2), o Papa polaco justifica-se:
“A Igreja, que sempre sentiu, a exemplo de Cristo, como parte integrante da sua missão o dever do serviço dos enfermos e dos outros que sofrem, está consciente de que na aceitação amorosa e generosa de toda a vida humana, sobretudo se é débil ou enferma, vive hoje um momento fundamental da sua missão (Christifideles laici, 38). E não deixa de sublinhar o caráter salvífico do oferecimento do sacrifício que, vivido em comunhão com Cristo, pertence à própria essência da redenção (cf Redemptoris missio, 78).”.
Quanto à escolha do dia, já havia um precedente, como refere o Beato João Paulo II (vd id, n.º 3):
“Como escolhi o dia 11 de fevereiro de 1984 para publicar a carta apostólica Salvifici doloris acerca do significado cristão do sofrimento humano e para criar, no ano seguinte, este Conselho Pontifício para a Pastoral dos Agentes Sanitários, considero significativo fixar esta mesma data para a celebração da Jornada Mundial do Enfermo. Com efeito, com Maria, ‘Mãe de Cristo, que estava junto à cruz, detemo-nos diante de todas as cruzes dos homens de hoje’ (Salvifici doloris, 31).”.
Depois, vem a justificação para a escolha do santuário de Lourdes:
“E Lourdes, um dos santuários marianos mais queridos para o povo cristão, é o lugar e, ao mesmo tempo, símbolo de esperança e de graça no sentido da aceitação e da oferta do sofrimento salvífico” (id et ib).
***
Convém referir que, em 1858, quatro anos após a definição do dogma da Imaculada Conceição pelo Papa Pio IX, a Imaculada Virgem Maria apareceu a Bernarda Soubirous (Bernardette, em termos familiares) na gruta de Massabielle, perto de Lourdes (França). Por intermédio desta menina, Maria declarou-se a Imaculada Conceição (como que a confirmar a definição dogmática), chamou os pecadores à conversão e despertou na Igreja um intenso movimento de oração e caridade, sobretudo em benefício dos doentes e dos pobres. Também Bernarda era pobre e doente.
Para comemorar as aparições na gruta de Massabielle, na margem esquerda do rio Gave, e o dogma da Imaculada Conceição, o Papa Leão XIII instituiu a festa de Nossa Senhora de Lourdes (memória litúrgica com a reforma do calendário após o Vaticano II), uma réplica da solenidade do dia 8 de dezembro, em tempo pré-natalício.
Em carta ao padre Gondrand, no ano de 1861, Bernarda confidencia:
“Um dia, fui com duas meninas às margens do Rio Gave buscar lenha. Ouvi um rumor, voltei-me para o prado, mas não vi movimento nas árvores. Levantei a cabeça e olhei para a gruta. Vi uma senhora vestida de branco: tinha um vestido alvo com uma faixa azul celeste na cintura e uma rosa de ouro em cada pé, da cor do rosário que trazia com ela. […]. Somente na terceira vez, a Senhora me falou e perguntou-me se eu queria voltar ali durante quinze dias. […]. Durante quinze dias lá voltei e a Senhora apareceu-me todos os dias, com exceção de uma segunda e uma sexta-feira. Repetiu-me, várias vezes, que dissesse aos sacerdotes para construir, ali, uma capela. Ela mandava que fosse à fonte para lavar-me e que rezasse pela conversão dos pecadores. Muitas e muitas vezes perguntei-lhe quem era, mas ela apenas sorria com bondade. Finalmente, com braços e olhos erguidos para o céu, disse-me que era a Imaculada Conceição”.
Sabe-se também que a Senhora fazia o sinal da cruz e mexia os lábios nas contas de pai-nosso no rosário, mas as contas de ave-maria desfiava-as sem mexer os lábios.
***
Por ocasião deste XXV Dia Mundial do Enfermo, o Papa Francisco nomeou o Cardeal Secretário de Estado Pietro Parolin como seu Enviado Especial a Lourdes.
A jornada foi inaugurada, na tarde do dia 10, pelo Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado e Enviado Especial do Papa, pelo Cardeal Peter Turkson, Prefeito da Congregação para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, e por Dom Nicolas Brouwert, bispo de Tarbes e Lourdes. Na manhã do dia 11 (o dia principal), o Cardeal Pietro Parolin presidiu à Celebração Eucarística, denominada Missa internacional, na Basílica São Pio X, a que se seguiu a oração mariana do Angelus. Na parte da tarde, fez uma meditação durante a Adoração Eucarística. No dia 12, o Cardeal Peter Turkson celebrou a Santa Missa, a que se seguiram duas conferências: a do Arcebispo de Chieti-Vasto, Dom Bruno Forte, com o tema “A Igreja, Mãe de Misericórdia”; e a do Arcebispo de Rennes, Dol et Saint Malo, Dom Pierre Ornellas, “Digam aos doentes: o Reino de Deus está próximo de vós”.
Em sintonia com o Dia Mundial do Enfermo, neste domingo, 12 de fevereiro, a Igreja na França celebrou também o Domingo da Saúde, com o tema: “Escolha a vida”.
