quarta-feira, 23 de março de 2022

Presidente da República irritado com fuga de informação

 

Estava prevista uma audiência do Primeiro-Ministro em Belém na noite deste dia 23 de março, após reunião com o grupo parlamentar do PS, para entrega ao Presidente da República do elenco de ministros do XXIII Governo Constitucional, elenco que os serviços da Presidência da República divulgariam após o conhecimento consolidado das conclusões da contagem dos votos dos emigrantes do círculo da Europa, escrutínio repetido a 12 e 13 de março por deliberação do Tribunal Constitucional, do que resultaram 2 mandatos para o PS, perdendo o PSD o que obtivera.

Entretanto, António Costa, no início da tarde, divulgou as linhas gerais da estrutura orgânica do novo Governo. Assim, ficou a saber-se que o novo Executivo terá menos dois ministros do que o atual. Isto corresponde, no total, a uma redução de 20 por cento no número de governantes, nas contas do gabinete do PM – redução que se consegue, não tanto pela redução de ministros, mas sobretudo eliminando secretarias de Estado. Nestes termos, o Governo, com 17 ministros e 38 secretários de Estado, é a imagem da média dos executivos desde 1976, mas maior do que os mais recentes: os de José Sócrates e Passos Coelho.

A nova orgânica confirma que não haverá ministros de Estado (há 4, atualmente). O Primeiro-Ministro terá dois secretários de Estado na sua direta dependência: o da Digitalização e da Modernização Administrativa; e o dos Assuntos Europeus.

Acabam três ministérios: do Mar, do Planeamento e da Modernização do Estado; e surge um novo, o Ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares.

O Ministério do Mar desaparece como entidade autónoma e é incorporado na Economia, que passa a Ministério da Economia e do Mar. Também são extintos os ministérios da Modernização do Estado e da Administração Pública e o do Planeamento. Ambos são reduzidos a secretarias de Estado: as do Planeamento e da Administração Pública ficarão na dependência do Ministério da Presidência. E o Ministério da Presidência do Conselho de Ministros passa a ser o segundo na hierarquia, logo a seguir ao PM.

A nova estrutura ministerial é a seguinte: Ministro da Presidência, com três secretários de Estado; Ministro Negócios Estrangeiros, com dois; Ministro Defesa, com um; Ministro da Administração Interna, com dois; Ministro da Justiça, com dois; Ministro das Finanças, com três; Ministro-Adjunto e Assuntos Parlamentares, com dois; Ministro da Economia e do Mar, com três; Ministro da Cultura, com um; Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, com um; Ministro da Educação, com um; Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, com três; Ministro da Saúde, com dois; Ministro do Ambiente e Ação Climática, com três; Ministro das Infraestruturas e Habitação, com dois; Ministro da Coesão Territorial, com dois; e Ministro da Agricultura e Alimentação, com dois.

E ficou reiterado que a lista nominal dos ministros seria revelada à noite, pelos serviços do Palácio de Belém, depois de o Primeiro-Ministro a entregar formalmente ao Presidente da República.

Entretanto, o Presidente da República manifestou-se irritado com as fugas de informação que já revelavam, embora com erro a composição completa do novo elenco ministerial de Costa.

Falando à SIC à porta do Palácio de Belém, Marcelo disse que, se a lista divulgada ao início da tarde “for correta, dispensa-se uma audiência” com o Primeiro-Ministro para esse efeito.

O Presidente assegurou que ainda não conhecia a composição do novo Governo. Mas, “no caso de a lista ser correta, até facilita a minha vida porque assim mais rapidamente estou à vontade”. Ou seja: “Dispensa-se uma audiência”.

Pelos vistos fiquei a saber pela comunicação social”, desabafou.

Na verdade, citando apenas “fontes”, a SIC-Notícias revelou esta tarde o elenco ministerial daquele que será o XXIII Governo Constitucional.

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Não duvido de que Marcelo tenha razão na sua postura de irritação. O próprio Dr. António Costa o reconhece, pois, quando chegou à reunião da bancada do PS, falou aos jornalistas para desfazer equívoco institucional criado com Marcelo dizendo:

Sobre o facto de ter havido uma fuga de informação, só posso partilhar da mesma irritação do Presidente da República, porque todos sabemos que deve haver normas institucionais”.

Todavia, rejeitou que este desencontro seja mau indício para o arranque de um novo mandato. Ao invés, enalteceu o facto de o Presidente ter aprovado os nomes propostos para o novo governo, que diz ser um governo de “combate”, com um forte “núcleo político”.

E sobre a predita irritação, foi claro:

Se ele estiver irritado, percebo bem, não estou menos irritado do que ele (…). Os portugueses conhecem bem o senhor Presidente da República, conhecem-me bem e nós conhecemo-nos bem um ao outro: se há coisa que o senhor Presidente da República sabe, é que a fuga não veio de mim, não veio do meu gabinete nem de ninguém que dependa de mim.”.

Não obstante, o PR devia ficar incomodado com tantas fugas de informação que ocorrem nos diversos departamentos do Estado: no Ministério Público, nos Tribunais, nas Polícias, nas Forças Armadas, no Parlamento, no Governo, no Palácio de Belém, nos comentários televisivos e em notícias de jornal. Mas parece que se irrita só quando as fugas de informação atingem direta ou indiretamente o seu exercício, com dano ou sem ele.

Caso emblemático foi o da tentativa de substituição do CEMA em outubro passado. Irritação, sem dúvida, mas sem consequências para o autor da fuga de informação, mas tendo como resultado a travagem do processo.

Jornais, como “Expresso” e “Correio da Manhã” ostentam a cada passo informações veiculadas de fontes de diversos departamentos do Estado, incluindo o Palácio de Belém, Marques Mendes é useiro e vezeiro em adiantar informações que era suposto estarem ainda fora do conhecimento público, segredo de justiça é quebrado recorrentemente, enfim as fugas de informação são recorrentes nas empresas, nos serviços, no Estado, na diplomacia. No entanto, nunca se vê qualquer irritação presidencial.   

Desta feita, anulou a audiência com o Primeiro-Ministro que apenas significava um ato de deferência, porquanto a lista de ministros poderia muito bem ter sido enviada por correio postal ou eletrónico ou por entrega em mão numa circunstância solene, como realmente veio a acontecer na abertura das comemorações da revolução abrilina no Pátio da Galé.

Por fim, aqui se deixa o próximo elenco ministerial que espera nomeação e posse lá para o dia 30 de março, publicados que estejam os resultados oficiais das eleições legislativas de 30 de janeiro, dossiê terminado neste dia 23 e da primeira reunião da Assembleia da República:   

Primeiro-Ministro: ANTÓNIO LUÍS SANTOS DA COSTA

Ministra da Presidência: MARIANA GUIMARÃES VIEIRA DA SILVA

Ministro dos Negócios Estrangeiros: JOÃO TITTERINGTON GOMES CRAVINHO (mudou de pasta)

Ministra da Defesa Nacional: MARIA HELENA CHAVES CARREIRAS (novidade)

Ministro da Administração Interna: JOSÉ LUÍS PEREIRA CARNEIRO (novidade)

Ministra da Justiça: CATARINA TERESA ROLA SARMENTO E CASTRO (novidade)

Ministro das Finanças: FERNANDO MEDINA MACIEL ALMEIDA CORREIA (novidade)

Ministra-Adjunta e dos Assuntos Parlamentares: ANA CATARINA VEIGA DOS SANTOS MENDONÇA MENDES (novidade)

Ministro da Economia e do Mar: ANTÓNIO JOSÉ DA COSTA SILVA (novidade)

Ministro da Cultura: PEDRO ADÃO E SILVA CARDOSO PEREIRA (novidade)

Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: ELVIRA MARIA CORREIA FORTUNATO (novidade)

Ministro da Educação: JOÃO MIGUEL MARQUES DA COSTA (novidade)

Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: ANA MANUEL JERÓNIMO LOPES CORREIA MENDES GODINHO

Ministra da Saúde: MARTA ALEXANDRA FARTURA BRAGA TEMIDO DE ALMEIDA SIMÕES

Ministro do Ambiente e da Ação Climática: JOSÉ DUARTE PITEIRA RICA SILVESTRE CORDEIRO (novidade)

Ministro das Infraestruturas e da Habitação: PEDRO NUNO DE OLIVEIRA SANTOS

Ministra da Coesão Territorial: ANA MARIA PEREIRA ABRUNHOSA TRIGUEIROS DE ARAGÃO

Ministra da Agricultura e da Alimentação: MARIA DO CÉU DE OLIVEIRA ANTUNES

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Uma dezena de rostos novos, mas a maior parte já conhecida de outras andanças. Na educação parece que se continua como dantes, pois o homem forte de Secretário de Estado passou a titular da pasta. Não creio que a escola se livre do espartilho das fichas, relatórios, avaliação atomizada, tensão entre autonomia e controlo externo. A espectativa estará na pasta da Economia e do Mar.  

2022.03.23 – Louro de Carvalho

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