A Unesco (Organização
das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) imagina um cenário em que todas as escolas servirão
de modelo para o respeito dos direitos humanos.
Na verdade, em novo relatório “Futuros da Educação: Reimaginando
os nossos futuros juntos: um novo contrato social para a educação”, que suscitou
a consulta a mais de 1 milhão de pessoas, aquela agência da ONU pede reflexão
sobre o tipo de educação que o mundo imagina e quer em 2050, mencionando
práticas a manter e outras que podem ser abandonadas, bem como sugerindo criatividade.
O principal ponto é a pedagogia baseada na cooperação e solidariedade, por um
mundo com mais compaixão.
A produção do
relatório, apresentado ao mundo a 10 de novembro pp, levou 2 anos e foca-se na
transformação do sistema educacional, para o tornar mais justo, humano e
sustentável, e na transformação do mundo com empatia e compaixão, pelo que propõe
que a “pedagogia tenha como base os princípios da cooperação, colaboração e
solidariedade”, levando em conta as capacidades intelectuais e morais dos
alunos, o que implica reverter preconceitos e divisões.
Também a
Unesco recomenda que os currículos escolares deem foco à aprendizagem
intercultural e interdisciplinar para que os estudantes produzam conhecimento e
desenvolvam a suas capacidades críticas. O documento defende que o programa
educacional “abrace conhecimentos sobre ecologia, para que a humanidade reequilibre
a maneira com que se relaciona com o planeta Terra”; releva a importância em
combater a desinformação, devendo as escolas aplicar conhecimentos científicos,
digitais e humanísticos que desenvolvam as habilidades dos alunos de saber
diferenciar informações falsas das verdadeiras; e sugere um futuro no qual os
professores sejam sempre reconhecidos pela sua importância na transformação
social, pelo que as principais caraterísticas da atuação dos docentes devem ser
a colaboração e o trabalho em equipa, com práticas pedagógicas focadas na autonomia,
liberdade e inclusão.
Assim, é imaginável
um cenário em que todas as escolas sirvam de modelo de respeito pelos direitos
humanos, sendo ambientes capazes de unir grupos diversos e expor os alunos a
desafios e possibilidades únicos, com foco no trabalho em equipa.
***
A
29 de novembro de 2021, a Fundação SM – obra de religiosos, ligada à ordem Marianista,
na Espanha e criada em 1977 com a missão de contribuir para o desenvolvimento
integral das pessoas por meio da educação – garantiu que publicaria o predito
relatório em português e espanhol em fevereiro de 2022, bem como as próximas cinco
edições nestas duas línguas. Com efeito, o documento convida governos e
cidadãos do mundo a forjar uma nova visão, regida por princípios como o reforço
da educação como bem público e comum, aumentando o investimento nela, na linha
do escopo da Fundação, incentivando o pensamento diferente sobre a aprendizagem
e as relações entre os estudantes, os professores, o conhecimento e o mundo e defendendo
sobretudo o papel dos professores.
Nas palavras
de Mayte Ortiz, diretora global da
Fundação SM, “vivemos um tempo decisivo para tornar a Terra um lugar
humanamente habitável e “este grande desafio só
poderá ser alcançado por meio da educação e em parceria com outras entidades”. Para
a Fundação SM, é uma honra e grande alegria trabalhar em parceria com a Unesco
para fazer chegar às escolas o impulso e motivação necessários para compreender
e tornar realidade Os futuros da
educação”.
Audrey Azoulay, diretora-geral da Unesco, e Sahle-Work Zewde, presidenta da Etiópia, apresentaram
este relatório, que é o resultado de um trabalho de dois anos, conduzido por
uma comissão internacional independente, de que faz parte o português Sampaio
da Nóvoa, a qual, para dar corpo a esta reflexão global, além de mais de um
milhão de cidadãos, consultou 400 escolas associadas e 200 cátedras Unesco em
todo o mundo. A sua leitura do relatório vê o tratamento pormenorizado de temas
ligados às tecnologias digitais, à mudança climática, ao retrocesso democrático
e à polarização social, bem como às incertezas em relação ao futuro no mercado
de trabalho. De acordo com as conclusões do documento, é urgente a mobilização
para criar novos contratos sociais ligados à educação que permitam colaborar
com o objetivo de forjar futuros pacíficos, justos e sustentáveis para todas as
pessoas.
Por tudo isto, os países membros da
Unesco comprometem-se a alocar 15% a 20% do gasto público à educação e a
aumentar o volume, previsibilidade e eficácia da ajuda internacional à educação
pelo cumprimento da doação de 7% do PIB para a ajuda oficial ao
desenvolvimento.
Nestes termos, está constituída a “Agenda para a educação em 2050”, segundo a qual pode a educação constituir um contrato social proposto pela
Unesco para superar a discriminação, a marginalização e a exclusão, devendo
garantir a igualdade de género e os direitos de todos, independentemente de
raça, origem étnica, religião, deficiência, orientação sexual, idade ou
cidadania. Para tanto, é necessário um grande compromisso em favor do diálogo
social e do pensamento e ação conjuntos.
Porém, o novo
contrato social propõe renovar a educação: organizando a pedagogia em torno dos princípios
de cooperação, colaboração e solidariedade; levando os currículos a dar ênfase
a uma aprendizagem ecológica, intercultural e interdisciplinar que ajude os
alunos a aceder a conhecimentos e a produzi-los, desenvolvendo ao mesmo tempo a
sua capacidade de os criticar e aplicar; continuando na aposta da profissionalização do ensino como um
esforço colaborativo em que o papel dos professores como produtores de
conhecimento e figuras essenciais na transformação educacional e social seja
reconhecido; tornando as escolas locais
educacionais protegidos, visto que promovem a inclusão, a equidade e o
bem-estar individual e coletivo, pelo que devem ser reinventadas a fim de
facilitar ainda mais a transformação do mundo em direção a futuros mais justos,
equitativos e sustentáveis; levando as pessoas e instituições a aproveitar
e fortalecer as oportunidades educacionais que surgem ao longo da
vida e em diferentes contextos culturais e sociais.
O
novo contrato social em referência vem na continuidade do 4.º ODS (objetivo
de desenvolvimento sustentável)
um dos 17 ODS definidos pela ONU para 2030 – “educação e qualidade” – que se desdobra
em: garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade; e promover
oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
Nestes
termos, até 2020, ONU propôs-se ampliar substancialmente, a nível global, o número de
bolsas de estudo para os países em desenvolvimento, em particular os países
menos desenvolvidos, pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países
africanos, para o ensino superior, incluindo programas de formação
profissional, de tecnologia da informação e da comunicação, técnicos, de
engenharia e programas científicos em países desenvolvidos e outros países em
desenvolvimento. A tal ampliação substancial é a batalha de todos os dias.
Até
2030, a agenda da educação comprometia-se a:
- Garantir
que todas as meninas e meninos completam o ensino primário e secundário, de
acesso livre, equitativo e de qualidade e conducente a resultados de aprendizagem
relevantes e eficazes;
e têm acesso a um desenvolvimento de
qualidade na 1.ª fase da infância, bem como a cuidados e educação pré́-escolar,
de modo a estarem preparados para o ensino primário;
- Assegurar a igualdade de acesso de todos, homens e mulheres, à educação técnica,
profissional e superior de qualidade, a preços acessíveis (incluindo
à universidade); aumentar substancialmente o número de jovens e adultos que tenham habilitações
relevantes (inclusive competências técnicas e profissionais) para emprego, trabalho decente e empreendedorismo; eliminar as disparidades de género na educação e garantir a igualdade de
acesso a todos os níveis de educação e formação profissional para os mais vulneráveis,
incluindo as pessoas com deficiência, povos indígenas e crianças em situação de
vulnerabilidade; e garantir que todos os jovens e substancial proporção
dos adultos, homens e mulheres, sejam alfabetizados e tenham adquirido o
conhecimento básico de matemática;
- Garantir
que todos os alunos adquiram conhecimentos e habilidades necessárias para
promover o desenvolvimento sustentável, inclusive, entre outros, pela educação
para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida sustentáveis, direitos
humanos, igualdade de género, promoção da cultura de paz e da não violência,
cidadania global e valorização da diversidade cultural e da contribuição da
cultura para o desenvolvimento sustentável;
- Construir
e melhorar instalações físicas para educação, apropriadas para crianças e sensíveis
às deficiências e à igualdade de género, e que proporcionem ambientes de
aprendizagem seguros e não violentos, inclusivos e eficazes para todos; e aumentar substancialmente o contingente de professores qualificados,
inclusive por meio da cooperação internacional para a formação de professores,
nos países em desenvolvimento, especialmente os países menos desenvolvidos e
pequenos Estados insulares em desenvolvimento.
***
Como foi
referido, ao longo de dois anos e com base nas contribuições de mais de um
milhão de pessoas, uma Comissão Internacional independente sob a liderança da
Presidente da Etiópia, tendo ouvido 400 escolas e 200 Cátedras Unesco, preparou
este relatório global.
A Unesco lançou o projeto, em setembro de 2019, baseando-se
num processo mundial consultivo amplo e aberto que envolveu jovens, educadores,
sociedade civil, governos, empresas e outras partes interessadas – uma
iniciativa de cariz global para repensar a educação e moldar o futuro, na
convicção de que o conhecimento e a aprendizagem podem moldar o futuro da
humanidade e do planeta. Dedicado aos professores e alunos que foram
perturbados pela pandemia, o relatório não é só o resultado dum plano, mas é o
resultado vivo da contribuição de todos, pois “a humanidade tem
futuros comuns” e
para forjar futuros pacíficos, justos e sustentáveis, é preciso transformar
a própria educação”.
***
É
estranho que o JN (deste dia 5), noticiando que Sampaio da Nóvoa,
embaixador de Portugal na Unesco, iria apresentar o relatório na Universidade
da Madeira, propale que a Unesco recusa digitalização da escola, quando o que pretende
é o acesso universal à escola e à educação, mas rejeitando-se o ensino à
distância como regra. De resto a digitalização é ferramenta adequada. E é calunioso
dizer-se que o ensino ainda está nos moldes do século XIX. Nem tão pouco…
2022.01.05 – Louro de Carvalho
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