***
Neste ano, o tema da mensagem do Papa (de 8 de dezembro, solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria) para o Dia Mundial do Enfermo é “Admiração pelo que Deus faz: o Todo-Poderoso fez em mim maravilhas”.
Francisco sustenta que este dia “é uma ocasião para prestar especial atenção à condição dos doentes e, mais em geral, a todos os que estão em atribulação. Ao mesmo tempo, convida quem se prodigaliza em favor dos doentes, começando pelos familiares, profissionais de saúde e voluntários, a dar graças a Deus pela vocação que dele recebeu para acompanhar os irmãos enfermos”. Além disso, afirma que “esta recorrência renova, na Igreja, o vigor espiritual para desempenhar sempre da melhor forma a parte fundamental da sua missão, que inclui o serviço aos últimos, aos enfermos, aos atribulados, aos excluídos e aos marginalizados” (cf João Paulo II, Motu próprio Dolentium hominum,1).
Em ajuda desta mística, vêm “os momentos de oração, as Liturgias Eucarísticas e da Unção dos Enfermos, a interajuda aos doentes e os aprofundamentos bioéticos e teológico-pastorais que se realizarão em Lourdes” e que “prestarão uma nova e importante contribuição para tal serviço”.
Assim, o Papa Francisco deseja encorajar “a todos – doentes, atribulados, médicos, enfermeiros, familiares, voluntários – a olhar Maria, Saúde dos Enfermos, como a garante da ternura de Deus por todo o ser humano e o modelo de abandono à vontade divina”; e também “a encontrar sempre na fé, alimentada pela Palavra e pelos Sacramentos, a força para amar a Deus e aos irmãos mesmo na experiência da doença”.
Como Consoladora dos aflitos, Maria ilumina, segundo o Pontífice, “com o seu olhar o rosto da Igreja no seu compromisso diário a favor dos necessitados e dos doentes”. E “a solidariedade de Cristo, Filho de Deus nascido de Maria, é, pela Paixão e Cruz, a expressão da omnipotência misericordiosa de Deus que se manifesta na nossa vida” – sobretudo frágil, ferida, humilhada, marginalizada ou atribulada –, infundindo-lhe “a força da esperança que nos faz levantar e sustenta” e dizer com Paulo: “completo na minha carne o que falta à Paixão de Cristo” (Cl 1,24).
Mas o Papa quer que aproveitemos o ensejo para: “encontrar novo impulso a fim de contribuir para a difusão duma cultura respeitadora da vida, da saúde e do meio ambiente”; e “encontrar um renovado impulso a fim de lutar pelo respeito da integridade e dignidade das pessoas, inclusive mediante uma abordagem correta das questões bioéticas, a tutela dos mais fracos e o cuidado pelo meio ambiente”.
E a mensagem termina com uma oração à Senhora do acolhimento:
“Ó Maria, nossa Mãe, que, em Cristo, acolheis a cada um de nós como filho,
Sustentai a expectativa confiante do nosso coração,
Socorrei-nos nas nossas enfermidades e tribulações,
Guiai-nos para Cristo, vosso filho e nosso irmão, e
Ajudai a confiarmo-nos ao Pai que faz maravilhas”.
***
Em carta de 19 de janeiro, em que nomeia o Cardeal Pietro Parolin como seu Enviado Especial a Lourdes, o Papa afirma que é nosso dever tratar da pessoa humana toda – alma, mente e corpo – “para que cada pessoa se sinta bem e louve o seu Criador, que fez, por amor, com que todas as coisas existissem, mas não criou o mal e a morte nem se alegra com a perdição dos vivos”.
Além disso, “o Altíssimo deu aos homens a ciência para que seja honrado nas suas maravilhas, pelo que os pastores, os médicos, os enfermeiros e os próprios doentes rogarão ao Senhor que os dirija para o reto conhecimento e propicie a cura”.
E, neste pano de fundo doutrinal e pastoral, Francisco pretende que o cardeal se apresente como seu legado a transmitir o peculiar afeto e solicitude do Sumo Pontífice para com todos os doentes e para com aqueles que têm o cuidado deles. Por outro lado, quer que o purpurado, que tem colaborado de forma eminente com o Papa em prol do bem de toda a Igreja, seja porta-voz da devoção filial do Papa para com Maria, a Saúde dos Enfermos, perante a multidão dos fiéis que a 11 de fevereiro se congrega no Santuário de Lourdes.
Mais solicita ao seu Enviado Especial que faça com que todos roguem à Mãe de Deus que “Ela própria implore do seu divino Filho as maiores graças, sobretudo a paciência na tribulação, a confiança em Deus, a gratidão pelos benefícios recebidos e a grande caridade para com todos”.
Finalmente, pretende que Parolin, explicando a todos, mas em especial a quem sofre e a quem trata dos doentes, a solicitude medicinal do Senhor para com os que sofrem, de modo que possam professar como o apóstolo Pedro com um coração sincero: “Senhor, a quem iremos? Só Tu tens palavras de vida eterna.” (Jo 6,68).
***
Que a Senhora da Saúde não deixe que o sofrimento nos distraia das maravilhas de Deus e do conforto da fraternidade em Cristo, espelho do coração misericordioso do Pai de todos.   

2017.02.12 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário